terça-feira, 30 de junho de 2015

Lula destrói o frágil relacionamento entre PT e governo

Charge O Tempo 23/06
De repente, o ex-presidente Luiz Inácio da Silva está de volta à política, numa perfomance avassaladora. No desespero para evitar o aprofundamento das investigações da operação Lava Jato, Lula mostra que está disposto a tudo e não respeita ninguém, vai atropelando quem estiver pela frente.

Enquanto a presidente Dilma Rousseff corta um dobrado nos Estados Unidos, tentando convencer o governo e os investidores a darem uma chance ao Brasil, Lula assume o governo paralelo em Brasília, convoca o marqueteiro João Santana, que está trabalhando na campanha presidencial da Argentina, e determina a ele que o próximo programa do PT na televisão se transforme numa reação do partido à Lava Jato.

Depois, se reuniu com a direção petista e com as bancadas no Congresso, para determinar como será o comportamento do PT daqui para frente.

É como se o governo e o partido subitamente passassem a ser varridos por um tsunami político, sob alegação de que não se pode mais suportar o massacre das investigações sobre corrupção.

Lula tem temperamento ditatorial, não ouve ninguém, seu apreço à democracia é uma peça de ficção. Desde a criação do PT, jamais permitiu que surgisse uma liderança que pudesse lhe fazer sombra, o partido é dele e estamos conversados.

Na reunião de ontem, exigiu que deputados e senadores sejam contundentes na defesa do governo e do partido, subindo à tribuna ou dando entrevistas contra as “arbitrariedades” do juiz Sérgio Moro, que tem mantido na cadeia empresários e representantes do PT, como o ex-tesoureiro João Vaccari Neto, para forçá-los à delação premiada, na versão lulática.

Antes da reunião, já tinha mandado o PT convocar três ministros de Dilma – José Eduardo Cardozo, da Justiça, Miguel Rossetto, da Secretaria-Geral da Presidência, e Rubens Barbosa, do Planejamento.

Lula pretende que o partido obrigue Cardozo a interferir na Polícia Federal, para que as investigações poupem o PT e levantem a corrupção dos partidos de oposição, especialmente o PSDB. Quer exigir de Rossetto uma grande pressão dos movimentos sociais a favor do governo e do PT. E pretende que Barbosa amacie o ajuste fiscal, para atende as centrais sindicais, como se fosse obra fácil.

Na sua ignorância sesquipedal, Lula desconhece que Cardozo não manda na Polícia Federal e também não sabe que desde o início as investigações não são feitas apenas pela PF, mas pela força-tarefa, que inclui a Procuradoria da República, regional Paraná. Além disso, até agora não entendeu que é a força-tarefa que pede as prisões, o juiz Sérgio Moro apenas despacha favoravelmente.

Lula também não percebe que Rossetto e Barbosa sonham em atender os movimentos sociais e as centrais sindicais, mas não têm encontrado receptividade, em função da crise política, econômica e moral do governo. De que adianta pedir o que eles já tentam fazer e não conseguem?


O pior é que, no PT e no governo, ninguém tem coragem de enfrentar Lula. Nem mesmo a presidente Dilma Rousseff, que logo atendeu a conclamação dele e comprou uma briga com a Justiça, ou afirmar ontem que não respeita delator. Tentar desmoralizar a Justiça não é papel de chefe de governo, especialmente numa crise tão delicada. Dilma se precipitou.

Por fim, não se sabe as reais consequências desta tresloucada estratégia made in Instituto Lula, mas pode-se dizer, sem medo de errar, que o primeiro resultado será destruir o frágil relacionamento que ainda existia entre o PT o governo.

Nova realidade institucional

 
O Brasil em 2015 é, definitivamente, um novo país em termos institucionais. As relações entre os poderes mudaram radicalmente. O elemento detonador desse processo foi a insistência do Poder Executivo em manter-se, no mandato passado, em uma posição de distanciamento e até alheamento frente aos demais poderes.

