quinta-feira, 17 de agosto de 2017

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Genova. Coolest and most underrated city in Italy...
Gênova (Itália)

Gastamos para a dívida crescer, mas não para termos serviços de qualidade

Há no país uma crença estabelecida: se queremos atingir determinado objetivo, simplesmente passamos uma lei afirmando isso e damos o assunto por resolvido; pouca atenção é dedicada à construção dos meios para chegar aonde queremos.

Esse padrão também se aplica à principal medida aprovada até agora no âmbito fiscal, a criação do teto para as despesas federais.

Considero o teto um passo importante para recuperarmos o equilíbrio fiscal, em particular porque institui como princípio o controle das despesas, que cresceram de forma praticamente ininterrupta por 20 anos, de R$ 454 bilhões, em 1997, para R$ 1,3 trilhão, nos 12 meses terminados em junho, valores expressos a preços de junho de 2017.

No entanto, como tive a oportunidade de apontar mais de uma vez, trata-se de um ponto de partida, não a jornada completa.


De fato, a emenda aprovada no ano passado estabelece medidas de controle de gastos em caso de violação do limite (os incisos de I a VII ao artigo 109 da Constituição), mas não dá nenhum instrumento para evitar que isso aconteça.
Ao contrário, deixadas à própria sorte, as despesas obrigatórias —notadamente as ligadas à Previdência, mas uma série de outros gastos também— seguirão crescendo sem controle.

No primeiro semestre deste ano, por exemplo, as despesas obrigatórias aumentaram pouco mais de 5% na comparação com o mesmo período do ano passado, já descontada a inflação, ou seja, R$ 24 bilhões.

Já as despesas ditas "discricionárias" caíram R$ 23,1 bilhões, em particular o investimento, que registrou R$ 11 bilhões de retração no mesmo período.

Há, portanto, um paradoxo: faltam gastos em setores vitais para a operação do Estado, mas, em outros flancos, as despesas ainda crescem a ritmo quase chinês.

Dessa forma, não apenas o governo deixa de controlar o conjunto do dispêndio federal mas também a rigidez do gasto público aumenta (com maior peso para as despesas obrigatórias), enquanto a qualidade do gasto federal despenca.

Posto de outra forma, conseguimos o pior dos mundos: seguimos gastando mais do que o suficiente para fazer nossa dívida crescer de maneira acelerada, mas não para termos serviços públicos com um mínimo de qualidade.

O resultado desse arranjo é o aumento da meta de deficit para 2017 e 2018 em meio a notícias como corte no orçamento das Forças Armadas, assim como na Polícia Federal, entre outros.

Deve estar claro que esse arranjo não é sustentável. Sem controle da despesa obrigatória, não interessa que o teto de gasto esteja inscrito no Código Penal, na Constituição, ou mesmo nos Dez Mandamentos: não há diploma legal que se sobreponha a um fato inexorável. Se a lei estiver no caminho, será devidamente alterada, podem contar com isso.

Obviamente não estou recomendando que o teto constitucional seja revogado, apenas notando que, pelo que sabemos das instituições brasileiras, contar com mandamentos legais sem trabalhar para que funcionem é cortejar o fracasso.

A Lei de Responsabilidade Fiscal, que, reconheço, é uma lei complementar, não um preceito constitucional, não foi capaz de evitar a imensa deterioração das contas públicas.

A moral é simples: não resolveremos o problema só passando leis que expressam nossos objetivos; vamos ter que ralar muito para pôr este país em ordem.

Qual a diferença entre a Constituinte de Maduro e a reforma política?

No poder legislativo federal, agita-se intensamente o submundo do crime que ali atua de modo ostensivo. Por isso, diante do que vejo, torna-se impossível definir com vocábulos brandos as maquinações constitucionais em negociação com vistas às eleições de 2018.

É bom lembrar. No ano passado, ao cabo de campanhas municipais marcadas pela escassez de recursos técnicos, materiais e financeiros, sem militância paga, houve importante renovação e visível encolhimento de alguns partidos. Ficou nítida, então, no resultado das urnas, esta mensagem: "Senhores, por obséquio, abandonem o recinto". De lá para cá, a disposição para a faxina só aumentou.


