quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Receita para uma canção de escárnio

Uma maioria parlamentar fisiológica e voraz; a caneta presidencial que quase tudo pode e tudo faz para saciá-la; um presidente disposto a usá-la e usando-a sem escrúpulos. Uma Corte, majoritariamente condescendente. Camisas amarelas que voltam ao armário, satisfeitas com o ''Tchau'' que deram à ''Querida!'' e ou acomodadas ao fiasco resultante do impeachment. A sociedade, no geral, bestializada, apática, sem esperança. Lideranças políticas decadentes; um país pouco exigente: ingredientes para fazer uma canção de escárnio.

A não ser que os fatos ocorram de modo muito — mas, muito — surpreendente, o resultado da votação da denúncia do Ministério Público contra o presidente Michel Temer está dado: o arquivamento. Segundo o jornal O Globo, foram consumidos pelo menos R$ 12 bilhões — entre liberação de emendas, frustração de Receitas com o Refis, desistência de privatizações e a anistia de multas ambientais. 12 BI — culpa também do PT que banalizou o BILHÃO. E há concessões não quantificáveis, como a portaria do trabalho escravo — uma modernização, se comparada à idade média.

E não bastasse isso, a bofetada perene daquilo que se sabe e tudo o que se viu: malas destrambelhadas pelas ruas, escancaradas em apartamentos; parceiros de ontem, chamados canalhas de hoje. A desfaçatez, o desdém; o pouco rigor de quem, ontem, era rígido e exigente e hoje é só tangente.

Não se trata de justificar a volta de Dilma — essa vil desqualificação de argumentos já não cola. É apenas o direito que se lamente a morte da coerência, que se foi na corrente desse rio de lavar as mãos de tanta gente. O escárnio é tanto que dá para compor um versinho infame, uma cantiga de maldizer:
O presidente e sua base,
Heróis de antanho.
Figuras menores,
De baixo tamanho.
Vilões de opereta:
Homens de Estado
Profissionais da mutreta?
E há para quem tudo isso seja normal; coisa pouca, natural da política. O conceito de política que se carrega diz muito a respeito do caráter que se ostenta. Mas, caráter à parte — como se fosse possível — a questão é até mais comezinha: não se percebe que economia assim não se sustenta; que a credibilidade é base das instituições e a qualidade das instituições, o alicerce de qualquer economia.

E como se economia apenas bastasse… E como se a economia, agora, voasse… E como se o Estado e sua crise desaparecessem; e tudo, depois de esmaecer, acordasse em cores vivas, mistura de amarelo, verde e pink. Como se a sociedade fosse muito bem; a educação, a saúde, a segurança e o bem-estar prosperassem. E o cardápio eleitoral estivesse recheado dos mais saborosos quitutes… Que sonho idílico é esse que se sonha em meio ao pesadelo?

Mesmo para quem acompanha política, há anos, de nariz tapado, o odor é insuportável. Impregna na alma, na autoestima; fica nas unhas, esconde-se nas dobras e debaixo da pele. Aniquila a mais básica noção de identidade; imagem que não resiste ao espelho. Feita assim desse barro, a continuidade do mandato de Michel Temer é uma casa de palha onde não se abrigara país nenhum. Dessa matéria, não haverá país algum. Só esse nó e essa desfaçatez, diante da melodia de uma canção de escárnio.

Carlos Melo 

Brasil a pão e água

Se é governo tem que ajudar, se não é, pão e água
Darcisio Perondi (PMDB-RS)

Instituições com e contra pessoas

Essa é uma questão nas sociologias. Qual é o laço (ou o laço mais produtivo) entre um sócio e um clube, uma pessoa e uma instituição, um cidadão e um país?

E ainda mais curioso é discutir como uma instituição ou um grupo deve permanecer no tempo, enquanto seus membros desaparecem. 

É claro que a resposta está nas suas condutas que podem ser contra ou a favor da instituição da qual seus associados fazem parte. Se pensamos com o grupo, nós o internalizamos e ele se concretiza – se expressa (tal como ocorre numa peça de teatro) por meio de nossas ações que contribuem para os seus propósitos. Mas se dele tiramos proveito e o usamos desabridamente, ocorre essa tão nossa e triste conhecida cisão entre atores e papéis. O resultado é o desalinho da vida institucional porque os papéis sociais que pertencem à coletividade são usados para fins particulares. Os indivíduos tornam-se mais importantes do que o todo – ou a instituição que assim perde a lealdade dos seus membros e a confiança da sociedade em geral. Nesse caso, ela corre o risco de morrer ou, o que talvez seja pior, de sobreviver sem o respeito do sistema de poderes no qual é um poder fundacional.

Tenho falado sobre papéis e instituições sociais porque é por meio de papéis sociais que nos tornamos parte do mundo e nele atuamos. Não entramos no teatro da vida por escolha ou eleição, mas por destino. Um dia, percebemos que somos membros de uma família e de uma casa como filho, irmão, sobrinho e neto. Como uma “excelência” ou um humilde filho de família. No entanto, descobrimos que a casa tem normas. Não desonramos seus fundadores, insultamos os empregados ou roubamos os seus recursos.

