sábado, 30 de julho de 2016

Lula telefone ONU vira reu lava jatao tv esquece Delcidio obstrucao justica juiz ricardo leite brasilia

Collor e Dilma - abuso de poder e voluntarismo

Confirmando-se em agosto o impedimento de Dilma Rousseff, o Brasil terá experimentado dois impeachments em 28 anos da democracia. O número é elevado: dois em sete períodos de governo.

Mas não há que ver nisso sinal de fragilidade do regime de 1988. Ao contrário, nos dois casos o Congresso interrompeu o mandato de presidentes que abusaram do poder que lhes foi concedido pelas urnas. No caso de Fernando Collor de Mello o estopim foi a acusação de corrupção, de ter recebido recursos das operações suspeitas de PC Farias, tesoureiro de sua campanha. Este teria usado seu vínculo com o presidente para tomar dinheiro de empresas que dependiam de decisões do governo. No caso de Dilma Rousseff, as “pedaladas” de que é acusada constituíram abuso do poder que o Executivo tem sobre os bancos públicos, obrigando-os a conceder à União empréstimos disfarçados para gastar mais do podia. Assim, de uma ou de outra forma, os dois abusaram do poder, cometendo crime de responsabilidade. A frequência do impeachment é, pois, sinal de força da democracia brasileira. Ela tem sabido reagir aos chefes de Estado que ultrapassam os limites da autoridade recebida pela eleição.

O impeachment de Fernando Collor e o que atingirá Dilma Rousseff não decorreram, porém, apenas dos abusos mencionados. As crises que atingiram seus governos, embora bem diversas, resultaram em parte do seu extremovoluntarismo. O abuso de poder foi apenas uma das manifestações desse voluntarismo, normalmente obediente à ordem legal. Claro que os voluntarismos dos dois tiveram orientações políticas muito diversas: Collor orientou-se pela crença no valor do mercado e Dilma, pela crença nas virtudes da intervenção estatal.

O voluntarismo de Collor expressou-se, por exemplo, na edição de mais de uma centena de medidas provisórias no seu primeiro ano de governo e na tentativa, posterior, de forçar reformas liberalizantes que exigiam mudanças na Constituição e, portanto, grande maioria parlamentar, quando mal conseguia maioria simples no Congresso. Assim, o presidente buscou, com sucesso variável, impor sua vontade graças ao uso intenso dos poderes do Executivo, mas desconhecendo ou menosprezando os interesses políticos sediados nos partidos e no Congresso. Atuava como se os votos recebidos na eleição de 1989 lhe tivessem dado superior legitimidade em relação aos demais Poderes de Estado. Isso até o início de 1992, quando foi obrigado a recuar e tomar em conta a força e a legitimidade dos demais Poderes. Mas não o fez na medida necessária para retomar o controle da situação.

Berna Reale dança no lixão, navega em gôndola com centenas de gatos e carrega na boca próteses que lembram bonecas infláveis: a arte em seu poder de criticar.:

O voluntarismo de Dilma está mais à flor da nossa memória. Todos se lembram da dádiva maravilhosa de 20% na conta da luz, anunciada em setembro de 2012 juntamente com a renovação antecipada de todas as concessões no setor elétrico. A vontade presidencial foi feita, a despeito dos protestos das empresas do segmento de eletricidade e da desorganização do setor, mas teve de ser paga depois pelo consumidor, cujos gastos em 2015 aumentaram em cerca de 50% para compensar a benesse antes recebida. Caso similar foi a contenção dos preços dos combustíveis abaixo do nível internacional desde 2007 e, especialmente, a partir do início de 2011. Em nome do controle da inflação, esse voluntarismo presidencial trouxe prejuízos elevadíssimos à Petrobrás (US$ 50 bilhões até o final de 2014) e ao setor produtor de álcool combustível. Esses e outros casos de imposição da vontade se expressaram em formas de intervenção estatal que fizeram pouco da lógica própria dos mercados, incluídos aqueles em que empresas estatais tinham e têm parte relevante.

Contudo talvez tenham sido as decisões políticas que Dilma Rousseff tomou depois da vitória eleitoral de 2014 que mais corroeram sua capacidade de governar. A mais relevante foi a decisão de adotar o “ajuste fiscal” como diretriz da política econômica do novo governo e convidar um banqueiro para conduzi-la, desdizendo tudo o que afirmara na campanha eleitoral. Além de contrariar o seu partido, que vivia na ilusão de que gasto é sempre igual a desenvolvimento, transformou a tristeza da derrota oposicionista em revolta contra o estelionato eleitoral sofrido. A mentira indiretamente revelada e reconhecida reduziu, antes mesmo da posse, a legitimidade não da democracia, mas da presidente recém-eleita.

