quarta-feira, 9 de agosto de 2017

Por enquanto, promessas de reformas são subterfúgio

Das perspectivas de suspensão do mandato de Michel Temer já se fala pouco: a vitória na Câmara não foi avassaladora, mas foi suficiente — o que se tem para o momento. A bola, então, voltou para o Procurador-Geral da República. E Rodrigo Janot, à parte das entrevistas a que tem se exposto, parece não ter clareza dos próximos passos. Para o enxadrista, o vacilo é mortal; pousar o dedo por sobre o peão é um sinal eloquente da hesitação. Temer por sua vez, tenta aproveitar o momento que, se não é bom, é melhor do que ele mesmo poderia esperar.

Desnecessário repetir os métodos utilizados para garantir o mandato; são conhecidos. E mais: convencionais. É isso aí… O fato é que Temer ganhou tempo e busca, agora, ganhar movimento: bate o bumbo para convencer que comanda um governo robustecido. Não é para tanto: a vitória sobre Janot não é suficiente para aprovar reformas. Mas, sob a estratégia política possível, faz o que pode fazer e, do seu ponto de vista, o que deve ser feito. Mais do que promessa, as reformas ainda são subterfúgio.


Faz sentido que se garanta apto a fazer reformas; que seus aliados repitam a mesma nota musical. É uma tentativa de virar a página. Ademais, a necessidade é real e inegável o fato de que o país precise mesmo de ajustes fiscais antes que tudo resulte ainda mais dramático do que está. Ainda que seja artifício, as premissas são verdadeiras e ressoam aos ouvidos de agentes econômicos e de mercado. Assim como ecoa entre os que compreendem os limites dos recursos públicos e a transformação demográfica do Brasil.

Ao mesmo tempo, na estratégia governista, é imperativo pautar a mídia para o processo reformista, afastando-a da agenda anticorrupção, amenizando os humores da opinião pública; reduzindo o poder e a influência da Operação Lava Jato. Assim como o cão que lambe as virilhas, Michel Temer faz isto tudo porque pode: a oposição não o apoquenta para além de limites seguros — talvez, negociados — e as ruas acomodaram-se ou perderam a esperança.

Enfim, o processo normal da política diante das circunstâncias que se apresentam. Não dá para sonhar com muita coisa, no curto prazo pelo menos. A questão, agora, consiste em saber se o governo realmente entregará as reformas que promete; se o discurso é factível.

Em se tratando do Brasil, é arriscado cravar qualquer resposta taxativa, ''sim'' ou ''não''; o processo é mesmo dialético: ''sim'' E ''não''; tudo ao mesmo tempo. Contudo, o raciocínio de que os 263 votos pró Temer, no confronto com Janot, possam ser somados aos reformistas do PSDB e de outros partidos — que votaram pelo afastamento — é de um simplismo enganador. Entre os 263, há deputados pouco aderentes às reformas. Paulinho da Força é apenas um exemplo, existem outros.

Em primeiro lugar porque os instrumentos utilizados para o convencimento de uma parte da base, vinculada sobretudo ao Centrão, são escassos: os recursos de um Estado em crise são finitos, a voracidade fisiológica não. Depois, a proximidade das eleições torna deputados e senadores mais sensíveis aos humores da opinião pública refratária a reformas ainda mal comunicadas à sociedade.

Nesse sentido, não parece politicamente razoável exigir de parlamentares que se disputarão a reeleição que se submetam a uma sequência de desgastes crescentes: a) os já conhecidos escândalos da Lava Jato; b) a votação da primeira denúncia de Janot e, talvez, de mais duas; c) a inevitável aprovação do FFD (Fundo de Financiamento da Democracia), feito para destinar algo em torno de R$ 4 bilhões, do dinheiro do contribuinte, para custear a eleição de suas excelências, que não andam lá muito em alta com a população.

Tudo isto trouxe, traz e trará constrangimentos e perda de votos. Se a agenda reformista pode ser positiva para o Planalto, ela tende a não ser bem isso para o Legislativo, sobretudo, na dinâmica política destes tempos. O presidente não navega na popularidade — muito pelo contrário — e a guerra de comunicação pelas reformas ainda tem sido favorável a grupos de interesses, localizados no alto do corporativismo e patrimonialismo nacionais.

O que poderia alterar essa dinâmica seria o crescimento econômico significativo e a rápida sensação de bem-estar, o que parece pouco plausível, nos próximos meses.

Ainda assim, nessa disputa, alguma reforma pode ser possível; algo simbólico, que sirva como a vitória para o governo e que não implique em desgaste irreparável para a base. Mudanças que Temer possa demonstrar para o mercado e a manutenção de aspectos que o Congresso possa vender para a sociedade como resultado de sua resistência: a idade mínima para as novas gerações, por exemplo.

Provavelmente, algo em torno disto. O resto ficaria para os próximos governos e para as próximas legislaturas. Mesmo que não suficiente, o possível para o momento.

Enfim, o governo faz o que pode para sair do buraco; bate o bumbo, diz que está forte e, que, ao final, triunfará. Grupos e interesses vários se organizam em sentido contrário, abominando as reformas. Descrente da política, demonstram as pesquisas, a sociedade desconfiada é contra tudo e todos. Nas elites, uns apostam, outros torcem. O mais razoável, porém, é juntar fragmentos; ponderar desejos, intenções e possibilidades. Acompanhar com algum distanciamento, separando ilusões de realidades.

Carlos Melo 

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