domingo, 6 de março de 2016

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'Caso Lula' põe democracia brasileira à prova

A entrada do ex-presidente Lula e sua família nas investigações da operação Lava Jato, que apura o maior escândalo de corrupção política da história do país, não poderia deixar de produzir um choque nacional e internacional.

Lula é mais do que um ex-presidente da República e seu partido e governos já foram referência da esquerda trabalhadora e sindical latino-americana.

Foi durante seus dois mandatos que o Brasil ocupou as páginas da imprensa internacional como exemplo de um país em superação, no qual dezenas de milhões de pessoas saíram da pobreza para recuperar a sua identidade e dignidade de cidadãos.

Esse choque, que chega num momento em que o país está fortemente dividido e polarizado no contra ou a favor do Governo Dilma Rousseff, poderá ser um teste importante para analisar a força das instituições democráticas e a capacidade da sociedade para metabolizar o trauma.

Lula é a alma e o todo do Partido dos Trabalhadores (PT), que está há 14 anos no poder, e se preparava para voltar a disputar a presidência em 2018.

Não é de estranhar, então, que a operação lançada pela Polícia Federal para recolher supostas provas de sua culpa nos escândalos de corrupção tenha sido duramente criticada pelo PT, que a considera “ilegal e um golpe para a democracia” e que lembra até os tempos da ditadura. O partido convocou seus militantes e os movimentos sociais a tomar as ruas para defender Lula.

Volta assim a ressoar o fantasma do golpe, desta vez não infligido pelos quarteis, mas pelas operações policiais e judiciais e pela pressão dos conservadores que apostam na queda do Governo.

A maior responsabilidade, neste momento, –à margem das naturais declarações oficiais de indignação do PT–, está nas mãos, entretanto, de todas as instituições do Estado e dos partidos do Governo e da oposição. Para eles, o maior imperativo deveria ser manter, a todo custo, a paz social hoje ameaçada.

O terremoto dos interrogatórios forçados de Lula junto à polícia no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, chegam, de fato, num momento de grande fragilidade do Executivo de Dilma Roussef, cada vez mais acuada e sozinha, e de uma recessão econômica considerada a maior do último quarto de século, junto com a ameaça de um aumento do desemprego e da inflação.

Portanto, é mais urgente do que nunca colocar, à frente dos cálculos políticos, a consolidação de uma democracia que o Brasil conquistou com sangue e dor, e que foi aplaudida pelo mundo.

O Brasil não é a Venezuela. Pode parecer um paradoxo, mas talvez o teste pelo qual passam Lula e o PT aconteça porque foi nestes anos, os de seu Governo e os de Dilma Rousseff, que os três poderes do Estado mais se fortaleceram e consolidaram sua autonomia.

Por mais difícil que possa ser para um personagem mítico como Lula ter que passar pelo infortúnio de ser levado à força para ser interrogado pela polícia, também poderia ser uma oportunidade para ele se defender em público de todas as acusações que rejeita energicamente.

Cabe também a ele agora colocar todo seu carisma e seus inegáveis dotes de comunicador de massas, especialmente com os mais pobres do país, para tentar unir a todos em uma nova esperança de renovação política e econômica, evitando que, como muitos desejariam, seu caso sirva para aprofundar as divisões e a violência.

O Brasil vive um delicado momento histórico, que precisa mais de bombeiros que de incendiários e no qual deve prevalecer a responsabilidade de todos.

Os governos e os líderes – mesmo aqueles aos quais o país mais deve a construção de sua democracia e de seu progresso econômico e social– passam, como tudo na história. O que deve permanecer, sem perder sua força, é a riqueza de um povo, que foi emblema de coesão como país, de convivência pacífica de suas culturas e religiões. Como me explicou a grande atriz brasileira Fernanda Montenegro, esta é uma sociedade que “não se envergonha, como vocês, europeus, de dizer que é feliz”.

Guerras e violência não se conjugam com este Brasil que tanto cresceu democraticamente. É uma sociedade que não jogou a toalha nem renunciou aos seus sonhos de superação, hoje ofuscados pela crise econômica e política.

Daí essa irritação e desespero das pessoas. Irritação e desespero que os responsáveis devem prestar atenção para não degenerar em ódio e violência que só ajudariam a agravar a crise, em vez de resolvê-la.

O mundo hoje volta a olhar para o Brasil.

Esperemos que ele nos surpreenda positivamente de novo.

Pimenta nos outros, pode. Em Lula, não. É isso?

Na última sexta-feira, o ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, foi a primeira voz de respeito a censurar a decisão do juiz Sérgio Moro favorável ao emprego da condução coercitiva para que Lula fosse depor aos procuradores da Lava-Jato.

"Condução coercitiva? O que é isso? Eu não compreendi. Só se conduz coercitivamente, ou, como se dizia antigamente, debaixo de vara, o cidadão que resiste e não comparece para depor. E o Lula não foi intimado", afirmou o ministro.

Condução coercitiva quer dizer condução obrigatória. De fato, Lula não fora intimado. Agentes federais amanheceram no seu apartamento de São Bernardo do Campo e o lavaram para depor em uma delegacia da Polícia Federal no aeroporto de Congonhas. Ele ficou ali por três horas.

Naquele dia, a prefeitos que se reuniram com ela no Palácio do Planalto, a presidente Dilma havia manifestado seu "absoluto inconformismo" com a "desnecessária" condução coercitiva de Lula, que "por várias vezes compareceu de forma voluntária para prestar esclarecimentos".

Dito assim, parece que Lula saiu por aí batendo em portas de delegados e de procuradores se oferecendo para esclarecer isso ou aquilo. Não foi assim. Intimado a depor várias vezes, ele atendeu a algumas intimações. E conseguiu driblar outras.

Das dezenas de vozes que protestaram contra a condução coercitiva de Lula, entre elas as de juristas, a voz de Rui Falcão, presidente do PT, foi a mais inflamada, a ponto de provocar tensão entre generais do Alto Comando do Exército, em Brasília. Rui disse:

- A condução coercitiva de Lula representa um ataque à democracia e à Constituição. Trata-se de novo e indigno capítulo na escalada golpista que busca desestabilizar o governo da presidente Dilma Rousseff, criminalizar o PT e combater o principal líder do povo brasileiro.

Tudo é golpe para o PT. Quando o escândalo do mensalão ameaçou encurtar o mandato de Lula, o PT falou em golpe. O pedido de impeachment de Dilma foi e é tratado como golpe. A humilhação de Lula foi mais um capítulo do golpe que está em marcha.

