quinta-feira, 16 de março de 2017

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E agora?

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, entregou a caixa da Pandora com os nomes de centenas de políticos contra os quais pede a abertura de processo criminal por corrupção. Embora ainda não saibamos oficialmente seus nomes, não é difícil adivinhar que o furacão irá sacudir todos os partidos e a todas as ideologias. A sociedade brasileira, como no filme de Pedro Almodóvar, está “à beira de um ataque de nervos” e se pergunta, entre envergonhada e incrédula: “E agora?”.

Como ocorreu na Itália em 1992 com a chamada operação Tangentopoli [tangente em italiano significa suborno] — um caso de corrupção político-empresarial com muitas semelhanças com a situação atual do Brasil, que levou à prisão de 800 pessoas e varreu os grandes partidos da República —, as forças políticas brasileiras estão se organizando na tentativa de se salvarem do dilúvio. Na Itália eles conseguiram, com uma série de leis do Congresso, paralisar a ação regeneradora dirigida pelo juiz Antonio Di Pietro. E deram um jeito de aprovar uma espécie de indulto aos condenados. O resultado final não foi dos melhores, já que o desaparecimento dos políticos e dos partidos afundados pela corrupção deu margem à ascensão do bilionário Silvio Berlusconi, que acabou governando por 20 anos, deixou uma herança que os italianos chamam de “maldita” e ainda tem assuntos pendentes com a Justiça.


O que vai acontecer no Brasil? Como irá se comportar a opinião pública? E, sobretudo, o que fazer depois que a classe política ficou acéfala, sem, além do mais, que se vislumbrem no horizonte soluções viáveis, capazes de encaminhar a política hoje sentada no banco dos réus? Difícil fazer profecias neste momento. Algo, entretanto, começa a parecer claro: sem fazer meia dúzia de reformas, o perigo é não só que tudo fique igual, como na Itália, mas inclusive que piore, já que a política brasileira arrasta o peso de uma história onde os valores democráticos são ainda jovens e frágeis.

É necessário e urgente uma reforma política que acabe com essa anormalidade de dezenas de partidos, que na maioria das vezes servem apenas para se venderem à melhor oferta. Urge pensar na possibilidade de uma reforma do Estado, possivelmente acabando com a Presidência da República para dar lugar, como nas democracias modernas, ao parlamentarismo com a figura de um primeiro-ministro. Recordo que a Itália nunca foi tão próspera econômica e culturalmente como na época em que os Governos duravam uma média de apenas dez meses. Eram a sociedade, o empresariado, a cultura, a classe operária e até a arte que, com sua força criativa, mantinham o país à tona.

O Brasil precisa acabar com essa farra das campanhas políticas milionárias, um esbanjamento inútil e superado pelas novas tecnologias da comunicação. As campanhas hoje se fazem nas redes, mais do que na rua, com toda a sua parafernália de ruídos e lixo. É necessário acabar com a impunidade propiciada pelo foro privilegiado dos políticos, que perdeu todo o seu sentido original de assegurar a liberdade de expressão para se transformar numa couraça contra a Justiça. É preciso acabar com os partidos sem ideologia nem programas alternativos, com a reeleição a cargos públicos, com os privilégios e benesses dos que desejam fazer política, o que deve ser um serviço à sociedade, e não um seguro de vida e de impunidade. E, por que não?, uma mudança de Constituição, para adaptá-la àquilo que mudou no mundo e no Brasil desde a sua promulgação.

A grande pergunta, a do milhão, é quem seria capaz atualmente, com autoridade moral e liderança intelectual, de levar a cabo essas reformas: os políticos acusados ou condenados por corrupção? Os juízes? Os movimentos sociais? A pressão de uma opinião pública hoje salomonicamente dividida entre gregos e troianos e, ao que parece, sem esperanças de reconciliação? Talvez nenhum desses setores possa sozinho resolver a charada. Talvez a única possibilidade de esperança consista numa milagrosa conscientização dos que sobrarem vivos na Arca de Noé, depois do castigo do dilúvio. Tomara.

Donald e o temível mundo novo

Se o seu país é uma ideia cada imigrante é uma adesão que só pode torná-lo mais forte. Se é só a garantia armada da posse dos seus privilégios qualquer imigração é uma ameaça de ter de dividi-los.

A eleição de Donald Trump fecha o desmonte da ordem mundial que derivou da memória dos horrores do confronto entre as sociedades abertas e as duas vertentes totalitárias do socialismo – nazismo e comunismo – que ensanguentaram o século 20. É da busca da paz entre as nações e da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, que parte o ideal de um mundo sem fronteiras políticas que, ironicamente, a realidade de um mundo sem fronteiras físicas está pondo a perder.

Extinguiram-se as memórias das guerras mundiais; acabaram-se os estados-nação submetidos exclusivamente às suas próprias leis; dissolveram-se as cápsulas que mantinham cada pedaço da humanidade no seu próprio tempo de evolução institucional. Tudo se vai diluindo numa coisa só incerta e não sabida como nunca.

