sexta-feira, 16 de junho de 2017

Mala preta aos três anos da Lava Jato

O Brasil não é para principiantes. Tantas vezes ouvimos essa frase que se tornou lugar-comum. A fase de combate à corrupção iniciada há três anos pela Lava Jato pode levar-nos a conclusões maniqueístas, do tipo bem contra o mal, republicanos contra patrimonialistas.

Olhando de perto, a frente que se coloca contra o trabalho da Lava Jato é muito mais ampla do que o grupo dos grandes partidos que articulam para destruí-la, no governo e no Congresso.

Líder entre os juízes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que absolveram a chapa Dilma-Temer, apesar das provas, Gilmar Mendes fixou-se num argumento importante: o da estabilidade. Quem a rejeita, num país com 14 milhões de desempregados? O argumento de estabilidade deveria sempre estar sobre a mesa.


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No entanto, conforme mostrou Bolívar Lamounier, em intervenção recente, um julgamento visto por todo o País no qual se enterram as provas é um fator de instabilidade. Cava um novo fosso entre a sociedade e as instituições, revelando uma Justiça Eleitoral, pouco conhecida até então, como um artefato de outra galáxia.

Em outra posição dentro da grande frente adversária estão os responsáveis, jornalistas próximos ao Planalto e o próprio PSDB, que saltou para a enganadora maciez dos cargos no governo.

Interessante classificar os que pedem a queda de Temer como irresponsáveis. Já que estamos usando a palavra, é bom lembrar que não somos presidentes nem recebemos um empresário investigado à noite, sem anotação na agenda, usando senhas no portão de entrada.

Não nos parece responsável um presidente que mantém aquele tipo de diálogo, tarde da noite, com o dono da Friboi. Tampouco parece responsável designar como interlocutor do empresário Joesley Batista um assessor especial que, horas depois, é filmado carregando a mala com R$ 500 mil.

Para ficar no universo mínimo de uma só palavra, a irresponsabilidade decisiva foi de Temer. Supor que três anos depois da Lava Jato não só tudo terminaria em pizza, como o dinheiro da propina seria pago diretamente na Pizzaria Camelo.

Foi Temer sozinho que arruinou suas chances de conduzir as reformas e jogou para fora da pinguela uma grande parte da sociedade, já constrangida com ela, mas vendo-a como a única saída momentânea. A maioria tem o direito de rejeitar um presidente que se envolve em práticas tão sospechosas. De achar que ele deva ser investigado, mas que os dados já expostos o desqualificam para o cargo.

Neste instante, a pergunta dos que defendem a instabilidade: se Temer cair, não pode ser pior, o caos não tomaria conta? A hipótese das diretas é bom tema para uma pajelança, mas não é uma proposta viável, na medida em que sua aprovação depende do Congresso.

Não tenho ilusões sobre um presidente eleito pelo atual Parlamento. Também ele seria escolhido com base numa promessa de neutralizar a Lava Jato. Independentemente de seu perfil, ele terá, de alguma forma, de comandar a frente contra as investigações.

Lula cumpriu o seu papel, a cúpula do PMDB e o presidente do PSDB também o cumpriram. Nesse particular, até o momento foram derrotados.

Temer está em guerra aberta contra a Lava Jato. Usa a mesma tática de Lula contra Moro. Agora o general a abater nas hostes adversárias é o ministro Edson Fachin. Esta semana surgiu a notícia de que Temer teria usado a Abin para investigar a vida de Fachin, descobrindo seus pontos fracos. Atribui-se a notícia a um assessor de Temer. Se isso foi mesmo assim, fico em dúvida se ele queria atingir seu chefe ou deixar no ar uma suspeita sobre Fachin.

Na Câmara, um dos veteranos da batalha Eduardo Cunha, o deputado José Carlos Marin, tornou-se vice-líder do governo. E disse que é perfeitamente legal a Abin investigar um ministro do STF.

Marin e outros veteranos da batalha de Cunha articulam uma CPI da JBS e o objetivo principal é levar Fachin para depor. Fachin é o Moro de Temer, até que Temer caia do governo nos braços do próprio Moro.

Estranha estabilidade a que nos oferecem os defensores da presença de Temer. Nos tribunais as provas não valem. Durante as investigações também pouco importam: em vez de se defenderem, os acusados passam a atacar os investigadores.

A máquina do Estado volta-se agora contra as instituições que realmente estão trabalhando com seriedade, desvelando o esquema continental de corrupção. Temer assumiu a mesma tática de Lula. E sem nenhuma combinação prévia se prepara para gastar dinheiro com um pacote de bondades que o tire do isolamento de hoje. Nem os próprios defensores da estabilidade econômica pensavam num desdobramento como esse.