Está tudo bem, tudo muito bem, só não dá para entender uma coisinha: por que nenhuma das vozes que se revelaram inconformadas com a condução coercitiva de Lula se fez ouvir quando outros envolvidos com a Lava-Jato foram conduzidos coercitivamente para depor? Não repararam? Não se tocaram?

Só vale para os outros a condução coercitiva, para Lula, não? É capaz de valer para importantes empresários, alguns deles presos; ultimamente para políticos; e para gente comum. Aliás, para esse tipo de gente sempre valeu. Quem se incomoda com ela? Mas para Lula, não? Por quê?

Ex-presidente da República não tem direito a fórum privilegiado. Está sujeito à Justiça de primeira instância. Como os demais cidadãos, pode apelar de decisões da primeira instância às instâncias superiores da Justiça. E é só. Não tem direito a nenhum tratamento especial.

O mais espantoso é que Lula não foi o primeiro, nem o segundo, nem será o último suspeito da roubalheira na Petrobras a ser conduzido para depor “sob vara”, como prefere o ministro Marco Aurélio. Antes dele, 116 suspeitos foram alvo de condução coercitiva. Lula foi o 117º.

É como observa com razão a nota oficial distribuída, ontem, pela força-tarefa do Ministério Público encarregada da Lava-Jato:

"Houve no âmbito da Lava Jato 117 mandados de condução coercitiva. Apenas em relação à do Sr. Luiz Inácio Lula da Silva houve manifestação de opiniões contrárias. Conclui-se que esses críticos insurgem-se não contra o instituto da condução coercitiva em si, mas sim pela condução coercitiva de um ex-presidente da República".

Os procuradores reconhecem que Lula merece respeito, mas apenas "na exata medida do respeito que se deve a qualquer outro cidadão brasileiro".

Estão certos.

Lula, somente ele, é o responsável pela situação em que se encontra. Não foram seus adversários que o levaram a prevaricar. Não foram as elites que o forçaram a se corromper. Ninguém o obrigou a jogar na lama sua fama de homem decente.

Lula é vítima de Lula, da sua ambição desmedida pelo poder, do seu encantamento por um mundo ao qual sempre quis pertencer, da falta de solidez dos seus compromissos com valores e princípios que dizia cultivar. É triste que termine assim.

Não mandaremos Lula e Dilma tomar no c*. Vamos asfixiá-los com o oxigênio da democracia

A política se exercita segundo duas lógicas principais: a da publicidade e a do bunker. A primeira é própria dos regimes democráticos, que, segundo seus críticos, produz o milagre às avessas de equiparar os melhores aos piores. Em parte, a objeção é mesmo procedente.

É por isso que as democracias mais avançadas preservam alguns domínios do escrutínio da maioria. É o caso da ciência, por exemplo. Ainda que a sua dimensão ética possa e deva ser submetida ao debate público, não convém pedir que as maiorias decidam qual deve ser a estrutura do DNA. Sobre o dito-cujo, só uma postura é correta: a procura do “em si” da coisa. Nem o regime democrático é capaz de fabricar um para cada gosto.

Se a democracia não é o regime perfeito porque tanto os Schopenhauers como os idiotas valem um voto, ainda assim, já inferiu aquele, é o melhor de todos os regimes ruins. Seu oposto é a opacidade do “bunker”, que é típica das ditaduras, sim, mas que pode se manifestar mesmo num regime democrático.

Um vídeo espetacular circula na Internet. Jandira Feghali (RJ), deputada do PCdoB, conhecida por “Jandirão” em razão de seu estilo, da fineza da retórica e da delicadeza do pensamento, resolveu se comportar como cineasta de interiores. Depois do depoimento de Lula, ela flagra o ex-presidente da intimidade, numa conversa, segundo ela própria, com Dilma Rousseff.


O homem que, segundo o Instituto Lula, não tem nem usa celular se mostrava muito à vontade falando com a chefe da nação. Aos berros, expressou a importância que confere à Justiça: “Eles que enfiem o processo no c…”. E usou aquele monossílabo tônico de duas letras, que começa com “c” e termina com “u” — com assento e sem acento, na melhor fisiologia gramatical —, revelando, uma vez mais, as cavernas do pensamento onde se produz o autêntico petismo.

Como se nota, Lula gritava, como fazem os chefes mal-educados em seus ataques de assédio moral contra subordinados incompetentes ou, ainda que competentes, submissos. Submissa, Dilma é. Competente, sabe-se que não. Logo, suponho que, do outro lado da linha, ouvia-se apenas um muxoxo, uma fala presa na garganta, que não se voltava para o mundo; antes, ficava retornava ao diafragma, esmagada. Também a fala, na lógica do bunker, se exercita para dentro, não para fora.

No dia em que esse espetáculo grotesco veio a público, a presidente se desloca de Brasília para São Bernardo — com o nosso dinheiro, como tudo o mais — e vai visitar Lula em seu apartamento. Emprestava, assim, a solidariedade da presidente da República, não da amiga — já que tal dimensão deixa de existir quando se ocupa tal cargo —, àquele que é alvo de investigação, numa clara afronta à Justiça.

É a lógica do bunker se manifestando em plena democracia. Dilma sabe que, a exemplo de Lula, perdeu as ruas. E isso ficará bem claro no próximo dia 13. Os milicianos que saem em defesa do PT, do Poderoso Chefão e, secundariamente, da presidente são militantes ligados ao partido e a seus aparelhos. São a periferia da nova “classe social” que o PT representa no Brasil, para usar a expressão cravada por Milovan Djilas em 1957, título de seu livro, ao se referir ao sistema comunista (não só o iugoslavo), ao qual havia servido como presidente da Assembleia e vice-presidente. Mas sempre lutando por democracia, diga-se.

Djilas percebeu a impossibilidade de conciliar um regime de liberdades com o socialismo. Não estou atrás de medalhas, claro!, mas fui o primeiro no Brasil — tenho as provas, rsss — a associar as teses de Djilas ao PT. E era ainda o PT que disputava o poder. O livro é encontrável em inglês. Já teve tradução no Brasil. Acha-se em algum bom sebo, talvez.

A desnecessária condução coercitiva de Lula inflamou a nova classe, e quase nada de útil pode advir disso. Traz, no entanto, um efeito associado que pode ser positivo: levou Dilma para o bunker de Lula. Já não é possível distinguir, e é bom que não, o governo dela das artimanhas dele. É evidente que não existe “dilmismo”. Ela é mera funcionária da máquina de assalto ao estado em que se transformou o PT.