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A mobilidade não é igual para todos mas passou a ser total para alguns. Com trabalho e vida financeira em rede pode-se “arbitrar” entre centenas de ordenamentos jurídicos, tributários e do trabalho. Pode-se morar e vender na civilização e produzir na barbárie. A História se repete. Estão de volta à cena as “ferrovias” abrindo territórios novos virgens de qualquer legislação; estão de volta os “robber barons” que se aproveitam do vácuo regulatório para controlar a circulação de tudo que transita pelos novos caminhos e cavalgar o dinheiro para impor sua lei e voar voos inimagináveis de poder. Mas não ha no horizonte nenhum esboço do que possa vir a ser a nova “legislação antitruste” para impor limites à ganância sem matar a liberdade que fizeram dos Estados Unidos uma referência de esperança para a humanidade.

O que parecia a libertação do jugo do Capital pela tecnologia se vai materializando como um funil de boca ainda mais larga e saída ainda mais estreita. Entregue ou arrastado, tudo flui inexoravelmente para o Google, para a Amazon, para o Alibaba, para o Facebook. E por baixo, “disrompendo” dignidades, come solta a computação; espreita do ovo já picado a “serpente” da Inteligência Artificial.

Têm cada vez menos opções os consumidores e os proletários do mundo. Não existe mais uma relação segura entre esforço e remuneração. Vão desaparecendo as fronteiras entre Capital e Estado. As classes sociais transnacionalizaram-se mas já não ha campo para a luta. O “inimigo de classe” é anônimo e distante, praticamente indiscernível. Na velha seara dos chavões a confusão é total. “Direita” e “esquerda” perderam os esquemas simplificadores com que classificavam a humanidade e todos os seus atos. Vive-se o triunfo do “laissez faire” universal, até porque não ha mais como “ne lesser pas”, mas é a direita quem se oferece aos “vencidos” e a esquerda quem abraça os “vencedores” desse internacionalismo sem contrato social imposto à traição pela tecnologia. Quanto à “revolução”, está confinada à pretendida universalização dos costumes antes restritos às elites. A nova “utopia” é hermafrodita; é a “superação” da natureza bio-morfológica do indivíduo. No mais, é pé no chão. Nada “choca a burguesia” nestes tempos em que se “reivindica” a autoria das abominações que antes não se confessava nem sob tortura. A guerra tornou-se crônica. Tanto quanto as doenças Aedes aegypti-transportáveis, convivemos diariamente com ela contando mais com a sorte que com a defesa militar ou a proteção da polícia.

O medo é senhor. O carnaval sem fim é o carnaval do nada.

Donald Trump foi cultivado nesse caldo. Que a volta a um passado manufatureiro é impossível todo mundo sabe, até quem o elegeu. Mas que algo ao estilo vai ser ao menos ensaiado é a promessa solene que o pos onde está. O grande problema do protecionismo à Donald Trump, o Brasil bem sabe, é a corrupção que ele engendra. O dilema é velho como os Estados Unidos. O ponto de partida dos “Pais Fundadores” era que a única alternativa para a “privilegiatura” feudal é a radicalização da lógica do merecimento. A questão é que vencer pela eficiência também é infernal. Tem a vantagem de estar aberto a todos mas é uma luta sem fim. Requer “eterna vigilância“. Não perdoa um único vacilo. Daí a “libertação” do parasita latente em cada um de nós para a exploração do próximo ter a força irresistivel que tem. É por isso que é tudo ou nada. Aberta a menor fresta; atribuido a alguém o poder de outorgar “proteções” para dar a quem as consegue o privilégio de desfrutar sem fazer força aquilo que na realidade, requer imensa, começa imediatamente a estruturar-se uma rede tão intrincada de cumplicidades em favor do retorno à vida selvagem que é praticamente impossível evita-lo.

Já a democracia não passa de um artifício de precária sustentação criado justamente para “dobrar” a natureza humana. A americana é tão “entranhada” no tecido social sobre o qual atua, tão misturada ao dia a dia de cidadãos armados com os direitos de “recall”, “iniciativa” e “referendo” vivendo a liberdade plena de decidir suas vidas ha tantas gerações que perderam a noção da excepcionalidade de sua condição. Contra eles o presidente da republica pouco ou nada pode e isso não vai mudar. Mas nessa conjuntura de vulnerabilidade do império da lei pelo esgarçamento da soberania nacional; de ruptura de uma relação identificável entre esforço e remuneração; de extinção maciça de empregos, concentração da renda e, sobretudo, de medo do futuro, não é mais a vontade do presidente, é a vontade dos súditos que se tem de temer.

O medo é o pior dos conselheiros. É quando ele está à solta que se põe em marcha a insensatez. O mundo precisa mais que nunca daquela referência de esperança. Mas o estadista, que as grandes encruzilhadas da História requerem para que não se perca o eixo; aquele tipo de líder capaz de dizer ao povo aquilo que ele não está disposto a ouvir; esse, definitivamente, não é o figurino de Donald Trump.

Os mentirosos

Que tal enumerarmos as mentiras que andam contando pra você, caro eleitor? Primeiro, o STF já deveria ter constituído a sua força-tarefa, para fazer frente ao tamanho da demanda que tem pela frente, não é mesmo? Ou ele foi desenhado só para procrastinar o destino da casta podre? Há joio e trigo para ser separado no Congresso. A esquerda marreta insiste que, sem eles, o país ficará ingovernável, quando sabemos que é justamente o contrário. Alegam que um aventureiro – e Lula; o que é mesmo? – pode tomar a coroa e levar o país ao caos, como se já não estivéssemos tentando sair de dentro dele.

