terça-feira, 16 de maio de 2017

Da cadeira no Supremo

Tinha 48 anos, era professor de direito e advogava no Rio, quando foi convidado a escrever uma proposta de reforma política e eleitoral. Uma dúzia de anos depois, agora juiz do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso observa a mesma discussão e o velho impasse: “Me faz lembrar da história do Drummond num sebo. Ele encontrou um de seus livros com dedicatória para um amigo, que ainda estava vivo. Incomodado, comprou o livro e mandou para o amigo, de novo. Mas desta vez escreveu: ‘Para Fulano de Tal, insistentemente’. Sinto-me insistentemente tentando repensar o sistema político brasileiro.”

Barroso chegou ao Supremo na etapa final do processo do mensalão e, agora, assiste à descoberta progressiva de “uma situação de corrupção institucionalizada”. Pura corrupção, sem viés partidário ou de ideológico: “Não existe corrupção de direita ou de esquerda. E ninguém pode ter corrupto de estimação”.

Nesse meio ambiente proliferaram coisas esdrúxulas como a da festa em Angra dos Reis (RJ) na eleição presidencial de 2010, a pretexto de “lançamento” de uma plataforma marítima (P-57). Inacabada, ela compôs o cenário do discurso de Lula e, em seguida, foi rebocada de volta ao estaleiro. A Petrobras pagou uma fatura extra pela pré-montagem do equipamento para o comício do presidente: US$ 25 milhões (R$ 75 milhões hoje) — propina incluída.

Incomoda-se com expectativas de redenção pelo Direito Penal. “Não se refunda um país assim, mas é verdade que com a ineficácia no Direito Penal criou-se um país de ricos delinquentes, em que a corrupção se tornou meio de vida para muitos e modo de fazer negócios para outros. Não é fácil desfazer esse pacto espúrio, como se pode ver. Essas pessoas têm parceiros, até onde seria menos de se esperar.”

Entre os fundamentos da impunidade, acha, está o sistema político: “Precisamos refazê-lo para baratear o custo das eleições, aumentar a legitimidade da representação política e facilitar a governabilidade pela formação de maiorias.”
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A dificuldade para mudanças está no Congresso, mas parte dos danos, reconhece, teve origem no Supremo. Exemplifica com decisões que, acha, deveriam constar de qualquer antologia das barbaridades jurídicas brasileiras: o veto do STF à cláusula de barreira de partidos sem representação no Congresso, que avalia ter o mesmo quilate da manutenção do monopólio estatal dos Correios na era da internet.

O futuro não lhe parece inviável. “Estamos numa agenda construtiva. Vencemos a ditadura, a inflação e a pobreza extrema, portanto, a corrupção também não é invencível. Só não podemos desperdiçar a chance".

Além da corrupção, há uma agenda de temas sociais relevantes. Recentemente, foi apresentado assim numa palestra: “Está aqui o ministro Barroso, que, como advogado, defendeu as uniões homoafetivas e no Supremo votou pela descriminalização da maconha. Ministro, agora contamos com o senhor para a defesa das uniões poliafetivas.”

Ele retrucou: “Olha, vou pensar. Na vida democrática nenhum tema é tabu, mas eu já sou convidado para a Marcha da Maconha, já sou convidado para a Parada Gay... Preocupa-me o tipo de evento para que vocês vão me convidar se eu apoiar as uniões poliafetivas.” No último fim de semana, Barroso expôs suas ideias num fórum em Londres. Elas estão na rede.

José Casado

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