sexta-feira, 17 de abril de 2015

Um valioso companheiro


“O Partido dos Trabalhadores expressa sua solidariedade a João Vaccari Neto e sua família, confiando que a verdade prevalecerá no final."

O PT perde o pelo mas não perde o vício. Quando o condenado, o indiciado, o acusado, o suspeito não são ainda “heróis do povo brasileiro” e não exibem suas capas de superman e não erguem os seus punhos guerreiros, têm a solidariedade incondicional do partido, o que é bom para cimentar pactos de “omertá”, mas tem pouco a ver com práticas republicanas e democráticas.

A acusação a Vaccari não é jogar papel de bala na calçada nem furar a fila do cinema, é uma acusação séria. Segundo os procuradores do MP, ele desvia recursos para o PT há 10 anos.

É pacífico que uma acusação não é uma condenação, e que a presunção de inocência é um princípio pétreo, mas o PT, que se perdeu em debates internos se deveria ou não afastar o secretário do seu posto antes da prisão, coloca em risco a sua reputação (mas que reputação? -você pode perguntar maliciosamente) ao solidarizar-se tão incondicionalmente com um réu.

Se já não fosse uma posição exótica e recorrente do partido sempre solidarizar-se com seus suspeitos, acusados, réus e até mesmo condenados, eis que o líder do partido na Câmara, o espetacular deputado Sibá Machado, aquele para quem a CIA está atrás de tudo, a prisão de Vaccari foi uma “prisão política".

Há já algum tempo que o PT perdeu o medo do ridículo, e talvez fosse conveniente ao partido pensar em contratar uma empresa de administração de crises, do tipo daquela do seriado televisivo “Scandal”, pra dar conta do sobrecarregado expediente do partido no item “questões nebulosas”. Não há’ Ruy Falcão nem Sibá Machado que dê conta de carregar esse fardo sozinho.

Estoicamente, Vaccari desta vez se deixou prender sem obrigar os policiais a pular o muro, e disse, serenamente, que já esperava pelas algemas. Sua cunhada, acusada de estar envolvida em alguma de suas “enrascadas” (para usar o vocabulário logístico) até o momento em que escrevo, era considerada foragida, e a mulher e a filha tinham algumas coisas a explicar.

O titular deste blog, Ricardo Noblat, citando o repórter Paulo Celso Pereira, já teve oportunidade de mostrar a extraordinária eficácia de Vaccari como arrecadador. Um verdadeiro mão de ouro. E cita:

"Em 2007 e 2009, últimos anos não eleitorais antes de Vaccari virar tesoureiro, o PT arrecadou, respectivamente, R$ 8,9 milhões e R$ 11,2 milhões.”

"Boa parte das doações se originaram justamente de empreiteiras investigadas na Operação Lava-Jato, como OAS, Odebrecht, Camargo Corrêa, UTC e Galvão Engenharia."

"Nos dois anos não eleitorais seguintes quando Vaccari já cuidava da grana, a arrecadação disparou: foram R$ 50,7 milhões em 2011 e R$ 79,8 milhões em 2013.”

Na mesma época, apurou o repórter, o PSDB arrecadou 2,3 milhões (2011) e 22 milhões (2013).

Portanto, além do tradicional título de “herói do povo brasileiro”, como os presidiários anteriores, Vaccari carrega mais do que o simbolismo, porque na verdade vale quanto pesa e quanto carrega em segredos.

Toda solidariedade é pouca a um companheiro tão valioso.

Atitude não nos falta!


Criativos, lá isso somos. Ou alguém duvida da criatividade de João Batista Viana, Barão de Drummond?

Seu Jogo do Bicho, lançado em 1892, e que era ilegal desde o primeiro sorteio (o que não impediu que logo se espalhasse por este imenso Brasil), apesar da concorrência com todas as modalidades de jogo bancadas pelo governo federal, continua a ser o favorito em nossas ruas e há até cidades onde podemos “fazer nossa fezinha” debitando no cartão de crédito e levar o ticket impresso no bolso. Guarde o ticket: vale o escrito!