Enquanto governo e oposição se contorcem numa luta virtual em que apenas reduzida militância se envolve, a nação aguarda o momento de exercer sua soberania e mandar todos para o olho da rua, por justa - justíssima! - causa: se querem fazer negócios pessoais, abram uma quitanda. Recente pesquisa do Instituto Ipsos revelou que 94% da população não se sente representada pela classe política e por essa legislatura naufragada no próprio descaramento.

Congressistas que precisam comprar suas cadeiras alarmaram-se com a falta de dinheiro que marcou a campanha de 2016. A quem extorquirão agora,? De que servirão os usuais requebros e acenos que sugeriam acesso às facilidades do poder? Onde buscarão os milhões que, bem geridos, enchiam as urnas mais indignas no mercado eleitoral? Tudo indica que a conta sobrará para nós, mediante uma tarrafada legislativa que recolherá, sem dó nem piedade, R$ 3,6 bilhões para a campanha deles no ano que vem. É o preço da democracia", afirmam, simulando nobre proteção a um bem superior. Não, não nos tomem por tão ingênuos. Esse é o preço de vossas cadeiras. É a prudente primeira etapa do "Salvemo-nos todos!".

A segunda etapa pode ser resumida como uma bacanal de interesses escusos, indecência que se imaginaria articulada num ambiente sob mortiça luz vermelha. Refiro-me ao aleijão que recebeu o nome de distritão. Ele consiste em transformar em majoritária a eleição proporcional de deputados, na base do cada um por si e o diabo por todos. Elegem-se os mais votados. Porém, para que os atuais detentores de mandato estejam entre os mais votados, diminui-se radicalmente o número de candidatos. O motivo é óbvio: quanto maior o número de candidatos, menos votos para cada um. Se os eleitores querem renovar, feche-se a parta para os novos candidatos. Assim, inverte-se o procedimento usual. Os partidos, comandados pelos seus parlamentares, em vez de buscarem candidatos para ampliar suas nominatas e bancadas, porão a correr os novos pretendentes, assegurando, por falta de alternativa, as cadeiras dos que já têm.

É o mais recente truque da cartola dos corruptos. Corrompe-se a democracia, impedindo que se expresse de modo pleno a firme disposição do eleitorado: "Cavalheiros, abandonem o recinto!". Custo a crer que o STF tolere tão nítida disposição de nossos congressistas de promoverem uma farsa eleitoral. Não perceberá o Supremo aí, o empenho de inibir, por supressão de alternativas, a expressão da vontade dos cidadãos? Não está, a proposta do distritão, em claro antagonismo com princípios essenciais do regime democrático? Será necessário escancarar ainda mais os sinais de má fé legislativa? É sutil a diferença entre a constituinte de Maduro e a reforma política aprovada pela comissão. Ambas estabelecem regras que conduzem a resultados divergentes da vontade social.

Percival Puggina

Governo finge que tenta reduzir salário de marajás, e a gente finge que acredita

Quando se pensava que o país tivesse chegado ao fundo do poço em matéria de incompetência e esculhambação institucional, constata-se que a bagunça continua aumentando, é um nunca-acabar. Através da grande mídia, o governo divulga que enviará ao Congresso uma Proposta de Emenda à Constituição determinando que a soma do salário dos servidores e todos os adicionais recebidos no exercício da função não poderá ultrapassar o teto de R$ 33.763. Este será o limite remuneratório para todos os servidores do Executivo, Judiciário e Legislativo, incluindo Ministério Público Federal e Tribunais de Contas de todos os entes da Federação.

A medida faz parte do pacote de redução de gastos que o governo pretende anunciar segunda-feira, destinado a ajudar o fechamento das contas públicas.

A criativa proposta prevê que sejam incluídos nesse teto qualquer tipo de indenização, vantagens ou gratificações. Entre eles auxílio moradia, paletó, transporte e combustível. A medida atingirá principalmente os servidores do Judiciário e o impacto esperado para 2018 é de uma economia de R$ 725 milhões para a União.

Aparentemente, é uma proposta oportuna e altamente viável, mas na verdade é infantil, patética e ridícula. Com certeza, partiu do ministro do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, Dyogo Oliveira, o único petista conservado pelo governo Temer, apesar de estar comprovadamente envolvido na Lava Jato, como “operador” da compra e venda de Medidas Provisórias, conforme já denunciamos aqui na “Tribuna da Internet” e está mais do que comprovado.


