segunda-feira, 28 de março de 2016

O Outono de nossa confusão

Percebi que, aos poucos, a luz está ficando mais suave. Daqui a pouco, a água esfria e entramos nas maravilhosas manhãs de abril e maio. O verão foi embora e quase não nos demos conta dele, ouvindo discursos da Dilma, vendo Lula fugir da polícia e Eduardo Cunha mover-se como um velho dinossauro nos tapetes do Salão Verde. Ele nos trouxe uma sinistra novidade: o vírus Zika surgido no bojo do crescimento das doenças causadas pelo Aedes aegypti.


Verão do El Ninõ, verão confuso o bastante para contaminar o outono. Nessa chuva de argumentos e versões, é uma tarefa importante desfazer os mitos. Dilma e seus aliados dizem que o impeachment é um golpe. Ministros do Supremo afirmam que impeachment não é golpe, quando realizado de acordo com a Constituição. Quem disser que o impeachment é golpe estará ignorando a própria Constituição, ou se rebelando contra ela. Daqui a pouco, os governistas dirão que as pedaladas não são um crime de responsabilidade. A Lava-Jato já expôs a base legal da queda de Dilma. Sua campanha usou dinheiro do Petrolão. As provas são os recursos que a Odebrecht pagou ao marqueteiro João Santana, e mais detalhadas ainda ampliam-se na delação premiada da Andrade Gutierrez. Para não abandonar a expressão golpe, o governo terá de lançar mão do mesmo oximoro inventado após a queda de Fernando Lugo no Paraguai: golpe constitucional.

Num discurso para sindicalistas, Lula pede à oposição uma trégua de seis meses para o Brasil voltar a ser alegre. Não sei a que tipo de alegria ele se refere. Com mais seis meses de Dilma, estaremos arruinados e não restará nem vestígio da alegria brasileira. Pelo que vi no Congresso, o impeachment segue seu rumo. O único incômodo, para mim, é ver Eduardo Cunha presidindo o processo. O Supremo poderia nos ajudar, tirando-o de lá. Há provas abundantes. Haveria apenas um pequeno transtorno, desses que vemos nas obras: desculpem, mas é para o próprio bem do usuário.

A Lava-Jato segue, sob pressão intensa. O vazamento da lista de mais de 200 políticos na planilha da Odebrecht foi uma tentativa de deslegitimizá-la, ampliando o front dos descontentes. A lista só teria valor se houvesse clareza sobre a legalidade da doação. Houve um tempo, não muito longe, em que a Odebrecht era considerada uma doadora legítima. Conferia até certo prestígio à lista das doações. No mesmo período em que a lista vazou, a Odebrecht comunicava que faria uma contribuição definitiva, uma delação premiada. Isto sem combinar com os procuradores, nem iniciar negociações com eles. Quando a lista for adequadamente investigada, será preciso separar quem recebeu doações legais, quem recebeu ilegais e quem tinha influência nas obras tocadas pela Odebrecht.

O Brasil amadureceu para não cultivar bandidos de estimação, nem no governo nem nas forças contrárias a ele. Tudo será esclarecido sem que se perca o foco: os saqueadores da Petrobras e um governo que afunda o país a cada dia.

A aliança das empreiteiras com governos no Brasil é antiga. No meu entender, é responsável pela fragilidade de nosso planejamento. São elas que ditam o rumo. Estavam organizadas num cartel chamado Sport Clube Unidos Venceremos. Unidos perderam. E naufragaram junto com o governo do PT que as levou a um nível de sofisticação e deboche sem paralelo na História. Os próprios apelidos com que os diretores da Odebrecht tratavam os políticos agraciados revelam como viam todo o sistema de doações como uma farsa. O discurso público era de viabilizar eleições democráticas.

Numa semana mais calma, comparada às que virão, posso refletir um pouco sobre como o impeachment é apenas uma condição para que o Brasil comece a mudar na direção de uma verdadeira democracia. Os que defendem Dilma em nome da democracia omitem o mensalão e o Petrolão, verdadeiros ataques à democracia. O que adiantava estar no Congresso debatendo com deputados previamente comprados pelo governo? De que adianta fazer campanha contra máquinas poderosas, azeitadas pelo dinheiro da corrupção? Este tipo de democracia é uma fraude. Sei porque vivi intensamente todos esses anos, desde a retomada da democratização.

