terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

A 'maçã' e a Justiça

A política da "maçã podre" é danosa para o combate e a prevenção à corrupção. (...) A corrupção não decorre só de fatores individuais, mas também organizacionais. Não queremos só medidas em relação aos indivíduos, mas também às empresas, a aparatos organizados que contribuíram para que isso acontecesse
Deltan Dallagnol

No Oscar do Brasil

Filme B


Neste faroeste do cerrado, bandido que se presa sai (e às vezes cai) atirando. Tenta convencer que sempre foi assim. Que é tudo igual. Que todos são o mesmo

Engana-se quem pensa que é pesadelo. Sonhos ruins duram pouco. Desaparecem com despertar sobressaltado, agitado, cheio de ansiedade. Tem vida curta e deixam poucos resíduos.

Também se engana quem já viu este filme. Não é filme antigo. Não se trata de reexibirão. O que não quer dizer que a historia seja original. O filme de hoje é refilmagem sem versão original.

Espécie de filme b que agride olhos; perfura ouvidos; ofende inteligências. Enfim, mesmo que tenha sobrado orçamento na produção da historia, falta qualidade a narrativa. Talento é coisa difícil de ser comprada.

Já faz tempo que o roteirista de dispensou da obrigação de produzir narrativas sem sentido. E, pior ainda, repete, em ciclos, a mesma sequencia narrativa. Nos primeiros momentos, esconde a realidade e vende castelos nas nuvens, contos de fada, ou historias desconectadas de qualquer sentido ou materialidade.

Baixada a poeira, a ilusão não mais se sustenta. E nosso roteirista abraça a negação. Faz de conta que o elefante não esta na sala. E diz que não existe, não viu, não sabe, ou não é com ele. Finge. Finge tão completamente que chega a se convencer de sua própria mentira.

Nem sempre a repetição da mentira parece verdade. Na maior parte dos casos, parece mentira velha mesmo. Diante disso, o dedo indicador parece começar a funcionar. Fabricar culpados é tarefa simples. Basta distender o indicador. Não precisa imaginação, talento, ou arte. Embora a falta de escrúpulos ajude muito, a falta de familiaridade com o idioma compromete.

O problema, neste caso, é que a eficácia do dedo indicador é diretamente proporcional a credibilidade de seu dono. E credibilidade é coisa rara neste ajuntamento de cérebros baldios. Na impossibilidade de culpar exclusivamente ao outro, as opções diminuem.

Neste faroeste do cerrado, bandido que se presa sai (e às vezes cai) atirando. No que vê e no que não vê. Invariavelmente acerta o próprio pé. Mas sempre espalha a lama. Pinta todos com a mesma cor. Tenta convencer que sempre foi assim. Que é tudo igual. Que todos são o mesmo.

Incapaz de levantar o nível investe em rebaixar o teto.

Pobre pobre

Amado seja aquele que tem percevejos,
o que anda sob a chuva com sapatos furados
o que vela o cadáver de um pão com dois fósforos,
o que prende um dedo numa porta,
o que não tem aniversário,
o que perdeu sua sombra num incêndio,
o animal, o que parece um papagaio,
o que parece um homem, o pobre rico,
o puro miserável, o pobre pobre! 
Cesar Vallejo 

Vamos educar!

A educação também precisa de educadores. Precisamos de educadores para educar os educadores. Sinto que precisamos de dimensão moral. Por exemplo, faculdades de medicina, de engenharia, arquitetura, jornalismo. De algum modo, faltam conceitos morais, éticos. Acho que deve ser obrigatório o estudo da ética. É a principal coisa. Ao mesmo tempo devemos celebrar a vida. Eu disse antes que, no nazismo, havia o culto da morte. Devemos celebrar a vida. Eu digo, como escritor, que se pegarmos todos os livros do mundo que tratam da vida, e os colocarmos em um prato da balança e, no outro, uma vida humana, qualquer uma, essa vida humana é mais importante, pesa mais que todos os livros sobre a vida. E é isso que devemos ensinar aos nossos filhos, alunos, adultos, médicos, arquitetos. Não tenho o direito de denegrir a vida. Se eu fizer isso, é uma ofensa a Deus e a sua criação.
Elie Wiesel 