Vamos deixar bem claro uma coisa: a responsabilidade de governar é de quem ganha o pleito, mas a lisura da eleição é compartilhada por seus candidatos. Se o time adversário entrar em campo munido de pistolas automáticas, dá pra desconfiar que alguma coisa está errada com o jogo, certo? A oposição não vê dessa forma. Aliás, a oposição não vê nada que não lhe convém. Este é o ponto. Temos vários governantes dando exemplos administrativos hoje mesmo nessa casta de políticos vigaristas que são sempre os mesmos. Eu não teria o menor receio de passar uma borracha democrática em todo esse Congresso e no Planalto inteiro.


Servidor público é pra servir e não para ser servido, meus caros. A coisa já passou dos limites faz tempo e não vai ser corrigida por esses vagabundos que aí estão. A esquerda quer o monopólio da virtude. Do certo e do errado. Quer nos ensinar sua visão torta de mundo e liberdade. Vão pro inferno. Sem o patrocínio dos “empreiteiros capitalistas” eles não passam de batedores de carteira comuns, desses que seriam enquadrados por um boletim de ocorrência corriqueiro. A militância não suporta engolir isso. Vão se danar. Na próxima eleição inclusive. Vai trabalhar, vagabundo.

Imagem do Dia

Aurora boreal, em Unstad (Noruega)

Tarjaram a suruba

Expungir referência a um político em um processo no meio da avalanche de pedidos de investigação da nova lista do Janot é como tarjar mamilos numa suruba. Está todo mundo vendo tudo, com direito a closes proctológicos, mas há quem ache que se salvará apagando as menções a seu nome em um pedaço de papel. Faltou apagar a memória de todos que já haviam conhecido seu conteúdo.

Cobrir palavras de preto não encobre a história que elas contam. Pior: reforça na opinião pública a ideia de que estão a lhe ocultar a verdade. A atitude não é só do expungido. A tentativa de anistiar o caixa 2 e chamar isso de reforma política revela como capos de todos os partidos encaram a Lava Jato. Como se fosse da conta só de quem frequenta a praça dos Três Poderes.



Que todos eles sejam expungidos de todos os depoimentos, extratos, planilhas e caderninhos de empreiteiros. Que até seus apelidos odebrechtianos sejam censurados. Ainda assim o expungir nunca será completo. Farão desaparecer as citações, mas, aos olhos do público, nunca se tornarão limpos, isentos, livres – que é o segundo significado de “expungir” no dicionário Houaiss.

A insistirem nesse comportamento autocentrado, congressistas, magistrados e governantes se arriscam a transferir a reforma da política para as urnas ou, mais grave, para as ruas. Na melhor das hipóteses, estão alimentando o discurso da antipolítica, aumentando o apelo dos populistas de esquerda e de direita e cultivando uma crise de representação ainda mais profunda.

Os políticos brasileiros parecem se espelhar no que aconteceu na Itália após anos de investigação das conexões mafiosas com a política: os que sobreviveram à Justiça saíram mais fortes. Mas o expurgo também abriu espaço para um empresário autofinanciado criar seu próprio partido e mandar no país por uma década.

É típico do homo sapiens crer que será ele o sobrevivente, por menores que sejam suas chances. Talvez por julgar-se mais sapiens do que o resto da espécie. Basta ver o plano para 2018 dos partidos que monopolizam a eleição presidencial desde 1994.

O PT nem cogitou uma alternativa a Lula. Se o ex-presidente se tornar inelegível pela Justiça, importa pouco sua crescente intenção de voto nas pesquisas. O partido não tem um nome sequer com apelo para substituí-lo. Ainda acredita em poste. Corre risco de rachar e uma parte apoiar Ciro Gomes – que, depois de passear por seis legendas, está no PDT.

Entre os tucanos, as bicadas estão cada vez mais selvagens. Depois do descarte, por problemas de saúde, de José Serra, sobraram dois presidenciáveis que admitem ser pré-candidatos. Apesar da lista do Janot em comum, Aécio Neves e Geraldo Alckmin têm timings diferentes. O governador paulista quer disputar prévias em 2017 e o senador mineiro quer adiar tudo para 2018.

Se o calendário não sair como ele deseja, Alckmin teria uma justificativa e tempo para mudar de partido e tentar se viabilizar como candidato a presidente por outra legenda. Todas essas estratégias tucanas e petistas ignoram o desalento crescente do eleitor com a política e a rejeição aos partidos.

A popularização de Jair Bolsonaro não se deve apenas ao grupo autoritário que achou brecha para sair do armário. Há também entre seus admiradores aqueles que simplesmente se encheram da política como ela é. Em eleições passadas, eleitores com esse perfil votaram em Cacareco e Enéas. É um grupo crescente.

Por isso, mesmo que não queiram hoje, políticos tradicionais podem acabar surfando a onda antipolítica. O grupo de Alckmin já tem seu empresário autofinanciado que é político, mas nega. Falta fundar um partido sem nome de partido. Tipo “Acelera Brasil”.

José Roberto de Toledo

Milagre ou estagnação

De tempos em tempos, o Brasil arranja um encontro com uma incrível combinação de crise política e econômica. Como esta de hoje. Não que o país seja surpreendido. Os problemas a enfrentar exigem urgência, mas, um paradoxo, são velhos de décadas. Simplesmente ficaram por aí, sempre adiados porque, enfim, são difíceis ou incômodos para muita gente.