Já no século 21 criamos algo que, se bem explicado em fóruns internacionais, poderá se alastrar pelo mundo. Digo isso porque sei que a corrupção não é brasileira, ela é global desde tempos imemoriais. Em Roma havia corruptos. Em Atenas havia corruptos.

Só que, criativos como o Brasil são pouquíssimos países. Ou vocês conhecem outro lugar com propinas tidas como oficiais? Declaradas, contabilizadas, carimbadas, tudo dentro dos conformes? O Petrolão possibilitou essa espantosa modalidade de propinas.

Ambiciosos e cheios de atitude, apesar da Petrobras estar no olho do furacão, a saga da corrupção continuou. As doações ao PT prescindiram do petróleo e passaram para a área das palavras: o novo caminho era o empresário contribuir com pagamentos para a 'Editora Gráfica Atitude', visando publicidade para suas empresas.

João Vaccari Neto, tesoureiro do PT, se encarregava do papo com os empresários desejosos de colaborar com o partido. Segundo um dos empresários, Vaccari lhe pediu que “ao invés da realização de doações ao Partido dos Trabalhadores, contribuísse com pagamentos a Editora Gráfica Atitude”. A editora já fora multada pelo TSE, o que não foi impedimento algum.

O tesoureiro do PT compareceu à CPI da Petrobrás munido de um habeas-corpus para não ser obrigado a responder perguntas desagradáveis. Desafiou a sorte e com as bênçãos do presidente do PT, continuou no mesmo cargo.

Quero crer que o senhor Vaccari, dessa vez, esticou muito a corda e que agora, ex-tesoureiro do partido, não terá escapatória, mas digo isso com cuidado, pois aqui, neste gigante recém-despertado, tudo parece possível.

Outras criações verde-amarelas começam a pipocar. Por exemplo, a presidente da República indicar, para o Supremo Tribunal Federal, o nome de um juiz que, na campanha eleitoral de 2014, gravou propaganda pedindo que se votasse nela. Ele justificou o pedido declarando toda sua admiração pela candidata e seu partido. Como votará se for parar no STF, é a pergunta que se impõe.

Mas não paramos aí. Outra criação brasileira parece estar fazendo sucesso. É a guerra dos cabides. O vencedor não é quem tem mais força ou mais cabides. Ganha quem tem a caneta. Estranho, não é? Mas aqui é assim. Tudo muito estranho.

Um mochileiro de ouro


Os ladrões de bens particulares passam a vida na prisão e acorrentados; aqueles de bens públicos, nas riquezas e nas honrarias
Catão, o Censor

Nada como um dia de inferno depois de uma noite de festa. Foi o que aconteceu com o PT de Lula, o capo di tutti capi.

Em reunião Congresso Nacional de Metalúrgicos da CUT, em São Paulo, na noite que antecedeu a prisão, com direito inclusive a peça teatral (profética?) apresentando Lula e Dilma enforcados, Lula novamente despejou toda sua bravata: "Não podemos permitir que a infâmia, o mau caratismo e a má fé de algumas pessoas venham a destruir um projeto político que nós começamos a construir no país".

Lula não esconde que é um garganta de peso. Mente mais do que a própria mentira e tem uma capacidade extraordinária para transformar roubalheira em desenvolvimento. Mas felizmente não tem o dom de mudar os fatos como da prisão do companheiro Vaccari, a quem tanto blindou. E vai continuar blindando enquanto puder agora com o reforço de ministros petistas como José Eduardo Cardozo e Jacques Wagner ou do loquaz líder na Câmara, Sibá Machado. Afinal Vaccari não cuidava só das finanças, mas das negociações do PT.

É impossível o país engolir mais essa encenação bufa em nome de um projeto partidário de monopólio governamental. Só deixa passar quem assina atestado de cumplicidade com o crime.

