segunda-feira, 25 de abril de 2016

Charge do dia 25/04/2016

Feio, mas necessário

Se fosse catapultado a essa longa sessão da Câmara, sem saber o que estava sendo votado, eu diria com tristeza: eles estão vencendo, os velhos adversários. E se o cansaço da longa sessão me valesse um cochilo, acordar com o voto de Jair Bolsonaro me faria sentir num templo satânico. Sabia muito bem onde estava. Quatro mandatos e 16 anos naquele mundo subterrâneo me fizeram prever na semana anterior, no programa da CBN, a enxurrada de votos pela família, por filhos, netos, a avó que está doente.

Não era o primeiro impeachment que via. Foi assim na queda de Collor. Na verdade, o nível naquela época era um pouco mais alto. Enrolados em bandeiras, detonando bombas de papel picado, os deputados de hoje estão mais inseridos no espetáculo. Falam com imagens. É como se colocassem uma letra retrógrada na canção do impeachment, vitória da sociedade, de algumas instituições e da própria transparência.


A cabeça dos deputados passou por um raio X diante de 100 milhões de espectadores. Cerca de 90 deles são investigados no Supremo. Agora que todos sabem o que temos, certamente vão compreender a urgência de mudanças.

Com tanta coisa acontecendo, naquelas longas horas, procurei não me esquecer das tarefas principais: a reconstrução econômica e ampla transparência sobre o gigantesco processo de corrupção que devastou nosso país.

Os generais da esquerda levaram suas tropas para um combate que sabiam perdido. Refugiaram-se na tese do golpe, para mascarar as graves acusações que pesam contra eles. O que para os líderes era apenas uma boia no oceano, para muitos foi uma ilusão de que havia um golpe em marcha, e ele seria detido.

A insensatez se prolonga com a viagem de Dilma Rousseff ao exterior onde foi se dizer, para a mídia, vítima de um golpe aplicado pelo Congresso e pelo Supremo. Minha senhora, no seu país não há Constituição? Quem dá a palavra final quando ela não está sendo cumprida?

Os jornalistas internacionais não são tão ingênuos. Sabem que, quando se apela para eles, é porque já se perdeu a batalha no seu próprio território. Só uma presidente enlouquecida poderia sonhar em transferir a guarda da Constituição brasileira do Supremo Federal para a ONU. Ainda bem que não o fez.

Esse espetáculo decadente me entristece, apenas isso. Um jovem senador do PT disse que não dará sossego ao novo governo. O país terá de trabalhar muito para sair da crise e deve se concentrar nisso. Mesmo porque a própria Lava-Jato vai se encarregar de não dar sossego aos petistas, inclusive ao jovem senador.

Dilma foi cassada por crime de responsabilidade fiscal, decretos secretos para financiar um rombo de milhões, criar uma ilusão de prosperidade e vencer as eleições. Repetiu o erro em 2015. Se não fosse cassada por isso, seria pelos fatos de Curitiba: campanha com dinheiro do Petrolão, tentativa de obstruir a Justiça. O que vem de Curitiba não resulta apenas em impeachment, mas possivelmente em anos de cadeia. E cadeia, jovem senador, é um lugar que sintetizo numa frase que vi em várias celas onde estive preso e dezenas que visitei: “aqui, o filho chora, e mãe não ouve”.

Se olhamos para o futuro, pela ótica da transparência, a derrota de domingo será difícil de explicar para milhares de pessoas que acreditaram mesmo que havia um golpe em curso. Elas vão perceber que foram usadas como um álibi porque seus líderes tratavam mesmo de escapar da polícia, como aliás já ficou provado no áudio Lula-Dilma.

Essa tática do PT serve apenas para deixar mais arrasado o lado esquerdo do espectro político. As forças conservadoras que já eram fortes tornaram-se mais articuladas, milhares de jovens foram confrontados com a ideia de uma esquerda cínica, corrupta, autoritária.

De uma certa maneira, os discursos contra o PT foram um bálsamo para o partido. Olhem quem está nos derrubando. Mas todos sabemos que não foram derrubados pela Câmara, e sim pela sociedade. Nas ruas, era o discurso de Brasil moderno, contra a corrupção, pela transparência, por serviços públicos decentes, a rejeição do populismo bolivariano. Na rua, havia famílias sonhando com um projeto mais amplo; na Câmara, os deputados reduziram os destinos do país às suas próprias famílias. Isso marca uma distância, mas no essencial cumpriu-se o desejo da maioria.