Mas existe o lulismo, ao qual intelectuais pés-rapados conferiram o estatuto de uma teoria do poder, que o Babalorixá de Banânia expôs ligeiramente na sua entrevista-pronunciamento. Ela consiste, como ele mesmo deixou claro, em garantir lucros formidáveis aos muito ricos e distribuir caraminguás aos pobres, silenciando-os com benesses mesquinhas, roubando-lhes cidadania em troca de alguns reais.

O vídeo feito por Jandirão e a visita de Dilma ao apartamento de Lula restarão para a história como aberrações que antecederam a queda da presidente e do lulismo.

Lula não estava mandando a Justiça enfiar o processo no monossílabo tônico sem acento terminado em “u”. Lá do bunker, ele mandava a democracia tomar no c…

Respeitado o devido processo legal, sem atropelo, sem afronta a nenhuma das garantias, há elementos que indicam que o lugar da dupla é a cadeia. Não os mandaremos tomar no c… Vamos asfixiá-los com o oxigênio da democracia.

PS: Desde que se lançou na política, Jandirão prestou seu primeiro serviço à democracia.

Agonia moral

O ex-presidente Lula perdeu a batalha mais importante de sua vida. Tem pela frente, ainda, um demorado tiroteio nas altas, médias e baixas cortes da Justiça Penal brasileira. Mas não tem mais esperanças de sobreviver a uma doença para a qual não existe cura conhecida: a destruição de sua força moral. Trata-se do conjunto de atributos que realmente separa os homens, e mesmo as nações, em matéria de sucesso ou fracasso, e ao qual se costuma dar o nome genérico de caráter. Sabe-se desde sempre o que entra nesse conjunto. Entram aí o valor da palavra dada, a reputação, o respeito aos outros e a si próprio, a capacidade de transmitir confiança. É a força que faz uma pessoa falar e ser naturalmente acreditada. É a coragem para assumir responsabilidades, enfrentar momentos adversos, não abandonar os amigos em dificuldade. É o exercício da honestidade e da integridade comuns. Em suma, é o que na linguagem do dia a dia se chama de “vergonha na cara” ─ ou honra pessoal. Muito mais que fama, força ou riqueza, é o que realmente faz a diferença. Fará toda a diferença para Lula. Sua batalha está perdida porque ele perdeu o bem mais precioso que poderia ter ─ a força moral decisiva para tornar-se alguém que valha a pena como pessoa e como homem público.

Hoje, vivendo acuado num prédio de escritórios do bairro paulistano do Ipiranga, com suas despesas pagas por magnatas, cercado não pela massa dos pobres que diz ter salvado, mas por negociantes de “marketing”, burocratas do PT, parasitas variados e uma armada de advogados que pouquíssimos brasileiros poderiam pagar, Lula está só. Do povo, nem sinal. O homem que tanto menosprezou os adversários falando de sua popularidade de 100% não pode ir a um campo de futebol ─ nem ao estádio do Corinthians, em Itaquera, cuja construção impôs para a Copa do Mundo de 2014, da qual não conseguiu assistir a um único jogo. Não pode ir jantar um frango com polenta em São Bernardo. Não pode ir a uma loja, comer um pastel de feira ou andar sem a proteção de um regimento de seguranças. Não pode ir ao infeliz sítio de Atibaia que tanto frequentou até faz pouco, e no qual empreiteiros amigos socaram uma fortuna em reformas ─ nem, menos ainda, a esse amaldiçoado tríplex do Guarujá. Não pode, no fim das contas, sair à rua ─ e, como se fosse um castigo, não pode gastar livremente no próprio país os milhões de reais que ganhou fazendo palestras para construtoras de obras públicas e outros colossos da elite empresarial brasileira. Que líder de massas é esse? Aos 70 anos de idade, Lula veio acabar metido na situação contrária à que Guimarães Rosa descreve num conto particularmente genial de sua vasta coleção de contos geniais, o Burrinho Pedrês. Como se lembram os leitores da história, o modesto burrinho sabia uma coisa mais importante que todas as outras, para quem, como ele, tinha sido sorteado com uma vida difícil ─ jamais entrava em lugar algum de onde não soubesse como sair depois. O ex-presidente entrou com tudo. Agora precisa sair, mas não sabe onde está a saída.

É certo que Lula não será ajudado, nessa procura por um caminho capaz de tirá-lo do buraco, por nenhuma das manobras que vem utilizando há trinta anos para dar a volta em seus problemas. A causa verdadeira do colapso que vive hoje é o fato de ter entrado em estado de coma moral ─ e isso não se resolve chamando um gerente de propaganda para bolar comerciais de TV, da mesma forma que “imagem”, por mais esperteza que se empregue em sua criação, não substitui caráter. Também não adianta gastar dinheiro com advogados que passam o tempo armando chicanas processuais e outros truques destinados a impedir que se julgue o mérito real dos fatos alegados contra ele; isso pode funcionar como estratégia de fuga, mas não cria valores em cima dos quais se consiga construir uma reputação. Não é possível sair do lugar em que o ex-presidente se enfiou distribuindo camisetas vermelhas, fretando ônibus e pagando diárias, sempre com dinheiro público, a milícias que se apresentam como “movimentos sociais”. Dá errado, cada vez mais, continuar atirando em Fernando Henrique Cardoso ─ isso para ficar apenas no alvo que se tornou sua ideia fixa ─ na esperança de provar que “todo mundo é igual”; quanto mais tentam fazer a comparação, mais chocantes ficam as diferenças de conduta entre os dois. Enfim: tem-se tentado de tudo, e nada dá certo. Continuará assim, pois nada altera a pane central que existe nessa história: Lula não é o homem que diz ser. Também não é o que seus admiradores, de boa-fé ou por interesse, acham que seja.

A desmontagem da estrutura ética do ex-presidente está sendo feita unicamente através de fatos, não de alegações; e são fatos que não precisam mais ser provados, pois todas as provas já foram exibidas e confirmadas. Mais: nenhum deles, até agora, foi apresentado ao público brasileiro pela oposição, que se limita a acompanhar sua divulgação na imprensa e fazer o mínimo possível de comentários.

A derrota, enfim, não veio por causa de nenhuma batalha dessas que fazem tremer a terra ─ nada de Waterloo, ou de invasão da Normandia no Dia D. Tudo veio acabar em mesquinharia e pequenez, nas miudezas miseráveis da reforma de um sítio de segunda linha, nas 200 caixas de mudança da “transportadora Cinco Estrelas”, nos desvãos de uma arapuca imobiliária que lesou 3 000 famílias com um golpe na praça. Não houve a discutir, nessa demolição, uma única questão de princípio, filosofia política ou consciência ─ ficou tudo exclusivamente numa conversa de fim de feira sobre quem é o dono do tríplex na cooperativa falida, quem pagou a cozinha Kitchens, quem mora de graça na casa de quem. Mais que qualquer outra coisa, ficou uma palavra-guia, a palavra que não pode mais calar na biografia de Lula: empreiteira, empreiteira, empreiteira. É aí, na hora da verdade, que ele encontrou de fato sua perdição.