A relação entre o Palácio do Planalto e o Congresso foi dura e pontuada de momentos de crise e insatisfação, que resultaram na retomada do processo de votação dos vetos presidenciais, na aprovação do Orçamento Impositivo, na devolução da medida provisória da desoneração, entre outras iniciativas percebidas como gestos de confronto.

A nova realidade institucional está se impondo pelo fato de o Congresso ter entendido que tem uma ampla reserva de poderes, nunca utilizada de forma consciente e consistente. Seja por que estava cooptado pelas benesses do fisiologismo. Seja porque não tinha plena consciência de seu poder. O fato é que, por uma ou outra razão, ou por ambas, a situação mudou. E o Executivo terá de aprender a lidar com ela.

Mas a nova realidade institucional também atingiu o relacionamento entre o Executivo e o Judiciário. O ponto de inflexão foi o julgamento do mensalão, que colocou o Executivo sob escrutínios nunca vistos. As eventuais tentativas de domesticar o julgamento foram por água abaixo.

No fim das contas, o julgamento do mensalão reafirmou uma tendência que se mantém agora, quando o petrolão começa a avançar nas instâncias superiores. São tempos novos, que foram alimentados, entre outras coisas, pela demora de se indicar o novo ministro do Supremo Tribunal Federal, cuja aprovação foi, no mínimo, tormentosa. Como consequência, aprovou-se a PEC da Bengala, que retirou da presidente Dilma Rousseff a possibilidade de indicar cinco novos ministros do STF.

Outro vetor do reequilíbrio institucional está nas atitudes e decisões iniciais do Tribunal de Contas da União com relação às “pedaladas fiscais” do primeiro mandato Dilma. Nunca antes na História do Brasil, para usar um bordão conhecido, o TCU foi tão longe em questionar as contas de um governo. A ponto de esse questionamento poder resultar em grave condenação.

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Temos ainda uma discussão já evidente em torno do federalismo. Não cabe mais a antiga hegemonia do Executivo federal sobre estados e municípios. A autonomia existente sobre parte expressiva da arrecadação de contribuições deixará de existir. Uma nova repartição de receitas e responsabilidades deve ocorrer nos próximos anos. Viveremos uma nova época federalista, que dará outra feição ao poder antes hegemônico do Executivo federal sobre os demais entes federados.

Os fatos aqui mencionados impõem uma séria reflexão. O que devemos esperar dessa nova realidade? Provavelmente, mais crises e mais confrontos, até que as placas tectônicas do novo modelo se acomodem. São as dores de uma democracia nascente que vive um surto de fragmentação de poder nunca antes visto no país. É uma nova realidade institucional num país em que o presidente da República sempre foi “Sua Majestade”, como escreveu Ernest Hambloch nos anos 30.

Murillo de Aragão 

O paraíso para as 'zelites' revolucionárias


O filho caçula do ex-líder cubano Fidel Castro se envolveu em situação polêmica num resort de Bodrum, na Turquia. De acordo com meios da imprensa local, Antonio Castro Soto del Valle alugou cinco suítes de diárias de US$ 1 mil para 12 acompanhantes, após chegar em um iate alugado na grega Mykonos. Pouco depois, um guarda-costas dele flagrou repórteres e fotógrafos e partiu para cima deles.

De acordo com a revista “Gala”, o repórter Yasar Anter, da agência Dogan, foi atacado por um segurança cubano após filmar Del Valle e a delegação fugiu do local em um carro. 
A revista publicou novas imagens e relatos do episódio, ironizando a ausência de explicações para a procedência dos fundos utilizados para pagar a visita de luxo do filho de Fidel.
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A conta do atraso


Brasil já investe proporcionalmente mais no ensino do que nações ricas, mas anos de descaso com o setor comprometem resultados

O Inep (órgão de estudos e avaliação do MEC) atualizou na semana passada seus cálculos sobre o investimento público em educação. Pelas contas do instituto, o Brasil já gastava em 2013, último ano com dados disponíveis, 6,2% do PIB com o ensino. Não é pouco, mesmo se comparado com o que nações desenvolvidas hoje investem no setor. Para o mesmo ano, segundo informações do site usgovernmentspending.com, o patamar dos Estados Unidos era de 5,2%. Na média dos países da OCDE — organização que congrega, em sua maioria, países ricos —, este percentual era de 5,6% em 2011, último ano com dados agregados disponíveis.