Caixa 2 eleitoral, por exemplo. Ninguém se surpreendeu quando Emílio Odebrecht disse que sua empresa fazia isso desde os tempos de seu pai.

Mais, ninguém se surpreende quando os políticos de amplo espectro dizem que caixa 2 é uma coisinha de nada, um crimezinho comum. Por que toda essa gritaria? — como, aliás, repetiam os políticos de antigamente.

E parece que, de repente, todo o sistema está enrolado no caixa 2, depois que o STF, o Ministério Público, o juiz Moro, todos observaram o óbvio: é roubo, é dinheiro lavado.

Reagem em Brasília: precisamos de uma anistia.

Agora, que todo mundo já viu a sujeira? Sem chance.

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E a corrupção em obras públicas? Vários escândalos foram apanhados, pouca gente foi punida, e a coisa sempre terminava com conclusões assim: a corrupção é até pequena, quase irrelevante, quando se considera o tamanho das obras feitas. É uma questão moral, não econômica, se dizia, isso significando que estava tudo bem.

Mario Henrique Simonsen já percebia que a coisa era mais complicada. E até ofereceu uma solução pragmática, digamos assim. Muitas vezes, observava, é melhor pagar a propina e não fazer a obra; sai mais barato.

O que é isso, professor? — tal era a reação.

Também faz tempo que todo mundo sabe que o sistema eleitoral é inviável. Que há partidos demais, que as coligações necessárias para governar escancaram as portas do fisiologismo e da corrupção, que as eleições são cada vez mais caras, também criando a oportunidade — ou necessidade, dizem alguns — de arranjar muito dinheiro por fora.

E parece que, de repente, se percebe que, para pagar por fora, as empresas precisam ganhar por fora, colocando um sobrepreço nas obras. Melhor assim, diziam os mais cínicos ou mais realistas, do que economizar no cimento, por exemplo, e fazer estradas e estádios de má qualidade.

E acabamos ficando com as duas coisas: obras de qualidade, supercaras, e obras baratas, logo estragadas.

Finalmente, a economia. Foi ontem que ouvimos falar do déficit da Previdência? Ou que o sistema tributário brasileiro é o pior do mundo? Ou que a legislação trabalhista só protege o emprego de quem está muito bem empregado, sendo um obstáculo à abertura de novas vagas?

Assim chegamos aos dias de hoje, outra incrível combinação de dificuldades. Há uma tarefa gigantesca pela frente:

— reformar o sistema eleitoral às pressas, num momento em que as lideranças políticas foram flagradas fazendo a coisa errada, de um “simples” caixa 2 a gordas contas no exterior. (Notem o impasse: está vetado o financiamento eleitoral por empresas, e não há dinheiro público suficiente para pagar as campanhas nacionais de 2018);

— reformar ao mesmo tempo a Previdência, a legislação do trabalho, o sistema tributário e as regras para obras públicas;

— e levar a cabo o combate à corrupção, o que somente será possível com a punição de toda a tropa apanhada.

Aqui, aliás, há um outro velho problema que parece surpreender: a Justiça é lenta, especialmente o STF. Na verdade, a dificuldade aqui é maior, dado o que se ouve de ministros da Corte: é assim mesmo, o STF não está preparado para ações penais, paciência.

Mas a população já perdeu a paciência. Talvez ainda não com o STF, mas vai perder se os ministros não arranjarem um meio de acelerar os trabalhos referentes à Lava-Jato. Especialmente porque a publicidade dos processos e das delações torna imediato o julgamento popular e político.

Imaginemos agora que a descrição acima se referisse a um outro país qualquer e que nós, brasileiros, ficássemos sabendo da história hoje. “Esses caras estão ferrados”, é o que diríamos. É o que muita gente diz lá fora.

Mas já houve momentos em que o Brasil se meteu na mesma combinação de problemas e — milagre! — conseguiu sair. Nem faz tanto tempo assim.

Na era FHC, contando do tempo em que ele era ministro da Fazenda, o país matou a hiperinflação (que era um problema de quase três décadas); saiu da recessão; fez um enorme ajuste nas contas públicas, inclusive com uma reforma da Previdência; privatizou um monte de bancos, empresas e serviços; fez uma quase reforma tributária, conseguiu uma estabilidade político-eleitoral, que permitiu a ele, FHC, ser, em 42 anos, o primeiro presidente eleito pelo voto popular a passar a faixa para outro presidente eleito.

Há esperanças, portanto.

Mas foram anos de estagnação antes daquelas mudanças. É a alternativa que temos hoje: ou se fazem todas essas reformas ou serão anos de paradeira econômica e social até o milagre.

Carlos Alberto Sardenberg

Recessão faz quase um milhão voltarem ao Bolsa Família

Há meses desempregada, Cristiane Silva, de 38 anos, se viu obrigada, no fim do ano passado, a pedir o reingresso no programa Bolsa Família. Após conseguir um emprego de operadora de telemarketing em 2015, ela parou de atualizar o seu cadastro no programa, mas menos de um ano depois foi demitida. Em seguida, o ex-marido que ajudava a pagar as despesas da filha Tainá, de 4 anos, também entrou na lista de cortes de uma empresa em que trabalhava como motorista. "Não dá para viver só com os cento e poucos reais que recebo do benefício, mas, pelo menos, o dinheiro ajuda a comprar um remédio ou um sapatinho para a Tainá", conta Cristiane.

