sábado, 16 de setembro de 2017

Charge O Tempo - 16/09/2017

'Suissinato' do futuro

O futuro de um país tem a cara de sua escola no presente. Cortar recursos para a universidade é como suspender transfusão de sangue para o país. O que acontece com a Uerj é um exemplo disso; portanto, o futuro do Brasil não parece bonito nem próspero. Ainda mais quando percebemos que a crise é de todo o conjunto de nosso ensino superior.

Embora a falta de verbas seja a causa mais visível, a tragédia tem motivos internos que exigem uma autocrítica. Há décadas a universidade estatal brasileira vem cometendo o suicídio de uma morte anunciada, apressada pelo assassinato por governos irresponsáveis: abandono e acomodamento formam o veneno do “suissinato”.

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A qualidade do ensino superior depende diretamente da educação de base. Apesar disso, a universidade assistiu à degradação do ensino infantil, fundamental e médio sem lutar politicamente para forçar prioridade para elas. Também não se dedicou a formar bons professores para nossa educação de base.

A comunidade acadêmica falhou ao não lutar contra a irresponsabilidade fiscal, aplaudindo a construção de estádios e a implantação de programas populistas e fechando os olhos à corrupção, o déficit agora é pago com o corte de verbas. A universidade deve lembrar que a gratuidade é paga com dinheiro do conjunto da sociedade.

Diante do previsível esgotamento fiscal do Estado, a universidade precisa ser mais eficiente na gestão dos recursos que recebe e na captação de verba complementar em fontes não estatais, como fazem as universidades em todo o mundo. Mesmo em tempo de austeridade gastamos mais do que as universidades europeias e asiáticas que estão entre as melhores do mundo.

A universidade se contenta em ser basicamente escada social, pela outorga de diplomas, no lugar de ser alavanca para o progresso, pela inovação do saber em todas as áreas. Está desconectada do setor produtivo. Perdemos a sintonia com os rápidos avanços do conhecimento: considerar carreiras e diplomas como permanentes. Não se internacionaliza nem adota os novos métodos de ensino à distância.

Além do corte de verbas, a crise da universidade tem tudo a ver com sua rendição ao corporativismo, ao partidarismo, desprezando o mérito e sem um pacto de qualidade com a sociedade. Ao longo de anos foram tantas greves que a população chega a imaginar que a atual paralisação da Uerj é apenas mais uma delas, não decorre da falta de recursos por irresponsabilidade do governo estadual.

Se o Brasil quer encontrar um rumo, precisamos salvar a Uerj e as demais universidades do país da crise financeira do momento. Mas para isso, as universidades precisam salvar a si próprias, fazendo autocrítica, reformando-se para estar à altura dos desafios do conhecimento e, ao mesmo tempo, do esgotamento de recursos.

Abandonar as universidades, como acontece especialmente com a Uerj, é uma forma de assassinar o futuro do Brasil, mas manter a universidade sem uma profunda reforma é cometer suicídio institucional.

A máquina do imundo

Baixei os olhos, incurioso, lasso,
desdenhando colher a coisa oferta
que se abria gratuita a meu engenho.

Carlos Drummond de Andrade

Disseram os policiais federais da Bahia que um lençol, isso, um lençol, um simples e inocente lençol, dava cobertura às caixas e malas de dinheiro encontradas naquele apartamento de Salvador. Foi na semana passada, que também calhou de ser a Semana da Pátria, poucos dias antes do feriado nacional de 7 de Setembro. A dinheirama explícita transbordava de caixas de papelão e de valises de viagem. Para contar tantas notas, os agentes policiais requisitaram essas engenhocas automáticas que se usam em agências bancárias, que operaram por 14 horas ininterruptas. Eram R$ 42.643.500,00 e US$ 2.688.000,00 (que, convertidos pela cotação oficial, correspondem a R$ 8.387.366,40). Nunca antes na história deste país uma tal quantia foi apreendida, nem mesmo em cafofos de traficantes. Um recorde, exultaram os especialistas.

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De tudo isso, o toque mais espantoso é o lençol. Um reles lençol num apartamento vazio, sem morador nem mobília. Um lençol, tão leve, tão esvoaçante, para recobrir um ilícito de tão agigantadas proporções.

Nos versos de Chico Buarque, lá se vão muitos anos, o pecado podia até ser bom. “Não existe pecado do lado de baixo do Equador”, cantava o poeta, que logo adiante convidava: “Vamos fazer um pecado safado debaixo do meu cobertor”. Já que não havia pecado, que ele fosse bom e belo.

No caso do apartamento soteropolitano, o pecado é horrendo. Não por ser ilícito, aliás. É feio esteticamente, é repugnante. As fotografias feitas pela polícia desvelam o medonho que jazia sob o lençol: o papelão desconjuntado em uma geometria estufada, balofa, com as abas desgrenhadas, a ponto de rasgar-se. As malas, pobres malas, clamavam por piedade diante da câmera, como se pudessem gritar que não suportariam transportar tanto peso, que suas costuras romperiam no caminho, como se pedissem desculpas de estar ali naquela cena vexatória. “Eu posso explicar, eu posso explicar”, imploram as malas escancaradas nas fotografias. Tudo feio, tudo sem elegância nem glamour. E pensar que sobre aquelas montanhas de cédulas sem origem e sem dono declarado havia um lençol sem sobrenome para cobrir o odioso pecado safado; um lençol sem prazer, sem encanto, sem cadeado, sem segredo na fechadura; um lençol empoeirado, quem sabe, ou mesmo imundo.