Logo aprendemos que, entre ficar com os estranhos ou com os parentes, ficamos com os segundos. Ademais, temos uma aguda consciência de que perder o laço com a casa, colocando-se contra ela, nos levaria ao temível mundo da rua. Um universo é governado pela lei – essas leis que no Brasil são apresentadas e impostas por escrito e de modo impessoal (quase sempre de cima para baixo – do governo para a sociedade) – o justo oposto daquilo que ocorre em casa. Como advertia Gilberto Freyre no livro Ordem e Progresso, ainda não aprendemos que tão importante quanto inventar novas leis, é preparar a sociedade para as mudanças que elas objetivam. Sem tal preparação, as leis simplesmente “não pegam”...

Além disso, nossas ações em “casa” afetam um pequeno grupo, mas na “rua” (no mundo público) afetam bairros, cidades, Estados, partidos políticos e o País. Daí a questão: pode uma pessoa proceder como um irmão quando ocupa um papel público que lhe foi dado pelo Estado e cujo desempenho afeta óbvia e irremediavelmente a vida coletiva?

Que tipo de conduta caberia a um “homem público”? Por exemplo, a um senador? Qual seria o comportamento mais apropriado e o menos desejado? Um senador tem limites para o que pode ou não fazer? Existem atos incompatíveis com esse papel?

Tudo isso contém uma sensatez alarmante. Acima de tudo quando os jornais diariamente estampam membros do parlamento e do governo falando em insidiosas conspirações quando qualquer ética distingue – não obstante a legitimidade e a dureza do jogo político – o correto e o honrado dos seus contrários. E, pela mesma moralidade, o que é da parte e do clã ou do partido, e o que é do todo – do tesouro das coletividades.

O que não desce pela goela do cronista é a desmedida e pornográfica propina que tem regado os bens desses que, brutalmente enriquecidos pelo nosso trabalho, não labutam por nós, e se aristocratizaram pela política. Política perversamente transfigurada numa atividade paradoxalmente contra e não a favor das instituições.

A grande reforma política, a mais profunda, necessária e honesta não é a que discute filigranas, imitando ou não os tais “países adiantados”. É a que entende que uma das maiores consequências da igualdade como um valor e como lei é a dissolução do elo entre o público e o privado, entre a casa e a rua.

Para tanto, será preciso meditar se quem desempenha voluntariamente papéis públicos pode ser senhor de sua vida particular. Pois todo comportamento que perturbe o desempenho de um papel pertencente ao povo (como, por exemplo, o de senador, pois o povo é obviamente o Senado que o expressa) está sujeito ao escrutínio da dúvida ou a alguma penalidade.

Numa democracia, as divisões ou segmentações são permanentes, mas superáveis. Não há um fosso entre a casa e a rua conforme sugeri faz tempo e o modo mais simples de liquidá-lo é aprender a dizer não a si mesmo.

Espera por um Brasil novo? Puxe uma cadeira!

Num instante em que a Câmara se consolida como cemitério para a desova de denúncias contra o presidente da República, o juiz Sergio Moro e o procurador da República Deltan Dallagnol escancararam num seminário em São Paulo um fenômeno que subverte o combate à corrupção no Brasil. O juiz e o coordenador da Lava Jato discorreram sobre a ausência de respostas institucionais adequadas quando se trata de punir investigados que se escondem atrás do escudo do foro privilegiado.

A certa altura, Moro referiu-se ao caso de Geddel Vieira Lima. Foi deputado na Era FHC. Sob Lula, foi ministro. Sob Dilma, foi vice-presidnete da Caixa Econômica. O juiz lembrou que o nome do personagem está associado a escândalos desde a década de 90. Será que se tivesse sido punido naquela época, haveria o apartamento com R$ 51 milhões?, perguntou Moro. O procurador Dellagnol ecoou o juiz: Dinheiro continua circulando em malas anos depois do início da Lava-Jato. Ministros do Supremo soltam e ressoltam corruptos poderosos!, disse ele.

O país vive um paradoxo: o excesso de investigados poderosos deveria potencializar as consequências. Mas acontece o contrário. Os cerca de 200 encrencados com foro privilegiado se juntam para estancar a sangria. O que Moro e Dallagnol disseram, com outras palavras, é que a operação abafa é um sucesso bem maior do que a Lava Jato. Se você esperava por um Brasil novo, convém arregac;ar as mangas. Ou puxar uma cadeira. Vai demorar.

Imagem do Dia

Lake Orta, Italy Cusio Piemonte.

Black Quarta, dia de compras

Neste país todo mundo se queixa. Só porque o Governo volta a investir, colocando uns R$ 12 bilhões de capital em ações de apoio ao presidente Temer, ficam criticando vendedores de votos e compradores de opiniões.

Injustiça! Muito dinheiro trocou de mãos, mas civilizadamente, sem que até agora alguém tenha sido apanhado em flagrante, como o senhor ridículo que corria com a mala na rua. Uma transferência contábil – como a do Refis, em que o Governo deixará de faturar pouco mais de R$ 2 bilhões, em favor de Suas Excelências – não é tão inconveniente. Os de sempre são beneficiados e transferem parte dos ganhos a seus parlamentares de estimação, sem que bons amigos do presidente tenham de rechear e entregar pacotes com suas próprias mãos. É, convenhamos, mais chique. O efeito é o mesmo, garantir ao presidente os votos de que precisa para garantir aos amigos, e aos amigos dos amigos, que a garantia continua. É algo sólido: nada de la garantía soy yo. Emendas parlamentares de R$ 15 milhões, cada? Dinheirinho para pequenas obras. É uma boa economia: só se distribui a parte de cada um, sem que se gaste um centavo na tal obra.