Na verdade estou até escrevendo um livrinho, “Democracia Tropical, cadernos de um aprendiz”. A expressão aprendiz não é fortuita. No século passado, desprezávamos a democracia e lutávamos pela ditadura do proletariado. Quando vejo um militante de esquerda, como Guilherme Boulos, dizer que seu movimento vai incendiar o país em caso de impeachment, leio incendiar o país contra a Constituição. Só espero que a violência contra a democracia seja tratada com todos os instrumentos democráticos. Não cair na tentação de atropelar a lei. O consenso democrático é uma força tranquila, à altura da paz dominical das grandes manifestações pelo impeachment. Não creio que a oposição dará a Lula seis meses de trégua. Sinceramente, daqui a seis meses ninguém sabe onde estará. Começou o outono, e de Curitiba costumam soprar ventos frios.

'Pelé' chegou tarde

O governo de Dilma Rousseff se aproxima do final. O impedimento da presidente é o cenário básico de 9 entre 10 consultorias de política país afora. A conversa corrente entre os consultores políticos é que somente um fato novo extremo –por exemplo, suicídio do ex-presidente Lula ou mesmo um atentado ou algo do gênero– seria suficiente para estancar o processo político de impedimento da presidente.

A crise econômica resulta da sobreposição de duas dinâmicas: o péssimo desempenho da produtividade, que resulta dos efeitos defasados do desastrado intervencionismo da nova matriz econômica, em associação a uma crise fiscal aguda que redunda em desequilíbrio estrutural das contas públicas.

Ao longo de 12 anos, de 1999 até 2010, nosso desequilíbrio fiscal ficou escondido, pois nesse período a receita recorrente real da União cresceu a 6,8% ao ano, para um produto real que crescia a 3,4% ao ano.

De 2011 até 2014, a receita real recorrente da União passou a ter um comportamento normal: cresceu à mesma velocidade da atividade econômica. Quatro anos de vida normal da receita foram suficientes para tornar o superavit de 2% em 2010 em um deficit recorrente de 1,5% em 2014.

No primeiro mandato, a presidente decidiu não enfrentar a agenda fiscal estrutural. Empurrou com a barriga quatro anos. Para esconder os problemas fiscais, utilizou diversos artifícios: receitas não recorrentes, contabilidade criativa e, por fim, pedaladas fiscais.

Para ganhar as eleições, mentiu de A a Z. Aos seus eleitores e à sociedade. Empregou políticas que, ao custo de agravar ainda mais nossos desequilíbrios, sustentaram o emprego e a renda até a eleição. Adicionalmente, protagonizou, sob a liderança de João Santana, campanha agressiva e mentirosa demonizando os adversários. Muitas pontes foram queimadas.

O volume enorme de mentiras, a alteração abrupta do desempenho econômico, as pontes queimadas na campanha, agravadas pela incompetência política aguda nos primeiros cem dias do segundo mandato, minaram qualquer capacidade de governar da presidente. O Pelé do PT foi chamado tarde demais. Talvez, há seis meses, teria dado tempo.

Em maior ou menor grau, todos praticam estelionato eleitoral. Fernando Henrique Cardoso praticou em relação ao câmbio, mas não em relação ao ajuste fiscal. Na política, a quantidade importa.

É possível argumentar que as eleições presidenciais americanas são ainda mais violentas –é verdade. Mas as instituições políticas americanas são majoritárias, não requerem no dia seguinte da eleição o nível de consorciativismo requerido por nossas instituições.

Aqui é necessário entender a lógica do sistema e jogar segundo as regras: as formais e as informais. A presidente ganhou perdendo. É presidente, mas não governa.

Em vez da bela imagem de FHC passando a faixa a um candidato oposicionista, legando uma economia crescendo pouco mais de 2% e um superavit primário de 3% do PIB, teremos a presidente saindo pelas portas dos fundos do Palácio do Planalto, que será ocupado pelo seu vice, sabe-se lá até quando, e a economia na maior depressão dos últimos 120 anos.

O erro do PT foi jogar o jogo da política sem se preparar para o retorno à oposição. Pagar qualquer preço para se perpetuar no poder é, do ponto de vista do longo prazo de um partido, estratégia desastrosa. Persistir na estratégia de alongar esse governo somente aumentará os custos para o país e para o PT.

Não é preto e branco

Se preto e branco fossem as únicas cores da realidade, tudo seria mais fácil. Haveria somente duas opções para qualquer problema. E número limitado e pequeno de opções. Seria bom se fosse verdade. Infelizmente, não é. Imagens em branco e preto são sempre formadas por tons de cinza. Infinitos tons de cinza.