Era o instrumento legal que a sociedade tinha para se defender, por mais repugnantes que sejam algumas ideias que circulam ali. Tenho repetido isso, como um privilégio da idade. Os impeachments ocorrem num período de cerca de 20 anos. Se a frequência for mantida, este foi o último a que assisti na Câmara. Reste o do Senado, onde se toma muito chá, e espero uma elevação do nível. Se vierem com essa história de Deus, família, filhos e netos, saco da arma que uso sempre que me entediam: um bom livro.

Shakespeare e o impeachment

Por todo o mundo, registram-se comemorações pelos 400 anos da morte de William Shakespeare, completados ontem, 23 de abril, e não pode haver outro tema nesses eventos que a atualidade dessa obra, uma espécie de “escritura secular”, particularmente completa quando se trata de intrigas, maquinações, virtudes e desatinos dos homens públicos.

Nessa empolgação, diz-se que os enredos políticos do noticiário não passam de variações empobrecidas sobre um vernáculo catalogado há séculos. Será mesmo? Vamos, então, a um teste bem difícil: o que há sobre impeachment nas 38 peças de Shakespeare?

Pois bem, há uma peça que Antonio Cândido designou como a “tragédia do destronamento”, e que parece feita para nós. Ricardo II, escrita em 1595, oferece um retrato inacreditavelmente fiel da nossa crise e da ruína da presidência Dilma Rousseff, acredite se quiser.

Ricardo II foi a primeira de uma série de quatro peças históricas em sequência que cobriam o reinado do verdadeiro Ricardo II até o de Henrique V (1377 até 1422). Shakespeare escrevia dois séculos depois, numa época difícil, face às tensões em torno da rainha Elisabeth I, sempre muito questionada, e às voltas com conspirações.

O regime era absolutista e seu fundamento era o Direito Divino, sob o qual não cabia nenhum questionamento sobre as ações do rei, ainda que manifestamente idiota ou mesmo quando violavam a lei. Quem haveria de julgar um rei ungido por Deus?

A tragédia de Ricardo II começa com um escândalo, não em uma empresa de petróleo, mas um assassinato, e uma controvérsia sobre os culpados. Logo ficamos sabendo que o próprio rei foi o mandante, e a discussão se dava entre dois nobres: o assassino de fato e o primo do rei, de nome Henrique de Bolinbroke, um sucessor natural do rei.

A gestão política dessa crise foi uma coleção de erros e vacilações, quase um almanaque sobre o que não deve fazer um rei nessas situações, conforme o figurino de Maquiavel, cuja obra Shakespeare havia acabado de conhecer e abraçar.

O rei primeiro determinou que a controvérsia se resolvesse num duelo, mas depois mudou de ideia e determinou o banimento dos dois, sendo que Bolinbroke apenas por seis anos. O mundo político ficou sobressaltado com a solução. Instaurou-se a incerteza. Sabia-se que o rei havia violado a lei, e ordenado o assassinato.

Tudo é muito fácil, do ponto de vista dramático, quando o rei é acintosamente maligno, como Macbeth, Ricardo III, Claudio e tanto outros extraordinários vilões da galeria shakespeariana. O problema aqui era que Ricardo II era “um homem honrado”, no exato sentido em que essa linguagem foi utilizada por Marco Antonio, para se referir a Brutus, em seu elogio fúnebre a Julio Cesar, do que resultou atiçar o povo contra os conspiradores. Foi com essas mesmas palavras que FHC se referiu a Dilma Rousseff, no exterior, quando perguntado sobre ela.

Como se dá o destronamento de um “homem honrado” como Ricardo, culpado de assassinato, mas que apenas se expressa em poesia?

Os críticos identificam três eixos para o fenômeno que se designa como “perda de realeza” pelo qual, no universo de Shakespeare, e nessa peça em particular, o homem se separa da função e o rei se autodestrói.

Em primeiro lugar, o rei era um esbanjador irresponsável e havia levado a Inglaterra à bancarrota com guerras caras e tolas, e com impostos excessivos. Em uma cena que se tornou clássica, os jardineiros do palácio são os que melhor definem as “pedaladas” reais, comparando a Inglaterra a um jardim malcuidado, repleto de excessos e ervas daninhas.

