terça-feira, 29 de novembro de 2016

Universidade tradicional ou corporativa

Durante séculos, desde a criação da Universidade de Bolonha, nos acostumamos aos modelos de educação em que demandas tradicionais eram atendidas pela oferta de cursos convencionais, conduzindo a diplomas formais, sujeitos à legislação de cada país, e que habilitavam ao exercício profissional.

Com o advento da sociedade do conhecimento, resultado dos acelerados avanços da ciência e da criação de novas tecnologias, passamos a ter que preparar jovens para profissões que ainda não existem e para tecnologias que ainda não foram geradas. Por outro lado, as empresas são cada vez mais forçadas a incrementar a sua competitividade, para que permaneçam "vivas" num cenário de crescente seletividade.
A Universidade de Bolonha, fundada em 1088 e ainda em atividade, é a universidade mais antiga do mundo (Foto: Divulgação)
Universidade de Bolonha, fundada em 1088,
ainda em funcionamento
Por isso, muitas empresas começaram a ver seus quadros técnicos como potenciais “alunos não convencionais”, que necessitavam de “cursos não formais” específicos que, mesmo sem oferecer certificados ou diplomas formais, os preparassem para o enfrentamento dos inúmeros desafios que se colocavam nas suas atividades diárias.

Assim, foram implantadas as universidades corporativas, com o objetivo de desenvolver as competências determinantes para o negócio da empresa.

A primeira surgiu nos Estados Unidos, nos anos 1920, numa ação pioneira da General Motors, que construiu uma escola noturna para familiarizar seus técnicos com as linhas de montagem da indústria automotiva. Sua iniciativa foi tão bem sucedida que, em 1997, se transformou numa universidade independente, a Kettering University.

Hoje, as universidades corporativas naquele país são em número próximo ao das universidades convencionais.

No Brasil, elas começaram nos anos 90. Suas características dificultam saber o número efetivamente em funcionamento, mas, certamente, devem ultrapassar as 400.

Apesar da educação não ser o principal objetivo das empresas que as criaram, elas acabam por agregar, a cada um de seus funcionários, as competências que vão assegurar a sua empregabilidade no futuro, na medida em que, quase sempre, os preparam para aprender a aprender, para a construção de um raciocínio lógico na identificação e na solução de problemas, para o conhecimento das tecnologias empregadas no projeto e na fabricação de seus produtos, para o trabalho em equipe e para o autogerenciamento da própria carreira.

Dessa forma, os egressos das empresas que oferecem programas corporativos poderão vir a ter grande vantagem na busca por uma nova função, noutra empresa. Entretanto, ainda não desenvolvemos no Brasil procedimentos que sejam capazes de certificar os saberes, as competências e as habilidades adquiridas nas empresas. Noutras economias, como na Norte-Americana, na Britânica e na Australiana, há mais de um século foram criadas instituições especializadas neste tipo de certificação, e com validade em todo o mundo.

Pode, então, o modelo das universidades corporativas ameaçar o das universidades convencionais, já secular?

Parece-me que não, na medida em que as primeiras têm seu foco nas necessidades do setor produtivo, e as últimas são caracterizadas por uma formação geral, privilegiando o avanço do conhecimento.

Dessa forma, muitas instituições estão preparando para dar continuidade ao avanço da ciência e poucas na atuação dentro das empresas. O resultado é que sobram graduados no mesmo ambiente em que faltam trabalhadores qualificados.

A oferta de cursos superiores de tecnologia é uma solução, ainda desprezada pelas grandes universidades. A melhor articulação universidade-empresa, como um todo, se bem conduzida, poderá resultar em progresso expressivo para o nosso desenvolvimento.

Como exemplos, a realização de projetos de investigação que permitam o aumento da competitividade, a oferta de programas de educação continuada e a utilização dos laboratórios universitários em ensaios relevantes para muitas empresas, e que dependem de laboratórios de alto custo. Levar a universidade ao setor produtivo será decisivo para a retomada do crescimento.

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