Visões bipolares da realidade não oferecem informação ou ações uteis. Servem apenas para enganar os sentidos. Justificam comportamentos questionáveis. Preservam o status. Tornam inexequível qualquer tentativa de reforma ou mudança.


Explicar desafios, riscos, problemas e custos através da batalha entre bom e mau já não satisfaz, nem mesmo como desculpa. Justificar o estado de coisas com vitimizações e mistificações apenas serve para desviar o foco. E, às vezes, não nem para isso serve.

Mistificações protegem os culpados, obscurecem a analise, e matem o status quo. Por isso, e não somente por isso, devem ser evitadas. Culpados, claro, devem sempre responder por suas ações, sem que suas biografias sejam consideradas escudos ou desculpas para delinquência.

Mas não deixa de ser perturbador o tamanho, a frequência, e o numero de pecados. E, claro, o volume e importância dos pecadores. Muita gente, muito frequente e muito grave para ser coincidência.
Por traz de tantos comportamentos discutíveis existem razões coletivas. E estas, devem ser identificadas, endereçadas e corrigidas. Apenas punir pecadores sem tomar medidas que impeçam a reincidência futura destas condutas não é suficiente. Demorou a chegar onde chegamos. E nada indica que sairemos rápida, ou facilmente. Tudo indica, será travessia lenta e sofrida.

Como todos os grandes desastres, sua gênese foi discreta, quase imperceptível aos olhões nus. Começou com um país cansado da desigualdade. Justiça social precisava mesmo ser incluída na agenda. E foi assim que um país inteiro abraçou ideias e ações. E esqueceu-se de controlar sua execução.

Sem controle, boas intenções se tornaram condutas criminosas. Fins nobres serviram como justificativa para condutas não republicanas. E os erros se espalharam como vírus. Insidioso, resoluto, rápido e fatal, infectou instituições, organizações, mentes e almas. Até que o errado virou norma.

E como é comum nos casos em que as ações traem os valores, criou-se narrativa para justificar os (como gostam de dizer) malfeitos. Negam-se os fatos. Quebram-se os termômetros. Eliminam-se os mensageiros. Discutem formas, processos, e chicanas enquanto o conteúdo é deixado em segundo plano, e, de preferencia, ignorado.

Felizmente, já não mais é possível tampar sol com peneira. Impossível reduzir tudo a obsoleta narrativa maniqueísta. Não cola mais. Espero.

A agonia de Dilma em verbetes

Chega às livrarias nos próximos dias, pela Record: “Que horas ela vai? - O diário da agonia de Dilma”, de Guilherme Fiuza.  São frases e tiradas sarcásticas que Fiuza escreveu ao longo dos anos Dilma, agora retrabalhadas para o livro, que é organizado em verbetes. O subtítulo — O diário da agonia de Dilma — o resume.

“Dilma afirma que a democracia brasileira é adolescente. Ou seja, terá que responder também por corrupção de menor.”
"Erenice girou quase R$ 500 milhões fraudando a Receita. Ela era braço direito de Dilma. Se fosse o esquerdo também, chegaria fácil ao bilhão".
“Neta do Lula mente para atacar O Globo. É a prova de que o DNA do messias atravessa intacto pelo menos duas gerações.”

Lula, exposição necessária

Via Crúcis
Lula, Dilma Rousseff e a tropa petista ficaram escandalizados com a decisão do juiz federal Sergio Moro de suspender o sigilo dos autos da 24.ª fase da Operação Lava Jato. Eriçaram-se especialmente com a divulgação dos grampos que captaram conversas telefônicas de Lula durante 27 dias. O caudilho e sua criatura, desesperados, vociferaram contra o secundário para tentar fugir do essencial: a presidente da República cometeu crime de obstrução da Justiça, dando à Câmara dos Deputados motivos mais que suficientes para avançar no impeachment. É disso que se trata.

Informado pela força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, concordou com o pedido para a revogação do sigilo das interceptações telefônicas que captaram uma conversa entre a subpresidente Dilma Rousseff e o presidente de fato Luiz Inácio Lula da Silva. Janot disse que a divulgação da conversa entre Lula e Dilma não afrontou as garantias constitucionais da Presidência, pois o alvo da interceptação era o ex-presidente, que não contava com foro privilegiado.