Em segundo lugar, há uma impressionante sucessão de pequenos ridículos, imaturidades e hesitações do rei, todas revelando um temperamento muito difícil, não explosivo e com dificuldades com o idioma, como Dilma, mas evasivo, ausente, lírico, excessivamente autorreferenciado. O rei só ouve bajuladores, vive isento das exigências da realidade, aprisionado em sua própria poesia, “incapaz de distinguir a manipulação de coisas e palavras”, como explica Harold Bloom.

E, para culminar, o rei perpetra um outro desrespeito à lei, considerado mais petulante e inaceitável que o escândalo que inicia o drama: o rei determina o confisco das terras e bens da família de Bolinbroke. A interpretação do mundo político foi a de que o rei estava subvertendo a ordem, pois estava atacando as mesmas leis que estabeleciam o seu direito ao trono.

O drama se sucede de forma linear a partir desses três eixos, e Ricardo parece sucumbir sozinho à realidade de sua inadequação à posição de rei, mas estranhamente seduzido pela ideia que seu Direito Divino estava sendo golpeado e que um exército de anjos ia descer dos céus para salvar sua coroa.

Barbara Heliodora o descreve como “um egocêntrico incapaz de se concentrar objetivamente nos problemas que lhe são apresentados” e enxerga uma “alta dose de prazer masoquista” no “gozo que o personagem sente em se ver no papel de vítima”.

Enquanto o rei ia murchando, Bolinbroke apenas insiste que lhe sejam devolvidas as terras confiscadas, o que Ricardo interpreta como “golpe”. Os nobres reconhecem a legitimidade do pleito de Bolinbroke, pois queriam evitar a insegurança jurídica e, habilmente, Bolinbroke não revela a sua pretensão ao trono. Emerge muito clara a tensão da época entre o governante ungido e flagrantemente inepto e o pretendente bem preparado, porém, tecnicamente, usurpador.

Bolinbroke não avança sobre o trono, ou se o faz é com imenso comedimento, apenas comparável ao estranho conforto que o rei encontra em dramatizar o seu próprio fracasso. Barbara Heliodora observa que Henrique de Bolinbroke “chega ao trono sem que Shakespeare lhe dê um só monólogo”. Esse personagem é apenas ação, embora tudo lhe venha por gravidade.

O destronamento se torna praticamente uma renúncia, e o rei nem mesmo se opõe a uma cerimônia de abdicação que fazia a transição um ato voluntário. O rei cresce como personagem, e como poeta, embora de forma inútil e centrada unicamente nas indignidades que diz sofrer. Quanto mais lírico, mais clara sua inaptidão para o cargo, ainda mais diante de seu sucessor, um político profissional. Bolinbroke se torna Henrique IV, manda matar Ricardo, e promete uma Cruzada na Terra Santa para expiar o delito, promessa jamais cumprida.

Qual a lição?

Ricardo morreu afirmando que foi golpe, estranhamente confortado com essa versão de seu fracasso. No conceito absolutista, não há dúvida que Bolinbroke era usurpador, mesmo contando com apoio de todos. O poder não emanava do povo nesses tempos.

Hoje, não temos mais um rei, mas três poderes, tudo diferente, exceto pelo fato de que Dilma Rousseff reedita Ricardo II de tantas maneiras que sua agonia parece ainda mais falsificada e infinitamente mais tosca.

Gustavo Franco

Yes, nós temos banana!

São dias estranhos. Ou melhor, época estranha. A lama parece estar por toda parte. Notícias boas, desaparecendo. Provavelmente sumiram soterradas nos escombros de desabamentos, corrupção, noticiário policial e outras coisas ruins, novas ou antigas. Por todo lado, sobra confusão. Falta horizonte.

Otimismo extremo poderia sugerir que, com tanta crise, talvez existam oportunidades. Pessimismo não tão extremo indicaria que as coisas não têm mesmo jeito. A verdade parece estar em algum ponto entre estes opostos. O difícil tem sido chegar a conclusões razoáveis neste barulho todo.

Parte do problema parece ser que a razão parece ter desaparecido junto com as boas noticias. Encontra-se soterrada por argumentos falaciosos, baseados em paradoxos falsos e dilemas inexistentes. Soterrado por discursos complicados, sem sentido, travestidos de argumentos jurídicos opacos, mas sem sentido.