Na canção de Ruy Guerra e Chico Buarque, a safadeza tem um sentido erótico libertador: “Quando é lição de esculacho, olha aí, sai de baixo, eu sou professor”. Na cena do apartamento de Salvador tudo é o contrário. Palavras como “esculacho” ou “escracho”, agora sem erotismo, não mais significam liberdade, desejo ou paixão – significam apenas, e miseravelmente, parasitismo, rapina, perfídia, ganância, egoísmo, tudo, claro, sob o lençol da conveniência, da aparência de legalidade, das mesuras oficiais. O “pecado rasgado” encarnado naquela bufunfa não tem charme, não tem lirismo: aquilo é o pecado escarrado da corrupção.

A corrupção, no nosso caso, a corrupção ao sul do Equador, não é apenas um crime que o Estado dará conta de punir. A corrupção é método parasitário de gestão da coisa pública que, mais do que dinheiro, desvia a própria finalidade do Estado. A corrupção desvirtua as instituições e inverte o sentido da ação da política, assim como inverte a lógica da democracia. Sob a corrupção à brasileira, política e democracia se rebaixam à negação do que deveriam ser, o que é muito pior do que virar de ponta-cabeça o sentido de palavras que encontramos na poesia.

Sigamos um pouco mais com a poesia. Em A máquina do mundo, Drummond conta de uma maravilha que se abriu para o poeta, que ia desavisado a passos lentos caminhando numa estrada pedregosa de Minas Gerais. Abriu-se para ele “a máquina do mundo”, que expunha em claridades todos os mistérios da existência. Mas, como o caminhante não esboçasse ímpeto de tomar posse de tamanha aparição, a máquina se fechou, e ele foi embora “de mãos pensas”.

Sigamos um pouco mais com as inversões. Está se abrindo diante de nós, mal saídos da ressaca da Semana da Pátria, não a “máquina do mundo”, mas uma impensável e intragável máquina do imundo. Talvez seja um castigo para os poetas. Por não terem se atirado de cabeça no que de sublime se ofertara, são agora tragados por engrenagens sem luz, sem compaixão, que movem o mundo pelo que ele tem de mais abjeto. Que um lençol puído venha cobrir nossas vergonhas e os nossos sonhos mortos.

Gente fora do mapa

India

O povo semissoberano

Durante quase dois séculos diferentes escolas de pensamento tentaram explicar as imperfeições e rupturas dos regimes democrático-representativos. O esforço clássico – e mais antigo – foi o de Jean-Jacques Rousseau, que contestou a própria ideia de representação. Em sua linha de raciocínio, o indivíduo iludia-se com o efêmero status que o processo eleitoral lhe proporcionava: cidadão por um dia, mas no dia seguinte retornava ao estado de imemorial submissão em que se encontrava desde priscas eras. Não chegaria jamais ao status de membro pleno da coletividade enquanto se concebesse como um simples indivíduo, e não como uma parte indissociável daquela entidade mística e homogênea, o todo permanente reunido em assembleia.

A segunda linha de crítica, muito mais potente, remonta a meados do século 19 e parte de um ponto de vista exatamente oposto. O problema não era o individualismo excessivo, mas o fato de a maioria da sociedade não ter acesso a uma condição de verdadeira autonomia individual. Por toda parte, o que vemos são maiorias supostamente aptas a legitimar (por meio do voto individual e igual de cada um) minúsculas oligarquias, mas na prática o que ocorre é o oposto: tais maiorias são clientelas facilmente controláveis e manipuláveis pelas minorias governantes. O clientelismo rural, por exemplo, afetando a maior parte da população, era um poderoso impedimento à igualdade substantiva e, consequentemente, da verdadeira democracia. Incapazes de se “atomizarem”, ou seja, de se tornarem indivíduos realmente autônomos, as maiorias não correspondem nem ao modelo da cidadania mobilizada concebido por Rousseau nem à sociedade individualizada do liberalismo; são como uma grande ameba, uma massa amorfa incapaz de qualquer protagonismo.


Nos limites de um artigo é impossível destrinchar a teia de juízos de valor e de equívocos factuais subjacente a essa longa história, mas é imperativo sublinhar alguns estágios dela se quisermos compreender a contraditória percepção do mundo atual acerca da democracia. Em 1942, em seu clássico Capitalismo, socialismo e democracia, o economista Joseph Schumpeter detonou a antiga suposição de que as grandes massas eleitorais do mundo moderno têm de ser constituídas por indivíduos igualmente autônomos, bem informados e aptos a exercer cargos no governo, se convocados a tal. Schumpeter escreveu que a função do eleitor se reduz a dar seu voto a um dentre os grupos contendores, que são eminentemente grupos técnicos, especializados na gestão do Estado. Em 1961, não se permitindo o cinismo implícito no argumento schumpeteriano, Elmo E. Schattschneider, no livro The Semisovereign People, armou uma equação mais interessante. A função do eleitor é de fato irrelevante, ou quase isso, onde não há partidos políticos dignos do nome; onde eles existem, o eleitor de fato não governa diretamente, mas pode exercer uma influência substancial, não raro determinando os rumos da política pública. Mas um “verdadeiro” partido, o que é? Simplificando ao máximo, a resposta dele foi: uma organização não só especializada na disputa política, mas que a pratica sem jamais se deixar absorver ou subjugar por grupos de interesse, sejam estes econômicos, religiosos ou de qualquer outra natureza. A função do partido é transcender e agregar tais interesses num nível mais geral; e um que se deixe incrustar e controlar por meia dúzia de empreiteiras, por certo, não merece ser chamado de partido.