O governo tenta desviar o foco do principal, que é de grande relevância: o crime de obstrução da Justiça praticado pela presidente da República. A divulgação do diálogo entre Lula e Dilma evidencia que o intuito da nomeação de Lula para a pasta da Casa Civil foi blindá-lo do pedido de prisão preventiva que seria examinado pelo juiz. Tal gravação comprova que foram feridos quatro princípios fundamentais da administração pública, listados na Constituição da República: o princípio da moralidade (nomeação para ministro de Estado de um investigado por corrupção), o da impessoalidade (nomeação no interesse pessoal do amigo, e não no interesse público), o da eficiência (nomeação exclusivamente para blindá-lo, não em virtude dos atributos para o exercício do cargo) e o da legalidade (desvio de finalidade na nomeação).

Sergio Moro tinha o dever de tomar a providência. Se não o fizesse, seria até caso de prevaricação. Como salientou recente editorial do jornal O Estado de S. Paulo, esse “episódio mais a divulgação das gravações feitas com autorização da Justiça das conversas telefônicas de Lula prestaram ao País o importante serviço de mostrar exatamente o que o chefão do PT, a presidente Dilma e seus interlocutores pensam a respeito do atual cenário político. Graças à correta iniciativa do juiz Sergio Moro de levantar o sigilo das gravações, os brasileiros puderam constatar, de maneira indesmentível, que com essa gente não há ‘conversa republicana’”.



O que se ouve nos diálogos de Lula mostra a recorrente intenção de cometer ilegalidades e de usar o Estado em seu proveito e proteção. “Era preciso você chamar o responsável e falar ‘que porra é esta?’”, ordenou Lula ao ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, referindo-se à Receita Federal. O ex-presidente havia sugerido ao ministro acompanhar o que a Receita fazia juntamente com a Polícia Federal, avisando que o Instituto Lula mandaria para ele as informações sobre a atuação dos fiscais. O ministro diz: “Conta com a gente para o que der e vier”. Que apoio o ministro oferece ao ex-presidente?

Lula continua: “Você precisa se inteirar do que eles estão fazendo no instituto”. O ministro comenta que “eles fazem parte”. Quer dizer que a Receita integra a Operação Lava Jato. Lula diz que, se “eles fizessem isso com meia dúzia de grandes empresas, resolvia a arrecadação do Estado”. Diante dessa proposta de uso da Receita, o ministro diz “uhum”.

Depois de mandar que o ministro chame o responsável para admoestá-lo com palavrões, ele dá a lista dos que gostaria que fossem alvos, “a Globo, o Instituto Fernando Henrique Cardoso, o SBT, a Record”, e solta outros palavrões. O ministro em resposta pede que Paulo Okamotto envie para ele os papéis do instituto. Lula reclama de que uma investigação contra a revista Veja está parada desde 2008. E manda outro palavrão aos agentes da Receita Federal. O ministro disse que mandou apurar a razão de haver “velocidade diferente” de investigação.

Ao contrário do que Lula costuma apregoar, nada no diálogo é republicano. É uma tentativa clara de uso e controle da Receita Federal.

Enlouquecidos com o poder, Lula e os companheiros se mostram nos grampos em toda sua feiura moral. Debochados, grossos, cínicos, preconceituosos, arrogantes. Os melhores trechos são aqueles em que Lula e seus seguidores revelam o que têm por dentro: mentira e hipocrisia.

Numa conversa com a presidente da República, por exemplo, Lula se queixa da imprensa e da Lava Jato. Reclama da falta de reação: “Nós temos uma Suprema Corte totalmente acovardada, nós temos um Superior Tribunal de Justiça totalmente acovardado, um Parlamento totalmente acovardado. Somente nos últimos tempos é que o PT e o PCdoB começaram a acordar e começaram a brigar. Nós temos um presidente da Câmara fodido, um presidente do Senado fodido. Não sei quantos parlamentares ameaçados. E fica todo mundo no compasso de que vai acontecer um milagre e vai todo mundo se salvar. Sinceramente, eu tô assustado com a República de Curitiba”.

Na imagem produzida pelo marketing petista, o governo apoia as investigações e a independência do Judiciário. No escurinho do celular, Lula quer esculhambar as instituições e acabar com a Lava Jato.

O juiz Sergio Moro atendeu ao princípio da publicidade ao retirar o sigilo da gravação, já que o interesse público justifica claramente sua divulgação. Não houve invasão da privacidade do ex-presidente. A informação era um dever. É uma clara questão de interesse público. Os grampos rasgaram a embalagem e mostraram o produto. Lula, despido das lantejoulas de João Santana, é torpe e indigno. Um triste capítulo da nossa História.