Quando se desenha uma estabilidade com um presidente na corda bamba, as pretensões, mesmo legítimas, vão esbarrar a cada instante na sua própria negação. Ao invés do termo estabilidade, para conservar o que já existe, prefiro uma expressão para mudar o que está aí: equilíbrio dinâmico.

Se Temer incorreu em crime, ele precisa sair. Um novo presidente, eleito pelo Congresso, fará parte do mesmo bloco contrário ao da sociedade que apoia a Lava Jato. Mas como seria o último a tentar a batalha final, talvez tivesse algum cuidado – nessa guerra já caíram alguns dos principais expoentes da política brasileira. Num ano eleitoral existe uma chance de a sociedade controlar um pouco mais o Parlamento e o presidente escolhido por ele.

Não é um futuro dos sonhos. É um caminho difícil no rumo das mudanças, mas é o que a Constituição nos oferece. Teremos muito ainda que suportar. Mas será um fardo menor que enterro de provas nos tribunais e guerra contra investigações que podem destruir o gigantesco esquema de corrupção.

Por enquanto, vamos assistir à guerra de Temer contra a Lava Jato. Apertem, pois, os cintos: o que chamam de estabilidade nós chamamos de turbulência.

Democracia não é assim...

Dezenas de processos de recall são postos em andamento todos os dias nos EUA afetando funcionários públicos eleitos que vão de promotores e xerifes a gestores de escolas, além de representantes eleitos diversos para os poderes legislativo e executivo, de governadores e prefeitos para baixo, nos niveis municipal e estadual. Até juízes de 1a instância, em vários estados, têm de passar, a cada quatro anos, por “retention elections” onde o povo diz se devem ou não permanecer nessa função.

O filtro, lá, aplica-se de baixo para cima, ao longo da carreira, na expectativa de que até chegar ao nível federal o candidato já tenha sido testado e depurado o bastante.
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A título de exemplo, dou um resumo dos três processos que estavam para ser decididos na terça-feira passada, 13 de junho, a última data para a qual encontrei registro hoje, dia 15.

Em Homer, Alaska (5.470 hab.), três membros do City Council, que faz as vezes de prefeitura e elege 6 membros para mandatos de três anos, sobreviveram a uma votação de “recall” ou retomada de mandato convocada contra posições que assumiram em relação à construção de um oleoduto e de um projeto correlato que pretendia transformar em santuário uma área indígena que o oleoduto atravessaria. O processo foi aberto em 6 de março por iniciativa de eleitores. Eram necessárias 373 assinaturas contra cada um dos três objetos do “recall“. Nos tres casos foram obtidas mais de 430 assinaturas. Seguiu-se campanha contra e a favor, como é da lei. Os proponentes tinham arrecadado US$ 2.462 para a campanha a favor. Os contrários US$ 2470 para a campanha contra.

Em Frenchville, Maine (1.087 hab.), o chefe do Board do City Cuncil, John Ezzy, equivalente a prefeito, perdeu uma votação de “recall” onde era acusado de ter incidido em “conflito de interesses” (pessoais e financeiros) num projeto de reforma de uma avenida da cidade onde ele prório mora. Ezzy acabou renunciando ao cargo mas como o fez menos de 10 dias antes do prazo marcado para a votação ela ocorreu mesmo assim, conforme estipula a regra local, vencendo o recall por 52,88% a 47,12%. O processo tinha sido aberto em março, a coleta de assinaturas terminou em 20 de abril, a votação foi convocada em 2 de maio e ocorreu em 13 de junho.

Em Tucumcari, Novo México, a prefeita Ruth Ann Litchfield e tres outros membros da City Comission sobreviveram a uma eleição de “recall” por 75,29% a 24,71%. A acusação era de aplicação de multas indevidas e outros fatos menores. Embora o proponente tenha conseguido as assinaturas para qualificar o processo havia consenso de que ele se tinha precipitado e a questão podia ser resolvida por meio de negociação ou recurso à corte local. Nos EUA cada cidade pode ter o sistema de governo que quiser. Tucumcari tem pouco mais de 5 mil habitantes com cinco distritos eleitorais, cada um dos quais elege cinco membros para uma City Comission por quatro anos. Essa comissão elege indiretamente o prefeito.

Os três exemplos do dia registrados no site Ballotpedia que acompanha todos esses processos e outras formas de exercício da democracia americana, referem-se a casos quase prosaicos mas servem para mostrar a distância em que estamos de uma verdadeira democracia.