Há o desconto de 60% nas multas ambientais. Justo: o prejuízo do Governo com as multas não pagas será 60% menor. O Governo desiste de privatizar o aeroporto de Congonhas: uma vaca com mais tetas tem mais a oferecer a quem quer mamar. E sobra até para nós: cabe-nos pagar a conta.

O caro leitor pode ficar tranquilo: Temer ultrapassa mais essa denúncia, que deve ser votada hoje. Mas, se o resultado é certo e sabido, por que tanta gentileza com os senhores deputados? Porque não ficaria bem, para Temer, derrubar a denúncia com menos votos do que teve ao derrubar a denúncia anterior. Para evitar que ele se mantenha no cargo dando a impressão de que perdeu apoio, fez-se a Grande Queima Pré-Natalina de Votos. Sabe como é, se prevalece a impressão de que o presidente se enfraqueceu, vários parlamentares passarão a exigir ainda mais por seu apoio. Evita-se então o vexame pagando adiantado para o presidente parecer forte. Muda algo? Muda: o dinheiro, por exemplo, muda do Tesouro para bolsos ávidos.

É claro que, aparentemente, é mais fino oferecer favores transformáveis em dinheiro do que dinheiro propriamente dito. Nem é preciso, por mais substanciosas que sejam as quantias transferidas, alugar apartamentos-cofre com um geddel de área construída para abrigar a fila de caixotes de notas novinhas. Mas, por maior que seja a tolerância com que se observe o mafuá das Excelências, o que está ocorrendo ultrapassa largamente a fronteira do decoro: o PMDB, por exemplo, partido de Temer, liberou seus deputados para apoiá-lo ou não. Traduzindo, o apoio ao presidente é negociado voto por voto com seus correligionários, mesmo sabendo-se que Temer foi presidente do PMDB, seu candidato em aliança com Lula e Dilma, e é a única possibilidade que o partido tem de permanecer no poder. Como esta é a última chance de derrubar o presidente, cada deputado exige o que pode. O Governo não se preocupa com isso: afinal, nós é que pagamos.

Na luta contra a denúncia, Michel Temer já convenceu todos os que poderia ter convencido (a oposição, convencida da derrota, decidiu tentar impedir o início da sessão, negando o número necessário de deputados). Mas há uma luta que Temer ainda terá de lutar, e com amplas chances de ser derrotado: as centrais sindicais não aceitam a reforma trabalhista. O motivo é o de sempre: com a extinção do Imposto Sindical, hoje cobrado de todo assalariado do país, seja ou não sindicalizado, e entregue aos sindicatos, só terá receita quem prestar serviços aos associados. Receber, sim; trabalhar para ter sócios contribuintes é outra coisa, dá trabalho. Centrais sindicais e sindicatos programam manifestações em todo o pais em 10 de novembro, véspera da entrada em vigor da reforma trabalhista. Só voltam atrás se o Governo lhes der outra receita no lugar desta.

E não se fale mal apenas de centrais e sindicatos de assalariados. Centrais e sindicatos patronais também estão pendurados no imposto.

Uma apatia conveniente

A semana da votação que poderia derrubar Michel Temer começou em clima de marasmo. Governo e oposição apostam no arquivamento da segunda denúncia contra o presidente. Se a previsão se confirmar, ele ganhará mais 14 meses de hospedagem grátis no Jaburu.

Nesta segunda, a Câmara permaneceu vazia. A sessão da tarde foi cancelada por falta de quorum. Mais cedo, um deputado solitário discursou em homenagem à Sociedade Brasileira de Eubiose. Os próximos eventos da entidade serão um simpósio sobre o bem e o mal, um recital de piano e uma oficina de origami.


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Temer compareceu a uma cerimônia militar, mas abriu mão de discursar. Os parlamentares que decidirão seu futuro não estão interessados em palavras, e sim no “Diário Oficial”. Nesta terça-feira, foi publicado o decreto que oferece desconto de até 60% em multas ambientais.

A medida é mais um presente para os ruralistas. Na semana passada, a bancada do trator já havia festejado a portaria que afrouxa o combate ao trabalho escravo. Não há limites ao retrocesso para barganhar votos.

Sem esperança numa zebra, a oposição recolheu as armas. Nos últimos dias, não houve manifestação expressiva em nenhuma capital do país. O ex-presidente Lula também evitou mobilizar sua tropa. Apareceu numa ocupação do MTST e viajou para fazer pré-campanha nos cafundós de Minas Gerais.

A omissão tem motivo. Apesar do ressentimento com o impeachment, o PT não está interessado na queda de Temer. O partido prefere enfrentar um presidente desgastado em 2018. Por isso, escolheu a tática de cruzar os braços e esperar a eleição.

Essa apatia também favorece o silêncio dos movimentos verde-amarelos que fizeram barulho no ano passado. Sem pressão para voltar às ruas, a turma permanece escondida atrás da tela do celular. Em vez de protestar contra a corrupção, seus líderes distraem a plateia atacando museus e novelas de TV.