Há quem conclua a partir desses dados que, se o Brasil investe mais em relação ao PIB do que países ricos e fica muito atrás deles em termos de resultados, esta é uma prova irrefutável de que estamos gastando mal. Que o investimento público é ineficiente no país, resta pouca dúvida. O problema neste argumento é ignorar nosso atraso histórico.

No mesmo site que fornece informações sobre o gasto governamental americano, é possível fazer uma série histórica do investimento no PIB daquele país desde 1900. Na tese “Taxas de matrícula e gastos em educação no Brasil”, o economista Paulo Maduro Junior fez o mesmo para o caso brasileiro, estimando o investimento no setor desde 1933. A comparação das duas séries históricas revela o tamanho do atraso brasileiro.

De 1933 a 1964, o menor gasto público em ensino no Brasil foi de 0,9%, registrado em 1943, e o maior foi de 2,0%, em 1963. Ou seja, nesses 31 anos, oscilamos ao redor de 1% a 2% do PIB. No mesmo período, os Estados Unidos registravam patamares bem superiores, ficando quase sempre acima de 3%, mas oscilando de 1,3% (em 1944) a 3,9% (em 1964). Mesmo no auge da Segunda Guerra Mundial, em que os americanos tiveram participação infinitamente mais expressiva do que o Brasil, eles investiam mais do que nós.

No Brasil, somente em 1988 chegamos ao patamar de 4% do PIB investido em educação. Nos Estados Unidos este percentual foi alcançado (e nunca mais ficou abaixo disso) 23 anos antes, em 1965. O primeiro ano em que na série histórica das duas nações o Brasil superou os Estados Unidos foi 2012.

Não é por acaso, portanto, que os indicadores educacionais dos dois países hoje sejam tão discrepantes. Já em 1950, enquanto no Brasil 51% da população com mais de 15 anos não sabia ler e escrever, os EUA registravam uma taxa de analfabetismo adulto de 3%, inferior até mesmo ao patamar em que nos encontramos hoje no Brasil, de 9%.

O argumento dos defensores da ampliação do gasto com ensino é o de que, para compensar o atraso histórico, o Brasil precisa investir proporcionalmente mais do que as nações ricas. É por isso que o Plano Nacional de Educação planeja o patamar de 10% do PIB até 2024.

 

Há, porém, um alerta do outro lado — dos críticos da ampliação do gasto — que não deve ser desprezado: o risco de todo esse esforço não trazer resultados. Dois exemplos recentes de políticas públicas educacionais mostram que a preocupação faz sentido. Um deles é o do Fies, que elevou de R$ 1 bilhão para R$ 14 bilhões os gastos com financiamento de alunos no ensino superior privado sem que as matriculas crescessem em ritmo satisfatório. Outro é o do Reuni, programa que o MEC lançou em 2007 com o objetivo de aumentar o investimento em universidades federais para que elas ampliassem vagas e fossem mais eficientes. As matrículas até cresceram, mas a ampliação do gasto veio acompanhado de aumento da evasão e sem mudança na relação de professores por alunos.

É preciso investir mais, e melhor. Não será fácil.