Nada destruiu tanto a autoridade moral de Lula quanto seu convívio com as empreiteiras de obras brasileiras, durante e depois de seus dois mandatos. Nunca antes, em toda a história do Brasil, houve um presidente da República com tantos e tão íntimos amigos entre os empreiteiros. Alguém é capaz de citar outro? Em apenas quatro anos, de 2011 a 2014, momento em que a casa começou enfim a cair, Lula recebeu 27 milhões de reais para fazer palestras encomendadas pelos gigantes da construção pesada no país. Foi presenteado, também, com contribuições milionárias para sustentar as despesas do seu Instituto Lula ─ isso e mais viagens de jatinho, uma antena de celular a 100 metros do sítio que utiliza em Atibaia, e as obras de reforma nesse mesmo e malfadado sítio, que agora atormentam sua vida. Os presentes não vieram apenas das empreiteiras, certo, mas isso não melhora sua situação em nada ─ vieram de fontes mais sombrias ainda, como um consórcio de estaleiros que vivem de contratos com a Petrobras, o Banco BTG Pactual, um “centro de estudos” de Angola. Através da francesa GDF Suez, há traços até da inesquecível Astra Oil, que vendeu à Petrobras o ferro-velho da refinaria americana de Pasadena, algo tão parecido com uma negociata em estado puro, mas tão parecido, que até hoje não foi possível descobrir a diferença. Ganhar dinheiro fazendo palestras para essa gente está dentro da lei? Está. Está dentro da moral comum? Não está, e é aí que começa e acaba o problema. Um ex-presidente da República não pode, simplesmente não pode, aceitar dinheiro de empresas que dependem do Tesouro para sobreviver. É isso, e ponto final.

Como seria possível confiar na imparcialidade, na palavra e na integridade de valores de alguém que anda em tais companhias, ainda mais quando se sabe da influência que exerce no governo que está aí? Lula recebeu dinheiro das empreiteiras porque foi presidente do Brasil por oito anos, e não por seus conhecimentos em matéria de viadutos, ferrovias e usinas hidrelétricas; ninguém lhe daria um tostão furado se tivesse sido apenas presidente de sindicato. Lula diz o tempo todo que só chegou ao comando da nação porque os pobres votaram nele. Mas não vê nenhum problema no ato de transformar em dinheiro vivo, agora, o apoio que recebeu dos humildes ─ a quem deve tudo, inclusive sua transformação em milionário. O ex-presidente, de tempos em tempos, diz que tem o direito de ser rico. Tem, mas não tem. Não pode botar no bolso, sem se desmoralizar, 27 milhões de reais de empreiteiros ─ nem ser seu amigo íntimo, prestar-lhes serviços, permitir que lhe paguem despesas, aceitar que sejam sócios de um dos seus filhos e sabe-se lá ainda o que mais. Um homem público como ele não pode, nessas coisas, ser igual aos demais cidadãos. Tem de abrir mão de uma porção de confortos; é o preço a pagar para manter inteira a sua moral. Se achar injusto, bastará deixar a vida pública; ninguém é obrigado a ser presidente da República.

Lula acostumou-se a achar que tem direito a tudo, e não está sujeito a nada. Imaginou que pudesse ser o mais querido entre as empreiteiras ─ e que isso não iria lhe trazer problema algum. Achou que seus dois filhos pudessem ganhar milhões fazendo negócios com empresas que dependem do governo. Não viu nada de mais em meter-se com uma quadrilha que vendeu apartamentos na planta a bancários, roubou o dinheiro que recebeu deles e foi à falência sem entregar os prédios. Com exceção, claro, de um ou outro que foi concluído por uma empreiteira, mais uma, e reservado aos amigos ─ entre eles o que abriga o tríplex do Guarujá. O que Lula, que nem bancário é, estava fazendo no meio dessa gente? As histórias vão adiante e adiante; o que apareceu escrito aqui está muito longe de ser tudo. Mas é o suficiente. Este é um combate que claramente chegou ao fim.

Lula propõe anarquia que pode explodir o governo de Dilma

Ao lançar, como fez na entrevista coletiva de sexta-feira, a ideia de um movimento popular no país para defendê-lo das acusações que pesam sobre ele, o ex-presidente Lula na realidade está propondo as bases de uma anarquia, a qual, além de não lhe adiantar nada, pode explodir o governo Dilma Rousseff.

O que deseja Lula? Na realidade um confronto de parte da população que o inocenta e apoia contra o Poder Judiciário e o Ministério Público. A contradição é evidente, a colisão inevitável, cujos estilhaços serão remetidos contra o Palácio do Planalto e, portanto, contra a presidente Dilma Rousseff. Isso porque tal perspectiva não pode interessá-la para exercer seu mandato, cujo caminho já se encontra cheio de obstáculos. O maior deles construído pelo próprio Lula ao aceitar que Odebrecht e OAS pagassem por palestras e pelo acabamento do Guarujá e Atibaia, bens que sustenta não lhe pertencerem.

As contradições de Lula não terminam aí. Na, entrevista afirmou-se indignado contra sua condução ao depoimento à Polícia Federal, determinada pelo juiz Sérgio Moro. Porém, na realidade o ex-presidente não estava disposto a depor, pois se assim fosse não teria recorrido ao Supremo em busca de uma liminar que pudesse afastá-lo dessa obrigação. Tanto recorreu que a relatora do processo, Ministra Rosa Weber, negou-lhe a medida. Verifica-se então o seguinte: o ex-presidente diz uma coisa e na realidade age para obter o efeito contrário. Este aspecto da questão é o que mais o compromete e retira a força da realidade de suas afirmações.

De fato, o ex-presidente não deseja discutir ou esclarecer as acusações contra ele. Apenas tenta evaporá-las, o que revela um sentimento de culpa evidente. Afinal de contas, qual o motivo que o leva a tentar escapar das explicações? Ora, é a inconsistência de suas próprias declarações possíveis.

Falei no título na perspectiva de uma incursão para desencadear uma anarquia no país. É isso mesmo. Pois este aspecto, aliás bem analisado pela repórter Fernanda Mona, Folha de São Paulo de sábado, destaca bem a hipótese mais que viável de a campanha de Lula contra o Ministério Público e o Poder Judiciário desencadear uma série de conflitos em massa no Brasil. Anarquia evidente, porque não existe lógica alguma na tentativa de alguém contrapor-se à Justiça com base em manifestações populares.