Além de corrupto, Dyogo Oliveira é também incompetente, e com certeza foi mantido na equipe econômica por acumular essas características, que são comuns à maioria dos atuais ministros.

A emenda Dyogo Oliveira é mais uma “jabuticaba”, pois só existe no Brasil. Nunca antes, em nenhum outro país, um governo tomou a iniciativa de enviar ao Congresso uma emenda que já existe na Constituição. Sem a menor dúvida, será o maior vexame político-administrativo já registrado na História Universal.

A norma constitucional para coibir essas distorções salariais existe e está em vigor duplamente, contemplada em dois dispositivos diferentes. Um deles é o artigo 17 das Disposições Transitórias: “Os vencimentos, a remuneração, as vantagens e os adicionais, bem como os proventos de aposentadoria que estejam sendo percebidos em desacordo com a Constituição serão imediatamente reduzidos aos limites dela decorrentes, não se admitindo, neste caso, invocação de direito adquirido ou percepção de excesso a qualquer título”.

E agora, quase 30 anos depois de estar em vigor esta norma, o ministro Dyogo Oliveira, demonstrando exuberante ignorância, quer aprovar uma emenda que repete exatamente este artigo, para estabelecer as mesmas restrições.
O atual ministro do Planejamento também desconhece que já existe na Constituição outro dispositivo reforçando a obrigatoriedade do artigo 17, que manda rebaixar os salários acima do teto. Trata-se da Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003, que deu nova redação ao inciso XI do artigo 37, que estabelece como limite os subsídios de ministro do Supremo Tribunal Federal.

Esta Emenda Constitucional 41, em seu artigo 9º, reforçou a caça aos marajás: “Aplica-se o disposto no art. 17 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias aos vencimentos, remunerações e subsídios dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza.”

Como se vê, o problema não é da Constituição, cujos dispositivos são claríssimos. Não adianta o desprezível ministro do Planejamento enviar para aprovação do Congresso uma emenda que já existe em dose dupla no texto constitucional.

A emenda Dyogo Oliveira é uma falsa providência, de conteúdo meramente marqueteiro, apenas para fingir que alguma medida concreta está sendo tomada, e esta farsa tem a conivência da Casa Civil, da Secretaria da Presidência, do Ministério da Justiça e da Advocacia-Geral da União, órgãos que obrigatoriamente opinam em propostas constitucionais.

Mas o que esperar de ministros como Eliseu Padilha, Moreira Franco, Torquato Jardim e Grace Mendonça?

Para reduzir os salários dos marajás, só há um caminho – apresentar ao Supremo uma ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade), para derrubar todos os penduricalhos salariais que vêm sendo aprovados pelo próprio STF desde que a Constituição entrou em vigor em 1988.

E tudo começou quando o Supremo aprovou um adicional de salário para os três ministros que estiverem trabalhando também no Tribunal Superior Eleitoral. Foi assim que a farra se iniciou, porque depois vieram, em sequência, auxílio refeição, acúmulo de funções, auxílio moradia, auxílio educação, auxílio creche e tudo o mais. Mas será que o governo se interessaria em enviar essa ADI ao Supremo?

Paisagem brasileira

guarda
Guarda do Embaú (SC)

Não! Só quero a liberdade!