Na sequência, ela escolheu uma equipe ministerial que a afastou mais ainda da corrente majoritária do PT. E decidiu disputar, com candidato do PT, o comando da Câmara dos Deputados (para o qual se vinha preparando o deputado Eduardo Cunha), corroendo a já precária aliança com o PMDB, que lhe dera o vice, votos e um bom naco de tempo no rádio e na televisão. A derrota fragorosa nessa disputa evidencia, mais que tudo, o voluntarismo político da presidente. Ela se inclinou quase sempre a tomar pouco em conta os interesses de partidos e lideranças com os quais interagia, como se eles tivessem de curvar-se à vontade presidencial por terem menos legitimidade. É verdade que o sistema presidencial brasileiro dá ao chefe de Estado um poder muito grande. Mas o impeachment de Collor demonstrou que para governar o presidente precisa manter liderança sobre uma coalizão partidária majoritária. Se não consegue fazê-lo, perde condições de bem exercer o cargo.

Seguramente abuso de poder e voluntarismo presidenciais não explicam, por si sós, a crise política atual. Mas sublinham que a democracia não exige apenas eleições; demanda também responsabilidade no exercício do poder, tanto pelo respeito aos limites da lei como por levar em consideração os interesses legítimos dos demais atores. Infelizmente, Collor e Dilma, não se mostraram capazes disso.

Rio 2016, hora do xadrez

Dilma e Lula não vão à Olimpíada. Foram pegos no antidoping.

O laboratório da Lava-Jato descobriu que a campanha da presidente afastada derramava milhões de reais numa empresa de fachada do setor de informática, entre outros anabolizantes criminosos. No caso do ex-presidente, uma nova substância ilegal foi atestada em laudo da Polícia Federal — constatando que as reformas no sítio de Lula que não é de Lula foram orientadas pelo próprio. Só a repaginação da cozinha custou 252 mil reais.

O ex-presidente já avisou que não vai deixar barato. De fato, nada que envolva Lula é barato. Perguntem aos laranjas da Odebrecht que compraram um prédio para o Instituto Lula. E lá foi o maior palestrante do mundo para Genebra, com sua comitiva, denunciar à ONU a perseguição que está sofrendo no Brasil.

A elite vermelha está rica, pode rodar o mundo se quiser, alardeando o seu sofrimento, protegida por seus advogados milionários. Há de conseguir uma rede internacional de solidariedade, para que todos tenham direito de matar a fome em cozinhas de luxo, e não falte a ninguém uma empreiteira de estimação.


A ONU é a instância perfeita para o apelo de Lula. É uma entidade recheada de burocratas bem pagos para fomentar a indústria do alarme e da vitimização. Mas a ONU não é perfeita como Lula: parte de suas ações tem efetividade, manchando o ideal do proselitismo 100% parasitário. Deve ter sido um frisson em Genebra a chegada do ídolo brasileiro — que passou 13 anos liderando um governo oprimido, sugando um país inteiro sem perder a ternura, e permanecendo livre, leve e solto, voando por aí. Um mago.

É justamente para continuar livre e solto que Lula foi à ONU. Ele sabe que será condenado por Sérgio Moro. Acaba de virar réu por obstrução de Justiça, no caso Delcídio-Cerveró. Nessas horas é melhor mesmo recorrer aos gigolôs da bondade internacional. É uma turma capaz de ignorar numa boa as obras completas do mensalão e do petrolão, e tratar Lula como um pobre coitado, perseguido por um juiz fascista. A lenda do filho do Brasil cola muito mais fácil do que a do filho adotivo da Odebrecht.

Os plantonistas da solidariedade cenográfica já bateram um bolão na resistência ao golpe contra Dilma. Claro que toda a picaretagem revelada por João Santana não comove essa gente. Nem as confissões da Andrade Gutierrez sobre a rota da propina montada com um assessor direto da companheira afastada, injustiçada e perseguida. Muito menos o buraco em que esses heróis progressistas jogaram o Brasil, escondendo déficits graças à arte da prostituição contábil. Nada disso é crime para os simpáticos jardineiros da fraude.