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As duas moram atualmente em um casa de dois cômodos emprestada pelo patrão do irmão de Cristiane, no bairro da Lapa, na região Oeste de São Paulo. Elas terão, no entanto, que deixar o imóvel em breve. Enquanto vai vivendo de favores e ajuda de amigos, Cristiane corre contra o tempo para achar um trabalho que lhe permita novamente ter uma independência financeira. "Todos dia saio a pé distribuindo currículos enquanto a Tainá está na escola. Mas parece que a crise no Brasil está cada dia pior, não tem oferta de emprego e tudo está caríssimo", diz Cristiane na sala de espera do Centro de Referência de Assistência Social (Cras) do bairro. Ela tenta no local averiguar a possibilidade de receber outro benefício: uma cesta básica.

Cristiane, que nasceu em Teresina, no Piauí, mas veio ainda pequena viver em São Paulo, foi a primeira da família a cursar uma universidade. Há sete anos, depois de conseguir uma bolsa parcial em uma faculdade privada, concluiu o curso de Ciência da Computação. "Na época não foi difícil conseguir um emprego na área. Pagavam bem, e o Brasil vivia um ótimo momento em 2010. Lá no Nordeste, vi muita gente melhorar de vida. Muitas pessoas começaram a ter acesso a eletrodoméstico, carros e mais estudo. Nunca pensei que pioraria tudo outra vez", desabafa preocupada com o alto desemprego no país, que já soma mais de 12 milhões de pessoas sem trabalho.

O retrocesso testemunhado por Cristiane é cada vez mais comum entre os brasileiros. Em meio à maior recessão econômica das últimas décadas, quase um milhão de famílias tiveram que recorrer novamente ao benefício do Bolsa Família nos últimos dois anos. Segundo o Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário, devido ao agravamento da crise, houve um salto de pedidos de reinclusão em 2015: 423.668 famílias que foram beneficiárias do Bolsa Família entre 2003 e 2011 retornaram ao programa. Em 2016, ano em que a economia brasileira encolheu 3,6%, o número foi ainda maior, 519.568 retornos. Somando os dois anos foram 943.236 famílias que voltaram a receber o benefício. Nos anos anteriores ao início da crise, os números de retornos eram bem menores. Em 2014, por exemplo, foram 186.761 reinclusões. Atualmente, 13,6 milhões de famílias são beneficiadas pelo programa e o valor médio do benefício no último mês de fevereiro foi de 179,62 reais

"Não há a menor dúvida que esse número reflete a crise econômica em geral e a dificuldade de achar emprego. A taxa de desemprego mais que dobrou entre 2013 e 2016, passou de 6% para 12%. Essa situação induz as pessoas a voltarem ao benefício", explica o economista João Saboia, professor da UFRJ.

O Banco Mundial alerta, entretanto, que a crise econômica pode levar a um número ainda maior de brasileiros para abaixo da linha de pobreza até o fim do ano. Segundo um estudo da instituição publicado recentemente, o número de pessoas vivendo na pobreza no país aumentará entre 2,5 milhões e 3,6 milhões. Ainda conforme o Banco Mundial, a maior parte dos "novos pobres" virá de áreas urbanas. O estudo considerou abaixo da linha da pobreza as pessoas que vivem com menos de 140 reais ao mês. Nessa categoria, há ainda a extrema pobreza, que contempla os brasileiros que vivem com menos de 70 reais. Nesta última classificação, o Brasil passaria de 6,8 milhões em 2015 para 8,5 milhões em 2017. No leitura geral, a expectativa é que 11,8 milhões de pessoas desçam um ou mais degraus na escala da pobreza, fruto da atual recessão.

Gente fora do mapa

Dilma, um caso sério

Não satisfeita com o desastre causado ao País pelos seus cinco anos de governo – cujos efeitos daninhos são ainda sentidos diariamente pelos brasileiros –, a ex-presidente Dilma Rousseff dedica-se agora, assim fazem crer suas ações e palavras, a envergonhar o Brasil mundo afora. Seu comportamento em Genebra, onde participou de palestras e seminários, é sinal de que sua falta de discernimento, seja em questões nacionais, seja em relação às suas capacidades pessoais, não tem fim.

É conhecida sua dificuldade para se expressar na língua portuguesa. Como bem sabem os brasileiros, a beligerância de Dilma Rousseff com o idioma pátrio não exige condições especiais, podendo ocorrer até mesmo em casos de comentários triviais ou argumentos despidos de qualquer complexidade. Ela facilmente se embaralha com palavras e pensamentos, o que muitas vezes deu a eventos oficiais no Palácio do Planalto contornos de show humorístico.

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Pois bem, essa mesma Dilma Rousseff, que já tanto maltrata a língua portuguesa, achou que podia, em sua viagem à Europa, dialogar em francês. O programa de televisão no qual a ex-presidente teve a ousadia de usar a língua de Victor Hugo é de incomum constrangimento, com alguns apresentadores em sérias dificuldades para manterem a compostura diante de tamanha agressão ao idioma francês. Mais do que simples gafe, a participação de Dilma no programa de televisão corrobora sua invencível incapacidade de realizar qualquer tipo de autocrítica.