O prontuário de João Vaccari não tem apenas o cargo de tesoureiro de sucesso conquistando recordes de doações desde de 2004, quando já está na mídia o mensalão e citado outro tesoureiro petista, Delúbio Soares, hoje condenado. O ex-bancário e sindicalista, alcunhado de "Moch", vale seu peso em ouro. Não é à toa a blindagem e a defesa do ex-tesoureiro escandalosamente defendido por Sibá como "preso político", o que mostra a falta de vergonha petista quando apela para correr da Justiça.

Vaccari, enfim preso na operação Lava Jato, deixou o PT desarvorado, que não contava, ao menos agora, com a prisão. Mas a mais emporcalhada pelo caso Vaccari, embora não tanto citada na mídia, é Dilma, que assinou sua nomeação, quando ministra das Minas e Energia, em 2003 para o cargo de conselheiro da Itaipu Binacional, a segunda maior empresa do mundo no setor.

Como explicaria Dilma um conselheiro de uma empresa de tanta importância no país que não passava de tesoureiro de seu partido? Seria para dar uma ajuda de custo de pouco mais de R$ 20 mil mensais para seis reuniões por ano? Vaccari, portanto, já era escândalo e protegido desde aquela época. Do cargo, só saiu em janeiro de 2015 nem mesmo respondendo desde 2010 à denúncia do Ministério Público por suposto desvio de recursos da Bancoop, uma cooperativa habitacional.

Vaccari tem mais valor para o PT do que imagina nossa vã filosofia. Se continua empurrando seu processo como réu por estelionato, formação de quadrilha, falsidade ideológica e lavagem de dinheiro no caso Bancoop, nada afetava até então o ex-tesoureiro que, pasme-se, chegou a ser cotado para ocupar a presidência da Caixa Econômica Federal. Ainda bem que Deus é brasileiro!

Fracasso da 'pátria educadora'

A “pátria educadora” anunciada pela presidente da República não se sustenta para além da propaganda nem se ampara nos fatos

O desmantelo que caracteriza o governo de Dilma Rousseff, refletido pela ampla rejeição à presidente verificada nas últimas pesquisas, atinge também a educação. Aquela que talvez seja a área mais importante para o futuro do país, contemplada pelo marqueteiro oficial com o slogan “pátria educadora” como palavra de ordem, é uma das que mais sofrem com o descaso, o abandono e a incompetência de quem não tem nenhum compromisso com o Brasil, apenas com seus próprios interesses.

O resultado de tamanha desfaçatez não demorou a aparecer, e a peça de ficção construída pela propaganda enganosa do PT ruiu mais uma vez. Segundo um relatório divulgado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), o país cumpriu apenas duas das seis metas fixadas em 2000 pelo Marco de Ação Educação Para Todos (EPT), compromisso firmado por 164 nações, para o período até 2015.

Os únicos objetivos alcançados pelo Brasil, na esteira de avanços que já haviam sido conquistados durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, foram a educação primária universal (primeiro ciclo do ensino fundamental, do 1º ao 5º ano) e a paridade de gênero (mesma proporção entre meninas e meninos) nas escolas.

O estudo ainda aponta que o Bolsa Família – cantado em prosa e verso pelo lulopetismo como a solução de todos os problemas – “não enfrenta os desafios” dos mais pobres na área educacional, embora melhore suas condições de vida de forma imediata e temporária. Também não se alcançou um nível razoável de expansão da educação infantil (creche e pré-escola), especialmente para as crianças mais vulneráveis, nem se ofereceram condições para que os jovens concluam o ensino médio no tempo adequado.

Outro drama agravado nos últimos anos é o analfabetismo. De acordo com a Unesco, o país não alcançou a meta de redução de 50% e concentra 38,5% dos analfabetos na América Latina. Dos 36 milhões de adultos latino-americanos que não sabem ler nem escrever, 14 milhões são brasileiros. Vale lembrar que também o IBGE já havia registrado, entre 2011 e 2012, um vergonhoso aumento no índice de analfabetismo do país, após 15 anos de quedas consecutivas, com um acréscimo de cerca de 300 mil pessoas ao grupo daqueles que são incapazes de se comunicar pela escrita.