Antônio Gois 

Túnel do tempo

Pátria deseducadora

a charge pátria educadoraAo bradarmos "BRASIL, PÁTRIA EDUCADORA" estamos dizendo que a educação será a prioridade das prioridades, mas também que devemos buscar, em todas as ações do governo, um sentido formador, uma prática cidadã, um compromisso de ética e um sentimento republicano
Presidente Dilma, discurso de posse, 01/01/2015)
Como é inconsistente e distante da realidade o compromisso do governo de Sua Excelência com a ética! E vale o mesmo para o "sentimento republicano" e para a tal "prática cidadã", seja lá isso o que for. Treze anos de governo petista só serviram para desnortear moralmente a sociedade e semear descrédito nas instituições mediante exemplos, palavras e atos. O governo mente, faz o que não deve, não faz o que deve, cerca-se de péssimas companhias, ele mesmo é muito má companhia, corrompe, se deixa corromper e acusa os demais daquilo que faz. Na inepta frase presidencial, contudo, há outro aspecto e é nele que quero me deter.

A presidente disse que a educação será a prioridade das prioridades e que para essa tarefa convergirão as ações do governo. Aparentemente, ninguém a advertiu para o fato de que a sociedade não pediu ao Estado para ser por ele "educada". O que a sociedade espera do sistema público de ensino é que cumpra, dentro das salas de aula, nas escolas, o papel de transmitir à juventude brasileira ensinamentos úteis à vida na sociedade contemporânea e à realização das potencialidades de cada indivíduo. Para variar, é tudo ao contrário do que a presidente e seu partido fazem. Por isso seguimos dilapidando preciosos recursos humanos e perdendo tempo na imprópria tarefa de "construir sujeitos" e de preparar "agentes de transformação social"! Chega de construtivismo, de Paulo Freire e de Emilia Ferreiro (até os argentinos já perceberam o estrago que o método da conterrânea causou à alfabetização no seu país). "Chega de Piaget e de Vygotski!", me assopra num antigo texto o sociólogo e jornalista José Maria e Silva.

Eu sei que o parágrafo acima escandalizará setores do meio acadêmico brasileiro, especialmente nos cursos voltados à formação de professores. Eu sei. Ali, multidão de mestres e doutores ensina os futuros professores dos nossos jovens que a transmissão de conhecimentos, de conteúdos, será apenas parte, e parte pouco relevante, de seus quefazeres profissionais. Por isso, em nosso país, não se ensina História, mas leituras ideologicamente convenientes de fatos históricos. Não se ensina geografia, mas geografia política em conformidade com a sociologia e com a política que convém ao uso revolucionário da rede escolar. Pouco e mal se ensina língua portuguesa porque o uso correto do idioma é instrumento de dominação e desrespeito à cultura do "sujeito educando". E não se ensina matemática, talvez por ser conteúdo exigente, que dispersa energias revolucionárias.

Aferir resultados é uma imposição da razão a toda atividade humana. Não haveria de ser diferente no sistema de ensino. E o que esse sistema proporciona ao Brasil é tão ruim que chega ao absurdo de repelir o mérito e de manter um compromisso com a mediocridade, da base ao topo do sistema. Enquanto na minha infância, no piso da pirâmide, as crianças eram alfabetizadas em poucos meses, passadas seis décadas, esse objetivo não é alcançado por muitos sequer em três anos. Pesquisa do Instituto Paulo Montenegro e da ONG Ação Educativa revelou, em 2012, que 38% dos estudantes universitários não dominavam "habilidades básicas de leitura e escrita", qualificando-se como analfabetos funcionais. No topo da pirâmide, na produção acadêmica, o Brasil responde por apenas 1% da obra científica mundial de maior qualidade, segundo a revista Nature. O Chile, com 8% da população brasileira, produz mais artigos científicos do que o Brasil. No entanto, enquanto nós gastamos nisso US$ 30 bi, o Chile gastou US$ 2 bi. A ineficiência no uso dos recursos, entre 53 países analisados, nos coloca em 50º lugar.

Não vejo como se possa mudar essa realidade quando ela decorre do projeto político, ideológico e pedagógico há muito em curso no Brasil. Esse projeto, anterior ao PT, levou-o ao poder. Por isso, em relação ao Plano Nacional de Educação, o próprio Lula reconheceu (leia aqui) que ele é "a chance de começar uma revolução no país". A presidente sabe disso tão bem quanto eu e você.