Não falta, porém, a Dilma Rousseff discernimento apenas em questões de idioma. Ela ignora – e alardeia sua ignorância mundo afora – questões institucionais. Diante de uma plateia no Instituto de Altos Estudos Internacionais de Genebra, a ex-presidente afirmou haver o risco de que os ocupantes do poder no Brasil tentem impedir nova eleição de Lula da Silva. “Podem tentar condenar o Lula por duas vezes, podem mudar as regras da eleição presidencial, por exemplo, com introdução do parlamentarismo e, terceiro, podem simplesmente adiar a eleição presidencial do ano que vem”, disse Dilma.

É grave que uma ex-presidente fale de forma tão irresponsável sobre a democracia e as instituições no Brasil. Eventuais discordâncias de Dilma Rousseff com a decisão do Congresso de condená-la por crime de responsabilidade não lhe dão direito a tratar o País da forma vil como ela o tem tratado.

Ainda que imperfeita, a Lei da Ficha Limpa contribuiu para a moralidade das eleições no País, ao barrar candidatos que tenham sido condenados criminalmente em segunda instância. E o Poder Judiciário é independente, não mero instrumento de manobra do Poder Executivo, como dão a entender as palavras da ex-presidente. O que ela indevidamente aplica ao Brasil ocorre em países de seu especial agrado, como é o caso da Venezuela. No entanto, a respeito desse abuso Dilma sempre preferiu o silêncio.

Dilma ainda tratou de duas possíveis manobras para afastar Lula da Silva da Presidência da República: o parlamentarismo e o adiamento das eleições de 2018. A ex-presidente manifesta, assim, seu completo desconhecimento da realidade política e institucional do País. Ainda que seja plenamente legítimo, o parlamentarismo não é um assunto atual do Congresso. E a menção a suposto risco de adiamento das eleições é mais do que simples irresponsabilidade. Trata-se de uma acusação grave, sem qualquer prova ou indício, contra a democracia brasileira. Observe-se, a favor de Dilma, que ela não aventou a possibilidade da restauração da monarquia para manter Lula fora do poder.

Por mais que Dilma Rousseff não goste, há lei e há instituições no Brasil. O panorama é bem diferente do que ela alardeou na Suíça. Já em relação ao retorno de Lula da Silva à Presidência da República, os obstáculos estão bem evidentes, dispensando os tremendos esforços mentais de Dilma Rousseff. O principal óbice é ela mesma, pelo estrago que causou ao País. E, em segundo lugar, o próprio Lula, com sua incapacidade de emendar-se.

Palhaçada tem fim

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Um povo já não acredita nas promessas dos governantes, porque perdeu a vontade fanática que o levava a acreditar e a tecer razões para isso
Agustina Bessa-Luís

Os caçadores derrotarão o lobo mau

Chapeuzinho Vermelho entrou toda faceira no quarto da Vovozinha, levando na cesta café com leite, queijo e uma maçã. A velha tirou a cabeça dos lençóis e espantou a netinha. “Vovó, para que esses olhos tão grandes?” “Para melhor te ver, minha querida”. “E essas mãos tão compridas?” “Para melhor de abraçar, meu bem”. “E essa boca com dentes tão feios?” “Para melhor te comer, meu petisco!” A história para crianças não termina assim, porque logo vieram os caçadores, mataram o lobo e retiraram a Chapeuzinho e a avó de sua barriga, ficando todos felizes.

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A historinha se conta a propósito da chegada dos líderes dos partidos ao gabinete do chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, ontem. Tinham sido convocados para cuidar da reforma da Previdência Social. Espantaram-se quando ouviram dele apavorantes ameaças no caso de o projeto do governo não ser aprovado. Perderiam as benesses e vantagens, não teriam apoio nenhum e seriam derrotados nas eleições do ano que vem. Cederam, dispostos a aceitar a proposta, antes de ser deglutidos, quando um deles exclamou: “Vamos chamar os caçadores!”

Parece evidente a reação da base parlamentar oficial à proposta que penaliza os assalariados e retira dos menos privilegiados os derradeiros direitos ainda vigentes. Pior fica a situação quando se acrescenta a reforma trabalhista.

O governo insiste e aterroriza o Congresso, diante do horror das mudanças apresentadas sob a promessa de recuperação da economia nacional. Ninguém escapará, nas eleições do ano que vem. Muito menos o empresariado, iludido com as promessas de ser favorecido com o sacrifício das massas. Elas são os caçadores, ávidos de arcabuzar quantos, como Eliseu Padilha, imaginam sobreviver à anacrônica iniciativa das prerrogativas do Lobo.

Você paga o circo, mas não escolhe o palhaço

Acomodada pelos colaboradores da Odebrecht no mármore quente do inferno, a elite política do país se uniu em torno de um plano para criar uma porta de saída para o céu. Protegidos pelo foro privilegiado, os congressistas cuidam dos minutos porque sabem que as horas no Supremo Tribunal Federal passam mais lentamente. Os encrencados correm para aprovar até setembro uma reforma eleitoral para ser aplicada já nas eleições de 2018. Assim, a bancada dinheirista poderá se reeleger antes de ser julgada, mantendo o escudo do foro privilegiado do Supremo.


Trama-se uma reforma baseada no princípio de que nenhuma ilegalidade justifica a incivilidade de um castigo, muito menos a desonestidade com fins eleitorais. Não é porque as delações da Lava Jato transformaram um modelo bem-sucedido de rapinagem em escândalo que os rapinadores ficarão de braços cruzados. A autodepuração é suspeita e cheira mal.