Lá ninguém toca num funcionário ou representante eleito senão quem o elegeu. Aqui somente os mesmos TSE e STF que tratam, neste momento, de julgar o presidente da republica, deputados federais e senadores envolvidos com a Lava Jato, alem de mais todos os 330 assuntos a que a nossa Constituição dedica artigos ou sub-artigos e acabam sendo “decididas” pelo STF, se encarrega de destituir prefeitos do Oiapoque ao Chuí que nenhum deles elegeu, com a pertinência e o conhecimento de causa que se pode esperar de tão vastas atribuições. Já em funcionários públicos que todos eles – réus e juízes – nomeiam a granel ninguém especificamente põe as mãos.

A própria “desimportância” das razões pelas quais o povo põe e despõe nos EUA mostra a diferença de sensibilidade que se adquire depois de pouco mais ou menos de 100 anos de uso dos instrumentos de democracia semidireta que eles adotaram na virada do século 19 para o 20 (“recall“, referendo, leis de iniciativa popular) quando a política por lá tinha chegado a um grau de deterioração muito semelhante ao da nossa hoje.

Isso educa os eleitores e também os políticos. Tanto que somente tres governadores de estado chegaram a sofrer “recall” nesses anos todos. Eles sabem bem de que tipo de armamento dispõem os seus representados e que jogar a favor deles é a única maneira de evitar que o usem.

Democracia mesmo é assim que se faz. Lá de cima, de uma elite de “excelências”, “eminências” e “meritíssimos” – e sem breque como podem se dar o luxo de ser aqui – só vem mesmo sobre nós, os meros “zés”, o que temos recebido.

Não ha maneira mágica de “resolver” o problema brasileiro. Democracia é uma obra que começa e não termina nunca, e que pode dar excelentes resultados comparativos desde que fique a cargo de quem precisa viver dentro dela.

As contas não dão trégua

O governo terá de podar R$ 300 bilhões das despesas obrigatórias, até 2030, para evitar o rompimento do limite de gastos, mesmo com a aprovação da reforma da Previdência. Esse é o cenário central de um novo relatório da Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão de assessoria do Senado. No melhor cenário será preciso um corte de R$ 100 bilhões. No pior, de R$ 500 bilhões. A mensagem é tão clara quanto inquietante: a aprovação de um projeto razoável de mudança previdenciária será insuficiente para garantir a eficácia do teto de gastos criado em 2016 por emenda à Constituição. Especialistas poderão discutir detalhes e pressupostos desses cálculos, mas nenhuma pessoa responsável e razoavelmente informada poderá menosprezar o alerta lançado por uma equipe respeitada.

O conserto das finanças públicas, devastadas pela mistura de incompetência e irresponsabilidade na gestão petista, ainda vai tomar muito tempo e será mais complicado, provavelmente, do que hoje supõe a maior parte das pessoas. Além disso, hoje o desafio é maior do que há pouco tempo.


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Enquanto a crise política se prolonga, aumenta a insegurança quanto ao desempenho da economia, decisões são adiadas, tempo é desperdiçado e cresce o risco de entraves ao programa de arrumação das contas governamentais. Conflitos em Brasília podem até paralisar ações importantes para a recuperação do País, mas nenhuma palavra mágica imobilizará o relógio e imporá uma pausa às necessidades do País.

Economistas do mercado continuam projetando para este ano um resultado primário – sem a conta de juros, portanto – pouco pior que o programado oficialmente. O Ministério da Fazenda publicou na terça-feira passada as estimativas coletadas até dia 5. A mediana das projeções aponta um déficit primário de R$ 142,05 bilhões em 2017 e de R$ 127,45 bilhões em 2018. O buraco previsto para este ano é maior que o fixado na lei orçamentária, de R$ 139 bilhões. O calculado para o ano seguinte continua abaixo do limite, estabelecido em R$ 129 bilhões.

O primeiro valor é menor que o publicado em maio (R$ 148,04 bilhões). Em relação ao próximo ano a previsão piorou. Em maio, a mediana para o déficit ainda estava em R$ 125,12 bilhões. Para os dois anos houve ligeiro aumento da arrecadação prevista e diminuição da despesa total esperada.

Apesar do quadro muito complicado tanto em 2017 como em 2018, o conjunto de problemas ainda parece administrável, se o governo puder manter o rumo da política orçamentária e, naturalmente, se o Brasil escapar de uma recaída na recessão. Uma semana depois da coleta desses números, economistas de instituições financeiras e de grandes consultorias baixaram suas previsões de crescimento econômico. A mediana das estimativas para 2017 passou de 0,50% para 0,41%. O ritmo de expansão esperado para 2018 caiu de 2,40% para 2,30%.

Técnicos de alguns dos maiores bancos, segundo se informou nos últimos dias, passaram a trabalhar com números piores que esses e já há quem estime crescimento zero neste ano, como consequência da insegurança política. Menor avanço da atividade comprometerá a arrecadação de tributos, mas o governo continuará forçado a realizar a maior parte da despesa prevista.