O melhor silêncio

Em certos momentos tudo parece ser inconsolável, mas consolo há. Sempre. Como os faiscantes brilhos tingem a água de ouro, chegará o momento em que a luz mais tênue dará cor e profundidade ao oceano. Debaixo do espelho aparecerá um mundo de cores e de seres fantásticos que ignoram o que está acima. Os manacás no jardim hoje cheiram como nunca, mais ainda ao entardecer, e chamam atenção pela “inteligência” que neles se encontra. As potestades divinas que os sustentam, que brincam com eles como um músico brinca com seu instrumento, fornecem o testemunho da incalculável inteligência que melhora a natureza.

Em cada centímetro quadrado desse mundo se esconde o universo, e se aprendermos a notar o que tudo liga e interliga, inclusive os homens uns aos outros, poderemos ler o céu, as cartas e a palma da mão, poderemos ter explicação dos eventos, ler o passado, entender o presente e pressentir o futuro.

Quando as pessoas começam a usar enganos como facilitações e os criam em benefício próprio, estão perto de se perder. Os enganos enganam em todos os sentidos, a começar por quem os cria.Nunca revele, dizem os sábios, mais do que o necessário a um despreparado, a um estulto que por vias tortas quer chegar à afirmação de si. Esse, se chegar, não terá proveito, deixará oca sua lembrança, ou ela ficará marcada de negatividade.

É temerário dizer ao porco, que naturalmente gosta de seu semelhante, que existe maior beleza em outras raças, ainda explicar-lhe que o porco fede e chafurda em fezes. Ele se sentirá ofendido. Explicará, em seguida, aos outros porcos que todos eles são porcos e desagradáveis para o resto da humanidade. Nenhum deles entenderá, e todos juntos se armarão.

Portanto, nunca explique a ele o que faz dele um animal de pouca estima, não diga que sua prole é desafortunada em relação a outra. Pois o porco se invocará. Ele ainda atiçará na raça o sentido de injustiçado, que é absolutamente enganador. Porco é porco, apenas não pode ser lembrado de ser porco.

Este tem que ser mantido onde ele pode chafurdar, excluído de ambiente mais urbano. Pois vale o ditado de que “quem com porco anda farelo come”.

Também não explique a quem cometeu erros que esses fazem parte de sua derrota. Considerará a amigável e correta observação como fosse uma afronta.

Não fale mais que o necessário e deixe o silêncio executar inexoravelmente o que apenas a ele cabe. Do silêncio nascemos e no silêncio acabaremos. Findam-se ciclos, e outros nascem das ruínas.

Assim como quem perde uma luta e encontra a “principal” culpa nos outros, sem considerar a axiomática verdade de que cada um é artífice da sua sorte, não vale a pena informá-lo de seus erros. Muitas vezes, em vez de agradecer pela crítica, quem é estulto resvala na vingança contra quem lhe revelou o caminho certo.

Existem pessoas que fundamentalmente desconfiam de serem inferiores, não se resignam a esse papel, querem fraudar a realidade e vivem abatendo e capinando o que está em volta para se sobressaírem. Isso é o que mais acontece com a humanidade, e os resultados estão nesse incrível desconforto moral e social em que precipitamos.

Vittorio Medioli

Começou o ano

Revolta do cidadão não é golpe

O pedido nos cartazes é o mesmo, só mudou o nome a quem se apela
O golpismo tão propalado por Dilma, Lula e Companhia Ilimitada certamente não está na Oposição, a quem atribuem essa sensação térmica no ar. Com sua costumeira assepsia de não entrar em briga para não sujar as mãos, e com a turminha que tem, está mais do que encolhida, restrita a piparotes. Não tem jeito de dar golpe nem de ar. Por ela, tudo seria como dantes no quartel de Abrantes numa briguinha eterna com o PT e sua gangue. É como numa frase de Eduardo Galeano: “Na luta entre o bem e o mal, quem morre é o pobre”. Que se dane esse!