Se tudo correr como planejado pelos reformadores, a reforma incluirá uma anistia do caixa dois (pode me chamar de perdão retroativo da propina). Incluirá também a criação de um fundo eleitoral para pagar com verbas públicas as campanhas políticas. Esse fundo virá acompanhado da instituição do voto em lista fechada. Nesse modelo, o eleitor vota no partido, não no candidato. Elegem-se os políticos acomodados numa lista pelos caciques de cada legenda.

Para resumir: você vai bancar a bilheteria do circo e não terá nem o direito de escolher o palhaço da sua preferência.

Paisagem brasileira

João Machado
João Machado

A propósito do caixa 2: 'Em terra de murici, cada um cuida de si'

A luta que insiste em separar o caixa 2 de propina me lembrou provérbio nordestino que parece ter-se transformado, há muitos e muitos anos, em lei maior em nosso país. Essa lei prosperou a partir da redemocratização, no governo Collor, passou por Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso e, finalmente, conquistou maior relevo nos governos petistas. Na verdade, porém, essa “tendência” em querer demonizar uma classe, que já fez muito mal ao povo brasileiro, não deixa de ser um tremendo escape, usado por outras classes (ou por todas elas?) que fizeram e fazem caixa 2 como saída para fugir do Fisco.

Alguns chegam até a afirmar que, sem essa prática – que “é modelo reinante no país”, segundo o patriarca da família Odebrecht, Emílio, ou que é, segundo o ex-ministro José Eduardo Cardozo, “recorrente no país” –, nenhuma empresa, de pequeno, médio ou grande porte, sobreviveria por muito tempo. Dizem que o caixa 2 chega a ser “atitude patriótica”: no fundo, defende, com unhas e dentes, o emprego...

Mas deixemos isso pra lá (as mazelas de nosso povo e, em consequência, de nossos políticos, eleitos por nós, leitor, são de fato incomensuráveis e inumeráveis!) e encaremos o muricizeiro – uma espécie rústica que se desenvolve, com facilidade, em solos arenosos. Seu fruto, o murici, é típico do sertão nordestino. Permanece sempre florido e bonito em época de seca braba. E, quanto mais florido fica o muricizeiro, segundo a lenda, mais difícil fica a vida do sertanejo.

O provérbio, que está no título destas linhas, data de 1896, quando o arraial de Canudos, no sertão baiano, sofreu invasão das tropas comandadas pelo general Moreira César. Mortalmente atingido pelos “rebeldes”, o general deveria ser substituído pelo coronel Pedro Nunes Tamarindo. Apavorado, o coronel arrepiou caminho e abandonou a luta dizendo que, “em terra de murici, cada um cuida de si”.

Não há duvida de que o “crime de caixa 2” tem nuances que precisariam ser definidas, mas que, até prova em contrário, não podem sê-lo por meio de “autoanistia”. Essa figura, disse-o o ex-presidente do STF Carlos Ayres Britto, simplesmente não existe: “A Constituição não concebeu o instituto da anistia em matéria eleitoral. O instituto da anistia não foi concebido com o intuito de autoperdão. O Estado não pode perdoar a si mesmo, é inconcebível, um disparate, um contrassenso. É a negação do Estado de direito. Não existe”.

Por outro lado, talvez por estar de olho no que são, na realidade, desde remotas eras, as eleições no Brasil, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), disse que a ameaça à estabilidade política do país pode pesar na decisão do julgamento da chapa formada por Dilma Rousseff e Michel Temer. Sobre o caixa 2, Gilmar considera que ele tem que ser desmistificado também: “Necessariamente, ele não significa um quadro de abuso de poder econômico. Temos a doação plenamente legal. Tem essa chamada ‘doação legal’ entre aspas, (oriunda de) propina. Temos a doação irregular, informal, caixa 2, que não teria outros vícios. E podemos ter também essa doação irregular, informal, (oriunda de) propina, portanto com o objetivo de corrupção”.

Talvez seja hora de se lembrar do provérbio do coronel Tamarindo, mas com um objetivo nada desonroso. Cada acusado, que sabe o que fez, cuide de si e se defenda no processo mostrando a verdade. Não seria nos autos, enfim, que se poderia fazer a distinção?

A velhice em agonia


Pago a pensão com a pensão que o Estado me paga pelo meu estado.
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Não chega a ser bem um poema, mas a vida não é nenhum poema
Campos de Carvalho, Vaca do nariz sutil

Gilmar Mendes preserva Temer e assume autoria das teses para abafar a Lava Jato

O objetivo verdadeiro é mitigar os efeitos da Lava Jato e preservar os mandatos de parlamentares e governantes, assim como proteger os interesses das grandes empresas que se dedicam a distribuir dinheiro vivo e fazer depósitos em contas no exterior para agradar a elite da classe política brasileira, digamos assim.

Na tentativa de dar uma aparência de normalidade à manobra contra a Lava Jato, o ministro Gilmar Mendes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, acaba de assumir a autoria das “sugestões” de reformas políticas e eleitorais, a título de colaboração ao amigo-presidente, que por coincidência é réu num rumoroso processo que tramita justamente no TSE, vejam a que ponto de promiscuidade institucional se chegou.