Os confrontos que vão decorrer das manifestações podem detonar uma crise colossal no país, causando explosões seguidas com as quais Dilma Rousseff não poderá concordar ou se omitir.

Implantada a anarquia não estará em jogo apenas o destino de Lula. Estará em jogo principalmente o futuro do governo Dilma Rousseff.

O xeque-mate da Justiça e a aula magna de cinismo

Lindo dia este em que o país indignado assistiu eufórico à aula prática de civilidade a que o rei da era da canalhice foi submetido. Num xeque-mate, o juiz Sergio Moro aplicou uma lição simples: a de que ninguém está acima da lei. O jeca e respectivos devotos, refratários a essa luz civilizatória mínima para qualquer país se viabilizar, reagiram como sempre: reafirmando a mentira como um modo de estar no mundo e, para ser escuridão em manhã plena de luz, Lula responde ao xeque-mate da Justiça ministrando uma aula magna de cinismo.

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Insistindo em deformar a realidade, o jeca amputou a verdade mediante o vitimismo de drama de circo; a clivagem já ineficaz entre “nós” e “eles”, excetuado o bando devoto; a tentativa inútil de fazer o juiz Sergio Moro, a pessoa mais admirada no país atualmente, parecer detestável. Um metalúrgico não pode ter um sítio? Claro que sim: ao milionário Lula, assim como a qualquer cidadão, basta adquiri-lo honestamente e declarar o bem. Onde guardar 11 contêineres da mudança? Um bazar beneficente com os presentes cedidos pelo amigão dos pobres teria sido uma boa maneira de aliviar essa carga. Necessária a condução coercitiva? Pergunte-se ao procurador Cássio Conserino que não pôde colher o depoimento do casal fujão que debocha da lei.

A fala expelida das profundezas da pilantragem profissional germina naquilo em que é mestre: falsidade, truculência e arrogância que têm, no coração do caudilho, ninho indevassável. Do que mais precisa para triunfar um homem primitivo com esse talento insuperável para a farsa? Gerado no peleguismo sindical, amamentado no colo da ditadura, amadurecido nos braços das esquerdas na redemocratização, a Lula só faltava a chave do cofre e, de lambuja, um ambiente semicivilizado, inóspito à dissidência, ao cumprimento das leis e ao confronto político.

Dono da chave do cofre eleito presidente, tratou de degradar ainda mais o ambiente, o que o eternizaria na posse da chave, uma coisa garantindo a outra. Muito simples: cooptação de capitalistas selvagens, colonização ideológica, demagogia, sabotagem da democracia, compra de consciências. Até a manhã luzidia desta sexta-feira a que a Lava Jato e a conduta serena e segura de Sergio Moro nos trouxeram, acelerando o desmanche da farsa iniciado há algum tempo com a nação exangue que tenta se reerguer como pode, apoiada nas instituições falhas e tardias, no jornalismo independente que resiste e abandonada pela oposição.

Depois do depoimento, a fala de Lula traduziu um líder – para os devotos incuráveis – que, atingido, se fortalece e se apresenta para liderar, precisamente, os devotos incuráveis. Mas também mostra que, cego pela luz da manhã radiosa, não vê que ela vai raiar ainda outras vezes em desdobramentos saneadores do primitivismo que a súcia quis eternizar e que esse xeque-mate é apenas parte disso. O jeca que se vê como herói de dramas falsos ignora a verdadeira tragédia pessoal da farsa que se crê mito: como disse Isaac Asimov, na vida, ao contrário do xadrez, o jogo continua após o xeque-mate.

'Genocídio' dos vulneráveis

A corrupção afeta mais agudamente os brasileiros mais pobres. Quando o corrupto rouba dinheiro para benefício próprio, saúde, educação, alimentação, saneamento e outros direitos humanos básicos são negados aos setores mais vulneráveis da sociedade. A corrupção é um imposto pago pelos mais pobres de nossos países
José Ugaz, presidente da Transparência Internacional

Acima da lei e fora da lei


Enquanto um punhado de militantes petistas protestava contra a ação da Polícia Federal que conduzira Lula ao aeroporto de Congonhas, veio-me à mente imagem com a qual me deparei ontem no Google. Retrata um evento da campanha eleitoral de 2002. Lula, Genoíno, Mercadante, Berzoini e Alencar formam um abre-alas e marcham portando faixa, devidamente estrelada, com os dizeres "Quero um Brasil decente". Fácil compreender a decepção de quantos creram que a faixa expressasse um sentimento real.

Os fundadores do PT viam-se como agentes de um processo revolucionário. Frei Betto, em artigo de 2007, assim descreve os anseios dos vitoriosos de 2002: "A lua seria o nosso troféu. Haveríamos de escalar suas montanhas e, lá em cima, desfraldar as bandeiras da socialização compulsória". O nome disso é revolução. E nenhuma causa revolucionária consegue ser compatível com o Estado de Direito. A revolução por dentro do regime democrático, sem sangue, como sonhou o PT, é uma lavoura que, entre outros requisitos, precisa ser irrigada com dinheiro. Dinheiro para as campanhas eleitorais, para a militância e para os movimentos sociais controlados pelo partido, para manter operante um exército de jornalistas e formadores de opinião. É preciso ter e manter multidão de agentes que começam no sanduíche de mortadela, mas miram o topo da cadeia alimentar revolucionária, onde estão a lagosta ao thermidor e o Romanée-Conti. O sanduíche é meio e não fim de toda jornada socialista. Não conheço um só revolucionário que queira o comunismo para continuar batendo cartão e operando a mesma máquina.

Numa democracia, o poder é buscado dentro da regra do jogo, dentro da lei. No entanto, se o objetivo é revolucionário, pertence à própria natureza do processo que seus agentes se considerem acima da lei. A causa vem antes e lhe é superior. A lei que não convém à causa é iníqua e não merece respeito. Na primeira etapa, então, se instala esse sentimento de superioridade em relação à ordem jurídica. Face bem visível do que descrevo pode ser observada nos assim chamados "movimentos sociais". Quem se opõe às suas ações é acusado de criminalizá-los. Por quê? Porque quem está acima da lei não comete crimes.

É aí que se começa a explicar o incomparável desastre moral que acometeu o PT. A mentira vira argumento. Calúnia, difamação e injúria ganham utilidade política. Fatos são substituídos por versões. A verdade perde interesse e utilidade. E por aí vai a decência para o brejo.