O “golpe” da Oposição, como insistem as hordas petralhas, não passa de uma insistente revolta com os desmandos, a roubalheira e os arrochos que vêm aí. O que está se convencionando chamar de golpismo, por interessar muito à propaganda nazi-petista - dá um tremendo ibope na massa de imbecis - é a pura e simples saudável revolta. Essa mesma que saiu às ruas e foi apagada por um contragolpe, que alcunhou de vez manifestantes como black-blocks, esquecendo-se de que em 1968 foram estudantes fazendo o mesmo estardalhaço e quebra-quebra. Eram revolucionários, subversivos, poderiam derrubar o país com paus, pedras e bolas de gude.

Preferível, para afugentar gente das ruas, dar um novo nome, mais sugestivo e assustador, deixar o pau comer solto e muito holofote de câmera em cima para amedrontar a quem se atrever. Faz parte do jogo de cena da manutenção do poder. Sem tirar nem por, assim fizeram os militares. Até taxarem estudantes que se manifestavam de bandidos, dando aos “cabeças” até direito de foto em cartaz de Procura-se.

A tentativa é calar a boca de quem reclama para melhor e tranquilamente continuar com as práticas de se implantar de vez, no trono da República Petista do Brasil, um reino de assalto ordenado a uma população escravizada para pagar o comissariado, os banqueiros, os empresários e logicamente os políticos.
Com o manifestos contra o golpismo, divulgado e assinado pelos mesmos conhecidos correligionários ou simpatizantes dos desmandos, o objetivo é livrar muita gente da Justiça e em particular blindar as estelares Dilma e Lula de caírem em desgraça definitiva. Querem salvar a própria pele e o Partido dos Trabalhadores de ficarem estigmatizados como os maiores ladrões que já roubaram um país, porque até agora o recorde de empresa mais assaltada por um governo pertence à Petrobras.

Da tragédia à farsa

A presidente tem agora a oportunidade de reafirmar seu compromisso com as apurações dos malfeitos “doa a quem doer”. Pode até mesmo repreender seu ministro da Justiça
“Hegel observou que todos os fatos e personagens de grande importância na História universal acabam por se repetir. E esqueceu-se de acrescentar: ocorrem a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa”, registrava Karl Marx em “O 18 Brumário de Luís Bonaparte” (1852).

Pois bem, socialistas bolivarianos e peronistas do século XXI insistem em praticar como farsa os mesmos experimentos que causaram tragédias no século XX. O poder político é conquistado essencialmente pela promessa do Paraíso na Terra.

Os pobres, deserdados pela insensibilidade dos liberais e pelo oportunismo dos conservadores, tornam-se então presas fáceis da secular seita socialista que arrancou das grandes religiões a bandeira da solidariedade.

Instalados no poder os socialistas, de sua ignorância em assuntos econômicos resulta inexorável desorganização da base produtiva. Segue-se o caos social e dispara-se finalmente a busca de bodes expiatórios. Assistimos depois aos sucessivos episódios de desonestidade intelectual, irresponsabilidade moral e truculência política como passos inevitáveis de uma desesperada tentativa de manutenção do poder.

Precisamos defender nossas instituições dessa grotesca e recorrente farsa histórica que já tragou nossos vizinhos. Estaremos nos próximos meses testando e aperfeiçoando nossas instituições. Veremos claramente quem são os inimigos de uma sociedade aberta no Brasil.

Joaquim Barbosa e Sergio Moro, cujas contribuições demarcaram a independência do Poder Judiciário, advertem-nos para a atuação do próprio ministro da Justiça, Eduardo Cardozo, que estaria tentando evitar a delação premiada do coordenador de um cartel de empreiteiras para fraudar licitações na Petrobras.

A presidente Dilma tem agora a oportunidade de reafirmar seu compromisso com as apurações dos malfeitos “doa a quem doer”. Pode até mesmo repreender seu ministro da Justiça. Teori Zavascki poderá demonstrar, com impecável desempenho futuro, que não evitava a delação premiada de Renato Duque quando o soltou, mas apenas cumpria o devido rito processual.

Seria o Mensalão a tragédia e o Petrolão a farsa? Tempos interessantes, pois pede-se moralidade até mesmo em patrocínios de nossa amoral festa pagã. Escola carnavalesca patrocinada por ditadura não deveria ser campeã.

Paulo Guedes