Penso que a realidade atual, e não só a brasileira, está a exigir uma reflexão mais abrangente. Nas democracias atuais, com seus grandes eleitorados e técnicas apropriadas de votação, os antigos argumentos antiliberais jazem moribundos em covas rasas, aguardando o sepultamento a que fazem jus. Mas a questão permanece: vamos bem ou vamos mal? O modo democrático de viver está se robustecendo ou, ao contrário, correndo riscos onipresentes, cuja dimensão ainda não conseguimos avaliar? A visão pessimista pode invocar argumentos poderosos, muito mais sérios que os tradicionalmente associados ao controle clientelista do eleitorado e até mesmo aqueles derivados das desigualdades sociais. Outro dia o professor Benício Schmidt, da UnB, postou no Facebook uma especulação sinistra. Na Colômbia, agora que as Farc se transformam em partido, teremos o narcotráfico controlado por uma organização ou disperso entre várias organizações beligerantes e bem armadas? Hipóteses desse tipo podem ser multiplicadas ad infinitum.

Mas a hipótese otimista também merece respeito. Os avanços no combate à corrupção talvez representem não apenas um aumento na higidez dos regimes democráticos, mas um passo decisivo no sentido de tornar realidade um de seus pressupostos essenciais. Democracia, como o termo é hoje entendido pelos cientistas políticos, é um regime no qual indivíduos privados ascendem a posições de autoridade mediante eleições periódicas, limpas e livres, das quais a maioria da população adulta participa. Admitamos, porém, por um minuto, o antigo sarcasmo dos antiliberais: como pode ser soberano um corpo eleitoral que desconhece os elementos mais importantes da gestão do Estado? Suponhamos, no caso brasileiro: qual é a real importância dos votos de 145 milhões de eleitores que até pouco tempo atrás desconheciam por completo o modo de agir de um BNDES, de uma Petrobras, de uma Eletrobras?

Salta aos olhos que, sem um enorme avanço na transparência, no acesso a informações do tipo mencionado e numa drástica redução da impunidade, o pressuposto democrático da soberania popular permanecerá, realmente, vulnerável ao escárnio.

O inverno do patriarca

O roteiro de um filme sobre a história real de Lula seria recusado por qualquer produtora, por fantasioso e inverossímil

Lula diz que prefere a morte a entrar para a história como um mentiroso. Mas essa é uma de suas maiores mentiras.

Ele ama o poder, a glória e a boa vida e nunca teve vocação para mártir, embora na astrologia seja do signo do escorpião, que, cercado pelo fogo, prefere ferroar a si mesmo a se entregar.

Ainda há uma questão semântica: as bravatas, em que ele é mestre, tecnicamente, são consideradas mentiras ou exageros? Há controvérsias.


Lula aprendeu com Dilma, ou ela com ele, a chamar de “querida” (com aspas) quem lhe faz perguntas incômodas. Em Curitiba, ele foi advertido porque insistia em chamar de “querida” a procuradora que o interrogava, mas não chamava de “querido” os procuradores machos. E sempre se referia a sua mulher, sua verdadeira querida, como “Dona” Marisa, a responsável pela administração da família.

Em 2009, Ali Kamel publicou o “Dicionário Lula — um presidente exposto por suas próprias palavras”, uma compilação de 672 páginas com o que Lula disse sobre os mais diversos temas, sem correções, direto da fonte.

O verbete “Discurso” tem muitas citações, algumas premonitórias: “Um dia vão ganhar dinheiro pela quantidade de discursos que eu faço todos os dias. Eu ficaria milionário”.

No dicionário, ele se revela um personagem riquíssimo e contraditório, ou como ele mesmo reconhece, uma metamorfose ambulante. Imaginem de lá para cá! Esperamos um volume 2.

Um de seus clássicos é dizer que aprendeu com sua mãe a não abaixar a cabeça para ninguém. Mesmo quando está errado, não reconhece seus erros e nem se responsabiliza por eles. Pedir desculpas, nem pensar. Mas ele vive dizendo a juízes, delegados e procuradores que espera que eles lhe peçam desculpas um dia.

Ao contrário do sucesso do filme da Lava-Jato, “Lula, o filho do Brasil” foi um fracasso retumbante nos cinemas, contando a sua infância e juventude. Mas um filme com o resto da sua história até hoje certamente seria um sucesso. O problema é que um roteiro factual, documental, contando fielmente a sua história, seria recusado por qualquer produtora do mundo, por fantasioso e inverossímil.

Que faremos com a Terra? E com quem está sobre ela?

A gritaria é geral na área dos defensores da reforma agrária: o projeto para a Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2018, enviado pelo governo federal ao Congresso, promoverá “cortes severos em ações estratégicas para a população do campo, quilombolas e indígenas’’ (Instituto Humanitas Unisinos, 6/9). Estudos de instituições da área apontam queda que pode chegar a 95%, comparados os novos números com os de 2015. O valor destinado à agregação de terras no próximo ano será de R$ 34,2 milhões – quando em 2015 chegou a R$ 800 milhões. Segundo os críticos, essa quantia pode “aumentar o conflito agrário e a violência no campo”, já que pode atingir com rigor programas de assistência técnica, produção de alimentos saudáveis e comercialização de alimentos da agricultura familiar. Do outro lado ouve-se com frequência, como argumento de defesa, a “crise fiscal”.