As reações que surgem nestas horas às ações da PF, do MPF e do juiz Sérgio Moro são motivadas pelo mesmo fenômeno. Ou seja, o petismo ainda não caiu em si. Na fala do presidente Rui Falcão, na gritaria dos militantes no aeroporto de Guarulhos, no posterior discurso de Lula à claque petista, percebe-se a mesma convicção: todos supõem ser devida a seus líderes e ao partido uma reverência que os tornaria inatingíveis pela Justiça. E à sombra dessa reverência deveriam ficar resguardadas as condutas mais suspeitas e a vertiginosa prosperidade pessoal e familiar de tantos. A infinita sucessão de escândalos não é entendida como conduta fora da lei, mas situação normal para quem está acima dela.

Percival Puggina

Os arquivos de 'Judas'

Uma certeza prevalece sobre a torrente de dúvidas lançada nas últimas 48 horas na cena brasileira: como está, não vai ficar.

Dissipam-se as possibilidades de Dilma Rousseff se manter ilesa até o fim do mandato. O depoimento do ex-líder do governo no Senado Delcídio Amaral (PT-MS) expôs a presidente a novas e múltiplas iniciativas jurídicas por crime de responsabilidade.

A consequência imediata, previsível, é uma decisão mais rápida do Supremo Tribunal Federal na liberação do rito do processo de impeachment na Câmara dos Deputados.

Dilma tem pela frente, além da ação para impedimento, um processo de cassação do mandato no Tribunal Superior Eleitoral. A previsão dos juízes é que o desfecho ocorra, no máximo, até setembro.

A corrosão do governo ocorre sob as piores condições. Perdeu a base e a principal frente oposicionista se consolida dentro do próprio partido, capitaneada por Lula, que há tempos deixou-se seduzir pelo jogo simulado de conduzir a própria oposição, e governar na divisão. São de Lula as digitais na derrubada dos ministros da Fazenda (Guido Mantega e Joaquim Levy) e da Justiça (José Eduardo Cardozo).

Com o seu aval, também, o PT atravessou os últimos 14 meses sabotando todas as iniciativas do governo Dilma na economia, cujas dificuldades estruturais mais evidentes são herança da era Lula, agravadas pela soberba da presidente na condução da político-econômica. Resultou em recordes como o declínio de 14% nos investimentos em 2015 — o mais significativo em um quarto de século, desde o impeachment de Collor.


Astuto, Lula viu ontem uma chance na ordem assinada pelo juiz Sérgio Moro na última segunda-feira, 29, recheada de cautelas: “NÃO deve ser utilizada algema e NÃO deve, em hipótese alguma, ser filmado... O mandado SÓ DEVE SER UTILIZADO E CUMPRIDO, caso o ex-Presidente, convidado a acompanhar a autoridade policial para depoimento, recuse-se a fazê-lo”.

O ex-presidente anunciou que vai viajar pelo país fazendo aquilo que mais gosta: subir em palanques para demonstrar a certeza granítica de que todo o mal deve ser atribuído aos outros.

Dilma, ao contrário, mostrou-se nervosa. Em reuniões, xingava seu ex-líder no Senado. Nem teve o privilégio da primazia: em abril de 2006, no governo Lula, o então deputado Jorge Bittar (PT-RJ) chamou-o de “Judas”, no mais suave dos impropérios. A CPI dos Correios terminava com um acordo de Delcídio com o presidente: o relatório final isentava Lula e omitia o nome de um de seus filhos, Fábio.

Quando inconformados, como Bittar, Aloizio Mercadante e José Eduardo Cardozo, ameaçaram expulsá-lo do PT, ele anunciou um livro: “Registrei tudo, com parlamentares, executivos, empresários e pessoas do governo”, repetia pelos corredores do Senado.

Se livro e gravações existem, não se sabe, mas desde então Delcídio ascendeu no partido, com o apoio de Lula e Dilma. As poucas páginas já divulgadas da sua delação contêm detalhes suficientes para sugerir que o senador andou espanando a poeira dos arquivos. 

Velho infrator

Septuagenário, Lula, após ter sido convidado a prestar depoimento na Polícia Federal, foi levado ao aeroporto de Congonhas , e lá ficou por três horas. Ao sair, parecia um desses jovens infratores que, encaminhados às delegacias especializadas e, na certeza de que serão libertados , surgem nas televisões, com imagem distorcidas e vozes digitais, falando besteiras, afrontando policiais, xingando repórteres e proclamando que são "dimenor".

O líder dos enfurecidos companheiros, comportando-se como incentivador de badernas e violência, usando a sua emissora privada, prometeu colocar seus ilegais guerreiros nas ruas para exigir respeito e privilégios.

DESCOBRIRAM PAI DA FACCAO LULA SUSTO DILMA VE TV SOFA E O GIBSON NOVELA REGRA DO JOGO

Sendo "dimaior", o ex-presidente, com a colaboração de vídeo postado nas redes sociais pela "aliada Jandira Feghali", fala ao telefone com a ameaçada sucessora, e diz que podem enfiar, no orifício anal - para não ser chulo como o ex-presidente - os processos contra ele. Lula, que já havia feito discurso midiático, debochando da Polícia Federal, do Ministério Público, da Justiça e da maioria do povo brasileiro, com a divulgação do vídeo de Jandira confirmou a sua fama de debochado e desbocado.

É inacreditável que tenhamos sido governado, por tantos anos, por uma pessoa que incita a violência, destrata interlocutores, desafia a mídia, além de preferir bebidas fortes a vinhos refinados, apesar de possuir adega climatizada em um sítio emprestado de um amigo.

A fama de apreciador contumaz de cachaça, Lula deve ter tomado uns tragos antes de proferir o seu discurso. Olhos empapuçados, cabelos ralos e desgrenhados, voz rouca vinda da garganta sofrida, o ex-presidente encontrou o palanque que ,a tempos, buscava e vociferou ameaças aos ventos.

Em um momento terrível para o Brasil, Lula deveria se espelhar no africano Nélson Mandela que, após vinte e sete anos de injusta prisão, pregou a paz e o perdão aos seus concidadãos. A preferência do assustado conduzido depoente pela África, governada por ditadores, aclara o interesse de investir fortunas naquelas paragens. Deve ser este o ideal do político decadente: governar o país sem oposição, sem democracia e sem justiça para todos.

Lula sabe que os seus dias de liberdade estão por um fio e, desesperadamente, retoma as rédeas do seu séquito e pretende sair às ruas do país, cobrando dos mais pobres a dívida por ter proporcionado a eles melhores condições de vida. Esses cidadãos não devem nada ao ex-presidente, ao contrário, todos governantes devem proteger os carentes, desde que não coloquem uma parte dos recursos em seus bolsos através de artifícios.