O interessante é que não existe muita duvida sobre os fatos ou a culpa. Ninguém nega mais nada. Ninguém contexto os fatos. Ninguém nem mesmo pede desculpas. Ou se arrepende de qualquer coisa. Tudo o que se lê, se ouve e se fala diz respeito exclusivamente a conveniência e a oportunidade de punição de pessoas que, já sabemos, são, de fato, culpadas.

Não deixa de fascinar a simplicidade dos argumentos. Todos dizem que, embora não haja duvida em relação aos atos praticados e a responsabilidade por eles, punir não é justificado porque sempre foi assim no passado. A punição seria, portanto, não somente inconveniente, mas desnecessária e inútil. Tudo sempre foi e será assim.

Estranha logica. Assume que estamos condenados a reproduzir, sempre em escala e prejuízos crescente, os erros do passado. Não teríamos, portanto, o direito e muito menos a capacidade de melhorar. Nosso caminho natural seria simplesmente projetar no futuro um passado do qual não nos orgulharmos. Ignora a nossa sede de mudança e o desejo por um futuro melhor. O distinto público discorda. Quer melhorias.

A resistência da população em aceitar a repetição do passado como destino inevitável, combinada com a vontade de evitar a punição a qualquer custo preocupa os pecadores. Por isso, recorrem a falsos dilemas. Impossibilitados de melhorar a estatura de suas ações, tentam rebaixar o teto das ideias. Argumentam que a punição não é adequada porque todo mundo faz.

Talvez seja até verdade que as praticas ilegais sejam generalizadas. O problema é que a frequência dos delitos não torna menor a culpa. Más companhias não melhoram o caráter e muito menos reduzem a gravidade das ações. Apenas provam que o país tem muito que fazer.

Em triste espetáculo, querem que o distinto público abrace como destino a reprodução de erros passados perdoando pecadores atuais com o simples argumentos que o numero de pecadores é muito grande. Pedem que aceitemos viver em uma republica de bananas.

Só existe uma resposta possível. Banana para eles!

Vamos partir para a ignorância/?

Ah, é? Ah, é isso, é assim? É para partir para a ignorância? Vamos todos agora virarmos uns trogloditas, nos socando nas ruas, uns cuspindo em outros? Joga pedra na Geni? Vamos partir para o tacape? Para o tudo ou nada? Que coisa feia, dando exemplo para as crianças, para os meninos e meninas que se divertem sem saber por quê, muito menos do quê em rolezinhos-protestos.

Inacreditável. Estamos mesmo conseguindo andar para trás a passos largos – passos não, saltos, e saltos ornamentais provando que precisamos mais do que muito urgentemente fazer nada mais nada menos do que superar. Parar com isso, com essa animosidade toda. Não, não estamos divididos, pelo menos não em apenas dois pedaços como querem fazer parecer. Há uma infinidade de opções.

Não vamos partir para a ignorância.

De repente o ator conhecido, ultimamente mais por ser petista, burro e destemperado, do que como ator, cospe – sim, cospe no casal que o afrontou em um restaurante de São Paulo. Cospe no homem. Cospe na mulher. (Ele agora vai sentir com quantos cuspes se desfaz uma carreira)

O casal sem noção afrontou o ator petista, burro e destemperado, falando um monte de asneiras e bobagens, acusando o zézinho de ladrão, já que dali discussão civilizada sobre política não sairia mesmo. Vomitaram clichês, mas ainda bem que apenas em gritos, por insuportável sua quantidade.

Aí, o zezinho, o ator petista burro e destemperado, vai para casa e corre para o computador para escrever e contar para seus amiguinhos o quanto estava orgulhoso de ter cuspido no casal. Um grupo bate palminhas. O outro quer queimá-lo em praça pública, esquecendo apenas que ele é apenas um ator petista burro e destemperado. Sem qualquer importância.

Nem muita personalidade teve o ato, já que o projétil salivar já havia sido emitido por um outro “bravo combatente” há poucos dias na cara do imbecilnaro. Imbecilnaro esse que ousou evocar e pronunciar o nome do cão dos infernos em seus segundos de votação.

Quequiéisso?


Acho preocupante e considero um comportamento inadmissível ver amigos, inclusive jornalistas, rosnando e babando contra veículos de comunicação grandes, os poucos que estão sobrando, e propondo que no lugar se busque a informação para beber só nos poços alternativos – maioria, água que se diz pura, mas na verdade já vem contaminada com enormes equívocos históricos. Ou de origem e financiamento.