Os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro representam um momento histórico. Marcarão a demissão definitiva da mulher sapiens, e a devolução ao povo da frota federal que serve sua filha. Ainda tem gente escolarizada defendendo esse escárnio — contando ninguém acredita —, mas são cada vez menos. Até a vocação para o vexame tem seus limites. A Olimpíada do Rio encerra também a maratona de Lula correndo da polícia. Daí em diante, a prova é de 100 metros rasos. Se a democracia ultrapassar a demagogia, o ex-presidente vai ter que pagar pela ação entre amigos que depenou o Brasil.

A opinião pública segue, como sempre, em sua viagem na maionese. Segundo dois grandes institutos de pesquisa, a maioria quer eleições presidenciais antecipadas.

Ou a maioria não conhece a lei, ou não está interessada em cumpri-la. É a renovação da esperança para a escola de malandragem que o país, a tanto custo, está enxotando do poder. Os heróis providenciais estão todos aí, excitadíssimos, para herdar o rebanho petista. São os que, de forma mais ou menos envergonhada, combateram o impeachment da mulher honrada — aí incluídos os puritanos da Rede, PSOL e demais genéricos do PT. Prestem atenção: estarão todos nas eleições municipais atacando o governo de homens velhos, brancos, bobos e feios de Michel Temer.

Esse governo careta, recatado e do lar, que não tem mulher sapiens para divertir a plateia, está arrumando a casa. Não porque Temer seja um iluminado. Ele só percebeu — como Itamar duas décadas antes — que sua única chance era botar os melhores para tomar conta do dinheiro. E botou. Saiu a delinquência fisiológica, entrou a eficiência. É assustador para os parasitas das lendas humanitárias ver a máquina nas mãos de profissionais.

O vento já virou, o Brasil vai melhorar, e isso é terrível. Como na época do Plano Real, os solidários de butique correm o risco de voltar a pregar no deserto, enquanto a vida da população desgraçadamente progride. Quem vai comprar ideologia vagabunda num cenário desses?

Só pedindo socorro à ONU. Mas se apressem, porque depois da Rio 2016 será a hora do xadrez.

Guilherme Fiuza

Imagem do Dia

O maior legado da Olimpíada.

Esses apartamentos inacabados na Vila Olímpica não são nada para mim. Nada, diante da grande vergonha, de dimensões planetárias, que é a catástrofe ambiental do Rio de Janeiro. É pavoroso o crime de omissão (e provável desvio de verba) de sucessivos governos estaduais no cenário natural mais belo e majestoso do mundo. Pelo menos o crime está sendo exposto para o mundo. Viva a Olimpíada!

Além de carioca, sou militante desta Cidade Maravilhosa, nasci em Copacabana quando “arrastão” nada mais era que pescadores chegando com suas redes à areia coalhada de conchas e tatuís, peixes brilhando ao sol, águas cristalinas. Quando o Rio de Janeiro foi escolhido sede dos Jogos, em 2009, concorrendo com Madri, Tóquio e Chicago, vibrei. Era o momento de investir com seriedade. A adesão do povo foi impressionante: 85% queriam muito que o Rio fosse escolhido. Ingenuidade? Otimismo? Uma pesquisa da revista Forbes com 10 mil pessoas em 20 países acabava de eleger o Rio como “a cidade mais feliz do mundo”.

Meu artigo, há sete anos, parafraseava Barack Obama no título: “Sim, nós podemos”. Escrevi que cobraríamos o cumprimento de promessas porque estávamos “cansados de testemunhar falcatruas e projetos megalomaníacos que enchem os bolsos de políticos e são inúteis para a população”. Confiava em “uma virada” se houvesse “planejamento e responsabilidade”.

Nesse balneário com vistas de tirar o fôlego e clima ameno, havia três desafios a ser confrontados com a garra de atletas que buscam o ouro no pódio: a despoluição da Baía de Guanabara, a segurança pública e a infraestrutura urbana, com transporte adequado. Sabíamos como Barcelona havia aproveitado a oportunidade para se tornar um polo internacional de turismo. Por que não o Rio?

Até o prefeito Eduardo Paes me contradiz agora. Para o jornal inglêsThe Guardian, ele disse que “sim, nós perdemos”. “Esta [Olimpíada] é uma oportunidade perdida para o Brasil. Não estamos nos apresentando bem. Com todas essas crises econômicas e políticas, com todos esses escândalos, não é o melhor momento para estar nos olhos do mundo”, comentou, mas também reclamou de exagero nas críticas. “Isso me deixa louco. Se você ler os meios de comunicação internacionais, parece que tudo aqui é zika e pessoas atirando umas nas outras.”