A derrocada da maioria dos nossos políticos é a verdadeira prova dos desmandos causados por corruptos e incompetentes. As investigações que desmancham as maravilhas do Brasil líder mundial já levaram à condenação e prisão homens de confiança de Lula e, agora, se aproximam, implacavelmente, ao governo da presidente Dilma.

Deve ser duro para uma menina que sonhava, erroneamente, implantar uma sociedade mais justa, estar atolada no lamaçal arrasador que destruiu não uma represa, mas, uma nação.

Dilma, que também é "dimaior", mas não tem os privilégios dos septuagenários, deveria se afastar das más companhias para não ser convidada, ao amanhecer, antes sair nas constantes pedaladas, a depor no processo da Lava-Jato perante ministros do Supremo Tribunal Federal.

O número 13

O número 13, associado ao dia de sexta-feira, ganhou fama de maldito por via da conjuração contra a Ordem dos Templários, formada por cavaleiros que se intitulavam depositários do tesouro do rei Salomão, do Santo Gral, cálice que recolheu o sangue de Cristo, e da chave da sabedoria antiga.

Essa ordem celibatária, composta de monges guerreiros cristãos, pelas regras severas no limite do desprezo da dor física que adotavam, se transformou numa força transnacional poderosa como nenhuma outra. Seus adeptos tinham na ilha de Malta e em Rodes seus centros e bases de apoio, construídos na época das cruzadas para reconquistar Jerusalém e o Santo Sepulcro. Ainda hoje em Rodes existe o castelo da ordem, transformado em museu, que guarda a história e os brasões dos grandes mestres templários.

A ordem foi fundada em Jerusalém, em 1118, por oito cavaleiros (daí a lenda da Mesa Redonda) e passou em seguida a herdar de seus membros, que provinham de famílias abastadas da Europa, verdadeiras fortunas.

O tesouro da ordem também contava com o butim das conquistas em terras de infiéis. A riqueza deu origem a uma espécie de Banco Central do mundo ocidental, com sedes por todo lado e controle do mar Mediterrâneo. Os pagamentos e financiamentos passaram a ser apanágio da ordem. Poder acima do poder, maior que das endividadas famílias reais (dinastias merovíngias) da Europa; assim, a ordem, depois de dois séculos de expansão, trombou, no início do século XIV, com o rei da França, Felipe IV, o Belo.

Com o prestígio minguando e para restaurar o domínio em grande parte cedido aos templários banqueiros (e dar, assim, um calote na ordem), as realezas europeias, orquestradas por Felipe IV, pelo fraco papa Clemente V e por Guilherme de Nogaret (mentor da trama), fizeram chegar, bem em cima da hora, a mesma “ordem” escrita para prender, em qualquer país, e matar, na primeira hora de sexta-feira de 13 de outubro de 1307, os templários. Deu-se assim um extermínio no mundo ocidental já nas primeiras horas da sexta maldita. O plano, salvo algumas exceções, correu à risca; o grande mestre da ordem Jacques de Molay foi rendido e preso.

Depois de sete anos de masmorra, Jacques de Molay foi executado ardendo no fogo no dia 14 de março de 1314. Assim que a fogueira foi atiçada, ele teria desferido uma maldição aos inimigos pedindo que no mesmo ano todos fossem levados ao inferno sofrendo horrores.

Coincidência ou não, o papa Clemente V expirou em 20 de abril por doença intestinal; Felipe, apesar de Belo, caiu do cavalo, e um javali o rasgou, arrastando suas entranhas, em 29 de novembro; e Nogaret encontrou seu fim, por doença, exatamente no dia 31 de dezembro de 1314.

Os templários que escaparam da conspiração se organizaram em seitas, deixando de ser guerreiros e continuando a se vangloriar de depositários do Santo Gral e de outras façanhas do rei Salomão. Teriam originado a Ordem dos Cavaleiros de Malta, dos rosa-cruzes, dos Illuminati di Baviera, que até hoje emergem hora ou outra como manobristas da ordem mundial.

O número 13 ficou na história e na superstição; mesmo sem ser associado à sexta-feira, restou como número de má sorte, mas, para alguns, o número seria o contrário, de sorte. Ainda contra ele pesa o número de participantes da Santa Ceia, 12 apóstolos e o Mestre.

Ao se escolher o 13, se enfrenta sempre o dilema, hamletiano: bom ou ruim? Em alguns países o número 13 foi varrido como andar de prédios, como número de rua, e, se numa mesa sentam-se 13, mais um tem que ser chamado.

O próximo dia 13 será um dia decisivo para medir a capacidade de enfrentar a onda do impeachment, que depois de um recuo volta com força, aumentada pela recessão e pelo desemprego, a bater às portas do Planalto.

Lula, acossado como nunca, desceu do trono da popularidade e disputa agora o papel que lhe resta, de mito, para não passar por aquele de vilão. Sairá destruído ou fortalecido.

Resta o fato de que no Brasil a produção em qualquer setor (exceção para a agricultura) vem despencando verticalmente, fazendo empresas fecharem as portas, despejando multidões de desempregados. O governo enfrenta uma rejeição nunca registrada antes.

No horizonte e no Planalto não se enxerga algo que possa servir de freio à queda livre, e, sobretudo, dar sinal de controlar a confusão instalada na política e na economia, devastando as esperanças no Brasil e o conceito lá fora.

O Brasil precisa deixar para trás a insegurança, tem o dever de crescer, desenvolver, dar soluções às demandas de 200 milhões de brasileiros.

Novos tempos

Os poderosos perderam o medo de serem chamados de ladrões. É uma desfaçatez
José María Guelbenzu, em O poderoso quer tudo, recém lançado na Espanha 

Preso por excesso de honestidade

O mais honrado e honesto brasileiro foi levado nesta sexta-feira por condução coercitiva a prestar depoimento na Polícia Federal por excesso de honestidade e de honradez? Foi o que Lula passou em sua conclamação à militância, hoje tão minguada que só lota ônibus com bolsa mortadela.

O ex-presidente sentiu o golpe de entrar no camburão da PF.

Não é a mesma coisa quando o pelego entrava no camburão da Polícia, nos tempos da ditadura, seguindo para o DOPS. Era então livre e íntimo que mais parecia integrante policial do que passageiro em ação coercitiva.