É desonestidade intelectual e uma inusitada sordidez de ataque. Sabem que não é o que dizem, que não tem golpe nenhum, que erraram, que o país está parado, que a maioria os quer ver pelas costas seja por causa de pedaladas, dos pontapés, fora só uma, fora uma e o outro, os dois, desde que saiam da frente, nos deixem superar. Transformam-se em chacotas, fantasmas dos líderes que já foram. E eles não têm altivez para ao menos tentar solução, não semear a discórdia, parar de incentivar o confronto, e muito menos patrocinar os escrachos que vêm sendo feitos pela molecada, tão naturais e espontâneos que até assessoria de imprensa têm.

Uma coisinha, um cisco, vira uma tese sociológica e acadêmica chaaata, muito chata, de como forças conservadoras através de uma matéria com o perfil de uma sortuda estão operando para que as mulheres brasileiras todas regridam em suas conquistas e voltem a ser apenas belas, recatadas, e do lar. Coitada da mulher sortuda que parece saída de uma cândida fotonovela – se bem que com essa ela já toma o primeiro tranco para perceber o que vai vir daí por diante, o rojão grosso que terá de segurar.

Precisaria de uma mágica, um milagre para mudar os nossos políticos tentando fazê-los lordes – difícil. Penso nisso quando lembro que vi o espancador Pedro Paulo jogado na fogueira da ciclovia de pluma levada por Netuno. Atento ao marketing de quem ainda pensa(va) em ser candidato ousou, mexendo na aliancinha no dedo – balbuciar que “talvez” houvesse algum problema com a obra, e chamando de “incidente” aquela tragédia. Tragédia cuja imagem que restou – os dois corpos das vítimas jogados na areia da praia, e ao lado uma normal partida de futebol – essa sim, levada ao mundo essa imagem informou mais sobre como estamos do que as mais vigorosas teses intelectuais.

Nós já partimos para a ignorância. Quando a humanidade se acostuma com trevas, ficamos nos abalroando no escuro. Pisando uns nos calos dos outros. Chutando bem abaixo da linha do Equador.

A grande mentirosa

Quando vi imagens de uma manifestação contra o “golpe” em Nova York, não resisti e comentei com meus botões: deve ser o pessoal que faz compras na 25 de março... brasileirinhos bem alimentados em defesa da senhora Rousseff, corajosa-e-honesta representante de nossa “elite branca”, para falar nos termos da antropologia lulista.

Não entendo, aliás, a razão dos petistas insistirem tanto nesse elogio: corajosa-e-honesta. Estas palavras não querem dizer nada politicamente, quando usadas fora de contexto. Afinal, Hitler era corajoso e honesto. Quanto à senhora Rousseff, especialista em tentar tapar o sol com a peneira, melhor pôr em dúvida pelo menos um dos adjetivos. Honesta, mas... faz vista grossa à corrupção, acoberta malfeitores e se beneficia pessoalmente da situação, canalizando propinas para permanecer no poder, segundo delações marqueteiras que não surpreenderam ninguém com algum conhecimento do assunto.

Um adjetivo, no entanto, qualifica sem ressalvas a senhora Rousseff. Ela é mentirosa. Vimos isso na campanha eleitoral de 2010, quando ela definiu, entre suas quatro prioridades, a realização de uma grande reforma urbana nacional – e, depois de eleita, fez de conta que não tinha nada a ver com o assunto. A verdade é que Dilma entrou em cena mentindo – e vai sair do mesmo modo. Todos se lembram de que ela enfiou em seu currículo um doutorado na Unicamp, que nunca chegou a concretizar. E, sempre que se vê em algum perigo político, a dama indigna acusa os adversários de estarem se preparando para extinguir seus “programas sociais”.

A campanha presidencial de 2014, espetacularmente mentirosa, foi pura delinquência. Dilma promoveu ataques criminosos a Marina, personalidade realmente digna da recente história política do Brasil. E dizia que, se um de seus adversários fosse eleito, baixaria medidas “contra o povo brasileiro” – exatamente as medidas que ela começou a colocar em prática, assim que tomou posse.

Mas sua mentira mais duradoura é dizer que, durante a ditadura militar, lutou pela democracia. Ela nunca fez isso. Foi militante de uma organização clandestina – a Polop – que, em sua pregação “marxista-leninista”, considerava a democracia uma coisa burguesa. Dilma defendia, então, que era preciso substituir a “ditadura dos patrões” (como os polopianos discursavam nas passeatas da década de 1960) pela ditadura do proletariado. Democracia, nem pensar. Mas ela finge que foi democrata. E prosseguirá mentindo por toda a eternidade.