Vídeo tailandês satirizando 'limpeza' olímpica da Baía de Guanabara

Torcemos para a Olimpíada dar certo, em paz, sem ataques terroristas, sem assaltos a delegações e turistas, sem mortes de inocentes. E que sejam contornáveis os problemas na organização. Já nem são medalhas a nossa prioridade.

Um legado da Olimpíada talvez seja o reconhecimento de nosso vexame maior: as águas imundas e poluídas do Rio. Especialistas em saúde deram aos nadadores e velejadores um conselho. Fiquem de boca fechada para evitar doenças com dejetos, lixo, bactérias, rotavírus. “Os atletas estrangeiros estarão literalmente nadando em m... humana e correm o risco de adoecer por conta de todos aqueles micro-organismos”, disse ao jornal The New York Times Daniel Becker, pediatra carioca.

No ano passado, almocei com o governador Pezão e mencionei o fracasso de seu compromisso de despoluir a Baía até a Olimpíada. “Ruth, isso também é exagero do pessoal. Tem uns sacos boiando, uns pneus... a gente vai conseguir limpar.” Em 2014, ele dizia que a meta era ter 80% do esgoto tratado. Mas empurrou a meta com a barriga. Nas águas da Baía, há geladeiras, sofás, resíduos químicos de fábricas, óleo dos petroleiros. E, volta e meia, cadáveres.

Só pode ser gozação chamar de “ecobarco” aquele troço que faz papel de Comlurb na Baía de Guanabara, retirando toneladas de “lixo flutuante”. “Ecoboat” e ecobarreira não são nem paliativos. A 11 dias dos Jogos, foi retirada uma geladeira da água. Lars Grael, medalhista olímpico nas Olimpíadas de Seul e de Atlanta, disse que será “uma competição de vela com obstáculos”. Seu diagnóstico, em dia sem chuva: “Bastante sujeira, muito óleo na superfície e detritos. Plásticos, latas, engradados. Imagina, em plena regata, essa quantidade de lixo prendendo no casco da embarcação”.

Não foi por falta de planos bilionários ou de doações internacionais. Até ajuda do Japão o Rio já teve. As instalações de tratamento de esgoto são abandonadas ou sofrem vandalismo. As bombas param de funcionar e fica tudo por isso mesmo. Foi é por falta de vergonha.

Muita gente culpa “o brasileiro”, esse povo sem cultura ambiental. É verdade. Mesmo brasileiro com doutorado não sabe cuidar do lixo ou sai emporcalhando as praias. Mas o buraco é muito mais embaixo. Mais de 100 milhões de brasileiros não têm saneamento básico. Metade da população do país não tem coleta de esgoto! Depois da Olimpíada, talvez mude a cultura ambiental. É só a gente não ficar de boca fechada.

Lula, um caso perdido

O título acima expressa minha convicção de que o ex-presidente está condenado a uma das muitas grades em que se pode conter um ser humano: as que o amarram ao pequeno séquito dos que compartilham os mesmos vícios e desvios morais.

Entenda-me o leitor. Assim como os dependentes químicos se reúnem, qual escombros humanos, em terrenos baldios e obscuros recantos das cidades, assim também pessoas na situação moral e legal de Lula agrupam-se por semelhança e fogem do convívio com pessoas de bem. O mal feito às ocultas, nos porões, um dia é proclamado desde os telhados. E o que estava nas páginas dos processos, nas denúncias, nas provas e nos privilégios de foro, vai para as manchetes dos jornais. Acaba o teatro e a vida real começa. Pode ser curto, muito curto, o caminho entre a conduta viciosa ou criminosa e essa forma de reclusão por rejeição e repulsa social.


Será ele preso, condenado e cumprirá pena? Sei lá! No dia em que eu entender a Justiça em nosso país e, de modo especial, nossa Suprema Corte, que certamente exercerá o último grau de jurisdição no processo de todos os notáveis hoje investigados, provavelmente haverá outra composição por lá e nós estaremos vivendo num Brasil melhor. Não, não tenho resposta para essa pergunta. Nosso STF faz "desacontecer" fatos que todos viram e ouviram. Mas Lula, ainda não como se espera, já está sendo punido. Está contido, preso. Basta vê-lo, como o vi agora, há poucos minutos, na TV.

Quando Delcídio Amaral perdeu o mandato de senador, agravou-se a situação do ex-presidente. O Procurador Geral da República pediu ao ministro Teori Zavascki que o processo - que incluía Lula - fosse enviado para Curitiba e para o juiz Sérgio Moro. Ouriçou-se a morofobia do estadista de Garanhuns que, por seu advogado, solicitou a remessa para a Justiça Federal de São Paulo. O ministro, porém, acabou enviando tudo para Brasília, considerando que lá foi praticada a maior parte dos atos denunciados.