Há outros argumentos de várias fontes interessadas, como o de que ainda há 170 mil famílias no campo sem habitação, sob lonas pretas em assentamentos, sem crédito para plantar e vender a produção (Folha de S.Paulo, 3/2/2017). Em 12 anos, de 2003 a 2015, nos governos anteriores, o Tribunal de Contas da União (TCU) apontou 678.430 indícios de irregularidades – o que determinou a suspensão em 2016 do Programa de Reforma Agrária. Só com promessas do governo Temer o TCU permitiu a retomada de assentamentos. E agora, com alterações nas leis, o governo promete entregar 750 mil títulos até o ano que vem. A agricultura familiar – dizem as mesmas fontes – responde por cerca de 38% do valor bruto da produção agropecuária; gera 74,4% dos postos de trabalho rurais; e produz perto de 50% dos alimentos da cesta básica.

Mas há também argumentos de outras fontes que apontam para o agronegócio como “dono das terras no Brasil”, já que 53% da malha fundiária é privada no País (Amazônia.org, 20/3/2017). E, nela, 28% são considerados “grandes propriedades”, maiores do que 15 módulos fiscais. Áreas protegidas, incluídas áreas indígenas, somam 27% e os assentamentos, 5%. A Amazônia concentra 98% das áreas de conservação.

environment practice, Maximilian Degen on ArtStation at https://www.artstation.com/artwork/aBqzJ
Maximilian Degen 
O ponto polêmico está na informação de que metade da área rural brasileira pertence a 1% das propriedades, de acordo com estudo divulgado no final de 2016 pela ONG britânica Oxfam. E os estabelecimentos com menos de 10 hectares significam 47% do número, embora ocupem menos de 2,3% da área real total de propriedades e produzam mais de 70% dos alimentos consumidos no País, nesta área rural total. Já as grandes propriedades rurais, com mais de mil hectares, detêm 43% do crédito, enquanto 80% dos estabelecimentos menores conseguem de 13% a 23% do total. Por isso defende-se ardorosamente na área dos pequenos uma reforma agrária, com apoio de ONGs nacionais e internacionais. Só nas terras ocupadas por grandes devedores de impostos, segundo o Incra, seria possível assentar quase 215 mil famílias. 729 proprietários de imóveis rurais, por exemplo, declaram ter propriedades com dívidas totais de mais de R$ 50 milhões cada. Pelo lado oposto, os proponentes de uma reforma agrária desconcentradora pedem também um redirecionamento do crédito rural, pois mais de 400 propriedades com dívidas de mais de R$ 50 milhões cada devem um total de R$ 200 bilhões. E a Medida Provisória 733 permitiu que produtores rurais declarassem possuir 407 imóveis rurais com dívida de R$ 200 bilhões. Eles poderão, por medida provisória, liquidar o saldo devedor com bônus entre 60% e 95%. O imposto territorial rural respondeu por apenas 0,0887% da carga tributária em 2014.

Neste quadro, não faltam conflitos. Eles geraram, no ano passado, 50 mortes e 1.217 confrontos, que mataram mais de 2 mil pessoas entre 1964 e 2010 (Comissão Pastoral da Terra). Discute-se, neste ponto, a questão da pobreza rural e da concentração de renda.

Dos 4,4 milhões de estabelecimentos rurais brasileiros, apenas 500 mil responderam por quase 90% do valor produzido (Estado, 12/4/2016); 24 mil entre eles produziram metade desse valor. Em 2,9 milhões de estabelecimentos rurais moram famílias extremamente pobres, que retiram mensalmente, cada uma delas, apenas meio salário mínimo bruto produzido pela agricultura. Vivem graças ao complemento do Bolsa Família. Em 1 milhão de propriedades a renda equivale a um salário mínimo mensal para a média de quatro pessoas. Um quadro extremamente precário, com consequências graves nas áreas de saúde, educação e outras.

Parece evidente para os estudiosos que está reservado ao Brasil um papel exponencial na economia das próximas décadas. Mas que será com o quadro social? Que políticas implantaremos, das quais ainda não se vislumbram vestígios? Será preciso esperar por conflitos graves? Ou seremos capazes de avançar no terreno social e enfrentar também questões complexas que estão à espera, como a degradação de solos (no mundo, 30% deles degradados)? Não faz sentido cruzar os braços e aguardar conflitos imagináveis na área social ou econômica. Ainda lembrando que os mais de 7 bilhões de habitantes humanos poderão chegar a 10 bilhões em 2015.

Um único exemplo demonstra a importância do investimento em infraestruturas básicas no espaço rural. Estudo do Instituto Trata Brasil (11/9) sobre saneamento no Estado de São Paulo indica que para levar água e ligações de sistemas de esgotos a todas as moradias paulistas será preciso investir R$ 26,7 bilhões em 20 anos; mas em duas décadas os ganhos econômicos e sociais do investimento na expansão dos serviços nas diversas áreas chegariam a R$ 64,9 bilhões. Os cálculos concluem que, na média do período (2015 a 2035), a cada R$ 1 mil investidos na expansão da infraestrutura de saneamento, a sociedade terá R$ 2.326,00 de retorno social no prazo maior. Não há dúvida de que o ganho social mais que compensa o investimento.