Dilma e seu desamor ao Brasil

A Constituição determina que, para que o impeachment aconteça, é preciso ter crime de responsabilidade. E não tem, contra mim, nenhuma acusação de corrupção
Dilma Rousseff, em Nova Iorque, 22 de abril

Não sei se resta algum degrau na escada da dignidade do cargo presidencial para Dilma descer e macular ainda mais a própria imagem e a imagem do Brasil. A presidente afirma que não é corrupta, como se a distância entre isso e a santidade fosse vencida numa pedalada de cinco minutos.

Nossa dirigente máxima já cometeu crimes gravíssimos, que hoje habitam, apenas, a zona sombria de sua consciência. Foram anistiados. Ela os cometeu quando pegou em armas para implantar uma ditadura comunista no Brasil. Cometeu-os sabendo que a nação nada queria com sua organização, métodos e ideias. O desrespeito de Dilma ao Brasil e seu povo é, portanto, uma história antiga, só superada mediante robustas mistificações e maquilagem publicitária. O modelo que seguiu na juventude foi proporcionado, patrocinado e orientado pelas tiranias soviética e cubana. Era o que ela pretendia e nunca deixou de pretender, como fica patente cada vez que vai a Havana beijar as mãos sanguinárias dos Castro. Dela nunca se ouviu palavra de arrependimento.

Hoje, ao afirmar que não é corrupta, a presidente objetiva, de um lado, transmitir a falsa ideia de que apenas a corrupção pessoal pode motivar um processo como o que enfrenta. Ora, ainda que não tenha auferido recursos da corrupção, esses crimes, praticados dentro do seu governo, pela equipe sob seu comando e supervisão, ao longo de mais de uma década, proporcionaram a ela e a seu partido a manutenção do poder. Mas Dilma, a exemplo de Lula, nada soube e nada viu. Tudo lhe caiu do céu. Se a corrupção é o crime por excelência no teatro da política, por que tanto desmazelo? Por que tantos corruptos notórios no seu entorno? Por que agasalhar Lula com o cobertor de um ministério, para "usar em caso de necessidade"?

Por outro lado, quanto ao impeachment, Dilma e os seus parecem considerar irrelevante o controle parlamentar sobre a despesa pública. Tal desprezo é próprio de pessoas acostumadas a usarem nosso dinheiro para proveito pessoal ou político! Ignorância pura e simples é que não há de ser. Refresquemos a memória: não foi para estabelecer esse controle que nasceram os parlamentos deliberativos? Não foi principalmente por ele que, em 1215, se revoltaram os barões ingleses redigindo a Magna Carta Libertatum e exigindo do rei João que a assinasse? Estamos falando de um princípio constitucional com oito séculos de vigência! Sua ruptura é grave ofensa ao parlamento e à nação.

Nossa presidente mentiu desbragadamente aos eleitores em 2014; afundou as contas públicas, a economia privada e grandes estatais; fez disparar o desemprego; furou os tetos a respeitar e os pisos a não transpor. Transformou o Palácio em pavilhão de comício e comitê central de seu partido. Vive encapsulada para escapar de vaias e panelaços. Esfarelou seu apoio parlamentar e, em desmedida soberba, quer permanecer assim até 2018.

Acontece que o amor próprio de Dilma contrasta com seu desamor ao Brasil. Ele estava presente nos tempos da clandestinidade, no internacionalismo inerente ao comunismo, no desapreço às nossas raízes e à nossa história, na sempre ardilosa construção da luta de classes e no conceito da Pátria Grande, falsamente bolivariana e verdadeiramente comunista, urdida nos conluios do FSP e da Unasul.

Dia 22, em Nova Iorque, esse desvario chegou ao cúmulo de sugerir sanções do Mercosul e da Unasul ao Brasil caso seu impeachment avance. Nossa presidente repete Luís XV: "Depois de mim, o dilúvio!". Afoguemo-nos todos. As recentes manifestações de Dilma no palco internacional correspondem ao item 7 do art. 9º da Lei dos Crimes de Responsabilidade: "Proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo". Ou não?