Não poderia desabar sobre os muitos problemas do ex-presidente algo mais inoportuno do que a decisão do juiz Ricardo Leite tornando-o réu no exato momento em que choraminga perante a ONU as injustiças e perseguições que estaria sofrendo por parte de Sérgio Moro. Imagine só a situação: tapado de orgulho das próprias virtudes, inocente como um anjo de Rafael, vê seu delírio persecutório desfazer-se com o reconhecimento de outra robusta hipótese criminal em vara diferente, longe da tenebrosa Curitiba de seus mais freqüentes arrepios.

Orgulho, ambição e vaidade formam um explosivo coquetel. E Lula o bebeu até a última gota.

Percival Puggina

O que é política hoje?

Nunca vi tanto ódio, incompreensão, agressão, despautério. Nesse Brasil, viramos inimigos um do outro. É um país dividido. Se você for defender uma ideia política, o cara pode te dar um tiro.
 
Eu peguei a Revolução Socialista, que ia mudar o mundo. Não mudou. Hoje, não sabemos o que pode mudar o mundo. Essa impotência é que paralisa. As tais utopias… Cadê? Quais são? O que é política hoje?
Ignacio de Loyola Brandão

O álibi ultrajante de Cidinha Campos

No fim de tarde rodeando a casa modesta no topo de uma ladeira de Olinda, de onde se vê o sol desaparecer na fresta entre o horizonte e o mar, o pernambucano neto de escravos, de olhos, fala e coração mansos, reuniu parte da coleção de netos para começar a leitura de "A Vida dos Doze Césares". Meu avô trazia mapas, anotações e livros coadjuvantes: não era bem uma leitura, já que ele sabia tudo de cor e selecionava o que e como contar à audiência infantil; era mais uma folia regida para nos ensinar a intimidade entre leitura-literatura, conhecimento e afeto; e a lição de que os homens – todos poeira passageira, sejam imperadores ou escravos – agem pelo caráter, no Império Romano ou em Olinda. Começava narrando assim “isso foi bem antes desse velho preto nascer, mas nem tanto”.

Foi bem antes de existirem os portais da minha vida – minha mãe nascida da minha vó portuguesa alvíssima que não conheci de olhos verdes cuja cor adivinho nas fotos em branco e preto e que era rica e foi deserdada pela família porque cismou de casar com o preto magro e pobre só para ele ser meu avô e me dar esse apelido que usa botas nesta coluna – que Suetônio descreveu o choro de Júlio César diante do túmulo de Alexandre, o Grande, pois já ultrapassara a idade de 32 anos que o macedônio tinha quando morreu dono do mundo, mas o general romano só obteria glória parecida por volta dos 50 anos.

O Brasil inteiro deveria prantear o fato de chegar ao século 21 com apenas 48,6% da população atendida por rede de esgoto. Além desse dado, o site http://www.tratabrasil.org.br informa que apenas 40% do esgoto coletado recebe tratamento. Isso não me escandaliza mais; no país onde o básico é luxo, o que me intriga é como, depois de apenas 516 anos do descobrimento, quase metade da população já desfrute desse item civilizatório e a indiferença ultrajante dos 48,6% se soma à indigna pasmaceira dos 51,4% para resultar naquilo que boia nas águas olímpicas do Rio de Janeiro ou nas dos rios, córregos, praias, lagoas e lagos das cidades brasileiras: nossa cidadania rarefeita.

A consciência indigente do brasileiro a respeito das obrigações dos governantes degenerou, sob o lulopetismo, na indigência consciente do populismo de um governo do atraso cujas políticas primitivas se restringem a cotas, bolsa-disso-e-daquilo e ao discurso inaugurando ódios na pregação embusteira de que ele, sim, faz tudo pelos pobres, enquanto lhes nega dignidade. Flores desse mal são, por exemplo, Matilde Ribeiro (ministra da Secretaria da Igualdade Racial de Dilma Rousseff ) e Cidinha Campos (PDT-RJ).