Percival Puggina

Uma nova moda entre colunistas: a discriminação para o bem

Não queria entrar na discussão; quando o assunto me é indiferente, como a redução da maioridade penal, prefiro ficar quieto no meu canto e fazer aquele procedimento recomendado por 9 a cada 10 dentistas: cuspir só quando requisitado.

Ainda assim, não consigo ficar calado quando leio certos absurdos por aí. Entre os disparates que leio, contra ou a favor da redução, os piores são sempre aqueles comentários que vão para o tudo ou o nada.

Uma nova moda é dizer que a redução da maioridade penal serviria apenas para prender mais negros e pobres.


“Querem garantir que esses outros, adolescentes que não tiveram educação nem saneamento nem saúde nem lazer nem acesso a nenhum de seus direitos garantidos pela Constituição, esses outros que tiveram as leis que os protegem violadas desde o nascimento, crianças dessas “pessoas marrons” que o menino não sabe para onde vão à noite nem quem cuida dos filhos delas, sejam encarcerados mais cedo porque já decretaram que, para elas, não há solução”

Em tradução livre: negros e pobres serão os mais penalizados com a nova lei pois são os que mais cometem crimes. No meu tempo, definir o caráter de uma pessoa com base na cor da pele tinha um outro nome. Espero que tenha sido um ato falho de Eliane Brum aí.

Nossos colunistas nem desconfiam quem é o povo de que falam em seus textos. Segundo pesquisa do Datafolha, 87% da população brasileira é a favor da redução da maioridade penal. A rejeição à redução da maioridade penal é maior entre os mais escolarizados (21%).

Então por que escrever um texto inteiro dando a entender que são os mais ricos que defendem a exclusão? Pois é justamente na periferia que se concentra a maior parte da população que defende a redução da maioridade penal. É mais fácil encontrar quem rejeita a redução atrás desses “muros altos”, que a colunista critica, do que na periferia. Por que usar a redução da maioridade penal como sintoma da “exclusão pelos muros altos”?

Esse é o problema da polarização, do nós contra eles: ela não enxerga a realidade, mas o que quer enxergar.

“Uma sociedade de muros sempre vai precisar forjar monstros do lado de fora para seguir justificando seus privilégios e mantendo-os intactos” - No caso, quem está forjando os mais pobres aqui?

Certos colunistas acreditam mesmo ser a voz dos despossuídos. Não devem nem desconfiar que estão representando direitinho o papel das classes sociais às quais têm aversão
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A esquerda e a direita

 
Os políticos que se dizem de esquerda, por ser o bom sítio de se ser político, estão sempre a afirmar que são de esquerda, não vá a gente esquecer-se ou julgar que mudaram de poiso. Mas dito isso, não é preciso ter de explicar de que sítio são os actos que a necessidade política os vai obrigando a praticar. Como os de direita, aliás, que é um lugar mais espinhoso. O que importa é dizerem onde instalaram a sua reputação, na ideia de que o nome é que dá a realidade às coisas. E se antes disso nos explicassem o que é isso de ser de esquerda ou de direita? Nós trabalhamos com papéis que não sabemos se têm cobertura, como no faz-de-conta infantil. Mas o que é curioso é que o comércio político funciona à mesma com os cheques sem cobertura. E ninguém tira a limpo esse abuso de confiança, para as cadeias existirem. Mas o homem é um ser fictício em todo o seu ser. E é precisa a morte para ele enfim ser verdadeiro.
Vergílio Ferreira (1916 - 1996)

Dilma não tem medo da trovoada lulista

Dilma, em entrevista na última semana, garantiu que não vai arrancar os cabelos por sua queda na popularidade. Nem mesmo pelo risco de impeachment. Não quer largar o osso, mas não tem medo de ser cassada por pedaladas ou improbidade.

