terça-feira, 14 de março de 2017

Esforço de Gilmar para evitar a cassação de Temer desmoraliza Justiça

Em meio à esculhambação institucional que caracteriza o Brasil nesta fase sinistra e sombria, ganha destaque o empenho do ministro Gilmar Mendes para evitar a cassação do mandato do presidente Michel Temer por crime eleitoral, cometido na campanha de 2014 pela chapa PT/PMDB, encabelada pela então presidente Dilma. Na condição de integrante do Supremo e presidente do Tribunal Superior Eleitoral Rousseff, o ministro se esforça ao máximo para inocentar Temer, assumindo uma postura antiética, ilegal e deplorável. Ao mesmo tempo, tem defendido teses sob medida para abafar a Lava Jato.
Recentemente, Gilmar Mendes acompanhou Temer numa viagem à Lisboa, a repercussão foi péssima e ele se desculpou dando uma entrevista a O Globo, na qual alegou ser amigo de Temer há mais de 30 anos, revelação que depõe contra ele, que passa a estar obrigado a se considerar suspeito para julgá-lo, conforme determina expressamente o Código de Processo Penal.

Mas a lei não será cumprida, porque o digníssimo ministro jamais irá se declarar impedido, vejam a que ponto chegamos, com juiz e réu viajando e comemorando juntos.

É deprimente constatar essa decadência do Judiciário, com um ministro do Supremo e do TSE a dar declarações como se fosse advogado de um réu que irá a julgamento justamente nos dois tribunais em que o magistrado atua.


Em busca de abrir brechas à defesa do velho amigo, Gilmar Mendes não mede esforços e demonstra alta criatividade jurídica. A primeira iniciativa do presidente do TSE foi inventar a tese de que pode haver separação de réus, com base em um suposto precedente envolvendo a chapa encabeçada pelo governador Ottomar Pinto, de Roraima, mas na verdade essa separação jamais existiu nos autos. Pelo contrário, no TSE existe jurisprudência totalmente contrária. firmada em três outros casos de cassação de governadores – Jackson Lago, do Maranhão, Cássio Cunha Lima, da Paraíba, e Marcelo Miranda, do Tocantins.

Nesses três julgamentos, não houve separação de chapa e os vices foram cassados. Da mesma forma, no processo contra Ottomar Pinto (que morreu antes da decisão final), também não houve separação e o vice só ficou no governo porque a chapa foi considerada inocente por falta de provas.

Ainda não satisfeito, na semana passada Gilmar Mendes voltou a sair em defesa de Temer e criou a estranha tese de que as doações não declaradas, o chamado caixa 2 de campanha, não constituem crime, porque não passam de ilícitos fiscais e eleitorais.

A teoria imediatamente ganhou entusiásticos adeptos, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (que em seu governo nomeou Mendes para o Supremo), o senador Aécio Neves (PSDB-MG) e toda a gigantesca bancada da corrupção, que é amplamente majoritária no Congresso.

Mas há controvérsias, como diria o grande ator Francisco Milani. O ministro Luís Roberto Barroso, por exemplo, fez questão de declarar à Folha que “caixa dois e corrupção podem, de fato, ser coisas diferentes, mas ambos são crimes” – tese defendida também pela presidente do STF, ministra Cármen Lúcia.

Com esse posicionamento, Gilmar Mendes tenta criar uma presunção de inocência em crime comprovadamente praticado. Até os contínuos do TSE sabem que caixa dois é crime eleitoral, operado em dinheiro vivo e que configura abuso do poder econômico e tráfico de influência, que vão redundar em improbidade administrativa, associação para fraude em licitação, corrupção ativa e passiva.

Essa tese de que caixa dois não passa de ilícito fiscal e eleitoral, sem implicações penais, deve ser defendida por advogados e pelos réus, jamais por magistrados, especialmente quando se trata de um ministro do Supremo que se encontra na presidência do Tribunal Superior Eleitoral. Pega muito mal e desmoraliza a Justiça, justamente num momento em que ocorre um esforço extraordinário para moralizá-la, através do empenho da nova geração que toca a Lava Jato.

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