Paisagem brasileira

<strong><a href="http://viajeaqui.abril.com.br/cidades/br-ba-mucuge" target="_self">Mucugê</a>, <a href="http://viajeaqui.abril.com.br/estados/br-bahia" target="_self">Bahia</a></strong> Fundada no final do século XVIII, a cidade é considerada uma das mais antigas da região da <a href="http://viajeaqui.abril.com.br/cidades/br-ba-chapada-diamantina" target="_self">Chapada Diamantina</a>, tendo sido um dos polos mais importantes da exploração do ouro e do diamante no país. Sua herança histórica está bem preservada nas casas e edifícios datados do período colonial, que são cercados por ruas de paralelepípedo. Um dos pontos fortes do turismo local são as famosas festas juninas, repletas de boas atrações <em><a href="http://www.booking.com/city/br/mucuge.pt-br.html?aid=332455&label=viagemabril-cidades-historicas-do-brasil" target="_blank">Veja preços de hotéis em Mucugê no Booking.com</a></em>
Mucugê (BA)

No vácuo, Temer ficará apenas por ir ficando

No liquidar de seu mandato, Rodrigo Janot oficializa, enfim, a segunda denúncia contra Michel Temer e mais uma penca de peemedebistas e assemelhados. Trata-se de mais uma estocada, dura e contundente: Temer deixa de ser o primeiro presidente a sofrer uma denúncia do PGR para ser o primeiro a sofrer duas denúncias. Recorde sobre recorde. Contudo, o mais provável é que também esta seja uma marca destinada a não dar em nada.

Cabe compreender: a denúncia é, em si, notícia velha. As samambaias do país sabiam que ela viria mais tarde ou mais tarde. Aliás, Janot contava que, até o final do mandato, pudesse enviar três e não duas denúncias. Desgastar a Michel Temer e sua turma com mais método e vagar.

Contudo, por tudo o que tem acontecido em torno no Procurador-Geral — a frustração e o escândalo em torno da delação de Joesley Batista —, o processo não transcorreu como o PGR esperava. Também a tramitação da delação de Lúcio Funaro — o operador do PMDB — parece ter demorado mais do que se supunha. De modo que a denúncia chega fora do timing planejado, o que a torna menos potente e eficaz.

Além disso, a partir da próxima semana, ficará sob os cuidados de uma nova equipe, desvinculada de Rodrigo Janot e ligada a próxima Procuradora-Geral, Raquel Dodge. E independente da disposição da nova direção do MPF, o fato é que haverá uma quebra de ritmo nesse processo — até para que os novos agentes tomem pé da situação — e é natural que a disposição em aquecê-la na mídia também arrefeça.


Outro aspecto está vinculado a quase nenhuma disposição do Congresso Nacional em afastar o presidente da República, permitindo que seja investigado já — o ''depois'' fica para depois. Quando da votação da primeira denúncia, por força dos argumentos, cargos e recursos, o governo se fez valer e mais de 26O deputados disseram não ao PGR — e, de acordo com as pesquisas, também à sociedade.

Agora, com a sociedade resignada, coberta pelo desalento e falta de alternativas, ainda tanto maior será a facilidade da Câmara em deixar tudo como está e até retirar uma ou outra vantagem disto. Janot suspeitava constranger o sistema, mas, a lambança revelada na ''conversa de bêbados'' de Joesley e Saud dá desculpas e dissimulação a quem já não votaria mesmo pela abertura de processo.

O mais provável, portanto, é que o presidente termine seu mandato e que ajuste contas com a Justiça — se vier a ajustar — somente após 1o. de janeiro de 2019.

A efetividade da substituição de Temer é também cada vez mais duvidosa para boa parte do sistema político, mesmo na oposição; a cada dia interessa menos abreviar seu mandato, uma vez que sua hipotética sucessão, a cada hora, torna-se um exercício de imaginação menos real e mais confuso. É justamente o esgotamento do tempo que lhe resta que o torna mais estável.

Como o leitor deve ter notado, não há aqui considerações de mérito e juízos de valor a respeito da denúncia. Não porque inexistam questões dessa natureza, mas porque, de um ponto de vista prático, parecem pouco relevantes. E isto é o mais terrível: um presidente e seu grupo se mantêm no cargo não porque sejam importantes ou inocentes — o que, a rigor, somente a investigação e o julgamento que a Câmara não permitirá é que poderiam demonstrar —, mas apenas porque não valeria mais a pena mexer com ele. A íntima convicção de que não vale a pena. Michel Temer ficará simplesmente porque vai ficando e o tempo logo passará. Em política, às vezes, existe, sim, o vácuo.

Carlos Melo 

'Adeus, Lula' é um filme sobre implosão, separação e pulverização

"Adeus, Lenin!", filme satírico de Wolfgang Becker, ilumina o deslocamento psicológico causado pela queda do Muro de Berlim nos alemães orientais idosos, cujas referências cotidianas estavam todas definidas pelo "socialismo real". As confissões de Palocci, uma explosão fatal na imagem pública de Lula, pedem um roteiro sobre a orfandade da esquerda brasileira, que não se preparou para viver sem seu patrono de quatro décadas.