Collor é exemplo. Despachado da Presidência, retornou à vida pública e plantou novas armações como a recente denúncia de Ricardo Pessoa, da UTC. Está muito bem, obrigado, mesmo depois da desgraceira de seu “governo”. Se cair, Dilma ao menos sairá melhor do que o senador.

Quem está tremendo, arrancando os cabelos, é Lula. Sabe bem que criou a criatura presidenta, mas não pode nada contra a pessoa Dilma, que não tem medo de assombração de Garanhuns.

A rainha é a peça chave de todas as pretensões de Lula, que pode espernear à vontade. Dilma não tem medo dos trovões do criador, porque leve o governo até o final ou saia no meio do caminho pode muito bem reverter sua história. Se lançar um best-seller, que tal "Planalto, o palácio dos horrores", vai encher a burra de dinheiro e emporcalhar de vez a biografia do seu criador. Sem contar que o PT e o ex-presidente ficarão sem futuro.

Vai fazer o que acha que deve, mesmo errando aqui e ali, sem se entregar aos desejos alheios, servir de capacho, o que deve estar se arrependendo em parte.

Não lhe peçam mais para ser uma fiel servidora dos outros, se sujando com a porcalhada que fazem. Está dando sinais de que não contem mais com ela para faxineira.

O sinal foi bem claro no sábado quando mandou que Aloísio Mercadante e Edinho Silva se explicassem sobre as denúncias de recebimento de campanha no caixa 2. Foi com as garantias de Edinho que esbravejou contra os delatores em novo marketing de durona, a guerrilheira valente.

O jeito durão é que está defendendo a presidente. Lula treme e teme mais a Dilma, do que o contrário. A presidente tem muito a revelar, até mesmo confessar, para acabar com as pretensões lulistas e enterrar o PT. É a cartada da gerentona.

Lula prospectou que nem mesmo Cardosão, da Justiça, vai lhe servir, pois agora só faz o que a chefe mandar. Esse não mexerá mais pauzinhos para novas blindagens de Lula.

O temor de Lula é tanto que Dilma, mesmo envolvida pela maior crise já vivida no país, não deve aceitar mais interferências para defender esse ou aquele. Vai brigar para melhorar a própria pele e não deixará que alguém, mesmo seu criador, interfira. Não vai querer passar à História como o eterno poste.

No volume morto, sem a boia de Dilma, e pauzinhos aqui e ali para tentar remar contra a maré, o ex sabe muito bem que pode perder a pele, mas quer salvar ao menos a imagem. Não à toa se reuniu com Pai Santana para tentar os superpoderes do marketing para dar uma cor melhor à velha carcaça encarquilhada e à estrelinha petista. Mas o baiano santificado não faz milagres, no mínimo só pode jogar uma purpurina sobre o desastre.

Autoridade para o sucesso


Os dicionários da língua portuguesa colocam os termos “poder” e “autoridade” no mesmo nível, sinônimos. Entretanto, pode e deve haver uma distância enorme entre eles. Segundo Max Weber, talvez o maior entre os últimos sociólogos que apareceram na humanidade, que assegurou seu lugar entre os inesquecíveis, a diferença é imensa.

A uma pessoa pode ser dado o poder, mas carece de autoridade para exercê-lo, outro pode ter autoridade, mas o destino não o colocou no poder.

Para Weber, o poder pode cair no colo de um personagem sem que este tenha qualidades e cabedal para exercê-lo. Pode ser conquistado pela capacidade de luta, pela força, pela esperteza, mas sem ter relação com a capacidade para administrar as tarefas que se seguem a uma vitória.

Não tem preparo para as tarefas que se seguem ao erguimento para o cargo em que reside o “status” do poder. Costuma brindar uma figura também pelo acaso, pela herança, pela conjugação de circunstâncias estranhas, pelo sorteio de uma loteria, por erros alheios. Um competidor pode sucumbir por descuidos e fraquezas pessoais beneficiando um inepto, um débil, cujo único mérito é o demérito dos adversários que lhe deixam a porteira escancarada para seguir adiante.