Da mão para a boca

O sinal de que os três Poderes da República não temem mais a possibilidade da punição na boca da urna foi dado nos dias 3, 4 e 5 deste mês, quando o Congresso Nacional criou o Fundo de Financiamento para Campanha, fazendo a única concessão de trocar a insultada “democracia” pela descrição factual do objetivo do dinheiro farto – ou melhor com piso e sem teto – para bancar as certamente bilionárias campanhas eleitorais com dinheiro tungado do contribuinte. Na mesma ocasião, a turma reunida ao abrigo da cumbuca virada e da tigela emborcada concedeu a seus membros a mercê de pegar dinheiro emprestado dos cofres da viúva e se comprometer a pagar (o que não quer dizer que pagarão) as dívidas com a União, ou seja, o conjunto espoliado do povo brasileiro. Logo em seguida, em votação decidida por um voto na coluna do meio da presidente das belas frases vazias e do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, o Judiciário devolveu aos nada insignes, mas também nada insignificantes parlamentares o poder de tornarem seu foro um superprivilégio de intocáveis.

Antes disso, o Executivo, do alto de seu poder monárquico, havia recorrido aos expedientes de rotina para garantir a imunidade com pê no meio para seu chefe, concluído o processo de esvaziamento dos cofres de todos os receptáculos do suado e amarfanhado dinheiro escorchado dos contribuintes – a parte que sobrou do saque promovido por seus dois aliados de antanho, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Janete Vana Rousseff Linhares – para comprar com discrição zero o apoio de um terço dos deputados federais para que ele permaneça no poder. Não se trata, é claro, de algo inusitado; Nem sequer original. A prática vem de tempos idos e certamente será repetida em dias ainda não vividos por governos de todas as origens e regimes de todas as confissões de fé ideológica. Nem sempre foram bem-sucedidos. Nunca são aceitáveis, sob nenhum ponto de vista que contemple não apenas o civismo, mas a mais comum das manifestações de honestidade pessoal. O governante que compra votos de congressista age de forma mais perversa e maligna para a democracia do que o faziam os coronéis da Guarda Nacional no Império e na República Velha com a prática malsã das eleições de bico de pena.


Nem sempre essa distorção fatal para a democracia demanda recursos ou mesmo saliva dos poderosos do momento. Paulo Abi-Ackel e Bonifácio José Tamm de Andrada, ambos deputados do aprisco do senador Aécio – neto de Tancredo Neves, que foi ministro da Justiça no governo democrático de Gegê Vargas, primeiro-ministro no golpe parlamentarista de 1961 e canonizado pelo povo quando se encarregou de conduzir a Nova República –. têm uma longa folha corrida de bons serviços prestados aos poderosos de ocasião. O relator da primeira denúncia de Rodrigo Janot contra Temer é mais um exemplo de que também nesta Novíssima República nacional quem sai aos seus não “regenera”. Filho de Ibrahim Abi-Ackel, ministro da Justiça em plena vigência da Republica da Injustiça posta a serviço dos tecnocratas pelos militares, o deputado tucano mineiro não se fez de rogado quando encarregado de produzir o relatório alternativo para substituir o peemedebista do contra Sérgio Zveiter. Bonifácio, xará e aparentado do Patriarca da Independência, sempre candidato a mais ilustre brasileiro de todos os tempos, nunca se negou a votar contra o povo e a democracia: em sua longeva passagem pela Câmara dos Deputados, ajudou a derrotar a emenda Dante de Oliveira, que restabeleceria as eleições diretas para presidente, e preferiu Paulo Maluf (hoje fiel aliado de Temer, como antes já o fora de Lula) a Tancredo no Colégio Eleitoral, sempre à sombra do, este sim, nobre parente, cuja fotografia orna seu gabinete, mas cujo exemplo não é honrado em seu desempenhoi parlamentar. A desonra, aliás, não se limita aos aspectos políticos e éticos. Seu relatório é um documento à altura do libelo acusatório inepto e insólito do ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, também originário das Alterosas.

A inépcia de acusação e defesa, travestida de relatório, contudo, nada tem que ver com a derrota, sempre dada como líquida e certa, da segunda tentativa de denúncia contra o presidente da República, por organização criminosa e obstrução da Justiça. A margem de votos a favor do morador do Jaburu e ocupante do Planalto deve-se exclusivamente às manobras de manutenção do mandato do chefe do governo a qualquer custo. Os banquetes em palácio ou na casa de leais aliados, a distribuição de cargos e benesses e o cumprimento da obrigação legal de pagamento de emendas orçamentárias foram mais uma vez usados, não porque o hábito do cachimbo entorta a boca, mas principalmente porque esse é o meio mais eficaz de levar rapidamente a mão à boca para comer e consentir.