Quando a então ministra disse que não era preconceito “se um negro se insurgir contra um branco”, pois “quem foi açoitado a vida inteira não tinha obrigação de gostar de quem o açoitou”, enviei-lhe um email informando que, apesar de branco, meu pai jamais açoitara alguém; como filha de mãe mulata, gostaria que nenhum dos dois fosse atacado em virtude da cor; e um governo preocupado com a igualdade racial não determina os preconceitos justos, mas combate todos, conciliando a nação. Não tinha expectativa de resposta e Matilde, como boa petista de quem sempre espero o pior, não me decepcionou. Agora, Cidinha Campos se diz contra a violência doméstica, desde que a vítima seja “desvalida” e não tenha como “se socorrer”.

Ela não está apenas afirmando que mulher rica tem a missão social de apanhar à vontade, nem apenas desprezando o fato de a violência não ser meio de resolver coisa nenhuma: também está pouco ligando para as mulheres pobres que apanham, pois enxerga nelas apenas a condição social como álibi ultrajante para ser a vice do intolerável Pedro Paulo, abstraindo o sofrimento concreto de mulheres reais. O limite da violência doméstica é o assassinato, mas a indecência dos políticos parece não ter limites.

Por esse critério, Sandra Gomide e Eliane de Grammond, por exemplo, tinham como se socorrer, então por que estão mortas? Ao costumeiro julgamento da vítima desses tipos de crime, será acrescentado agora o delito da riqueza; a garota carioca vítima de estupro coletivo foi acusada de ser branca e só por isso o caso teria repercutido; as feministas emudecem se são menores de idade os estupradores em casos de repercussão – será que algum dia desfrutaremos uma cidadania não seletiva e menos rala, que não preconize a porrada autorizada, o estupro merecido, o preconceito correto, a igualdade diferente perante a lei?

Essa inquietação é um dos principais nervos das manifestações pró-impeachment exposto na última delas, depois de Dilma nomear Lula ministro, colocando-o acima da lei a que todos devemos nos submeter. Compreendo que ele não queira ser preso, eu também não quero, por isso, ao contrário dele, não faço nada que enseje cadeia. O farsante recorrer à ONU como perseguido político, escarnecendo do país e da lei que lhe escancara todas as brechas exclusivas a quem, como ele, pode pagar (com que dinheiro?) para escancará-las, revela que Thomas Turbando continua o ato imundo na nossa cara e que é preciso voltarmos às ruas dia 31 exigindo o respeito que essa súcia miserável nos roubou antes de roubar nossa grana.

Cresci em São Paulo e um sotaque leve que a memória afetiva faz remanescente não é o bastante para as pessoas perceberem que sou pernambucana, portanto é comum ouvir de algumas delas uma opinião detestável e estereotipada sobre os nordestinos. Como a maioria deles votou em Lula e Dilma, a coisa piorou. No começo, argumentava que paulistas elegeram Pitta e Haddad e deram inexplicável longevidade política a Paulo Maluf, o Rio Grande do Sul elegera Tarso Genro, etc. Mas cansei, agora corto o papo, revelo minha origem e digo que aqueles termos são ofensivos mesmo se ela fosse outra. A reação de surpresa é acompanhada de um ainda mais ofensivo “Ah, mas você é uma nordestina diferente”. Não sou: como qualquer brasileiro, desvalido ou não, vivo sob a mesma matéria que boia nas águas momentaneamente olímpicas do país.

Em 2011, algumas semanas antes de completar 103 anos, meu avô disse que, para uma poeira passageira, já tinha durado demais e estava cansado. Dias depois, pegou um atalho no cochilo depois do almoço e não acordou mais. Lá no topo da ladeira de onde se vê o sol desaparecer na fresta entre o horizonte e o mar.

Réu, Lula entra na faxina da era PT como detrito

Prestes a ser confirmado pelo Senado, o impeachment de Dilma Roussef marca o fim da era petista no poder federal —uma época que acaba com exames de consciência e uma tentativa de faxina. Convertido em réu pela primeira vez num processo relacionado à Lava Jato, Lula entra nesse pedaço da história brasileira como detrito.

Suprema ironia: um dia depois de recorrer ao Comitê de Direitos Humanos da ONU contra o juiz Sérgio Moro, Lula foi enviado ao banco dos réus por outro magistrado. O doutor Ricardo Leite, de Brasília, aceitou a denúncia em que a Procuradoria da República acusa Lula, o senador cassado Delcidio Amaral e outras cinco pessoas de tentar sabotar a Lava Jato comprando o silêncio do delator Nestor Cerveró por R$ 250 mil.