Era apenas líder sindical, lutando por interesses dos trabalhadores, mas na manhã dessa sexta-feira era um ex-presidente que deve se explicar sobre a promiscuidade entre o público e o privado. O Pai dos Pobres, beneficiário das zelites empresariais, não se explicou publicamente ainda. Fez apenas o que sempre faz: balançou a pança e convocou as massas, hoje magérrimas. Dá uma de pobre, que não é mais, esnjando os prêmios da Bolsa-Família que lhe rendeu os favores de inexplicáveis milhões.

Fez o velho discurso do pobre que subiu na vida como é do gosto petista. Da mesma forma, muitos companheiros conseguiram "emprego" e fizeram "carreira" de ex-pobres semi-analfabetos a novos ricos alfabetizados na cartilha petista. 
 
O super ex, que desafia a justiça e menospreza a polícia, ainda se achando com foro de imunidade, se desmontou. Sente que não está apenas na mira, mas nas mãos da Polícia Federal da qual sempre correu. Não tem mais aqueles companheiros aguerridos, hoje presos, esquecidos propositalmente pr ele, a fim de não se sujar. Traição, que é um traço no seu carreirismo, bem sabem os abandonados pelos caminho pelo honesto santo.

Resta carregar com a família o peso criminoso dos presentes das zelites empresariais a quem ataca só de boca pra fora, porque dentro dos bolsos sempre cabe mais um dindim. . 

Perda de consciência antes da guilhotina

São clássicos dois fenômenos de ciência política ocorrendo hoje no Brasil. O primeiro é a alienação cega dos governantes em relação ao quadro real dos momentos históricos decisivos pré-ruptura institucional. O segundo é o retardo dos atores das forças políticas em assimilar e se sintonizar com o clamor popular, ocasionando a ruptura.

Quanto ao primeiro, a passagem mais emblemática é a atribuída a Maria Antonieta reagindo ao clamor da plebe por pão. Teria sugerido brioches, a sério. Resultado: foi decapitada por uma engenhoca engendrada por um médico, um certo Doutor Guillotin na Revolução Burguesa de Paris. Alegava o doutor que o seccionamento abrupto da medula espinhal logo abaixo do bulbo cerebral evitava o sofrimento dos enforcados, pois a perda da consciência era imediata. Enganava-se o doutor.A perda da consciência dos decapitados já se dera no exercício do poder.


Hoje já se sabe que L'Autrichienne (a austríaca) ou L'Autre-chienne (a outra cadela), como era apelidada raivosamente pelo povo a última rainha da França, jamais proferiu tal frase sobre os brioches. Mas era notória a sua alienação e distanciamento das agruras populares num gueto palaciano em saraus operísticos, enquanto os miseráveis proliferavam à sua volta e a burguesia se armava para derrubar a monarquia.

Outro exemplo clássico do mesmo fenômeno dessa alienação cega é o episódio histórico do Baile da Ilha Fiscal. A monarquia já caíra de fato, e seus ocupantes bailavam.

O baile, às margens da Baía da Guanabara, se realizou a exatos seis dias da Proclamação da República. Oficialmente, era para homenagear a tripulação de um navio chileno, o Almirante Cochrane, que se encontrava fundeado em águas brasileiras.

Mas o Visconde de Ouro Preto, presidente do Conselho de Ministros, aproveitou para saudar pomposamente as bodas de prata da Princesa Isabel com o Conde D’Eu, gastando na festança o equivalente a 10% do orçamento da província fluminense, retirados da verba do Ministério da Viação e Obras para socorro das vítimas do flagelo da seca nordestina.

Enquanto isso, no Clube Militar, em terra firme, Benjamin Constant exortava os militares a derrubar a monarquia. Há outros exemplos. Mas esses dois já nos bastam. Qualquer semelhança com as falas reformistas, espúrias barganhas ministeriais, viagens internacionais, discursos na ONU e passeios de bicicleta da nossa “presidenta” é mera coincidência.

O segundo fenômeno é o delay técnico entre a ação parlamentar em se sintonizar adequadamente com o brado retumbante das ruas, apesar de todas as evidências, hoje potencializado pelos resultados das pesquisas de opinião, pelo próprio noticiário das televisões e da intensa mobilização pela internet no Brasil.

São inúmeros os exemplos históricos, sendo o mais significativo o episódio da República de Weimar. Governava-se um país em fermentação xenófoba e nacionalista com as massas se organizando militarmente em torno das propostas de Hitler, e os parlamentares de Weimar assistiam ao filme da normalidade institucional.

Na Itália, o mesmo fenômeno é tratado de modo magistral no romance épico de Giorgio Bassani, “Il giardino dei Finzi Contini”, não menos genialmente transportado para o cinema pelo talento de Vittorio De Sica, retratando a alienação da alta burguesia italiana dos anos que antecedem imediatamente à Segunda Guerra Mundial.

Qualquer semelhança com a situação brasileira de hoje também é mera coincidência.

Parece que o Parlamento brasileiro está localizado em outro país. Não é à toa que Brasília é apelidada a “capital da lua”.

Os presidentes das duas casas, membros do maior partido da base de sustentação do governo, sob investigação policial, o segundo maior partido com dois tesoureiros, um ex-presidente encarcerados e um senador, líder do governo, preso pelo STF em flagrantes e graves delitos, que abre o jogo em bombástica delação premiada, envolvendo diretamente a “presidenta” enquanto a Polícia Federal vasculha as residências de Lula e famiglia.

A República desgovernada, a economia em frangalhos, e o Parlamento agindo como se as manifestações que colocam multidões nas ruas estivessem acontecendo na Bessarábia.

As ruas pedem probidade na representação, e a cada dia se revelam mais escândalos de roubalheira do dinheiro público nos três níveis da desacreditada representação popular.

As ruas pedem a renúncia ou o impeachment de uma presidente desmoralizada, conivente com a incúria e a inépcia, e o maior partido no Congresso fortalece sua aliança com um Executivo apodrecido, através da barganha de ministérios, dando o da Saúde (o maior orçamento ministerial e onde se dá a qualidade mais sofrível do serviço público) a um ilustre desconhecido, apenas porque pertence aos quadros de um legislativo apequenado e fisiológico em tempos de epidemia mundial de zika.

As ruas rejeitam mais impostos e, em sua primeira e patética entrevista, esse ministro picaresco declara que não irá lutar apenas pela reimplantação da CPMF, mas por dobrar sua incidência.

São os tais brioches de Maria Antonieta ou o farto menu da Ilha Fiscal para o banquete de cinco mil convidados com o dinheiro dos flagelados da seca endêmica do reinado em decadência. Ou o Doutor Guillotin redivivo amolando a lâmina de sua engenhoca mortífera.

Nelson Paes Leme