Percival Puggina

A esquerda deixou de ser esquerda

A direita nunca deixou de ser direita, mas a esquerda deixou de ser esquerda. A explicação pode parecer simplista, mas é a única que contempla todos os aspectos da questão. Para serem participantes mais ou menos tolerados nos jogos do poder, os partidos de esquerda correram todos para o centro, onde, infalivelmente, se encontraram com uma direita política e econômica já instalada que não tinha necessidade de se camuflar de centro. Entrou-se, então, na farsa carnavalesca de denominações caricaturais com as de centro-esquerda ou centro-direita
José Saramago
 

O impeachment que não houve

Quanto mais nosso Gollum presidencial insiste em sua marcha fúnebre de carnaval – “Daqui não saio, daqui ninguém me tira”, em ritmo Tristesse, de Chopin –, mais permite ao país tomar consciência do quão fundo é o buraco em que estamos. Uma diferença crucial entre o processo de impeachment contra Collor e o atual é a existência, a favor de Dilma, do que chamam de uma “base social” a defendê-la.

Collor, de fato, quando suplicou ajuda à sociedade, não teve apoio de ninguém. Também, quem defenderia um governo corrupto? Depende: se ele for do PT, tem quem o faça. Basta ver fotos e vídeos das manifestações em defesa da presidente para se constatar que o público é bem definido, sendo quase na sua integralidade oriundo de sindicatos ou pago por eles, conforme fartamente noticiado. Só o que se vê são balões, camisetas, bonés e bandeiras de entidades sindicais, a quem se somam vários dos chamados “movimentos sociais”, cuja organização e modo de atuação é muito semelhante (se não espelhada) ao modelo sindical.

Ninguém parece ver nisso nada de mais, mas, pela lei, todo e qualquer sindicato tem por fim o estudo, defesa e coordenação dos seus interesses econômicos ou profissionais. Alguém poderia me explicar como a defesa de governos corruptos se enquadra nesses fins? Juristas dirão haver “desvio de finalidade”, pois eu ouso dizer: não, não, eles estão revelando sua finalidade real. Para entender, precisamos retornar a 1954.

O primeiro processo de impeachment na história brasileira aconteceu naquele ano, contra Getúlio Vargas. Uma das razões para tanto foi o fato de Getúlio estar a criar uma “República Sindicalista” no país. Como o pedido não foi aceito, a tal república não só nasceu como cresceu, consolidou-se, pariu Luiz Inácio Lulla da Silva (com “l” dobrado mesmo – ele fez por merecê-lo), tomando o poder em 2003 e nele ficando nos últimos 13 anos. Agora, está nas ruas a defender suas “conquistas”.

Há pouquíssima pesquisa e estudo sobre isso, mas o pouco que existe já ajuda a entender melhor. A doutora em Ciências Políticas Maria Celina D’Araújo, professora da PUC-RJ, realizou uma pesquisa inédita publicada no livro A elite dirigente do governo Lula, lançado em 2009 pela CPDOC/FGV. Nele, chegou a algumas conclusões que falam por si:

“Em nossa pesquisa chamaram a atenção os altos níveis de filiação a sindicatos e ao PT. Temos fortes razões para supor que essa participação tende a ser alta em outros governos, posto que a interface do PT e da CUT com o funcionalismo público é histórica, e que essa é uma categoria com níveis muito altos de sindicalização. Teríamos assim grande probabilidade de, independentemente da filiação partidária do presidente, sempre encontrar entre esses dirigentes provenientes do setor público uma grande massa de sindicalizados e de petistas. Dito de outra forma, os integrantes das carreiras públicas estão majoritariamente filiados a sindicatos e têm preferencialmente adotado o PT, de forma que mesmo que o governo seja de outro partido, a máquina pública irá refletir essa tendência.”

Ou seja, tanto faz quem esteja no governo, lá estará a “República Sindicalista” entranhada. O impeachment de Dilma Rousseff mudará quase nada desse quadro, mas sua teimosia em não largar o osso já teve seu lado bom: obrigou a tal república a revelar sua finalidade real. Dá para entender por que sua criação foi motivo para se pedir o impeachment de Getúlio Vargas, não?

Um caso para refletir

No já distante ano de 2003, aos 12 dias de março, Chris Huhne acionou o motor de seu potente BMW e entrou na rodovia M11, em um trecho próximo a Essex, no Reino Unido.