Pelas projeções coletadas no começo do mês pelo Ministério da Fazenda, a dívida bruta do governo geral, isto é, dos três níveis da administração, continuará a crescer neste e no ano seguinte como proporção do Produto Interno Bruto (PIB). Os números de junho são piores que os de maio para os dois períodos. A mediana das estimativas para 2017 passou de 75,44% para 75,47% do PIB. O número esperado para 2018 subiu de 78,50% para 78,60%. Já está bem assentada, de toda forma, a tendência de crescimento dessa relação pelo menos até 2020. Esse endividamento, é sempre útil sublinhar, é bem maior que o da maioria dos governos dos países emergentes.

Pode-se esquecer esses problemas enquanto se cuida de interesses partidários. Mas os problemas continuarão existindo e, quanto mais negligenciados, tanto mais graves se tornarão. Pior para o País.

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Igreja Remédios, Lamego, Portugal
Igreja N. Senhora dos Remédios, Lamego ( Portugal)

Sob os olhos da lógica

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Recentemente, o secretário municipal de Educação de uma importante cidade falou que se sentia como encarregado da segurança escolar, dedicando parte de seu tempo para assegurar o funcionamento de suas escolas, ameaçadas pela violência. No momento em que dizia isso, ele estava para decidir o fechamento de uma de suas melhores creches por causa da ameaça de balas perdidas, tráfico de drogas e assaltos. Sua cidade não é a única. Oitenta e três por cento dos alunos do ensino médio consideram que a segurança é o maior problema de suas escolas.

Um país que não consegue assegurar o funcionamento de suas escolas é um país em decadência: não conseguirá formar a inteligência que o mundo necessita para enfrentar os desafios do século XXI.

A decadência se mostra também dentro da escola, mesmo quando ela consegue funcionar, apesar da violência em seu exterior. Na atual civilização baseada no conhecimento, não será possível um país evoluir se cerca de 13 milhões de pessoas (8% da população adulta) são analfabetas, incapazes de ler até mesmo o lema “Ordem e Progresso” escrito em sua bandeira; se mais de 26 milhões (18%) de adultos são analfabetos funcionais; se o acesso à educação de qualidade é mantido como um privilégio para aqueles poucos cujas famílias podem pagar uma boa escola. O desprezo aos cérebros da nossa população é um claro indicador de que marchamos para uma decadência civilizatória.

A decadência está também sob os olhos do observador que percebe a falta de sentimento coletivo de nação, transformando o país numa soma de grupos corporativos que disputam entre si, da maneira mais egoísta possível, os recursos e os produtos nacionais.

Ainda mais visível está a degradação pela corrupção, tanto no roubo do dinheiro público por políticos em benefício pessoal quanto no desvio pela corrupção de dinheiro das prioridades para beneficiar apenas pequenas parcelas da população. A irracionalidade política é outra manifestação e causa de decadência: políticos, artistas, estudantes, filósofos e profissionais agem e reagem baseados em posições políticas passionais, sem compromissos com a lógica, como aconteceu em países cuja decadência decorre de disputas sectárias, cujo melhor exemplo hoje é a Síria. Fecham os olhos para a lógica da mesma maneira que fecham os olhos para não ver a decadência que suas ações provocam. E não percebem que a decadência surge com a falta de coesão social no presente e de rumo histórico para o futuro.

Não é preciso muita perspicácia nem análises sociológicas para perceber que estamos em um processo de decadência histórica, que pode nos levar à desagregação social e à condenação ao atraso em relação ao resto do mundo, talvez por décadas, no futuro.

Temer balança mas não cai, para desespero dos roteiristas de 'House of Cards'

Os roteiristas de “House of Cards” têm toda razão quando admitem que a política brasileira é muito mais criativa do que a premiada série da TV americana. Realmente, não há comparação. A crise brasileira é completamente original, tem características singulares, e os cientistas políticos estrangeiros não conseguem acompanhar nem compreender. No Brasil, reina uma esculhambação institucional verdadeiramente sui generis, os três Poderes imaginados por Montesquieu apresentam alto grau de impunidade, de forma alguma podem ser considerados independentes e harmônicos, muito pelo contrário.

Como explicar que o Congresso brasileiro cassou o mandato de uma presidente da República, mas manteve os direitos políticos dela, apesar de ter sido eleita com caixa 2 de campanha, proveniente de dinheiro sujo, oriundo da corrupção pública e privada. E depois a presidente cassada e seu sucessor foram absolvidos na Justiça Eleitoral, apesar de existirem abundantes provas de caixa 2. Como um analista estrangeiro pode entender essa situação?