A opção profundamente equivocada dos governos Lula/Dilma de apenas transferir recursos e bolsas para a área educacional, ao invés de criar programas consistentes e de qualificação, fez com que o Brasil regredisse e atrasasse o desenvolvimento de milhões de crianças e adolescentes. Para o PT, e isso ficou claro nos últimos 12 anos, o que importa é a quantidade de novos cursos, faculdades e universidades país afora, e não a qualidade do ensino oferecido aos jovens brasileiros. Infelizmente, pagaremos durante algumas décadas por tanta irresponsabilidade.

A “pátria educadora” anunciada pela presidente da República não se sustenta para além da propaganda nem se ampara nos fatos, que insistem em desconstruir essa realidade edulcorada. Trata-se de um lema que não diz nada, de um mero deboche contra os brasileiros, de um engodo falacioso criado sob medida para tentar ludibriar os cidadãos. Mas a esmagadora maioria do povo brasileiro, que tem ido às ruas contra o atual governo e o PT, não se deixa mais enganar.

Roberto Freire

Corsários e piratas

Um corso, ou corsário, (do italiano corsaro, comandante de navio autorizado a atacar navios) era alguém que, por missão ou “carta de corso” (ou "de marca") de um governo, era autorizado a pilhar navios de outra nação (guerra de corso), aproveitando o fato de as transações comerciais basearem-se, na época, na transferência material das riquezas. Os corsários agiam de acordo com seu soberano, exclusivamente em período de conflito. Seus navios eram armados por particulares, mas com autorização concedida pelo governo, e compunham os quadros da Marinha nacional.

Já os piratas agiam ilegalmente em tempo de guerra ou de paz, sem qualquer regra, sem pertencer a reis ou a qualquer governo.


Em comum, o fato de seus ataques causarem o apresamento ou afundamento do navio atacado, que tinha sua carga roubada e sua tripulação e passageiros morta ou aprisionada para posterior pagamento de resgate. Para as vítimas, ambos eram bandidos.

Também não era raro que um corsário desviasse parte do botim para seu próprio enriquecimento, escondendo-o em alguma fortaleza ou remota ilha – a ilha do tesouro, tema de tantos livros de aventuras.

Nos dias de hoje, corsários e piratas agem de outra maneira, mas ainda existem. Podem desviar recursos ou informações valiosas das vítimas, material ou virtualmente, pela pirataria das redes de informática. Podem agir por interesse próprio, por interesse de governo ou empresa poderosa, ou ambos. Podem até assaltar navios na costa da Somália.

No Brasil esses bandidos têm agido intensamente, em especial nos governos petistas, para quem os fins justificam os meios e tudo é válido, desde que colabore para a manutenção do poder pelo partido.

Há corsários, que cumprem missão para autoridades ou partidos, infiltrando-se em grandes empresas públicas (Petrobras), em ministérios (Transportes, Saúde, Cidades) ou outros órgãos do governo (BNDES). Sua missão envolve fraudes em licitações, pagamento de obras inacabadas ou serviços não prestados, aditivos milionários aos contratos firmados, na guerra sem quartel entre os aproveitadores políticos e a população indefesa, que sempre leva o prejuízo.

Já os piratas modernos tiram proveito de sua posição na hierarquia dessas empresas e órgãos para se locupletarem, enriquecendo ilicitamente às custas do mesmo povo.

Para as vítimas, como nos tempos coloniais, não há diferença: todos são bandidos, pois seus roubos tomam recursos que deveriam ser empregados na melhoria das condições de vida da sociedade espoliada.

Antigamente, os corsários e piratas aprisionados eram julgados pelo Almirantado Britânico, para verificar sua situação legal e decidir seu destino, em geral a forca.

Hoje vivemos tempos mais civilizados, onde os flibusteiros descobertos têm direito a longos julgamentos, defendidos pelas mais caras bancas, protegidos por autoridades que não querem ser envolvidas no escândalo, ampla defesa, contraditório, mil recursos e delongas, na esperança de que seu crime prescreva.

