quarta-feira, 9 de julho de 2014

Governo mexe pra ficar bem na foto

Ideia é explorar imagem da presidente vinculada somente à organização do evento

A humilhante derrota do Brasil na Copa do Mundo, fora de qualquer prognóstico, acendeu, no Palácio do Planalto, o alerta sobre o efeito político do 7 a 1 na campanha da presidente Dilma Rousseff à reeleição. Se até o momento Dilma estava explorando politicamente as vitórias da seleção brasileira, a estratégia agora é tentar colar sua imagem apenas à organização do evento, considerada um sucesso pelo governo.

Logo após a derrota, a presidente tentou se colocar como uma torcedora comum, afirmando por meio de sua conta no Twitter que estava “muito, muito triste” com a derrota da seleção brasileira, e tentou passar uma mensagem de motivação para a população.

O perfil institucional do Palácio do Planalto no Facebook adotou imediatamente a linha de defender a organização do evento: “Valeu Brasil! Vamos continuar mostrando ao mundo que, mesmo sem nossa seleção na final, batemos um bolão fora de campo”.

O perfil da presidente Dilma no Facebook, que é administrado pelo PT, foi ainda mais explícito: “Perdemos a taça, mas a #copadascopas é nossa”, afirmou, repetindo o bordão adotado pelo governo para referir ao Mundial.

Imagem do Dia

Pra frente, Brasil!

A ovelha negra


Em um país distante existiu faz muitos anos uma Ovelha negra.

Foi fuzilada. Um século depois, o rebanho arrependido lhe levantou uma estátua equestre que ficou muito bem no parque. Assim, sucessivamente, cada vez que apareciam ovelhas negras eram rapidamente passadas pelas armas para quer as futuras gerações de ovelhas comuns e vulgares pudessem se exercitar também na escultura.
Augusto Monterroso (1921-2003), escritor hondurenho

Os desiludidos da República


Há um notório sentimento popular de cansaço, de enfado, de identificação do voto como um ato inútil, que nada muda
A proximidade das eleições permite uma breve reflexão sobre o processo de formação de uma cultura política democrática no Brasil. A República nasceu de um golpe militar. A participação popular nos acontecimentos de 15 de novembro de 1889 foi nula. O novo regime nasceu velho. Acabou interrompendo a possibilidade de um Terceiro Reinado reformista e modernizador, tendo à frente Isabel como rainha e chefe de Estado e com os amplos poderes concedidos pela Constituição de 1824.

A nova ordem foi edificada para impedir o reformismo advogado por Joaquim Nabuco, Visconde de Taunay e André Rebouças, que incluía, inclusive, uma alteração no regime de propriedade da terra. Os republicanos da propaganda — aqueles que entre 1870, data do Manifesto, e 1889, divulgaram a ideia republicana em atos públicos, jornais, panfletos e livros — acabaram excluídos do novo regime. Júlio Ribeiro, Silva Jardim e Lopes Trovão, só para recordar alguns nomes, foram relegados a plano secundário, considerados meros agitadores.

O vazio no poder foi imediatamente preenchido por uma elite política que durante decênios excluiu a participação popular. As sucessões regulares dos presidentes durante a Primeira República (1889-1930) foram marcadas por eleições fraudulentas e pela violência contra aqueles que denunciavam a manipulação do voto.


O processo eleitoral reforça este quadro de hostilidade à política. A mera realização das eleições — que é importante — não desperta grande interesse. Há um notório sentimento popular de cansaço, de enfado, de identificação do voto como um ato inútil, que nada muda. De que toda eleição é sempre igual, recheada de ataques pessoais e alianças absurdas. Da ausência de discussões programáticas. De promessas que são descumpridas nos primeiros dias de governo. De políticos sabidamente corruptos e que permanecem eternamente como candidatos — e muitos deles eleitos e reeleitos. Da transformação da eleição em comércio muito rendoso, onde não há política no sentido clássico.

Leia mais "Os desiludidos da República", de Marco Antonio Villa

E se o Brasil fosse mais do que uma Copa?

As vitórias das novas Copas sociais e políticas, que toda a sociedade deve disputar, serão as que colocarão este país nos trilhos da verdadeira modernidade.

O Brasil do futebol se apagou entre milhões de lágrimas, mas este país é hoje mais do que a alegria de uma bola marcando gols. O Brasil tempos atrás, em uma tarde nefasta como esta em que escrevo, mais negra talvez do que a do maracanazo de 1950, teria sido um país em total depressão. Hoje pode talvez estar indignado com Felipe Scolari ou com raiva contra aquele que deixou Neymar de fora da Copa, mas esta noite os brasileiros não se atirarão pela janela.

Haverá quem queira fazer de bode expiatório da tremenda derrota o jogador colombiano que empurrou o herói Neymar. Não é o caso, é que simplesmente o Brasil não conseguiu jogar, foi dominado pelos alemães.

E se fosse verdade, o que não é, que a derrota teve origem na ausência do ídolo Neymar, o Brasil tem de recordar as palavras de Bernard Shaw: “Desgraçados os povos que necessitam de heróis”. Referia-se aos que continuam depositando sua fé em seus caudilhos mais do que na força e criatividade de seus povos, dos não heróis, ou melhor, dos heróis anônimos, os que se forjam na luta dura do cotidiano, os que sustentam nas suas costas, com seu trabalho, o peso da nação.


Os brasileiros deveriam agora ser capazes de ver nessa derrota a luz no final de um túnel para fazer deste maravilhoso país não só o salão do futebol mundial, mas uma oportunidade de bem-estar e justiça para todos, onde o futebol, como nos países já desenvolvidos, possa ser somente um jogo que às vezes nos faz tocar o céu e outras nos devolve tristes à vida real, que é a que conta. 

Leia mais o artigo de Juan Arias "E se o Brasil fosse mais do queuma Copa?"