Palocci é um furacão de categoria máxima. Nos bons tempos, antes do "mensalão", disputava com Dirceu a condição de sucessor de Lula –e tinha a preferência do próprio Lula. O ex-ministro da Fazenda, porém, não possui a têmpera de Dirceu ou dos "apparatchiks" do núcleo duro lulista, como Delúbio e Vaccari. Ele desconhece a "omertà", o código de honra que bloqueia a estrada da delação. Por isso, começou a falar, convertendo-se subitamente de "herói do povo brasileiro" (segundo o congresso do PT paulista) em traidor "calculista, frio e simulador" (segundo Lula).

Lula e os seus creem que a política está acima de tudo, inclusive dos tribunais. A tese tem alguma verdade: as implicações judiciais das confissões de Palocci permanecem turvas, mas suas consequências políticas são devastadoras. A sentença do traidor sobre o "pacto de sangue da propina" tem maior potencial destruidor para a candidatura de Lula que as sentenças de Moro sobre um certo tríplex ou um célebre sítio. Palocci fecha um ciclo histórico no qual a esquerda não precisou se ocupar com os problemas cruciais da unidade e do rumo ideológico.

O projeto do PT reuniu as heterogêneas correntes da esquerda, oferecendo um leito comum para sindicalistas, movimentos sociais, militantes católicos da "teologia da libertação", castristas de diversos matizes e grupúsculos trotskistas.

Lula serviu como traço de uma unidade que jamais derivou de consensos sólidos nos planos dos valores, da doutrina ou das estratégias. Na falta desse mastro, nada deterá a fragmentação em curso, ainda que venha a ser disfarçada sob o rótulo de uma "frente popular" de partidos e movimentos. A candidatura Haddad, plano B do lulismo, pode até evitar o naufrágio da nau petista, mas carece de força gravitacional para restaurar a moldura unitária que se despedaça.

O lulismo garantiu a unidade por meio da virtual supressão da divergência ideológica. No percurso, a curva decisiva foi a chegada de Lula ao Planalto, que cancelou o já rarefeito debate de ideias no interior do PT. Dali em diante, as correntes petistas engajaram-se na ocupação de cargos no aparelho de Estado, enquanto os "intelectuais de esquerda" aceitaram a humilhante tarefa de justificar tanto as oscilações de rumo do governo quanto as pútridas alianças do capitalismo de compadrio patrocinadas por Lula. O ex-presidente carrega a culpa direta pelo "pacto de sangue" confessado por Palocci, mas a responsabilidade política espraia-se muito além dele, até doutos acadêmicos que nunca se beneficiaram do vil metal.

Unidade e ausência de debate ideológico –as duas coisas estão ligadas como as lâminas de uma tesoura. O lulismo salvou a esquerda das forças centrífugas provocados pela discussão de temas como o lugar das empresas estatais, a produtividade da economia, a curva de sustentabilidade fiscal, a qualidade dos serviços públicos, o imperativo da reforma política. Lula construiu uma cápsula encouraçada, isolando a esquerda num santuário. A prova de seu sucesso está à vista de todos, nos artigos vexatórios dos "companheiros de viagem" que ainda defendem a política econômica dilmista ou celebram a calcificação ditatorial do regime venezuelano.

"Adeus, Lula" é um filme sobre implosão, separação, pulverização. Depois de Palocci, a unidade está morta. Com sorte, do desfecho ressurgirá o debate estancado. Ergamos um esperançoso brinde ao traidor.

Economia serve de álibi para abafar corrupção

O Planalto enterrará no plenário da Câmara a segunda denúncia contra Michel Temer com um discurso ensaiado. Adestrada e municiada com indicadores econômicos, a infantaria de deputados governistas entoará um coro com dois refrões. O primeiro diz que a recessão ficou para trás. O segundo afirma que as investidas do quase ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot não passam de flechadas irresponsáveis que podem frear o avanço da economia.

Não há em Brasília quem aposte uma cédula de real na hipótese de a Câmara autorizar o Supremo Tribunal Federal a dar andamento às investigações contra Temer e a quadrilha que Janot enxerga no coração do governo. A oposição não tem musculatura para cravar no painel eletrônico os 342 votos de que precisa. E Temer atrairá sem dificuldades o mínimo de 172 deputados que, subtraídos do total de 513 votos disponíveis na Câmara, impedirá seus rivais de atingirem a marca mágica dos 342.

A tática do governo convive, entretanto, com um grave paradoxo. Para sepultar a nova denúncia, Temer desperdiçará o tempo e a energia que lhe faltam para aprovar a reforma da Previdência. Em português claro: junto com as acusações de Janot, os deputados devem enviar à cova a pretensão do governo de mexer nas regras previdenciárias. Se isso acontecer, como parece provável, a recuperação da economia, mais lenta do que seria desejável, caminhará em ritmo de lesma.


Quer dizer: Temer conseguirá evitar a realização do pesadelo da queda. Mas não conseguirá realizar o sonho de passar à história como “presidente reformista.” Não deixará de se vangloriar de ter parado de cavar o buraco que Dilma Rousseff converteu em abismo. Mas tende a ser visto pela posteridade como alguém que testou os limites da paciência do brasileiro, ressuscitando a tese de que supostas realizações de um governante perdoam todos os seus meios. No passado, esse fenômeno costumava ser chamado de “rouba, mas faz.”

De costas para a sociedade brasileira, que lhe atribui uma taxa de aprovação de 7%, a mais baixa desde José Sarney, Temer ignora o saco cheio nacional. Voltará a oferecer cargos e verbas aos deputados. Se não for capaz de entregar a mãe de todas as reformas, como a equipe econômica se refere ao pacote de mudanças na Previdência, mesmo o brasileiro mais tolerante será levado a questionar se é mesmo tolerável um governo que se vende como reformista sem reformar seus velhos e maus hábitos.