Há muita gente com saudade do velho tempo da forca...

Há vagas para estadistas

“Estou triste, pensei que ia bombar”, foi a frase da vendedora Luiza Belmont, ambulante que atua na estação Consolação do metrô, decepcionada com a baixa demanda de seus produtos verde-amarelo fabricados para enfeitar os manifestantes de domingo em São Paulo. Como a operação do metrô foi mantida de maneira regular, era esperado que por ali chegassem aqueles que encheriam a Avenida Paulista, no protesto organizado contra a presidente Dilma Rousseff e seu governo. Talvez seja a crise, mas Luiza, peça de uma estatística maior, tem outra análise: os protestos estão perdendo força.

A sociedade grita por governos decentes, nos quais a corrupção não seja o resultado natural da realização de obras, do empenho dos gastos públicos, dos investimentos necessários ao crescimento das empresas públicas, como a Petrobras, a Eletrobras e outras 139 instituições dependuradas como sanguessugas nos recursos do Tesouro Nacional.


O cidadão pretende que não seja a corrupção a peça de defesa mais cintilante e eficaz para abater os autos de infração julgados no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) de Brasília (DF) – este que promete ser o mais novo escândalo de plantão. Aí, esperem, há bilhões varridos para debaixo do tapete.

A sociedade quer que sentenças prolatadas pelo Poder Judiciário não sejam produzidas pelos conchavos armados pelos grandes escritórios de advocacia, afinados com ministros, desembargadores e juízes, denunciados à larga em representações que as corregedorias e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) não são capazes de processar e julgar.

A sociedade não quer um Congresso de Bolsonaros e de seus malformados aprendizes, com senadores e deputados ausentes, surdos às demandas evidenciadas por seus eleitores, que passam os mandatos vomitando pelas redes sociais o que não acreditam, em bem trabalhados vídeos, com suas falas vazias e com suas representações igualmente vazias.

A sociedade quer projetos exequíveis, governos comprometidos, instituições autênticas e fortalecidas, políticas públicas concebidas para que o Estado seja presente nas áreas em que sua autoridade seja indelegável e naqueles setores onde esse mesmo Estado possa representar o incremento do aperfeiçoamento da economia, da realidade e das relações sociais.

A sociedade quer efetividade, propostas concretas – e não promessas. Não quer ouvir conversa fiada, panelaço nas frestas da janela, blá-blá-blá de senadores e deputados de momento. O Brasil quer mais, mas infelizmente não sabe onde buscar o que nos falta, porque as lideranças que se apresentam, independentemente do poder que integram ou onde estejam, ainda não se mostraram maduras e confiáveis.

Como já muito dito, há vagas para estadistas
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12% não é sustento

 Com 12% de aprovação, não é a democracia que sustenta a presidente. É o Estado de Direito. Então pergunto: pode ele servir para proteção do governo que vemos e não para proteger a sociedade do governo?
Percival Puggina 

Sobre as manifestações

Desqualificar os protestos não muda o fato de que não são só os bolsonaros que estão cheios do governo
Mal terminaram as manifestações de domingo, e as redes sociais já estavam cheias de postagens da militância governista, reproduzindo com perversa alegria os seus piores momentos: uma senhora covardemente agredida em Copacabana porque ousou perguntar aos manifestantes se sabiam quem governaria o país se Dilma fosse afastada, um fotógrafo mineiro apanhando apenas porque se parece com o ex-presidente Lula, analfabetos funcionais pedindo intervenção militar em mau português e pior inglês, como se este absurdo não fosse suficiente numa só língua.

Infelizmente, os protestos contra o governo têm mesmo reunido uma turma indigesta. Mas, ao contrário do que se esforçam em fazer crer os posts que atacam as manifestações, essa turma está longe de ser representativa da maioria dos brasileiros e brasileiras que têm ido às ruas. Desqualificar o descontentamento da população apontando para os piores boçais pode até servir de consolo para os petistas, mas não muda o fato de que não são só os bolsonaros da vida que estão cheios do governo.