Desta vez, contudo, a história será mal contada se não contiver os novos elementos que o vice de Dilma no posto a que ascendeu, mas que nunca usurpou, como garantem os antigos aliados, que nele votaram e hoje o chamam de golpista, acrescentou à rica em casos e pobre em méritos história da celebração de malfeitos em nome da democracia. No Brasil de hoje, em que há bens que vêm para o mal, em mais uma distorção dos bons ditos da sabedoria popular, aos responsáveis pelo maior orgulho da produção nacional – a agroindústria, corretamente comparada com a galinha de ovos de ouro num chiqueiro povoado de gambás – atribui-se também uma ignomínia histórica. Há uma grita geral, que não se limita à esquerda e à oposição, contra o que se considera uma espécie de descumprimento da Lei Áurea, com a qual a princesa regente aboliu a escravatura. A tal portaria do Ministério do Trabalho modificando a caracterização de trabalho escravo não tem tanta importância. Nem valor. Trata-se apenas de mais uma malandragem para a conquista de votos na Câmara e só isso a desqualifica. Tratar de assunto tão delicado e de tais proporções em portaria de um ministério composto da forma como foi o atual é apenas uma molecagem. E a quem não perdoa a irreverência do escriba este aconselha a rever o que o ministro da Agricultura, Blairo Maggi, um dos príncipes da agroindústria e da equipe de Temer, comunicou ao distinto publico com palavras claras, curtas e simples, por que sua categoria tanto se orgulha da decisão: “Aí, nós nos aproveitamos da ocasião”. A ocasião, que no caso faz o pavão, era a necessidade de contar com os 200 votos atribuídos à bancada dita ruralista para se livrar da flechada do bambu podre de Janot. Precisa mais?

Não precisava, mas houve. Na certa por não dispor mais de dinheiro para distribuir a mancheias, o dr. Temer, que se orgulha de ter know how em lidar com bandidos do Primeiro Comando da Capital (PCC) à época em que que foi secretário de Segurança Pública do Estado de São Paulo, assinou no fim de semana decreto que reduz em 60% o valor das multas contra crimes ambientais. Os 40% restantes poderão ser pagos com projetos de reflorestamento. Numa declaração em que demonstrou sua dificuldade em argumentar, o ministro do Meio Ambiente, José Sarney Filho, comemorou o feito, dizendo no discurso da solenidade que os ricos constituem advogados e não pagam multas, que só são honradas pelos pobres. Não é uma gracinha o militante da justiça social Zequinha do Zé de Ribamar? Apois!

Mas isso ainda não é tudo. Nesse ínterim, o dr. Michel assinou um pacto a fio de bigode com Valdemar da Costa Neto, o Boy, desistindo da privatização do aeroporto de Congonhas; em São Paulo, para mantê-lo sob controle do PR de um condenado no mensalão que, mesmo proibido de exercer cargo público por estar cumprindo pena, manda na Infraero. Temer, que até hoje não explicou por que recebeu Joesley Batista, atualmente preso, não se deu ao trabalho de justificar a desistência da privatização do segundo aeroporto mais rentável do País. E a oposição, que o acusa de golpista, ainda não se interessou em discutir seriamente o que há de indigno nessa volúpia do partido de um condenado pela indústria da aviação civil.

É, amigos, este Brasil da mão que empunha a faca direto para a boca que mastiga é mesmo duro de engolir.

Paisagem brasileira


Margem do Rio Piracicaba (1941), Álvaro Paulo Sêga


'Se é errado visitar porque é perigoso, seria errado morar lá, certo?'

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A espanhola María Esperanza Jiménez Ruiz, de 67 anos, foi morta pela Polícia Militar quando visitava a favela da Rocinha, no do Rio de Janeiro, nesta segunda-feira e muitas das reações nas redes são as mesmas: “Rocinha não é lugar de turismo, pelo amor de Deus”, reclamou um leitor do EL PAÍS nas redes sociais. “Favela não é lugar pra fazer turismo?! Não obedeceu, morreu!”, disse outro. O turismo nas favelas não só faz parte do cotidiano da cidade como se intensificou nos últimos anos. Nos tempos de Olimpíadas e de sensação de segurança gerada pelas Unidades de Polícia Pacificadora – instaladas sobretudo em favelas próximas aos principais pontos turísticos do Rio –, para muitos podia soar como a boa ideia que nunca foi.

Pacotes turísticos que incluíam passeios por favelas como Vidigal (Leblon) e Santa Marta (Botafogo) se espalharam. Camionetes que cruzavam a cidade em direção a Rocinha, com direito a turistas em cima do carro como estivessem fazendo um safári, passaram a fazer parte da paisagem urbana. E moradores das favelas passaram a conviver com a visita diária de gringos loiros queimados de sol, curiosos em saber como viviam e ansiosos por ver a paisagem do Rio do alto do morro. O Vidigal transformou-se em um dos lugares mais badalados da cidade, com novos moradores de fora, hostels e restaurantes em seu topo com preços proibitivos e uma vista deslumbrante.

Em meio a este turismo massificado também ganhou força o chamado turismo comunitário, feito por guias de turismo das próprias favelas. Cosme Felippsen, morador do morro da Providência, a mais antiga favela do Rio, perto da zona portuária da cidade. "Eu tinha oito anos em 1997, quando o morro fez 100 anos. Hoje a favela faz 120 anos e vai fazer 20 que eu guiei o primeiro casal. Eles me pediram para andar no morro e recebi um picolé como primeiro pagamento. Hoje ganho dinheiro e cerveja", conta. Depois, como membro da igreja metodista, levava missionários que vinham dos Estados Unidos para conhecer a favela e outras paisagens da cidade.