Esse pedaço do escândalo ficou em Brasília graças ao empenho da defesa de Lula para desmembrar a Lava Jato, afastando-a da mesa de Moro. O petismo soltou fogos quando o ministro Teori Zavaschi, relator do caso no STF, decidiu manter na Capital esse naco do inquérito. Deu chabu. A exemplo do que já sucedeu com partes do processo enviadas para outras praças, juízes de São Paulo e do Rio parecem acometidos de uma espécie de ‘efeito Moro’. Tomam decisões draconianas uma atrás da outra.

Para que outra época comece, a faxina é fundamental. É preciso recolocar o abajur em pé, desentortar a vara do trombone e certificar-se de que o governo de Michel Temer não continuará tentando esconder peemedebistas sujos sob o tapete. Dessa limpeza depende a qualidade da democracia brasileira.

Lula amou a democracia até o capítulo que estipulava que um ex-operário também pode chegar à Presidência da República. Passou a abominar o sistema depois que o Brasil se deu conta de que numa democracia plena todos são iguais perante a lei. Tratado como detrito e já meio farto de tanta democracia, Lula agora se queixa à ONU dos alegados excessos da “República de Curitiba”.

Por que aceitamos os dramas do lixo?

Entra ano, sai ano e o panorama não muda. Há poucas semanas foi divulgado o índice de sustentabilidade em limpeza urbana para os municípios brasileiros. E a conclusão é melancólica: o número de aterros sanitários inadequados aumentou 52% no Estado de São Paulo em 2015, na comparação com o ano anterior, segundo a Companhia Ambiental do Estado. O Índice de Qualidade de Aterros de Resíduos mostrou descartes inadequados em 41 municípios paulistas (em 2015 eram 27).

Não se muda. Não se introduz a coleta seletiva, não se transforma, via compostagem, o lixo orgânico em adubo, não se economizam espaços com aterros. Segundo a Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais, apenas 3% dos resíduos sólidos urbanos no Brasil são reciclados, de um total de 76,8 milhões de toneladas produzidas – apesar de a Política Nacional de Resíduos Sólidos estabelecer há anos prioridade para esse objetivo. Continua-se a esperar que o poder público municipal destine recursos para a área. Já os governantes querem que os munícipes paguem pela coleta, pela reciclagem e pelo aterramento. Mas os cidadãos não aceitam pagar, acham que o custo dessa tarefa já está embutido nos impostos municipais. E não se avança.

Em todo o mundo só se consegue solução se o gerador do lixo o separar (seco e orgânico) e pagar por coleta, destinação e reciclagem. Por aqui aceitamos que 3 mil municípios dos mais de 5.500 ainda mantenham lixões.


O Índice de Sustentabilidade da Limpeza Urbana para os Municípios Brasileiros, que veio a público agora (PWC , Sindicato de Empresas de Limpeza Urbana do Estado de São Paulo e ABLP), afirma que “não há referências quantitativas capazes de sintetizar as metas esperadas pela Política Nacional de Resíduos Sólidos em um cenário de vinte anos para os municípios brasileiros” – o que dificulta a formulação de políticas, financiamentos, monitoramento da qualidade de serviços, prioridades. Por isso se criou o novo índice, que foi avaliado em 3.500 municípios

Os problemas mais frequentes não surpreendem: inadimplência de prefeituras no pagamento de serviços contratados; ausência de coleta seletiva; manutenção de lixões; descaso ou ignorância das populações quanto às políticas da área; proliferação de doenças no setor. A Região Sul é a que tem os melhores índices de sustentabilidade, em seus três Estados. Nenhum município de porte maior se classificou entre os 50 com melhores índices. Menos de 50% dos municípios analisados têm arrecadação específica na área de limpeza urbana.

Há capítulos especialmente preocupantes na área. O site meioambiente.mg.gov.br divulga diagnóstico da Fundação Estadual de Meio Ambiente segundo o qual 57,24% do lixo gerado pelos estabelecimentos de saúde de 524 municípios mineiros (19,5 mil toneladas) vão indevidamente para aterro sanitário; o restante, para incineração (8,6 mil toneladas) ou para autoclavagem – 5,9 mil toneladas passaram por tratamento térmico seguido de destinação para aterro sanitários. Nas 524 cidades mineiras incluídas foram produzidas, no período analisado, 34,4 mil toneladas de resíduos de serviços de saúde. Apenas cinco municípios mineiros têm unidade de tratamento e destinação final dos resíduos desses serviços na própria cidade, o restante vai para outras localidades. Mas 95% dos municípios, a maioria de pequeno porte, “preferem enviar parte dos resíduos ou todos para a incineração”.

