quinta-feira, 3 de novembro de 2016

Gatinhos bonitinhos

A solução para conflitos agora reside em um ser. Argumentação, busca de termos comuns ou mesmo imposição de vontade se tornaram meras falácias. Terapia instantânea para ventilar outros sentimentos e manter sua autoafirmação em um mundo que esmaga a individualidade a cada clique. Em meio à luta por espaço, apenas um território é considerado neutro, em que a paz e a tolerância reinam peludas. É uma imagem, na verdade. Esta utopia são as fotos de gatos. Se forem filhotes, melhor ainda.

Resultado de imagem para gatinhos bonitinhos
O fenômeno do “gatinho bonitinho” transcende as redes sociais. Investimos nosso tempo e confiança em qualquer imagem que transmita esta segurança pela fofura. Basta um sorriso, um olhar, que imediatamente tentamos ver o lado positivo em algo que não necessariamente é aquilo que se apresenta. Ignorem-se os avisos, esqueça as atitudes… Ninguém com esta voz doce pode ser tão mal.

A busca pelo gatinho bonitinho, este ser que parece dependente, mas cheio de vontades próprias, aos poucos virou uma síndrome. Há uma falta gritante de empatia, que provoca qualquer chance de alcançá-la uma necessidade. Não precisamos de alguém que trabalhe em conjunto, mas que precise ser cuidado por nós. O gatinho fofinho está em qualquer esquina, aguarda adoção. Até crescer e tornar um animal que ache que nós precisemos ser cuidados.

É uma mistura de carnaval com UFC. A fantasia foi trocada. O lobo se veste de gato, emana um sorriso e finge guiar um bando de Alices perdidas. Senhor, há tanto em jogo que não devemos rezar “Pai nosso”, mas sim a oração de São Jorge. Porque o Mal ronrona e afia as garras escondido. A imagem é mais importante que o conteúdo. Em algum lugar, McLuhan se desespera em ver que sua teoria, supostamente ultrapassada, mutou em uma quimera midiática.

Queremos um gatinho fofinho com a voracidade de um tigre. Sorria para nós e destrua nossos opositores, amém. Fora a imagem, não há meio termo.

No turbilhão da melancolia, fico os gatinhos fofinhos de verdade. Os felinos merecem nosso apreço. Os humanos, não. Quando acordarmos do país das pretensas maravilhas, talvez descubramos. Enquanto isso é o momento de guardar nossas nove vidas. Vamos precisar.

Daniel Russell Ribas

Nenhum comentário:

Postar um comentário