Em 2013 abriu o Providência Turismo, dois anos mais tarde se formou como guia e, hoje, organiza o Rolé dos Favelados: um passeio por comunidades cariocas com moradores militantes. "É um passeio e um debate sobre o que é favela, a cultura da favela, uma discussão sobre cidade e direitos humanos... Um guiamento de militância feito por favelados", explica. Hoje, a maioria dos que visitam as favelas com ele são brasileiros e também cariocas, inclusive pessoas vivem em outras comunidades da cidade. "Existe um trânsito entre o asfalto e a favela que não é só turismo", explica.

Depois do que aconteceu com a espanhola, Cosme conta que os turistas estão mais assustados. Sobre o caso, opina que houve imprudência de todos os envolvidos. "Já cancelei um passeio no Complexo do Alemão por conta de uma onda de tiroteio, como já cancelei na Providência só por achar que o clima não estava bom", conta. "Se um guia local estivesse com a espanhola, talvez não tivessem feito aquele caminho ou teriam agido de outra forma quando passaram pela polícia. Tem que abrir os vidros, passar devagar com carro, ter cautela com todos que estão armados", acrescenta. Ele conta orgulhoso que já fez aproximadamente mil passeios pela Providência e nunca teve nenhum problema.

Ainda assim, Cosme critica veementemente aqueles que dizem que não se deve fazer turismo nas favelas. "Se é errado ir para a favela porque é perigoso, então seria errado morar lá, certo?", questiona. "Nesse momento que estamos falando, tem criança morrendo. E ninguém se importa. As pessoas querem ir curtir um samba, uma cerveja, mas aí acontece uma merda e se viram contra a favela, afastam a favela", argumenta. E completa: "Eles [a polícia] fazem uma merda e jogam a responsabilidade no guia. Mas o que existe não é uma guerra, é um extermínio de uma população pobre, preta e favelada".

Com a morte de María Esperanza, sabe-se agora que o turismo nas favelas é algo do cotidiano, assim como o perigo dos que vivem e transitam por elas de serem mortos.

Tem para dar e vender

Neste país, quando há merda, é tanta que não acaba. E ainda vamos escutar mais, porque devemos saber se sabem por onde andamos
Mempo Giardinelli, 'Impossível equilíbrio"

A falência das nações

Por que alguns países são ricos e outros pobres? Por que alguns países são inicialmente mais ricos do que outros, mas, com o passar dos anos, tornam-se mais pobres? O que explica o crescimento econômico sustentável e a melhoria na qualidade de vida das sociedades? Em 2012, os economistas Daron Acemoglu e James Robinson publicaram livro extraordinário intitulado Why Nations Fail: The Origins of Power, Prosperity, and Poverty. Embora o tenha lido quando de seu lançamento, na época não soube apreciar adequadamente a relevância da obra para o Brasil. Ao relê-lo, vi retratadas em suas páginas todas as mazelas que nos afligem – da falência institucional, à crise econômica, às inúmeras dificuldades de fazer reformas sem profunda mudança política.

O livro expõe com clareza – ilustrando em detalhe a experiência de diversos países – que é a natureza das instituições políticas que determina a distribuição de recursos, o crescimento, e o relativo “sucesso” econômico das nações. De forma simplificada, países onde as instituições políticas são moldadas por grupos interessados em extrair recursos do Estado em vez de garantir o bem-estar da sociedade, instalam-se o caos, as crises, a pobreza, a corrupção.


Curiosamente, os autores dedicam parte de um capítulo ao Brasil – não como exemplo de nação “falida”, mas como exemplo de superação: citam a mobilização social e a ascensão do PT ao poder em 2002 como exemplo de reconstrução das instituições brasileiras, tornando-as mais “inclusivas”. Passados os anos do lulopetismo, que jamais teria se consolidado sem a ajuda do que havia de mais status quo na política brasileira, sabemos que não houve revolução alguma. Os que ocuparam – e ainda ocupam – os mais altos escalões do poder, usaram e continuam a usar as instituições em benefício próprio. Sem que haja a desejada transformação política capaz de remodelar as instituições em favor da sociedade, corremos o risco de assistir repetecos infindáveis dessa história.

Sem que haja a desejada renovação política, tampouco é possível esperar que as reformas econômicas de que necessitamos sairão do papel sem serem desvirtuadas e distorcidas. O lastro de qualquer reforma é a credibilidade do governo que a propõe – a reforma da Previdência está aí como exemplo. Inicialmente formulada pelos princípios corretos, hoje está profundamente diluída e descaracterizada em nome da sobrevivência política daqueles que ainda andam com desenvoltura por Brasília, apesar de seus desmandos e tropeços, áudios e visitas. Não falo apenas do presidente da República e de seu círculo íntimo de assessores defenestrados, mas do senador e ex-candidato à Presidência em 2014. Que respaldo terá uma reforma aprovada por esse senhor e por outros de seus colegas no Congresso Nacional também envolvidos em atos escusos? O que é melhor, fazer uma reforma da Previdência de qualquer jeito, deixando de fora boa parte das causas principais de nossos problemas fiscais de médio prazo por conveniência política, ou aguardar os resultados de outubro de 2018?