Brasil fica para depois

Passear pelas milhares de linhas assinaladas a cada dia, mesmo a cada hora, se intoxicando de informação, propicia a quem quer colocar tudo num saco de gatos para poder se safar. No quebra-pau destes tempos no país, mais do que nunca há que se pensar, e muito, sobre os acontecimentos, que não são poucos. 

O que está em jogo é a briga pelo poder com a judicialização do Legislativo, a politização do Judiciário e a vitimização do Planalto. O poder petista embaralhou as regras, pois está aí para confundir. Quanto mais embaralhado, melhor. Ou seria quanto pior, melhor?

Nesta confusão entre conceitos e brasileiros, o que temos certeza é que o governo deixou de governar e levou o país para o brejo, por livre e espontânea vontade. Deixou de se explicar, como os petistas fugiram sempre de qualquer explicação, preferindo apelar para manipulações retóricas quando não para o ilusionismo de promessas e a arregimentação das massas (pagas).

Os erros de Dilma sempre foram claros. Péssima administradora e ainda pior conciliadora, mostrou arrogância até em errar como quando presidiu o Conselho da Petrobras ou ocupou a Casa Civil. Não há defesa que sustente sua prepotência de também gerir a articulação política. E agora demonstra o desastre total em respeitar a faixa presidencial. Saiu pro pau contra a Justiça, quase aparelhou o governo e investiu no bero troglodita partidário. Achou-se dona do Estado, quando é apenas mera servidora com prazo de validade.

A chamada Oposição, que sempre foi cúmplice na maracutaia com culpa no cartório, não tem nada com a crise econômica, porque não manda no Ministério da Fazenda. Jogar a culpa no Legislativo pelo mal funcionamento da economia é como Lula jogar o desastre do desemprego no colo de um juiz de 1º instância. Confete para alegria dos militantes.

Quanto ao PT e Lula, são o que eram quando oposição: não há adversário, há inimigos que não pensam como nós. É de um primarismo político extremo bem próximo do autoritarismo dos anos 1960. Os argumentos que usam cheiram a naftalina e nunca se adaptaram a novos tempos como apregoam. Nunca explicaram a participação no mensalão, mesmo praticamente envolvidos com eminentes figuras do partido presas. No petrolão, também recusam explicações sob alegação de inocência.

Se prenunciam um golpe, é para se vitimizarem. Erraram amplamente como partido e governo. Não podem culpar outros pela atual situação e atacarem o impeachment que é constitucional. Mais uma vez erram ao irem contra a Constituição e jogarem todos seus batalhões mercenários neste lance.

Nesta sucessão de erros Dilma, Lula e o PT esqueceram o Brasil para se dedicarem demagogicamente à luta contra o fim do governo. Como um bando vira-lata, se degladiam pelo osso como garantia de sobrevivência.

Talvez seja o maior crime que cometem: incendeiam o país, confundem cidadãos, embaralham poderes, em nome de assegurar o Poder. Ah, o Brasil, bem, fica para depois, mas está nos planos petistas, apenas como o osso que os mantém livres do xilindró e sobrevivam nos vinhos e charutos, no melhor estilo republiqueta.

'Profissionalismo'

Isso significa conseguir o que se quer por meio de mentiras e manipulações. Significa ordenar nossas prioridades segundo a cobiça e a vgantagem, em lugar do desejo de ver a bondade e a justiça prevalecendo no mundo. Se esse é o "profinalismo" a que o senhor se refere, não gosto dele e não tenho vontade de adquirí-lo
Kazuo Ishiguro

O Brasil que queremos

Vê-se em todos os espaços o reconhecimento da importância das redes sociais na construção de uma nova realidade política e social. No mundo e no Brasil. É inegável que a internet, de alguma forma, substituiu parte considerável da imprensa na sua capacidade de penetrar na consciência das pessoas para fazê-las presentes em torno de temas antes reservados a segmentos bem identificados, muitos quase sempre próprios à classe política e às lideranças de acaso. A denúncia, o debate e a participação política se deslocaram para os meios digitais, e é daí, para quem fez tal opção, que se espera que as decisões emerjam. Nessas redes seus seguidores são amealhados e também aí se organizam concentrações, alegres encontros de domingo e veementes protestos. Soluções, nem sempre. Política, mais do que nunca, virou coisa de político, essa classe hoje evitada e segregada, de forma horizontal, numa generalização no mínimo perigosa, mas certamente desconstrutiva, míope, despótica. Os partidos também viraram lixo. Verdade que não é totalmente sem razão: nossos políticos, com exceções, claro, construíram essa repulsa, hoje consolidada na consciência de uma sociedade, reconheçamo-nos, pouco presente, omissa, imediatista e mal servida na estruturação de suas decisões. As que se dão através do voto, mais especialmente, torpe e infame. Escolhemos mal, elegemos pior e porcamente, no atacado.