Dito isso, é triste constatar como o Brasil anda mal frequentado. Em todos os cantos e por toda a parte, a começar naturalmente pela Esplanada dos Três Poderes.

Os idiotas e desmemoriados que pedem intervenção militar estão contaminando as passeatas. Assim como os black blocks nas manifestações de junho de 2013, que também eram minoria, eles comprometem o todo, e podem afastar — se é que já não estão afastando — as pessoas que estão descontentes, gostariam de se fazer ouvir, mas não querem compactuar com essa sandice.

“Esquerda” e “direita” são conceitos maniqueístas ultrapassados. Ainda são utilizados porque não interessa aos fundamentalistas de um e de outro lado perceber a imensa gama de posições políticas que existe entre os dois extremos. Aos dois lados, que são muito mais parecidos do que diferentes, interessa dividir o país e semear o ódio.

O PT, por estar no poder, tem mais culpa pela polarização do que qualquer outro partido. Cabe aos vencedores estender a mão aos vencidos, e não o contrário. Se Dilma Rousseff fosse minimamente dotada para o cargo, teria feito um belo discurso de conciliação nacional ao tomar posse, ao invés de ignorar por completo a oposição; se Lula estivesse minimamente preocupado com os rumos do país, falaria para todos e em todos, e não em “nós” e “eles”. Estadistas que cuidam de um país, ao contrário de oportunistas que cuidam de um partido, se dirigem a todos os cidadãos, indistintamente. Cultivam a união, e não a cizânia.

O que esperam os luminares do PT ao bater nessa tecla? Acham que não enfrentarão reação alguma? Acham que as pessoas que não votaram em Dilma vão cobrir a cabeça de cinzas e aceitar, humildemente, as incontáveis ofensas que lhes são dirigidas pelo establishment?

Não se iludam. A cada ação corresponde uma reação igual e contrária. Quando Lula ameaça convocar o “exército do Stédile”, os defensores da intervenção militar correm a pintar suas faixas e a telefonar para os generais; quando Dilma participa de atos do MST, os outros imbecis também perdem a modéstia.

Nas redes sociais, na mídia e por toda a parte as pessoas se perguntam por que houve menos gente nas ruas no domingo passado do que no dia 15 de março, uma vez que os índices de rejeição ao governo continuam iguais, se não maiores. Como todo mundo, eu também tenho as minhas teorias.

Para começo de conversa, acho que as duas datas foram muito próximas: para quem ainda tem quatro anos de Dilma pela frente, fazer uma passeata por mês é desgastante e, convenhamos, um tanto inútil. A manifestação do dia 15 de março foi importante para mostrar ao governo o grau de insatisfação que sentimos; mas o governo sabe, e nós sabemos que ele sabe, que esse sentimento não mudou de lá para cá. É possível que, uma vez dado o recado, não seja necessário repeti-lo com tanta frequência.

No caso específico do Rio, a Atlântica não é uma boa avenida para protestos. Há lugares que representam o coração das cidades, onde todos os moradores têm uma sensação de pertencimento igual; mas a Atlântica não é um deles. Ela é Zona Sul demais, elite demais. O Centro sempre foi o ponto nevrálgico do Rio, o bairro para onde todas as tribos e classes sociais convergem nas grandes manifestações de cidadania.

Finalmente, acho que, como as manifestações de 2013, as deste ano também carecem de foco. Isso ficou claro nos cartazes exibidos, que tinham de tudo, de reclamações contra a infame tomada de três pinos a declarações perigosamente reacionárias.

Ora, ninguém consegue ficar protestando contra “tudo isso que está aí” indefinidamente. As primeiríssimas manifestações, tanto aquela de junho quanto essa de março, serviram para tirar o grito que estava entalado na nossa garganta coletiva. Dado o berro inicial e libertador, porém, é preciso uma pauta mais concreta. Faltam palavras de ordem. Mesmo o “Fora Dilma!”, tão repetido, não é suficientemente representativo, nem tem a força da unanimidade do antigo “Fora Collor!”