Sem querer exagerar a relevância da experiência de nossos vizinhos, a Argentina parece estar conseguindo fazer a renovação política, o que aumenta as chances de que boas reformas, respaldadas pela credibilidade conferida pelas urnas, sejam levadas a cabo. Há no Brasil muita movimentação e pressão para que venha a renovação. Movimentos como o Agora! e outros estão empenhados em promover mudanças políticas que garantam a modernização institucional, sem a qual as necessárias reformas sofrerão o mesmo destino de tantas outras feitas por nós e por outros países, o roteiro delineado por Acemoglu e Robinson mundo afora.

Ao mesmo tempo, há um sentimento inexplicável de nostalgia por um passado inexistente, uma onda que tenta pregar o liberalismo na economia e o retrocesso nas questões sociais, levantando a bandeira de um conservadorismo velho, gasto, que parecia em vias de extinção. Esse conservadorismo corre o risco de abraçar o que aí está com caras supostamente novas, mas que não necessariamente defendem a renovação institucional.

O conservadorismo mais puro é aquele que prega que “tudo mude para que nada mude”, como escreveu Giuseppe di Lampedusa. É isso o que precisamos evitar em 2018.

Gente fora do mapa

una imagen vale mas que mil palabras... solidaridad.

Temer é um falso constitucionalista que não tem respeito pelas leis

Temer é cínico. É um ventríloquo. Um marionete, como aqueles bonecos que se faz mover e gesticular por meio de cordéis. Os mordomos são respeitados, respeitáveis e úteis. Sem tais predicados, Temer nem mordomo é. Ele conta apenas com 3% de aprovação (de regular a bom), não se manca e também não renuncia. Temer não acerta. Erra e erra feio. Ninguém acredita nele. Essa portaria que ele mandou o ministro do Trabalho baixar é uma porcaria. Rosa Weber nem hesitou ao revogá-la, liminarmente. E quando o plenário do STF julgar o caso, nem será preciso entrar no mérito. A sessão será curta. Menos de 30 minutos. A questão é de fácil solução: portaria é tão porcaria que não revoga a lei. Uma lei só é revogada por outra lei que expressamente a revogue ou que com a lei existente seja incompatível. Ou quando ela própria — a nova lei — preveja tempo de vigência.

Temer é não cínico que diz agora que a culpa é do ministro! Ora, Temer, vá plantar batata. Ele é seu ministro, seu escolhido, seu braço. Ele é o seu governo. Por que então você não revogou a porcaria logo que foi publicada? Poder e legitimidade é que não faltam ao presidente, supremo chefe da Nação. Mas quando o presidente se chama Michel Temer, poder e legitimidade viram merda. Quem diria, Michel Temer supremo chefe da Nação, presidente do Brasil! Temer está saindo pior do que a Dilma, neste aspecto.


Muito já se falou e se escreveu sobre essa porcaria do trabalho escravo. O mundo inteiro reagiu contra. Mas a porcaria tem forte conotação de semelhança com outra que aqui vai meramente a título de exemplo. Imaginemos que o ministro da Justiça baixe uma portaria determinando aos agentes da Polícia Federal que, ao se depararem com qualquer prática criminosa, não interfira, não ajam, não atuem e nem prenda ninguém que esteja em flagrante, exigindo-se do agente que primeiro faça o tal B.O. (Boletim de Ocorrência) e o remeta ao ministro da Justiça para decidir o que fazer. Que lambança seria, hein?

Pois essa porcaria do trabalho escravo é uma tremenda lambança, tal como aquela aqui trazida a guisa de exemplo. Temer é um anão boçal. Essa tal porcaria retirou dos agentes fiscalizadores do Ministério do Trabalho o congênito poder de polícia que a todos é outorgado. Não apenas a eles, mas a todos os cidadãos, que é o de dar voz de prisão a quem estiver em flagrante delito.

Temer pratica corrupção oficial e nada lhe acontece. Com o dinheiro do povo brasileiro compra votos dos deputados para não sofrer processo no Supremo Tribunal Federal. Em qualquer outro país Temer já estaria preso por muitos crimes. O de lesa pátria é o maior deles.
Temer, vá embora. Deixe o cargo. O povo brasileiro odeia você. Você, que não gosta do cheiro do povo. A propósito, você, com presidente, já expressou suas condolências com os pais dos alunos que foram fuzilados no Colégio Goyases? Não sabe o nome deles? Está no jornas. Não sabe o telefone dos pais? É fácil obter. Mas este assunto que envolve sentimento e dor dos outros não é com você. E à família da empresária espanhola fuzilada na Rocinha? você já telefonou ou enviou condolência a todos eles? Temer, vá embora. Suma de vez.

Cada dia você cai de podre. Agora, deu anistia às multas ambientais. Um presidente da República não tem esse poder de pôr e dispor sobre multas que o particular deve à Administração por infrações e autuações que os agentes públicos aplicaram. Está na Constituição. Você sabia, Temer, o constitucionalista de mentirinha.

Depende de nós

A política do é dando que se recebe não foi inventada pelo presidente Michel Temer. O que mais choca no comportamento de Temer é que ele faz às claras, e aparentemente sem nenhum constrangimento, o que seus antecessores no cargo sempre fizeram às escondidas ou com mais discrição.