Área que merece cuidados extremos no Brasil – e da qual pouco se fala – é a dos resíduos eletrônicos, que, segundo órgãos da ONU (retoquejor, 5/7), gerou 1,4 milhão de toneladas de resíduos em 2015. Sem falar em que, segundo associação de empresas de tratamento de resíduos, mais de 500 milhões de aparelhos eletrônicos sem uso permanecem nas residências – podendo até causar problemas de saúde. São Paulo é o Estado que mais produz resíduos eletrônicos (448 mil toneladas anuais), seguido do Rio de Janeiro (165 mil) e de Minas Gerais (127 mil).

Não há ainda um acordo setorial amplo para o setor de resíduos eletrônicos – ao contrário, por exemplo, do setor de pneus. O acordo neste setor fez surgir a ONG Reciclamp, que coleta cerca de mil toneladas de pneus inservíveis em 900 pontos de 26 Estados. Na área de embalagens de óleo o primeiro acordo setorial foi assinado em 2012.

São áreas que merecem muito cuidado, uma vez que continua a desenvolver-se o chamado “colonialismo da imundície”, em que países do Primeiro Mundo exportam para países pobres seus resíduos eletrônicos. No Terceiro Mundo – como na Nigéria, por exemplo – formam-se gigantescos depósitos desses resíduos, que são separados e coletados pela população mais pobre, que os vende a preços ínfimos a empresas transformadoras.

O Brasil não está longe do problema. Várias publicações têm noticiado, por exemplo, que “o maior depósito de lixo a céu aberto da América Latina está no Distrito Federal”, a 15 quilômetros do Palácio do Planalto, e sustenta mais de 2 mil pessoas – é o “lixão da Estrutural”, uma área de 174 hectares. Na época em que foi secretário de Meio Ambiente, Ciência e Tecnologia no Distrito Federal, o autor destas linhas preparou um plano para dar fim ao lixão, implantar um depósito exemplar onde trabalhassem na separação do lixo, com salários dignos, aquelas 2 mil pessoas; a 500 metros de distância, uma usina de reciclagem moderna, administrada por uma cooperativa de catadores. Foi bombardeado por vários setores que tinham interesse na comercialização do lixo obtido a custos quase negativos. Nada foi para a frente. Não é diferente de muitos outros setores em que prevalece a exploração de trabalho quase escravo.

Mas no lixo as questões já foram longe gemais. É preciso que o poder público crie novas regras, novos formatos. A Política Nacional de Resíduos Sólidos deveria ter sido implantada até 2010, foi prorrogada e nada adiantou.

Washington Novaes

Com investimento bilionário na Rio 2016, NBC cria 'corujão' esportivo nos EUA

Muitas pessoas que compraram ingressos para eventos de basquete, natação e vôlei de praia da Rio 2016 devem ter estranhado quando encontraram uma programação mais adequada para uma "balada" do que para uma competição esportiva - as finais na piscina, por exemplo, começam às 22h de Brasília.

Os horários pouco ortodoxos, bem como a escolha dos esportes "agraciados", são mais uma face da imensa influência que a rede de TV americana NBC tem sobre não apenas os Jogos Olímpicos, mas sobre o Comitê Olímpico Internacional (COI). Tudo isso por força do investimento de US$ 1,3 bilhão nos direitos de transmissão da Rio 2016.

Não é surpresa alguma, então, que a emissora dê prioridade ao mercado americano, em especial no que diz respeito a esportes que atraiam o interesse de sua audiência, como é o caso das modalidades citadas acima, ou de provas de interesse universal, como a final dos 100m rasos no atletismo, marcada para 22h30.

Mas na Rio 2016, a NBC tentou influenciar até o protocolo olímpico: no início da semana, a emissora pediu ao COI que mudasse a ordem de entrada das delegações no desfile da Cerimônia de Abertura, na próxima sexta-feira.

De acordo com a tradição, a ordem do desfile tem a Grécia, berço dos Jogos, abrindo o evento, e o país anfitrião fechando. A entrada do restante dos países obede à ordem alfabética de acordo com o idioma local.

Em um comunicado oficial, a NBC disse ter "discussões regulares com nossos parceiros comerciais e o COI sobre tudo que envolve proporcionar a melhor cobertura possível da Olimpíada à nossa audiência nos EUA".

Os executivos da emissora temem um esvaziamento de sua audiência porque, de acordo com a ortografia brasileira, a delegação americana desfilará entre os países iniciados com a letra "E", o que poderá fazer com que parte do público mude de canal depois da passagem dos 555 atletas dos EUA.