O poder, quando conquistado à revelia da capacidade de exercitá-lo, se revela instável, vacilante como torre de escasso alicerce. No vértice da elevação, passa a balançar e a enfrentar os golpes de quem quer destroná-lo.

A história registra com fartura descendentes de monarcas que se aproveitaram do fator hereditariedade sem preparo para tanto. Assim o poder se fez um peso e um pesadelo, coube a subalternos exercitá-lo, e frequentemente nesse caso se registraram reinados breves e marcados por insucessos e confusões. Deixando épocas marcadas por regressos, econômicos e sociais.

Já a “autoridade” exala não do caso, mas da condição proveniente do mérito, da capacidade para exercer um poder.

Assim, se percebe que a “autoridade” é capacidade de exercer o poder proficuamente num ambiente de confiança, de admiração.

Trata-se de um reconhecimento sólido e generalizado de capacidades pessoais. “Autoridade natural e moral” confere o “poder” pelo mérito. Autoridade é alma do poder, sem essa o poder será uma desgraça.

Autoridade arrasta multidões, faz crer, despertar, avançar. É uma vareta mágica para o Estado, faz empreendimentos, projetos prosperarem. Subentende talento, justiça, determinação, desapego, amor à causa.

A Coroa espanhola reconheceu autoridade de Cristóvão Colombo, um simples genovês de família sem títulos, e lhe deu meios para encontrar um Novo Mundo. Os ingleses encontraram essa condição em Winston Churchill, os indianos, em Gandhi.

Nos maiores fracassos, nos momentos mais difíceis de um país, se enxerga essa diferença que nos momentos de bonança passa despercebida.

A autoridade é uma força magnética que precisa ser sempre lembrada na hora de escolher a pessoa que exercerá uma tarefa. Não importa se no âmbito de um poder restrito ou excelso. O sucesso depende dela.

Tempo de metáforas

Os otomanos sitiam Constantinopla, mas a imperatriz bizantina sorri e relaxa. É intrigante a ligeireza de espírito de Dilma Rousseff em meio à mais dramática enrascada política vivida por um presidente desde Fernando Collor. Escapismo, confusão mental ou deliberada sabedoria?

Talvez a presidente venha articulando um plano secreto para virar o jogo. Talvez confie na intervenção divina ou, materialista, na imposição inexorável da História.

Como de nada sabemos, ficamos a observar o governo esfarelar-se entre uma pedalada e outra. Tentamos decifrar, como os leitores de Dan Brown, que simbolismos estariam escondidos em referências herméticas acerca do papel da bola indígena e da mandioca na civilização. Prevalece a fumaça do mistério.

É tempo de metáforas. O ministro Joaquim Levy relembra a escola de construção de navios, onde se fez engenheiro, e nos diz que a economia está de ressaca. Não a ressaca dos homens após a bebedeira, mas a dos mares depois da tempestade. Isso passa, garante.

O chefe da Fazenda também gosta de comparar a tarefa do governo à do marujo incumbido de desfazer a bagunça do convés e deixá-lo limpo para quando o navio desencalhar e puder cruzar oceanos. É uma alegoria liberal sobre o papel do Estado, de mero regulador de uma atividade que deveria ser praticada por empresários, trabalhadores e investidores.

Já os puritanos rejeitam metáforas. Eduardo Cunha, na Câmara, e Sergio Moro, no Judiciário, parecem predestinados de Calvino. Cunha colocou a Casa num transe de votações definidoras cujo confuso resultado ameaça a estabilidade institucional e o equilíbrio fiscal. Moro e os procuradores intocáveis na vampírica Curitiba agem como cruzados que creem estar passando 500 anos de corrupção na lâmina de suas espadas.

Tenho pensado em me mudar para o Paraguai. No sentido metafórico.