Certamente é que hoje a opinião no Brasil é o resultado dos conceitos forjados nas redes sociais e os polos se dividem entre vermelhos ou coxinhas. Qualquer uma das duas designações é, no confronto de ambas, pobre, abominável, ineficaz a não ser para gerar palavrões e sopapos. São identificados como quem grita ‘fora’, é contra a corrupção, contra a bandalheira, contra o nepotismo, os favores pagos pelo dinheiro público, contra a alta carga tributária. Bem pensando, todo Brasil quer mudanças. Propostas, temos poucas; do preço que se pagará por elas ninguém quer saber, mas se desejam mudanças. Queremos reformas. Somos, todos, contra a corrupção e as bandalheiras, especialmente porque ela não é uma prática horizontalizada, republicana; esta que combatemos está reservada a uns poucos ‘felizardos’, ladrões, grupo que, graças a Deus, não integramos. Também não aprovamos o nepotismo, o empreguismo, os favores obtidos na intimidade dos gabinetes. Somos concursados, ainda que um dia alguns tenham ingressado na folha do serviço público em cargos menores e obtido promoções das formas mais abomináveis e imorais; não importa o jeitinho. Somos também contra a alta tributação do trabalho e da produção, muito embora muitos aceitem comprar produtos e serviços mais baratos sem nota fiscal, sem recibo, sem registros, o que frauda a arrecadação de impostos. Dependendo, somos contra conquistas dos trabalhadores ou por elas lutamos. Questão de lado e opção de justiça social.

O certo é que estamos longe do ideal. Não se constrói uma nação com falcatruas, com negociatas, com mentiras, com o assalto sistemático e criminoso ao caixa do erário e ao patrimônio público. Mas também não chegaremos a lugar algum com a intransigência, com a segregação, com o ódio, com a força e com a violência. Precisamos de coragem, de grandeza, de renúncias, de participação, de reformas urgentes, reais e factíveis. Querendo ou não, virar essa página vai requerer sacrifícios. Trabalho e consciência nacional.

Dilma precisa contar o que faz para dormir 'bem'

Desde que o governo Dilma começou a deslizar para o caos, o país espera por um sinal de que o fim está próximo. O desembarque do PMDB, nesta terça-feira (29), talvez fique, no resumo do ocaso da gestão petista, como uma apoteose às avessas da impotência que desgoverna o Brasil. Convém dizer “talvez” para não correr o risco de carbonizar a língua. A qualquer momento pode surgir uma antiapoteose mais marcante.

A crise se arrasta há tanto tempo que já existe uma coleção de episódios que poderiam funcionar como bons epílogos. Mas quando a coisa parece estar mal, tudo fica muito pior. No instante em que o Planalto assimila a notícia de que o Delcídio foi gravado tentando comprar o silêncio do delator Cerveró, vem a revelação de que o senador também suaria o dedo.


Na hora em que as denúncias do ex-líder do governo ganham as manchetes, fica-se sabendo que o Mercadante foi gravado oferecendo vantagens a Delcídio para que travasse a língua. No momento em que o ministro mais chegado à presidente ofende a inteligência alheia com o lero-lero de que agira por razões humanitárias, a presidente resolve dar um autogolpe, nomeando o Lula para a Casa Civil.

A plateia mal havia digerido a conversão do foro privilegiado em “desaforo privilegiado” e o Sérgio Moro enrolou na garganta de Lula as fitas do grampo em que o morubixaba petista soa fora de si, escancarando o que tem por dentro.

Ainda soava no noticiário o diálogo em que Dilma informa a Lula que está enviando pelo “Messias” o ato de nomeação —para ser usado “em caso de necessidade”—quando sobreveio a liminar do Gilmar Mendes. Nela, o ministro do STF susta o salvo-conduto e devolve Lula à “República de Curitiba”. O juiz Moro não teve nem tempo de saborear o retorno, já que o Teori Zavascki mandou silenciar os grampos até que o Supremo decida o que deve ser feito.