Na sequência da versão brasileira de “House of Cards”, o atual foi gravado por um megaempresário corrupto, no subsolo do palácio residencial, vejam que roteiro criativo, e até agora nada lhe aconteceu. A perícia da gravação ainda não foi concluída e novo capítulo traz o presidente sendo investigado pela Polícia Federal, que tem prazo até a segunda-feira, dia 19, para finalizar o inquérito.

No mesmo capítulo, o FBI tropicalista deve encerrar o caso que relaciona a presidente Temer ao chamado “homem da mala”, ex-deputado Rocha Loures. O suspense aumenta, de matar o Hitchcock, como diria o compositor Miguel Gustavo.

Realmente, os roteiristas de “House of Cards” não têm condições de competir com a trama que a política brasileira leva diariamente ao ar, ao vivo e a cores.

O mais curioso é que no enredo à brasileira o presidente é indestrutível, uma espécie de João Teimoso, que balança, mas não cai. As leis pouco importam, porque quem manda do país é o Mercado, que no tempo da ditadura militar os jornalistas chamavam de Sistema.

E a situação do Brasil ficou semelhante à da Bélgica, que recentemente passou quase dois anos sem governo (primeiro-ministro) e vida que segue, como dizia o João Saldanha.

Aqui na Tropicália, quem governa é Henrique Meirelles, que sempre sonhou em conquistar o poder pelo voto, jamais poderia imaginar que fosse alçado de outra maneira. Mas na vida o que vale é a prática e não a teoria.

Você tem um estadista no bolso do colete?

O que um bando de malfeitores petistas fez com a jornalista Miriam Leitão a bordo de um avião da Avianca no dia 3 de junho, num voo Brasília/Rio, pode vir a ser um favor ao Brasil.

Grosseiros, violentos, ignorantes, sob o beneplácito de uma tripulação amorfa, os delegados petistas, embarcados em Brasília ao término de um Congresso do PT, ao encontrar Miriam Leitão entre os passageiros do voo que os levaria ao Rio, acharam que esse era o momento ideal para mostrar como pensam e agem os petistas diante da Imprensa.

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Comportaram-se com ódio, foram brutos em gestos, palavras e ações e demonstraram toda sua ignorância ao estender sua fúria à empresa onde Miriam trabalha há muito tempo. Crente que estavam punindo a Rede Globo, gritaram que “quando eles mataram Getúlio o povo foi lá e quebrou a Globo”. Tão politizados são os malfeitores fardados do PT que nem sabem que Getúlio Vargas matou-se em 1954. O ano do sacrifício de Getúlio Vargas não merecia ser esquecido tão depressa, logo pelo partido que se autodenomina do povo.

A Avianca já sabemos o que fez. Nada. Ficou muda e calada durante o voo e, que eu saiba, está muda até hoje. Já o PT, ah! o PT. O que fez o PT com seus encantadores delegados?

Publicou uma nota na qual lamenta o ‘constrangimento’ sofrido pela jornalista. E reclama que várias vezes “muitos integrantes do Partido dos Trabalhadores, inclusive esta senadora, já foram vítimas de semelhante agressão dentro de aviões, aeroportos e em outros locais públicos”. A nota é assinada pela senadora Gleisi Hoffmann, atual presidente do PT.

A senadora petista omite mencionar que foi denunciada por receber um milhão de reais do esquema de propinas da Petrobrás para a campanha de 2010, o que não justificaria ser agredida pela população brasileira em lugar algum, mas pelo menos fundamentaria o desagrado do povo com sua pessoa, ré que é em processo da Lava-Jato.

E por que eu acho que esse triste espetáculo dos malfeitores petistas poderia ser bom para o Brasil? Pelo simples, e talvez ingênuo motivo de que talvez assim os brasileiros não tenham medo da saída de Temer ainda este ano e que não se apavorem com a ideia de eleições antes de 2018.

Acredito que todos os partidos se reúnam para pensar em nomes para lançar como candidatos. Unidos ou desunidos, sabem que o governo Temer está por um fio. Alguns, como os tucanos, acham que antecipar eleições é torcer pela vitória do Lula, o que os deixa muito assustados.

Pois eu tenho para mim que o comportamento dos petistas nos mais variados espaços públicos – em palanques, ruas, praças e até em aviões – só faz diminuir a chance da candidatura do Lula.

Precisamos cuidar do Brasil, escolher o que seria melhor para evitar que o país definhe. Vamos defender o Brasil, lutar para que as novas gerações possam ter um futuro tranquilo, sobrevivendo em paz e segurança sob a batuta de um estadista.

Quem seria esse estadista? Aí é que está o busílis.