A militância petista insiste em dizer que as manifestações têm alma de golpe, que os pedidos de impeachment da Dilma são golpe, que a oposição é movida a golpe. Veem golpe em toda a parte. Só não perceberam o golpe que foi dado debaixo do seu nariz. Elegeram o PT, mas agora estamos, oficialmente, nas mãos do PMDB.

Pensando bem, quando é a próxima manifestação?

Cora Rónai 

Resultado de imagem para manifestação de domingo nas ruas

A operação Zelotes e os ladrões blindados

Nada parece ser tão compensador quanto ser empresário ladrão no Brasil. Organizam um saque sistemático aos cofres públicos, são pegos com a boca na botija e recebem de troco incrível blindagem midiática. Falo do maior escândalo de corrupção da história recente do país. Não, não é o da Petrobras. O assim chamado “petrolão”, com todas as suas conexões partidárias – do PT ao PSDB, passando pelo PMDB de Renan Calheiros e Eduardo Cunha –, representou um desvio estimado em R$ 2,1 bilhões, segundo o Ministério Público Federal.

Muito dinheiro, é verdade. E um caso revelador do modus operandi do sistema político brasileiro, fundado no financiamento privado das campanhas eleitorais. Ou, como confessou Paulo Roberto Costa: “Não existem doações de campanha, só empréstimos a juros altos”. Mas, evidentemente, não é por aí que vai a exploração midiática do caso .

O mais impressionante é que, no final de março, há menos de quinze dias, explodiu um escândalo de proporções maiores que o da Petrobras, mas alvo de cuidadosa blindagem. A operação Zelotes da Polícia Federal descobriu um esquema de desvio de recursos públicos por grandes empresas

Operado através do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), com a mediação de escritórios de advocacia, empresas conseguiam anular ou reverter multas bilionárias com o poder público, mediante propinas a conselheiros. Estão sob investigação mais de 70 companhias, totalizando um desvio de R$ 19 bilhões. Quase dez vezes o valor desviado da Petrobras.

Apenas o montante do maior processo, do banco Santander, é de R$ 3,34 bilhões. O segundo maior, do Bradesco, é de R$ 2,74 bilhões. Cada um deles, sozinho, supera os R$ 2,1 bilhões da Petrobras. Somente os 12 casos em que a Polícia Federal detém provas mais conclusivas –incluindo os dois bancos citados– representam um rombo de R$12 bilhões aos cofres públicos.

Um deles é o do grupo de comunicação RBS, a maior afiliada da Rede Globo, investigada na Zelotes pela fraude num processo de R$ 671 milhões.

Corrupção graúda, protagonizada por magnatas das finanças e do mundo corporativo. Mas onde estão as manchetes histriônicas? E o som das panelas? Seria pedagógico para o país ver multidões de verde e amarelo manifestando-se em frente ao Santander, pedindo nosso dinheiro de volta. Só que não.

Nem no Santander, na Gerdau, no Bradesco e na Ford. Nem no Safra, na Mitsubishi. A Mitsubishi, tão limpinha! Essa é a imagem do setor privado no Brasil, sempre positiva, apresentado como alternativa à roubalheira no setor público.

A preservação desta imagem, mesmo após escândalos como o da Zelotes e do HSBC, só se explica pela blindagem que os grandes grupos econômicos conseguem garantir junto à maior parte da mídia, da qual são também poderosos anunciantes.

É inaceitável que os grandes corruptores continuem tendo suas identidades preservadas e tratados como coadjuvantes, mesmo sendo desde sempre os maiores beneficiários dos esquemas.

São ladrões blindados. Saem da lama limpinhos e cheirosos. E se, por descuido, vier algum respingo à marca, nada que a próxima campanha publicitária –quiçá paga com dinheiro desviado da Receita– não possa resolver.

Denúncias seletivas, indignação seletiva e acusados seletivamente blindados. Essa é a turma que fala em limpar o Brasil da corrupção?