mondo vazio » Uma Galeria só com Ilustrações F0#@!
Não! Só quero a liberdade!
Amor, glória, dinheiro são prisões.
Bonitas salas? Bons estofos? Tapetes moles?
Ah, mas deixem-me sair para ir ter comigo.
Quero respirar o ar sozinho,
Não tenho pulsações em conjunto,
Não sinto em sociedade por quotas,
Não sou senão eu, não nasci senão quem sou, estou cheio de mim.
Onde quero dormir? No quintal...
Nada de paredes — ser o grande entendimento —
Eu e o universo,
E que sossego, que paz não ver antes de dormir o espectro do guarda-fatos
Mas o grande esplendor, negro e fresco de todos os astros juntos,
O grande abismo infinito para cima
A pôr brisas e bondades do alto na caveira tapada de carne que é a minha cara,
Onde só os olhos — outro céu — revelam o grande ser subjectivo.
Não quero! Dêem-me a liberdade!
Quero ser igual a mim mesmo.
Não me capem com ideais!
Não me vistam as camisas-de-forças das maneiras!
Não me façam elogiável ou inteligível!
Não me matem em vida!
Quero saber atirar com essa bola alta à lua
E ouvi-la cair no quintal do lado!
Quero ir deitar-me na relva, pensando "Amanhã vou buscá-la"...
Amanhã vou buscá-la ao quintal ao lado...
Amanhã vou buscá-la ao quintal ao lado...
"Amanhã vou buscá-la ao quintal"
Buscá-la ao quintal
Ao quintal
ao lado...
Fernando Pessoa (Álvaro de Campos)

Temer tornou-se presidente da cota do centrão

À medida que vai penetrando o caos fiscal, Michel Temer percebe aos poucos que se deixou enfeitiçar por um tipo de ilusão que Brasília não perdoa num presidente: a ilusão de que preside. Antes de ser denunciado por corrupção, Temer se vangloriava de ter uma sólida base parlamentar. Hoje, os parlamentares é que têm o presidente. A banda fisiológica do Congresso encostou a faca na jugular de Temer.


A história ofereceu a Temer uma extraordinária oportunidade. Ele não aproveitou. E acabou se transformando na oportunidade que seus aliados fisiológicos e oportunistas aproveitam. O governo fraco potencializa a política do ‘quanto eu levo nisso’?, um defeito congênito de Brasília —cidade nascida de um canteiro de obras lamacento, lugar de movimentos pesados, espaço ideal para o trânsito de tratores e do ‘centrão’.

Para sobreviver, Temer entregou-se ao centrão. Prestes a ser denunciado novamente pela Procuradoria, o presidente celebra um conchavo do despudor com a falta de escrúpulos. O centrão pede algo como meia centena de cargos públicos. E o presidente já começou a entregar ao grupo os cofres exigidos. O único cargo que os fisiológicos não reivindicam é o de presidente da República. Está entendido que essa poltrona já é da cota do centrão.

Digo, Lula

Morreu na semana passada, aos 88 anos, Haruo Nakajima, o ator japonês que interpretou o monstro Godzilla em 12 filmes, desde o primeiro, "Godzilla", de 1954, até "Godzilla contra Megalon", em 1973. Godzilla, claro, é o lagarto gigante despertado por uma explosão nuclear no Japão. Na prática, era uma roupa de borracha pesando 100 quilos e medindo 2,5 m, do coco à ponta do rabo, que Nakajima, 65 quilos e 1,68 m, usava durante a filmagem.

Sob o calor dos refletores do estúdio, a temperatura dentro da fantasia ia a 50 graus e fazia Nakajima despejar meio balde de suor por dia —tinha de ser reidratado a todo instante, por um canudinho introduzido num buraco da roupa.

Só o esforço para rebocar o rabo do monstro era suficiente para deixá-lo moído ao fim de cada take.

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Nos filmes, Godzilla pisava e arrasava maquetes de Tóquio, derrubava miniaturas de torres de eletricidade, levando os choques correspondentes, e enfrentava outros monstros do seu calibre, um deles, King Kong. Por causa disso, Nakajima sofreu queimaduras, quebrou costelas e destroncou braços. O que encerrou sua carreira, no entanto, foi a tecnologia. Com os novos recursos eletrônicos, já não era preciso fantasiar ninguém de Godzilla.

Mas Nakajima nunca abandonou o monstro. Levou o resto da vida fantasiado, fazendo aparições especiais em feiras, quermesses e, já que Godzilla não assustava mais ninguém, até em aniversários infantis.

Isto não lhe lembra alguém? Lula. Está em caravana pelo país, arrastando sua fantasia de Godzilla, digo, Lula, por comícios para plateias de militantes profissionais. Joga para a galera, finge soltar fogo e enxofre pelas ventas e cospe marimbondos contra os que o processam. Como Godzilla, julga-se acima da lei.

Mas, até para Lula, sua fantasia está cada vez mais difícil de carregar.

Ruy Castro