Assim tem sido a rotina de Dilma. Quando conserta a antena do Planalto, estoura a privada do Alvorada. Não passa dia sem que haja um novo problema. Como se não bastasse a divisão interna do PT e todo o resto, o PMDB anuncia que irá para a oposição nesta terça-feira. O PP ameaça desembarcar na sequência. O PR e o PSD também.

Dilma repete aos auxiliares algo que disse na semana passada a jornalistas estrangeiros: “Não sou uma pessoa depressiva. Eu durmo bem à noite”. Não sei quanto a você, mas eu quero uma porção do que Dilma está comendo, bebendo ou inalando, seja o que for. Diante de tudo o que se passa, quero viver no país que embala o sono da presidente da República, seja ele onde for.

Quando impeachment era legal...

Agonia de uma lenda

Acontece no Brasil algo tão transformador quanto a luta contra a corrupção. É o desmascaramento da mentira como instrumento de governo, da ficção como prática política.

A investigação conduzida pela operação Lava-Jato nos trouxe de volta ao mundo real. Revelou mais do que um gigantesco crime organizado por um partido político, acumpliciado com empresários inescrupulosos. Desvelou o caráter impostor de lideranças que abusaram durante anos da confiança de seus eleitores. Com a mão direita, ofereciam Bolsa Família e Minha Casa Minha Vida, políticas necessárias e louváveis. Com a mão esquerda, assaltavam a Petrobras, destruíam a golpes de desonestidade e incompetência a economia do país, gerando desemprego, o que realimenta a pobreza. Enquanto enriqueciam suas contas bancárias. No botim do PT brilha, roubada, a esperança dos pobres. E isso é o mais imperdoável.

Investigado por crime de ocultação de patrimônio, o ex-presidente Lula foi para as ruas reavivar sua lenda e, com gestos histriônicos, garantir que o perseguem porque “eles” não querem que os pobres melhorem de vida.

Quem são eles, esses personagens da ficção de Lula? Os milhões de brasileiros que país afora saíram às ruas contra a corrupção? São milhões de malvados, reacionários e egoístas? Nessa ficção de péssima qualidade, o justo precisa dos maus, precisa de um algoz para ser vítima.

A varinha de condão do pai dos pobres transforma, então, as manifestações contra a corrupção e o fracasso do governo em artimanha da direita. Divide o país entre direita e esquerda, retrocedendo em meio século a nossa história, desqualifica o que hoje emerge com força: a consciência democrática, que abriga esquerda, direita e demais as nuances de opinião, contanto que respeitem a lei.

A ficção que Lula e seu partido escrevem sobre si mesmos, com a assessoria do ilusionista João Santana, que já está preso, não resiste à capacidade de discernimento que a população brasileira desenvolveu nos últimos anos. O aumento da escolaridade, a informação ampliada, o debate intenso nas redes sociais e a retroalimentação desses fatores amadureceram uma sociedade com senso crítico, capaz de formar, por si mesma, suas convicções. Depois de tantos anos jogando com a fé cega de seu eleitorado, é difícil para o ex-presidente admitir que o encanto tenha se quebrado.

Seu partido, na ficção, mantém viva a esquerda brasileira. Na vida real, matou-a. O que a direita não tinha conseguido fazer ele fez. Jogou na vala comum da criminalidade uma causa generosa que ainda mobiliza muitos militantes honestos, hoje atarantados, como mobilizou a minha geração na luta contra a ditadura, fundadores cuja memória o PT desrespeitou, frequentando doleiros e offshore. Acordou uma direita adormecida há três décadas, que encontrou nos seus desmandos o argumento fácil para abrir uma brecha no espectro político até então blindado a ela.

Acuado pelos próprios fracassos, escuda-se no papel de defensor dos pobres. Ora, não são os ideais de justiça, de combate à pobreza e de equidade — que não são propriedade de nenhum partido — que estão em causa. É um sistema de poder que, construído sobre a mentira, nas últimas eleições se elegeu prometendo o que sabia impossível cumprir. E não cumpriu.

Quem ganha com o descrédito dessa ficção não são os políticos de oposição, é o Brasil. O Brasil que está sendo passado a limpo pelo trabalho da Justiça, um país onde as instituições estão funcionando, apesar do baile de fantasmas que ainda dançam no Congresso Nacional e que, na mira dos juízes, têm seus dias contados.

Esses tempos de tensão e desavenças são o preço que a sociedade está pagando pelo difícil enfrentamento da verdade, pela agonia da lenda. São as dores do parto de um novo país. Duas grandes manifestações pacíficas, cada uma juntando milhões de pessoas, deram um relevante testemunho sobre a solidez da nossa democracia.