Imagem do Dia

Patagônia argentina

Lama no ventilador

A delação premiadíssima dos irmãos Batista, com toda a carga de suspeitas que levantou, teve ao menos um efeito colateral positivo: obrigou o procurador-geral Rodrigo Janot a desengavetar denúncias que lá estavam há quase dois anos.

As denúncias contra os quadrilhões do PT e do PMDB misturam fatos antigos com outros recentes. Foi o meio que Janot encontrou de enquadrar o presidente da República, Michel Temer, que a lei exime de prestar contas de atos alheios e anteriores a seu mandato.

Mas a pressa, ainda que necessária, que Janot exibiu em relação a Temer, não a teve em relação a Lula, Dilma et caterva.

O caso Aluízio Mercadante, por exemplo, que tentou comprar o silêncio do ex-senador Delcídio do Amaral, que preparava delação premiada (a seguir feita), veio a público em março de 2016. Só agora Janot a encaminhou ao STF. Por quê?

Mercadante, que cometeu o mesmo delito que levou Delcídio à prisão sumária e à perda do mandato, não foi incomodado e exerceu seu cargo de ministro da Educação até a saída de Dilma.

Janot, a rigor, não incomodou nenhum dos governos do PT, pelos quais foi nomeado e renomeado.

Chegou a ser visto como um procurador do PT. Não explicou, até agora, por que incinerou a delação do ex-presidente da OAS, Leo Pinheiro, que tratava em minúcias de Lula e de um ministro do STF, Antonio Dias Toffoli. Sua atuação, até os 44 minutos do segundo tempo, esteve longe de mostrar isenção.


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Ao sair, porém, em meio às trapalhadas (eufemismo de coisa bem mais séria) da delação dos irmãos Batista – e do comportamento que agora criminaliza de seu braço direito na PGR, Marcelo Miller -, decidiu jogar lama no ventilador.

E haja lama. O contribuinte, lesado por tudo quanto veio à tona, agradece. O problema é que a extensão do que remeteu ao STF faz prever encaminhamento lento e problemático. Por serem amplas demais, e documentadas de menos, as denúncias perdem clareza e objetividade. A defesa dos acusados agradece.

Janot viverá dias difíceis. Arranjou inimigos poderosos em todos os partidos. Mas o modo como o fez, de última hora e sem transparência em suas motivações, não o tornou um herói popular. Muito pelo contrário, o colocou sob suspeição.

Não terá, pois, a contrapartida que tem um Sérgio Moro, de compensar a ira dos poderosos com o apoio entusiástico da opinião pública. Inversamente, terá muito o que explicar, para fora e para dentro da PGR. Seu entorno na instituição está todo citado nos áudios de Joesley Batista e Ricardo Saud.

Ele, que inicialmente defendeu a probidade de Marcelo Miller, terminou por pedir-lhe a prisão. Tal como Lula, alegou que não sabia de nada, embora, por força do cargo que ocupava, devesse sabê-lo.

É a teoria do domínio do fato, que a PGR sustentou, com êxito, no Mensalão contra José Dirceu, levando-o à condenação.

O fato concreto é que, se o país já estava quase órfão de referências institucionais, agora ficou sem nenhuma. Os três Poderes estão, para dizer o mínimo, chamuscados com o que se extraiu das fitas de Joesley e Saud. E há mais, muito mais por vir, em áudios ainda não decodificados, em posse do STF.

Disso resultam urgências políticas, decorrentes da anomalia de um presidente da República, acusado de comandar uma quadrilha, continuar no cargo, em contraste com o rito judicial, lento, complexo e pouco confiável, incumbido de selar-lhe o destino.

O PT, que está em situação bem pior, já que sua quadrilha ficou com a parte do leão na rapina ao Estado, não hesita em insistir no “Fora, Temer!”. Pretende levá-lo com mais força às ruas, acreditando que até os antipetistas serão sensíveis ao apelo.

O certo é que a semana termina com extensa lista de ações da Justiça: O depoimento desastroso de Lula a Sérgio Moro; o agravamento da pena de José Dirceu e João Vaccari, no TRF 4 (para 40 anos), pendente ainda do voto de minerva; a rejeição unânime pelo STF da tentativa de Temer de colocar Janot sob suspeição; a prisão de Wesley Batista; a prisão do ex-governador Garotinho; a evidência de que Marcelo Miller era agente duplo (participava, inclusive, de um grupo no WhatsApp com o pessoal da JBS para tratar da delação junto à PGR). E a busca e apreensão no apartamento funcional do ministro da Agricultura, Blairo Maggi, acusado também de corrupção.

Diante de tal cenário, é absolutamente inviável especular sobre as eleições de 2018. Falta um ano – e até lá não se sabe quais serão os atores dessa peça de horrores a que o país assiste. Não se sabe sequer que partidos haverá - ou mesmo se haverá eleições.

A democracia brasileira está em crise?

"Intervenção militar já!", "fora todos eles", "pela volta da monarquia". Em meio à crise político-econômica que assola o Brasil, vozes que questionam a democracia ganham força, apesar de o país ter passado por um regime de exceção não muito tempo atrás.