Gente fora do mapa

Bamiyan (Afeganistão)

Governo, oposição e a bala de prata

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Há muitos anos, em um dos shows que periodicamente apresentava na linha do "Eu sou o espetáculo", o comediante José Vasconcellos parodiava o ator Gary Cooper subitamente cercado de índios inamistosos. Eram dez mil índios à frente, dez mil à retaguarda, outros dez mil de cada lado. "O que farei?" perguntava, em inglês, simulando o astro hollywoodiano em diálogo consigo mesmo. "O melhor é tornar-me índio também!", concluía.

Lembrei-me do saudoso comediante e do impasse de Gary Cooper ao ponderar nossa situação como cidadãos no quadro político em que nos emolduraram. Nunca vivi cena assim. Ela está bem expressa na imagem que me chegou pelas redes sociais solicitando marcar com "x" a instituição em que mais se poderia confiar. Apresentava, para isso, quatro alternativas: governo, parlamento, judiciário e ... jogo do bicho. Impossível negar que estamos literalmente cercados!

Se buscarmos saídas pelo padrão universal, ou seja, dentro do binômio governo/oposição, salta aos olhos a ausência de alternativas. O que acontece no Brasil é inusitado! Sabe-se, agora, fora de qualquer dúvida, que havia uma organização criminosa dentro do governo e outra na oposição. Com o impeachment, uma parte da que estava no governo juntou-se aos quadrilheiros à espreita nas cavernas da oposição e formou o novo governo. Havia gente boa no anterior? Sim, claro; pouca, mas havia. Há gente boa no novo governo? Sim, claro, pouca, mais há. O problema é que os interesses se polarizam em torno da disputa pelo poder, fazendo com que deixe de existir uma alternativa política respeitável, na qual a nação possa confiar.

Com a cisão da organização criminosa que governava o país foi como se uma cápsula de guerra bacteriológica se rompesse. A peste se alastrou. E o fez com intensidade, atingindo os tribunais superiores, que confundem dignidade com indignação ante qualquer dedo virado para seu lado. Não, cavalheiros, arrogância nunca foi sinônimo de virtude e não é o pedestal que faz o santo.

No curto prazo, nosso rumo está traçado pelo GPS da Constituição. Seremos governados por uma quadrilha, pelo menos até 31 de dezembro de 2018. A situação também não se altera mudando-se a Constituição, como quer o PT com suas joint ventures para eleger Lula. Oportuna e felizmente, logo ali, em outubro do ano que vem, ou seja, dentro de 16 meses, o poder volta às mãos do povo viabilizando a higiênica faxina eleitoral que poderá encurtar, para muitos, a distância entre a Praça dos Três Poderes e a porta da cadeia. E saneando o quadriênio vindouro. No presidencialismo, dia de eleição é a bala de prata quadrienal. Errou, se ferrou.

Enquanto não forem melhorados, assim são os passos da democracia e do Estado de Direito dos quais este colunista não arreda pé. Quem quiser alternativa diferente vá beber noutra caneca.

Somos como Gary Cooper parodiado por José Vasconcellos. Estamos entre dois bandos que se enfrentam. Graças a Deus não precisamos aderir a um deles. Aliás, se me recuso a apontar qualquer um como merecedor de adesão, não hesito em identificar o pior. Muito resumidamente, porque a lista seria imensa, refiro-me ao bando formado por aqueles que:
• apreciam, reverenciam e apoiam financeiramente os regimes cubano e venezuelano;
• sonham com um "marco regulatório" da imprensa, com um "marco civil" da Internet e com um Conselho Federal de Jornalismo para cercear quem os incomode;
• promovem a luta de classes, conflitos raciais, conflitos de gênero, invasões de terra, violência sindical;
• são contra privatizações e responsabilidade fiscal;
• se puderem, criarão os sonhados "Conselhos populares" (sovietes) para esterilizar a representação parlamentar;
• dão refúgio a terroristas, fundaram e comandam o Foro de São Paulo;
• apoiam quaisquer políticos ou filósofos adversários da cultura e da civilização ocidental;
• chamam bandidos de "heróis do povo brasileiro", dão nomes de ruas e constroem memoriais a líderes comunistas;
• têm fobia a órgãos de segurança pública;
• dedicam preferencial atenção aos direitos humanos dos bandidos;
• promovem a ideologização da educação e defendem o direito de fazê-lo;
• são contra a redução da maioridade penal e a favor do desarmamento;
• apoiam a agenda de gênero nas escolas, criaram o kit gay, defendem a liberação do aborto, financiam a marcha da maconha;
• criaram, compreendem e utilizam movimentos sociais como milícias a serviço de suas causas políticas.
Cadeia para todos os corruptos, independentemente das letrinhas partidárias em que estejam acantonados! Toda a atenção para o esclarecimento dos eleitores com vistas ao pleito do ano que vem! Todo empenho por uma reforma institucional com parlamentarismo, voto distrital e cláusula de barreira! O poder não pode voltar às piores mãos! Estamos cercados, mas lutando o bom combate!
Percival Puggina