Já era tarde da noite, a estrada estava vazia e assim este intrépido motorista decidiu trafegar em velocidade superior à permitida pela legislação. Para ser bastante preciso, ele dirigiu a 32 km/h acima do limite.

Eis que este impetuoso condutor foi surpreendido por uma câmera de vigilância instalada em um trecho da rodovia. Seguiu-se, evidentemente, a emissão de uma autuação de trânsito por excesso de velocidade.


Chris Huhne, político de razoável projeção, não desejando ter sua imagem pública manchada por conta de infrações de trânsito, buscou alguém para assumir a culpa - e foi assim que entrou neste enredo sua esposa, Vicky Pryce, “eleita” para declarar-se culpada por aquela infração.

O problema é que as autoridades descobriram a manobra, quando então começou um processo criminal contra ambos por “obstrução da justiça”. Enquanto isso, o tempo passava e a carreira política de Chris Huhne acelerava: ei-lo eleito membro do Parlamento e, na sequência, nomeado Ministro de Estado.

Chegamos, então, ao dia 12 de março de 2013 - precisos dez anos depois daquela noite fatídica. O sistema legal britânico, finalmente, deu seu veredito: Chris Huhne e sua já ex-esposa Vicky Price são culpados, e como tal foram condenados a uma pena de oito meses de prisão - que já começaram a cumprir.

Antes de chegar a este ponto, o político já renunciara ao cargo de Ministro de Estado, e até mesmo ao mandato de membro do Parlamento - afinal, a opinião pública britânica simplesmente não aceitou que pessoa tão relevante mentisse tão descaradamente sobre questão tão simples.

Ao sentenciar o casal, assim disse o juiz: “Ofensas desta natureza atingem o coração do sistema de justiça criminal. Afinal, o propósito do sistema de pontuação é que aqueles que eventualmente dirijam de forma imprudente sejam punidos com a suspensão do direito de dirigir, o que serve para desencorajar o cometimento de outras infrações e proteger o público. O sistema depende, relativamente aos motoristas surpreendidos pelas câmeras, do reconhecimento honesto da culpa. O preenchimento desonesto de formulários (atribuindo a outra pessoa a culpa pela infração) é algo fácil de fazer, e a troca de responsabilidades frequentemente acaba passando desapercebida”.

E prosseguiu o magistrado: “Esta prática corresponde a uma ofensa criminal séria, pois tende a perverter o curso da justiça, e, assim, uma condenação imediata a dada pena de prisão deve ser aplicada. Eis aí um tipo de ofensa que requer deste tribunal a observação de que a prevenção geral é um dos objetivos da sentença” - vale dizer, fazendo uso das palavras de Lord Halifax, “não se enforca um homem por ele ter roubado cavalos, mas para que cavalos não sejam mais roubados”.

Sobre este episódio, transcrevo as palavras do Primeiro-Ministro David Cameron: “Eis aí uma advertência de que ninguém, não importa o quão importante ou poderoso seja, está fora do alcance do sistema judiciário”.

O Reino Unido, evidentemente, não é um país perfeito. Tem lá suas graves falhas por corrigir. Mas que tal meditarmos sobre este episódio? Há, nele, alguns aspectos relacionados à cultura e ao comportamento de todo um povo - e das instituições que o representam - que mereceriam profunda análise sob o pano de fundo da nossa realidade.

Pedro Valls Feu Rosa

PT não entregará obras bilionárias prometidas

Se aprovado o impeachment da presidente Dilma Rousseff, o Partido dos Trabalhadores entrará para a História do Brasil como maior case de estelionato eleitoral. Vendida como competente gerente, Dilma não conseguiu fazer deslanchar as principais obras do governo, seja como ministra ou como presidente da República. São incontáveis obras que tiveram aumento de preço no decorrer de sua execução.

Somando o trem-bala, a ferrovia Norte-Sul e a Transposição do São Francisco, estão previstos gastos na ordem de R$ 49,3 bilhões.

Inacabada, a transposição passou de R$ 4,58 bilhões para R$ 8,2 bilhões. A previsão de conclusão da obra: 2017.

O trem-bala saltou de R$ 12 bilhões para R$ 38 bilhões. O PT criou empresa para cuidar do leilão, que receberá R$ 45,9 milhões em 2016.

Na Norte-Sul, trecho de Palmas a Anápolis foi inaugurado em maio de 2014. Desde então, serviu para apenas duas viagens de carga.