Essa jovem democracia quer viver na realidade. Esquerda e direita são categorias anacrônicas que não dão conta do mundo contemporâneo. Vai ser preciso encarnar o desejo de uma sociedade mais justa em ideias e propostas que leiam nossa sociedade atual e, sobretudo, em uma gente nova que está emergindo dos milhões que desfilaram nas ruas no dia 13 de março, que não foram guiados por ninguém e sequer abriram espaço aos velhos políticos de oposição. Não seguiam líderes, apenas exprimiam um tributo merecido à coragem do juiz Sérgio Moro.

A mentira tem autoria, serve ao seu autor. O fato é o autor da verdade. E a verdade serve a todos.
Rosiska Darcy de Oliveira

A democracia, não o demo

Frequente em discursos de muitos, até daqueles que por ela não nutrem qualquer apreço, a democracia vem sendo vítima do governo brasileiro, um serial killer obstinado que finge o inverso, mas tudo faz para aniquilá-la.

Cotidianamente, a doutrina que rege mais da metade das nações do mundo tem sido espancada por aqueles que teriam a obrigação maior de praticá-la e protegê-la, mas que só se importam em preservar a própria pele.

Democracia é um conceito complexo. Exige muito de todos. Até os países que exibem maturidade e solidez derrapam. Levantamento da revista The Economist, Democracy Index 2015, aponta que apenas 20 dos 96 países enquadrados como democracias exercem o regime em sua plenitude. O Brasil aparece entre as “democracias imperfeitas”, em 51ª posição, com notas que vêm decrescendo a cada ano. Em 2006, quando a série iniciou, o país alcançou 7.38 pontos. Agora, 6.96, com perdas significativas na participação popular e no funcionamento do governo.

Uma imperfeição que a presidente Dilma Rousseff, o ex Lula e o PT têm feito questão de acentuar.

“Em defesa da democracia”, Dilma usa o Palácio do Planalto para bradar “não vai ter golpe” e outras palavras de ordem contra o seu impeachment. De uma só vez cede a sede do governo ao seu partido e golpeia de morte a instituição Presidência da República, que dela quer se afastar e não sentirá saudade alguma quando ela se for.

“Em defesa da democracia”, movimentos autoproclamados populares ameaçam incendiar o país caso a presidente seja legalmente afastada.

“Em defesa da democracia”, Dilma e o PT atropelam tudo e todos para fazer o ex Lula ministro e, assim, poupá-lo de eventual prisão iminente.

“Em defesa da democracia”, Lula solicita regalias a ministros para se safar da “perseguição” da Lava-Jato e denuncia que parte da oposição prepara um golpe, como se impeachment, com regras definidas pela Suprema Corte, fosse inconstitucional. E repete que ele, sempre ele, vai tirar Dilma dessa.

Tudo feito “em defesa da democracia”.

No palanque montado em um encontro de sindicalistas, na quarta-feira, 23, Lula expôs por completo a sua visão autocrática, mítica e mística. Um papel que em nada combina com a democracia. Depois de explicar que a elite conservadora tem dificuldade para aceitar que o povo cresceu em consciência e maturidade política e que isso foi fundamental para elegê-lo presidente, disparou a máxima: “Eu sou o resultado da consciência política dos homens e mulheres deste país”.

Fraca no que diz respeito à governança, a posição mediana do Brasil no ranking mundial de democracia começou a ser ameaçada em outra frente: a liberdade de expressão, que desde a primeira pesquisa conferiu as maiores notas ao país. Mas a insistência dos autointitulados defensores da democracia em acusar a mídia pelos dissabores de Dilma, Lula e seus asseclas, pode pôr isso a perder.

Useiros e vezeiros em inverter os sinais, os valores e o sentido das palavras, Dilma, Lula e os seus não enxergam outra saída a não ser a de tudo misturar. Todos são culpados pelos erros que eles e só eles cometeram e continuam a cometer. Polícia, Justiça e a maioria dos brasileiros, instigados pelas elites - exceto a elite de amigos presos em Curitiba - e pela mídia golpista são os responsáveis por todos os males, por todas as crises, pelo desemprego, pelo PIB negativo.

Ao insistir na insustentável existência de um complô de direita - um adjetivo que determina o lado físico e que na geografia política mundial nada mais diz -- escorraçam o Direito, substantivo que define aquilo que é justo, reto e em conformidade à lei.

À democracia, preferem o demo (demônio, diabo), verbete que a antecede no dicionário.