O longo voo 6237

‘Foram duas horas de gritos, xingamentos, palavras de ordem contra mim e contra a TV Globo. Não eram jovens militantes, eram homens e mulheres representantes partidários. Alguns já em seus cinquenta anos. Fui ameaçada, tive meu nome achincalhado e fui acusada de ter defendido posições que não defendo.” No voo Avianca 6237, durante duas horas, Míriam Leitão tornou-se alvo da hostilidade organizada de grupo — no caso, de delegados do Congresso Nacional do PT. A aeronave converteu-se, assim, em mais um registro numa história secular. O “ato de repúdio” — esse é o nome da coisa — não deve ser confundido com eventos randômicos de agressão politicamente motivada. É um mecanismo de ação política consagrado por regimes e partidos que exercitam, ou almejam, um poder absoluto.

Na Rússia Soviética dos anos 20 do século passado, o “ato de repúdio” acompanhou, como uma sombra, os passos de Trotsky, Zinoviev e outros bolcheviques da velha geração que articulavam movimentos de oposição a Stalin. Desde 1992, a Rússia restaurou a antiga bandeira czarista e a aliança entre o Kremlin e a Igreja Ortodoxa que sustentava os imperadores e hoje sustenta Vladimir Putin — mas não esqueceu o “ato de repúdio”. Alexei Navalny, líder de manifestações contra a corrupção governista, é ritualmente recebido nas estações de trem do interior por chusmas de militantes ultranacionalistas que, sob orientações de cima, lançam-lhe ovos e tomates.

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O “ato de repúdio” sempre obedece a um gesto de comando do alto, mas nunca tem chancela oficial explícita, disfarçando-se de manifestação espontânea. Contudo, a simulação é deliberadamente farsesca. Putin confraterniza com os chefes das gangues “patrióticas” que atacam Navalny, como fazia Stalin com os militantes comunistas encarregados de repudiar seus desafiantes. Ambos, porém, negam ligação direta com os episódios de baderna. A ambiguidade proposital alcança um duplo objetivo: de um lado, preserva a imagem das autoridades ou dirigentes políticos que os instigam; de outro, veicula a eficaz mensagem de que a agressão parte de um temível aparato de poder.

O nazismo e os fascismos europeus conduziram, por meio de milícias semioficiais, incontáveis “atos de repúdio”, que se completavam com espancamentos ou a destruição de jornais, lojas ou residências. Na China da Revolução Cultural, o ritual adquiriu feições de tortura de “inimigos do povo” em praça pública. A ideia básica do “ato de repúdio” não é intimidar a vítima circunstancial, embora isso também eventualmente aconteça, mas propagar uma onda de medo: “você pode ser o próximo”. A finalidade é silenciar, genericamente, o adversário (real ou imaginário). Seu emprego, na democracia, destina-se a suspender a crença de que a divergência faz parte do jogo político normal. No voo 6237, a milícia de delegados petistas erguia uma paliçada em torno de seu partido, delimitando uma fronteira para a crítica.

A blogueira dissidente cubana Yoani Sánchez foi alvo de “atos de repúdio” em Feira de Santana, em 2013. Os bandos de militantes do PT e do PCdoB, narrou Yoani, “seguravam o mesmo documento, contendo um feixe de mentiras a meu respeito” e “repetiam um roteiro vulgar” de slogans gritados em coro “que mesmo em Cuba não mais são ditos”. Não se deve equiparar a agressão verbal de indivíduos malcriados, como os que hostilizaram Guido Mantega, no saguão de um hospital, ou Chico Buarque, numa calçada, com o “ato de repúdio”. Os primeiros agem sós, no calor da hora, sob o impulso de seus desvios de caráter. O segundo é uma operação planejada, codificada e de natureza coletiva. Os agressores de Míriam Leitão encontraram-na fortuitamente no voo 6237, mas agiram guiados por uma tradição política contra um alvo nomeado pelo próprio Lula em diversas ocasiões.

Cuba isto é, o castrismo — está na raiz da prática petista do “ato de repúdio”. Yoani tinha 5 anos, em 1980, durante a crise dos emigrados de Mariel, quando viu, casualmente, pela primeira vez, um “ato de repúdio” no qual “as pessoas berravam e cerravam os punhos à frente da porta de um vizinho”. Depois, ao longo do tempo, como transeunte, vítima ou jornalista, observou dezenas de outros. Nas suas manifestações silenciosas, as Damas de Branco, parentes de presos políticos na Ilha, são invariavelmente circundadas por hordas de funcionários comunistas convocados para “atos de repúdio”. A baderna de Feira de Santana foi articulada a partir de uma reunião na embaixada cubana, em Brasília, da qual participaram assessores parlamentares.