Ainda que o modelo democrático seja prestigiado como uma das grandes conquistas da humanidade, apenas 11% dos países são democracias funcionais, conforme índice da revista The Economist. O desempenho é avaliado com base em fatores como liberdade de imprensa, representatividade feminina no parlamento e corrupção.

Segundo esse índice, o Brasil é considerado uma flawed democracy (democracia falha), estando em um nível entre uma democracia plena – como a do Uruguai – e um regime híbrido – como o venezuelano. A menor pontuação do país é na categoria que mede o apoio da população à democracia.

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Estudos nacionais de fato embasam a ideia de que a democracia é cada vez menos importante para os brasileiros. Uma pesquisa Pulso Brasil/Ipsos de agosto indica que para 33% da população a linha democrática não é a melhor para o país.

Nesta sexta-feira, Dia Internacional da Democracia, chamou a atenção tanto o aumento no número de brasileiros que não respaldam a democracia como o daqueles que manifestam abertamente preferência por regimes ditatoriais.

"Na minha última pesquisa, de 2016, saltou de 15% para 20% o percentual dos que apoiam a ditadura", destaca o professor de Ciência Política da USP, José Álvaro Moisés.

Aspectos que remontam ao próprio processo de fundação do Brasil estão na raiz da não consolidação da democracia. Laura Benda, presidente do Conselho Executivo da Associação Juízes para a Democracia (AJD), constata que a democracia nunca foi um valor em si para a sociedade brasileira.

"Nós temos uma sociedade cujo elo fundador é a violência. É um país forjado na escravidão do povo indígena e do povo negro. Mesmo com a República, mais ou menos se segue a mesma lógica de dominador/dominado", argumenta.

A perpetuação desse modelo corrobora para o Brasil figurar, segundo a ONU, na 10ª posição de países mais desiguais do mundo em termos de renda. Tamanha desigualdade trava a plena efetivação da democracia, que tem como promessa "a inclusão social, a diminuição das desigualdades e privilégios", aponta a coordenadora de Direitos Humanos da Fundação Heinrich Böll, Marilene de Paula.

A ínfima representatividade de certos grupos sociais nos espaços políticos contribui para uma menor identificação com a democracia. Atualmente, apenas 9,9% dos congressistas são mulheres, proporção bem inferior à da já baixa média mundial (22,1%). Semelhante situação acontece com negros, pardos e indígenas, que juntos somam 51% da população, mas preenchem somente 20% das vagas na Câmara dos Deputados.

Sem representatividade e com altos níveis de corrupção, as instituições democráticas caem em descrédito. Uma pesquisa Datafolha divulgada em julho mostrou que a taxa de brasileiros que não confiam no Congresso e nos partidos políticos é de, respectivamente, 65% e 69%.

"Numa democracia estável é saudável desconfiar do governo. Mas se a desconfiança de instituições como Congresso, partidos e Justiça for muito prolongada, e ao mesmo tempo crescer, como aconteceu no Brasil nas últimas décadas, isso pode criar a oportunidade para uma base social de natureza autoritária", aponta Moisés.

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Seu controlador

Dia desses meditava sobre nossa realidade. Temos testemunhado um fascinante início de milênio, pleno de avanços tecnológicos formidáveis! Somos, a cada dia mais, "cidadãos do mundo"!

Se, no entanto, você viajar para a Malaysia, não leve consigo nenhuma roupa de cor amarela. Esta cor, relacionada a um grupo de ativistas contrários ao governo local, é de uso proibido naquele país.

Indo ao avançado Japão, tenha a cautela de não dançar em nenhuma discoteca ou clube após a meia-noite - trata-se de atividade proibida por lei.

Se estiver no Irã e pretender aparar o cabelo, fique ciente de que cortes no "estilo ocidental" são rigorosamente proibidos. Observe, também, que nas lojas de roupa não há manequins, cujo uso é objeto de vedação legal.

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Caso esteja no Reino Unido, tenha a cautela de não morrer no Parlamento, sob pena de violar a legislação. Li que esta lei é objeto de rigorosa aplicação: todas as vezes que alguém começa a sentir-se mal lá é imediatamente retirado pelos funcionários.

Nas Filipinas, sob pena de pesadas punições, não fale mal do país. Na China, não converse sobre a possibilidade de viagens através do tempo.

Desejando ir à Rússia, esteja ciente de que usar roupas no estilo gótico é proibido. Passando pela França, descubra que o "catchup" é item banido das cantinas escolares, a fim de que a boa culinária local seja protegida.

Indo à praia na Itália, não tenha a infeliz ideia de construir castelos na areia - é proibido. Aliás, certifique-se de que na região onde estiver chinelos de praia podem ser legalmente utilizados.

Poderia escrever um livro sobre leis assim. Paro aqui por falta de espaço. Agora reflita sobre sua rotina, a cada dia mais repleta de proibições absolutamente desconectadas da realidade.

Seus criadores, nossos controladores, são aqueles burocratas que, desprovidos de toda legitimidade, dentro de suas salinhas isoladas, passam os dias a criar regras de utilidade inversamente proporcional à vaidade nelas embutida.

Graças a essa gente, alimentada por nossa submissão, cá estamos a viver a tecnologia do século XXI sob usos lá da Idade Média - um contraste que só faz aumentar nossa humilhação. Cuidado com eles! Afinal, como alertava Castiglione, "quando o chefe pode o que quer, há grande perigo de que queira aquilo que não deve querer".

Pedro Valls Feu Rosa