Temer convidou Gilmar Mendes, Eunício Oliveira, presidente do Senado, e Rodrigo Maia, presidente da Câmara, para discutir no Planalto a reforma político-eleitoral. Depois da audiência, que durou uma hora, o ministro do Supremo e do TSE tentou dissimular que exista uma armação para abafar a Lava Jato. Deu entrevista e alegou à imprensa que há algum tempo existe na Justiça Eleitoral a preocupação com o mau desenvolvimento do sistema político-eleitoral e por isso tem sido discutida a necessidade de reformas.

Segundo a Assessoria de Imprensa do Planalto, Mendes “relatou que se reuniu recentemente com o Conselho de Notáveis do TSE e recebeu a recomendação de que essa preocupação fosse levada aos chefes dos poderes para colocar a necessidade de que fizéssemos um esforço no sentido de um reforma do sistema eleitoral que envolvesse necessariamente o financiamento de campanhas”.

Como diria Lula nos velhos tempos, é “menas” verdade, porque Gilmar Mendes não recebeu nenhuma “recomendação” nesse sentido do “Conselho de Notáveis”. Aliás, a denominação correta é Conselho de Pesquisas e Estudos Eleitorais, formado no TSE em junho de 2016 “para formular propostas visando o aperfeiçoamento da fiscalização e do controle das atividades eleitorais no pleito deste ano, que escolherá os representantes municipais”.

Como não pode ter sua palavra colocada em dúvida, o presidente do TSE está agora no obrigação de vir a público e informar quando o Conselho se reuniu e lhe deu recomendação para apresentar propostas destinadas a modificar drasticamente as regras políticas. Qual foi a data da reunião? Quais os conselheiros presentes? Qual foi exatamente a recomendação?

São três perguntas simples, singelas e prosaicas. No entanto, Gilmar Mendes jamais conseguira responder a esses questionamentos, que são do interesse do cidadão brasileiro que paga o salário dele como ministro do Supremo e do TSE.
O Conselho tem (ou tinha) 13 integrantes, todos verdadeiramente notáveis, brasileiros ilustres – Everardo Maciel, Maria Tereza Sadek, Jairo Nicolau, Antonino Trevisan, José Antonio Lavareda, Vladimir Passos de Freitas, Osvaldo Imamura, Mamede Lima Marques, Bolívar Lamounier, Orjan Olsen, Eliseu Martins, Luiz Felipe D’avila e Athayde Fontoura Filho.

Mas nenhum deles vai confirmar que o Conselho fez tal “recomendação” a Gilmar Mendes, tampouco dirá que o ministro está autorizado a usar o nome do Conselho numa iniciativa desse porte, que pode macular as brilhantes biografias de seus integrantes.

É inaceitável, inqualificável e intolerável o comportamento de Gilmar Mendes. Se precisa tanto ajudar Temer, seu amigo há 30 anos, deveria agir discretamente, sem envolver a presidência do TSE numa tenebrosa transação que representa um atentado à frágil democracia brasileira.

O detalhe mais intrigante é que o ministro do Supremo tem atuando na operação Abafa com invulgar dedicação. Há meses ele vem defendendo teses esdrúxulas e inconvenientes. Algumas delas são flagrantemente inconstitucionais, como a desqualificação de caixa 2 como crime, a separação da chapa eleitoral em processo de cassação e a anistia ao caixa 2.

Ao menosprezar as leis em vigor e tentar demolir a jurisprudência específica que ajudou a formar, o ministro Gilmar Mendes não parece perceber que está desmoralizando o Judiciário e causando constrangimento a todos os ministros do Supremo e do TSE que não estão ligados a personagens envolvidos com a corrupção. Deve haver alguma explicação para o seu estranho comportamento.

Carlos Newton

Criminalidade campeia do Oiapoque ao Chuí

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O Brasil está se desvendando como um país da criminalidade ampla, geral e irrestrita. Os últimos acontecimentos das rebeliões em presídios do Norte e Nordeste, com indícios da promiscuidade entre organizações criminosas e governos, a Lava Jato denunciando a quadrilhagem política e a lista do Janot fazem crer que há mais intimidade entre governos e crime do que poderiam imaginar as teorias de conspiração.

A convergência de interesses em dinheiro (de milhões a bilhões) e no poder parece que irmanou de vez, nos últimos anos, instituições do Estado, empresas e a marginalidade em desfavor da população.

A confissão da Odebrecht de que investiu na ilegalidade, com "pedágio" mensal às Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) durante os últimos vinte anos para atuar nos territórios dominados por elas, abalaria qualquer Estado. Se uma empresa admite financiar com mensalidades, obtidas através de rapinagem aos cofres públicos com o superfaturamento, uma organização particularmente ligada ao tráfico de drogas, o Estado é um cancro só. Mas diante da aberração criminosa com o país, a notícia tomou chá de sumiço. Foi engolida pelo dragão da política, se é que se possa chamar assim tais facções.

O absurdo tolerado como mero acerto monetário ou um caixa 2 disparou como raio no noticiário. Clareou as relações espúrias que governam o país de Brasília ao último município. 

Os negócios criminosos passaram a fazer parte da sociedade e põem em risco uma nação de gente que só quer viver segundo as regras dos direitos humanos, dos quais as organizações criminosas não participem em conluio com as instituições. Não é mais uma luta política como querem os adeptos do deixa estar que vai melhorar, o que só beneficia bandidagem. O país se depara com a necessidade de mudar a política e enterrar de vez o interesse privado em detrimento do bem-estar público.
Luiz Gadelha