O “ato de repúdio” é uma encenação teatral. Os milicianos — funcionários ou militantes — representam o papel do “povo”. À vítima, cabe o papel involuntário de “inimigo do povo”. A antropologia possui os instrumentos para decifrar os significados simbólicos embutidos na performance, enquanto a psicologia talvez seja capaz de esclarecer as recompensas emocionais obtidas pela horda de “repudiadores”. Mas, no plano político, o espetáculo do “ato de repúdio” ancora-se no lodo do totalitarismo. Que ninguém se engane: o voo Avianca 6237 decolou cem anos atrás.

Demétrio Magnoli

500 barragens ameaçam sufocar o Amazonas

Ao longo do Amazonas existem 140 barragens hidrelétricas em funcionamento ou em construção e outras 428 estão planejadas. Mesmo que no final apenas uma parte delas saia efetivamente do papel, os cientistas acreditam que seu impacto sobre os rios amazônicos será “desastroso”. Um estudo global sobre as consequências de tantas barragens aponta que elas alterarão o curso do rio, retendo a maior parte dos sedimentos e nutrientes fluviais que não produzirão seus efeitos benéficos na planície amazônica, sufocando a vida que depende do rio e do oceano onde acaba.

Tudo no rio Amazonas é desmedido. Seu principal trecho tem cerca de 2.000 quilômetros até a foz no Atlântico, em um estuário com mais de 300 quilômetros de largura. Mas ainda há outros 5.000 quilômetros até o extremo oposto, a nascente nos Andes peruanos, onde correm seus principais afluentes. Alguns, como o Madeira, o Negro ou o Japurá estão entre os 10 maiores rios do planeta. A Bacia Amazônica cobre uma área de 6,1 milhões de km2, 12 vezes maior que a Espanha. E a água que flui pelos rios amazônicos equivale a 20% da água doce líquida da Terra.


Belo Monte, no rio Xingu, será é a terceira do mundo
em geração de energia quando entrar em operação
Apesar de tanta enormidade, nenhum rio sobrevive a 568 barragens. Essa é a principal conclusão de um amplo estudo do qual participaram de ecologistas a engenheiros, passando por economistas e geólogos de uma dezena de universidades norte-americanas, alemãs, britânicas e brasileiras. Apesar de cada barragem trazer consigo um estudo de impacto ambiental, nunca havia sido estudado o impacto regional de todas as barragens existentes e a construir na Bacia Amazônica. A pesquisa, publicada pela revista Nature, analisa o impacto que elas terão sobre a vida do rio, das inundações sazonais que dão vida à Amazônia, aos sedimentos que deixará de arrastar até a desembocadura.

Os rios não são apenas água. Também carregam grandes quantidades de sedimentos que arrancam de um lado e depositam no outro. Esses sedimentos são o substrato mineral da vida numa enorme região de mais de um milhão de km2, entre zonas úmidas e planícies de aluvião. Em seu último trecho, o Amazonas transporta anualmente entre 800 milhões e 1,2 bilhão de toneladas de lama, areia e argila e pelo menos a metade disso acaba no oceano. Em cada barragem que surgir entre o rio e o mar, uma porcentagem desses sedimentos ficará presa no concreto.

“Lembrem-se do antigo Egito, que dependia dos sedimentos do rio que fertilizavam as terras da planície de aluvião”, diz o pesquisador da Universidade do Texas, em Austin (EUA), e principal autor do estudo, Edgardo Latrubesse. “O Nilo é hoje um rio totalmente regulado de maneira artificial por megarrepresas. É um caso típico que exemplifica os enormes impactos provocados por infraestruturas construídas há várias décadas, que produziram grandes impactos sociais, ambientais e econômicos”, acrescenta o especialista em geomorfologia dos rios. Não é a primeira vez que a situação do Egito moderno é relacionada com a alteração do curso do seu grande rio.

No caso que Latrubesse conhece melhor, o amazônico, o impacto combinado das barragens poderia provocar que mais de 60% dos sedimentos que o rio arrasta fique preso. “No Yangtzé [onde foi levantada a barragem das Três Gargantas], a retenção atualmente já é de mais de 75% e em outros rios, como o alto Paraná, no Brasil, a retenção é superior a 100%. Valores maiores que 70-90% são típicos no mundo. Esperamos algo semelhante no Amazonas se tudo for construído”, afirma.