domingo, 14 de maio de 2017

Lava Jato levará à Renascença ou à Idade Média

Quando Lula explica para Sergio Moro que os nomes indicados pelos partidos para ocupar diretorias da Petrobras tramitaram “normalmente” no governo, quando Michel Temer diz em entrevistas que considera “adequado” manter em sua equipe oito ministros investigados na Lava Jato, quando o tucanato trata com naturalidade a permanência de um Aécio Neves crivado de inquéritos na presidência do PSDB… Quando tudo isso acontece sem que nada aconteça, o Brasil é invadido pela luz de uma revelação. É normal! Sempre foi assim. É natural! Espanta que queiram questionar o que nunca foi considerado inadequado.

Uma pequena palavra petrificou-se como lema do homem público brasileiro: Realpolitik. Trata-se do nome de fantasia da hipocrisia que domina a política nacional desde a primeira missa. Os chatos que infestam o cenário —procuradores, magistrados e certos repórteres— querem subverter práticas seculares sem levar em conta a solidez das tradições que Lula, Temer e o tucanato evocam quando proclamam: “É normal, é adequado, é natural!” Não é despudor, mas solidez. Não é cinismo, mas pragmatismo.

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Se as delações da Lava Jato revelam alguma coisa além de crimes, é que o oportunismo cínico alavancou muitas carreiras políticas no Brasil. Mas o trágico, o essencial mesmo na lição das mazelas expostas pela investigação é que tudo foi feito com a melhor das intenções. A safadeza encontra sempre uma justificativa absolvedora. Lula não tem culpa se os técnicos apadrinhados pelos partidos viraram larápios do dia para a noite. Temer não pode afastar ministros que ainda nem viraram réus. O tucanato tampouco pode destronar um dirigente que ainda usufrui do sacrossanto benefício da dúvida.

O sistema político brasileiro não protelou os seus crimes. Apenas se esforça para protelar as suas culpas. Não há inocentes no palco, só culpados e cúmplices. Alheios à estética imunda da conquista, os desbravadores das fronteiras morais prometem presentear o país no final com um futuro radiante. Ah, nada como o passado para fazer o brasileiro desacreditar do futuro. Ele sempre parece estar ali na esquina, mas acaba tropeçando. E nunca chega. Escândalos que explodem em ritmo epidêmico ajudam a explicar o por quê de o Brasil ter virado o mais antigo país do futuro de todo o mundo.

A Lava Jato pode conduzir o Brasil à Renascença ou à Idade Média. Não há por que temer o futuro. Ele nunca roubou ninguém. Terrível mesmo é o passado ou, pior, o presente. Ou o Brasil aproveita a oportunidade para adotar o regime de tolerância zero com a corrupção ou as futuras gerações recordarão, com nostálgica melancolia e um certo fascínio antropológico, das palavras pronuncidas na época do encontro do sistema político nacional com os seus limites, o sangrento rompimento desses limites e a sobrevivência dos velhos valores depois do rompimento: “É normal, é natural, é adequado!”

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