Deputado à Assembleia Constituinte de 1988, Luiz Inácio Lula da Silva disse que o Congresso abrigava pelo menos “300 picaretas”, aqueles que cobram caro para apoiar o governo. Presidente da República, Lula governou com os 300 picaretas e ajudou a multiplicá-los.

Pagar mensalão a deputados e senadores para que votassem como o governo queria não foi uma invenção do PT de Lula. A compra de votos, ali, é antiga. Há registro de que deputados foram comprados para aprovar a emenda que permitiu a reeleição de Fernando Henrique.


Deputados e senadores receberam grana para votar em Tancredo Neves, elegendo-o presidente da República em janeiro de 1985. Paulo Maluf, adversário de Tancredo, ficou com a fama de o maior comprador de votos naquela eleição ainda indireta.

A ditadura militar de 64 não precisou pagar em dinheiro para aprovar no Congresso tudo o que quis. Mas pagou, em escala menor, com cargos e outras sinecuras. Do governo Sarney para cá, a compra de apoio só fez crescer e sofisticar-se. Todos os escrúpulos foram mandados às favas.

O que sempre houve só virou escândalo graças à Lava Jato. Temer só foi alçado à condição inédita de presidente denunciado por corrupção no exercício do cargo porque acabou gravado por um empresário amigo dele, e caixa de campanha do PMDB e de outros partidos.

Nada do que Temer tem feito para manter-se no poder e livrar-se de acusações é estranho aos costumes políticos nacionais. Nada. E essa é a tragédia maior. A Lava Jato escancarou a podridão da política entre nós. Mas não é sua tarefa acabar com ela ou reduzi-la, é nossa. Se quisermos.

China pune 1 milhão de corruptos no maior expurgo desde Mao

Desde que se tornou a principal liderança da China, em 2012, Xi Jinping vem comandando uma grande e implacável campanha anticorrupção que já puniu até agora mais de 1 milhão de funcionários públicos.

Mais de 170 ministros e vice-ministros foram demitidos e muitos deles acabaram na prisão após serem acusados de crimes como corrupção, má conduta e transgressão das diretrizes do partido.

Essa é a conclusão de um estudo realizado pela BBC que mostra o que alguns descreveram como um expurgo interno sem precedentes de opositores, em uma dimensão nunca antes vista desde Mao Tsé-Tung (1893-1976).

Arquiteto e fundador da República Popular da China, Mao se livrou de muitos altos comandantes do partido. Ele governou o país de sua criação, em 1949, até sua morte, em 1976.

Xi acaba de ser elevado ao mesmo status que Mao. Por unanimidade, seu nome e sua teoria de governo foram incluídos na constituição do partido.
Expurgo

A maior diferença é que desta vez muitas convenções que existiam no Partido Comunista Chinês (PCC) desde a época de Mao foram quebradas.

Várias autoridades estatais, por exemplo, foram julgadas e figuras proeminentes discretamente retiradas de cena.

Nos últimos cinco anos, 35 membros com e sem direito a voto no poderoso Comitê Central do PCC foram punidos.

Ou seja, quase o mesmo número dos que tiveram a mesma sorte entre 1949 e 2012.

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Os dados oficiais indicam a punição de 1,34 milhão de funcionários do governo em todos os níveis (apelidados de "tigres e moscas") durante os primeiros cinco anos do governo Xi.

Eles foram acusados de corrupção e transgressões disciplinares.

Nenhuma área foi poupada: as baixas atingiram desde líderes de vilarejos e gerentes de fábricas, passando por ministros e generais do governo.

A chamada "grande limpeza" atingiu, inclusive, a cúpula do regime.

Um caso emblemático foi o de Zhou Yongkang. Ex-chefe da segurança interna, ele foi condenado à prisão perpétua por suborno, abuso de poder e "intencionalmente revelar segredos nacionais".

Já Sun Zhengcai perdeu o cargo de secretário do partido na cidade de Chongqing. Também se tornou o quarto membro do politburo - o comitê que reúne as principais lideranças do PCC - a ser expulso do partido.

Ele tinha ascendido à cúpula do governo chinês antes de Xi chegar ao poder e havia a expectativa de que poderia futuramente liderar o politburo.

Quase 70% dos membros do Comitê Central serão substituídos no Congresso do Partido Comunista, que acontece desde a semana passada.

Mas, na maioria dos casos, o motivo não está ligado à corrupção ou a transgressões semelhantes, mas à idade.

Muitos dos membros do Comitê têm mais de 60 anos e, de acordo com a tradição, devem se aposentar.
Exército

Defensores de Xi alegam que a campanha anticorrupção é necessária para restaurar a credibilidade do partido 

Nenhuma área foi reestruturada de forma mais radical pelo governo do que a militar. Xi foi rápido em reorganizá-la e modernizá-la em grande escala.

Mais de 60 generais foram investigados e demitidos como parte de um plano para inserir um estilo ocidental de comando conjunto e colocar jovens em postos de comando.

Mesmo quando os delegados começaram a se reunir em Pequim para o Congresso, o ritmo da campanha de expurgo não dava sinais de desaceleração.

Dois generais, Fang Fenghui e Zhang Yang, desapareceram da cena pública no mês passado e uma série de investigações de alto nível foi anunciada.